Acórdão nº 227/16.3T9MBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Outubro de 2018
Magistrado Responsável | ALCINA DA COSTA RIBEIRO |
Data da Resolução | 10 de Outubro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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RELATÓRIO 1.
Por sentença proferida em 16 de Novembro de 2017, foi o arguido A.:
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Absolvido da prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, nº1, alínea a), e nº 2, 4 e 5, do Código Penal; b) Absolvido pela prática de dois crimes de ameaça agravada previsto e punido pelo artigo 153º, nº 1 e 155º, nº 1, alínea a), do Código Penal; c) Condenado pela prática de um crime de ofensas à integridade física previsto e punido pelo artigo 143º, nº 1 e 145º, nº1, alínea), por referência ao artigo 132º, nº 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão, substituída por 240 dias de multa, à taxa diária de 7 euros, o que perfaz o montante global de 1 750,00 euros.
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Condenado pela prática de um crime de detenção de arma proibida previsto e punido pelo artigo 86º. Nº 1, alíneas c) e d), por referência aos artigos 2º, nº 3, alínea p) e ac), 3, nº 2, alínea I) a Lei nº 5/2006, de 23.02. na pena de 250 dias de multa, à taxa diária de 7 euros, o que perfaz o montante global de 1 750,00€.
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Condenado a pagar ao Centro Hospitalar de B., o valor de 270,59€ acrescido de juros vencidos e vincendos a contar da data da notificação do pedido, sendo a taxa a aplicar de 4% até efectivo e integral pagamento.
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Condenado a pagar à assistente a quantia de 6 500,00 euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora, à taxa legal, contados da decisão condenatória até efectivo e integral pagamento.
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Inconformado com esta condenação, dela recorre o arguido, formulando as seguintes conclusões: «
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O presente recurso tem como objecto a matéria penal e a matéria civil, pretendendo-se com o mesmo a impugnação de determinados pontos da matéria de facto provada e o reexame da matéria de direito.
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Atenta a manifesta inexistência e/ou insuficiência de provas que permitissem, com segurança e certeza jurídicas, dar determinados factos como provados, temos para nós que mal andou o tribunal recorrido ao condenar o arguido pela prática do crime de ofensa à integridade física qualificada e no pedido de indemnização civil.
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No que há nulidade concerne, a sentença recorrida preconiza uma errada interpretação do direito processual aplicável, nomeadamente, à luz das normas constitucionais pertinentes, bem como uma incorrecta aplicação do direito substantivo aos factos dados como provados.
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O arguido presentes autos vinha acusado entre outros, da prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, n.º 1, alínea a), n.º 2, 4 e 5 do Código Penal.
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Na douta sentença e sem antes ter comunicado tal facto ao arguido, o tribunal a quo decidiu operar uma alteração da qualificação jurídica dos factos constantes da acusação e condenar o arguido pela prática, um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelo artigo 143º, n.º 1 e 145, n.º 1, alínea a) por referência ao artigo 132º, n.º 2, alínea a) do Código Penal.
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Para proceder à alteração da qualificação jurídica dos factos, o tribunal a quo, nos termos da lei processual, estava obrigado a comunicar essa alteração ao arguido.
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Ao não o fazer, violou o disposto no artigo 358.º, n.ºs 1 e 3, do CPP.
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O entendimento do tribunal a quo, para além de ilegal, prejudica gravemente os direitos de defesa do arguido.
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Nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea b), do CPP, a condenação por factos diversos da acusação sem cumprimento do disposto no artigo 358.º do CPP, acarreta a nulidade da sentença, nulidade essa que expressamente se alega para todos os efeitos legais.
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Deve a douta sentença ser revogada e substituída por douto acórdão que declare, na parte em que procedeu à alteração da qualificação jurídica dos factos e à condenação do arguido por crime diverso do que constava da acusação, a respectiva nulidade, com as legais consequências.
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Ao interpretar o artigo 358.º do CPP no sentido de que a alteração da qualificação jurídica da acusação para crime diverso não carece de ser comunicada ao arguido, o tribunal violou o disposto no artigo 32.º, n.º 1, da CRP, o que expressamente se alega, para todos os efeitos legais.
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A sentença recorrida viola, entre outras normas e princípios legais, o disposto nos artigos 379.º, n.º 1, alínea b), 358.º, n.ºs 1 e 3, 283.º, n.º 3, alínea c), todos os CPP, nos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, alínea a), do CP e, ainda, no artigo 32.º, n.º 1, da CRP».
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Quanto à parte penal, entendemos terem sido incorrectamente julgados os factos vertidos sob matéria de facto provada referida em 16 a 20. e, consequentemente, o ponto 28.
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Quanto à factualidade vertida 16 a 20, a prova destes factos assentou essencialmente nas declarações da assistente.
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Na verdade, tirando a assistente e o facto de no dia seguinte a sua vizinha … ter visto aquela com ferimentos, não foram carreados para os autos outros elementos relacionados com este acontecimento.
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O tribunal recorrido não relevou, como devia, outros elementos essenciais para a formação da convicção.
