Acórdão nº 42/17.7PDSXL.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelALDA CASIMIRO
Data da Resolução06 de Novembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: No âmbito do processo comum (em Tribunal Singular) com o nº 42/17.7PDSXL que corre termos no Juízo Local Criminal do Seixal (Juiz 2), do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, foi o arguido, G.

, condenado, como autor material de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. pelo art. 3º, nºs 1 e 2 do D.L. 2/98 de 3.01, na pena de admoestação.

* Sem se conformar com a decisão, o Ministério Público interpôs o presente recurso onde pede a revogação da sentença recorrida no que tange à medida concreta da pena.

Para tanto, formula as conclusões que se transcrevem: 1– Impugna-se apenas a medida concreta da pena fixada pela Mma Juiz "a quo".

2– Para a aferição da medida concreta da pena considera-se: a delimitação rigorosa da moldura penal abstractamente aplicável ao caso concreto, a fixação do grau de culpa do agente e a equação das exigências de prevenção social e especial que auxiliarão o julgador no âmbito da qualificação penal.

3– O percurso conducente à fixação da pena concreta é ditado por regras e comandos normativos precisos e previstos no Código Penal.

4– Partindo da factualidade apurada, o grau de ilicitude dos factos, a intensidade do dolo do agente, o grau de violação dos deveres impostos, as consequências graves da conduta do arguido e a sua situação pessoal e social, bem como as exigências de prevenção geral e especial, entende-se que o Tribunal "a quo" não doseou equilibradamente a medida concreta da pena aplicada (vd. art. 77º do Código Penal).

5– Ainda que se concorde com o tipo de pena a aplicar (pena de multa), já não se concorda que a mesma possa ser substituída por admoestação, afigurando-se ser demasiado benévola a pena concretamente aplicada.

6– Por outro lado não estão reunidos os pressupostos legais subjacentes à aplicação da admoestação in casu, já que, atendendo ao índice de criminalidade associada ao ilícito criminal rodoviário em Portugal e ainda à taxa de sinistralidade existente nas estradas portuguesas, afigura-se que a pena de admoestação não protege cabalmente o bem jurídico segurança rodoviária, para a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, nem acautela suficientemente as necessidades preventivas gerais.

7– Com efeito, por um lado, os factos cometidos pelo arguido não são, de forma alguma, de escassa ou diminuta gravidade e, por outro lado, o tipo de crime em causa, atentas as necessidades de travar a acentuada sinistralidade que se verifica e para a qual a condução sem habilitação legal contribui em larga medida, hodiernamente tem vindo a gerar na sociedade um sentimento generalizado de repúdio; a aplicação da pena de admoestação, in casu, colocaria precisamente em causa as exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico e feriria inapelavelmente o sentimento jurídico da comunidade, tendo, consequentemente, havido, por erro de interpretação, uma errada aplicação do disposto no art. 60º, nº 2, do C. Penal.

8– Por outro lado, o facto de o arguido ter cumprido uma das injunções impostas (entrega da quantia de € 400. a instituição de solidariedade social e por, em face da sua situação irregular em território nacional, não lhe ter sido possível o cumprimento do outro dever (inscrição em escola de condução), não permite concluir que tenha havido reparação do dano; no que tange ao cumprimento do primeiro dever, há que atender à jurisprudência fixada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 4/2017, publicado no Diário da República nº 115/2017, Série I de 2017-06-16, onde se estipula que «Tendo sido acordada a suspensão provisória do processo, nos termos do art. 281º do Código de Processo Penal, com a injunção da proibição da condução de veículo automóvel, prevista no nº 3 do preceito, caso aquela suspensão termine, prosseguindo o processo, ao abrigo do nº 4, do art. 282º, do mesmo Código, o tempo em que o arguido esteve privado da carta de condução não deve ser descontado, no tempo da pena acessória de inibição da faculdade de conduzir, aplicada na sentença condenatória que venha a ter lugar.» 9– Se assim é para o caso de cumprimento de injunção análoga ao cumprimento de pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor, também raciocínio semelhante se deverá operar para o cumprimento de outros deveres no âmbito da suspensão provisória do processo, nomeadamente de entregas de valores monetários, os quais não deverão por qualquer forma ser considerados, em caso de prosseguimento dos autos para a realização de audiência de discussão e julgamento, na determinação das penas principais, nomeadamente de multa.

10– A circunstância de o arguido não se ter inscrito em escola de condução, e ao invés do entendido pela Mma Juiz "a quo" apenas ao mesmo é naturalmente imputável, porquanto das duas uma ou está ilegal em território nacional e sem possibilidade de resolução no seu processo de legalização e, assim sendo, não deveria ter aceite a suspensão provisória do processo, porquanto já tinha previamente conhecimento de que não poderia cumprir essa mesma injunção; ou então teria que fazer todos os esforços para obter a sua legalização e assim conseguir a inscrição em escola de condução; o arguido não pode é aproveitar as duas circunstâncias: suspensão provisória do processo e não cumprindo uma injunção, ver-lhe atenuada a pena, descontando-se o valor pecuniário entregue e considerando-se com isso reparado o dano do seu acto ilícito.

11– Este tipo de entendimento não viola os princípios "ne bis idem" nem da igualdade, porquanto, quanto ao primeiro havendo uma suspensão provisória de processo e, por força do não cumprimento de um dever, não é violado o principio "ne bis idem", já que inexistem dois julgamentos, com a suspensão provisória do processo é facultada ao arguido a composição consensual do litígio, que sempre o beneficiará nomeadamente em termos de registo criminal e custas que, e após não cumprimento de deveres, há que ultrapassar e seguir para uma fase litigiosa; quanto ao princípio da igualdade com a suspensão provisória do processo primordialmente até existirá uma desigualdade mas a seu benefício, se o mesmo não cumpre com o judicialmente determinado, por incúria sua, como ocorreu nestes autos (não se inscreveu em escola de condução porque não realizou as diligências necessárias à sua legalização em território nacional, ou então, sabendo que não poderia cumprir tal dever, não deveria ter aceite a suspensão provisória, e correndo o risco, só a si próprio se pode atribuir tal responsabilidade e, assim sendo, deve ser tratado, prosseguindo os autos, como qualquer outro arguido sujeito a julgamento.

12– Não lhe poderá ser concedida qualquer atenuante por ter cumprido parcialmente os deveres.

13– Ao entender como o fez a Mma Juiz "a quo" pela aplicação da...

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