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Os factos ocorridos no dia 29 de janeiro de 2019, nas palavras da assistente aconteceram no final do dia, mas em hora que a própria teve dificuldade em concretizar, começou por ser ao final da tarde, estando o tempo lusco fusco, para depois após muita insistência ter sido afinal já com a noite caída, mas sem nuca ser capaz de concretizar ou precisar a hora dos acontecimentos.
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Não se percebe, mas, a assistente foi ver se tinha correio ao domingo à noite.
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Enquanto verificava a caixa de correio a assistente foi surpreendida por trás, tendo sido agarrada pelo pescoço, e agredida com socos e pontapés em diferentes partes do corpo, mas não obstante o que estava a acontecer, e apesar de viver num local rodeado de casas vizinhas, todas elas habitadas, a assistente não gritou, nem pediu por ajuda.
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A assistente, que à data destes factos tinha protecção por teleassistência, em como telemóvel próprio, uma vez terminada a agressão recolheu a casa e não cuidou de pedir ajuda.
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Foi a vizinha que vendo o estado da assistente, e sem ela pedir, tratou de obter ajuda para a assistente, sendo que esta apenas lhe referia que tinha sido o arguido que lhe tinha feito aquilo na noite do dia anterior.
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A assistente não justificou ou apresentou qualquer justificação à vizinha para não ter pedido ajuda logo após a ocorrência.
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A testemunha... indicou a forma como a assistente lhe apareceu, e não pode deixar de merecer relevo o facto de ter sido referido que o sangue não estaria seco (aqui note-se que a agressão terá ocorrido mais de 12 horas antes) e que existiam marcas de arranhões.
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A assistente não actuou da forma que qualquer pessoa actuaria no seu lugar.
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Para surpresa e estupefação de a quem quer se conte esta versão dos acontecimentos, a assistente que estava muito maltratada preferiu, como a própria referiu, arrastar-se até à cama e aí permanecer em vez de solicitar ajuda pelo serviço de teleassistência ou por telemóvel.
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Apenas na manhã do dia seguinte é que a assistente se abeirou da casa da vizinha, mas mesmo aí não pediu ajuda, procurando apenas e só enfatizar o facto de ter sido o arguido a perpetrar os actos que resultaram no estado em que se apresentava.
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A vizinha, …, refere, mais de 12 horas após a agressão a existência de feridas ainda abertas, com sangue para o “fresco” pois não se encontrava seco.
bb) Algumas das lesões descritas pela testemunha vizinha, não têm qualquer correspondência com a dinâmica dos acontecimentos descritos pela assistente.
cc) algumas das evidencias de agressão relatadas pela assistente não encontram repercussão e não são corroborados pelo relatório médico legal.
dd) O arguido, é pessoa da terra, conhece perfeitamente o ambiente daquelas ruas, as pessoas que lá vivem, e as suas dinâmicas, tanto mais que foi vizinho delas durante anos, e por isso afigura-se como pouco crível que alguém conhecedor da vivência local, se expusesse ao risco de ser visto a agredir a assistente.
ee) Não é de todo inócuo o testemunho, valorado ainda que com reservas pelo tribunal recorrido, das testemunhas (…), (…) e (…), ao terem afirmado, tal como a assistente o fez, que o arguido teria estado naquela tarde numa prova de motocross, e que no final foi para casa da sua irmã onde lanchou na companhia de entre outros a testemunha (…), indo em seguida, quando se dirigia para casa, fazer uma entrega a pedido da sua irmã, tendo depois seguido sempre na companhia da testemunha … para sua casa.
ff) A testemunha (…) abandonou a viatura que foi estacionada pelo arguido na garagem, tendo em acto continuo cada um recolhido à sua respectiva residência, quando eram cerca de 19:30 ou 20:00 horas.
gg) Pelo que, o arguido estaria ou na companhia desta testemunha ou em casa.
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Tudo analisado à luz do normal desenrolar das coisas e do seu normal acontecer, não podia o tribunal recorrido deixar de atender a toda esta “anormalidade” e por isso mesmo no mínimo não poderia ter valorado da forma como valorou as declarações da assistente.
ii) Ademais, no que tange à restante prova testemunhal produzida, nenhuma das testemunhas revelou ter conhecimento directo dos factos, motivo pelo qual o depoimento das mesmas não pode valer como prova dos factos.
jj) Assim, ao invés do que entendeu o tribunal recorrido, a assistente não logrou apresentar um testemunho coerente e credível, susceptível de conduzir, por si só, à condenação do arguido, na medida em que não é isento de discrepâncias inexplicáveis.
kk) Do tribunal a quo, não poderá ser dito que tomou a sua decisão de acordo com o princípio da livre apreciação das provas, uma vez que este princípio não tem carácter arbitrário nem se circunscreve a meras impressões criadas no espírito do julgador, estando antes vinculado às regras da experiência e da lógica comum, bem como às provas que não estão subtraídas a esse juízo, sendo por isso imprescindível que este seja motivado, estando ainda sujeito aos princípios estruturantes do processo penal, como o da...
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