Acórdão nº 282/16.6GAACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução10 de Julho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção - Criminal - do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do Processo Comum Singular n.º 282/16.6GAACB do Tribunal Judicial de Leiria - Juízo local criminal de Alcobaça, na sequência do despacho proferido pelo Ministério Público finda a fase de inquérito, nos termos e para os efeitos do art 285º, nº 1 do CPP, veio a assistente apresentar acusação particular contra a arguida A…, imputando-lhes a prática de três crimes injúrias p.p. no artigo 181º n.º1 do Código Penal.

  1. Tal acusação particular veio a ser rejeitada - ao abrigo do artigo 311.º, n.ºs 2, alínea a), e 3, alínea b), do Cód Proc. Penal, - por manifestamente infundada.

  2. Inconformada com a decisão recorreu a assistente B…, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: “1. A Assistente deduziu contra a arguida A…, acusação particular pela prática de três crimes de injúria.

  3. Os factos imputados à arguida na acusação particular deduzida pela assistente foram acompanhados pelo Ministério Público.

  4. O Tribunal à quo considerou a acusação manifestamente infundada, por não descrever o lugar e o tempo em que os crimes foram cometidos, tendo-a rejeitado e não admitido o pedido de indemnização civil.

  5. Com o devido respeito, entende a recorrente que o Tribunal a quo não interpretou devidamente o disposto nos artigos 283º, n.º3 al b) e 311, n.º2 al a) e n.º3, al b) do CPP.

  6. O art.º 283, n.º3 al b) não impõe a obrigatoriedade de se mencionar o lugar e o tempo da prática dos factos, apenas dispõe que se deverá mencionar “… se possível”.

  7. O local e o tempo da prática dos factos não são elementos essenciais, pelo que a acusação não poderá ser rejeitada por manifestamente infundada, por falta destes elementos.

  8. A acusação contém os elementos objectivos e subjectivos necessários para ser admitida.

  9. Atendendo ao meio utilizado para a prática do crime (chamadas pelo telemóvel), estamos perante um crime de localização duvidosa ou desconhecida, pelo que se terá de atender ao disposto no art.º21, n.º2 CPP.

  10. Os elementos objectivos e subjectivos estão preenchidos.

  11. Não faz parte da ilicitude do tipo legal de crime o lugar da prática dos factos, tratando-se de um mero elemento circunstancial, pelo que a sua falta não poderá implicar uma acusação manifestamente infundada e consequentemente a sua rejeição.

  12. A indicação do local não é um elemento essencial para a Arguida preparar a sua defesa.

  13. O local da prática do crime pode ser apurado no julgamento, visto que se tratará de uma alteração não substancial de factos.

  14. Pois, termos do disposto no artigo 21.º do CPP, sempre que seja desconhecido o local da prática do crime, é competente o Tribunal do local onde tiver havido primeiro a notícia do crime.

  15. Não constando da acusação a localização temporal (data) dos factos, pois indica que foi no Verão de 2016, não pode ser rejeitada por manifestamente infundada.

  16. A Acusação deverá ser aceite e não considerada manifestamente infundada porque contém a identificação da arguida, narra os factos, indica as disposições legais e as provas e os factos constituem crime.

  17. No sentido da posição defendida no presente recurso, faz a Recorrente referência à jurisprudência, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17.02.2016, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12.07.2017 e Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12.07.2011, publicados em www.dgsi.pt.

  18. Ao decidir como o fez, o despacho recorrido violou as seguintes disposições: artigo 181º do Código Penal, artigos 283° n° 3 alínea b), artigo 311, n°2, a) e n°3, b), do Código de Processo Penal.

  19. Atendendo aos fundamentos supra expostos, deverá o presente Recurso ser julgado procedente, revogando-se o despacho recorrido, sendo o mesmo substituído por outro que designe dia e hora para a realização da audiência de discussão e julgamento nos seus precisos termos, imputando à arguida a prática de três crimes de injúria previsto e punido pelo artigo 181º do Código Penal.

    Assim se fará JUSTIÇA!” 4. O recurso admitido e fixado o respectivo regime de subida e efeito.

  20. Ao recurso respondeu o Ministério Público, concluindo: “(…) Nos termos previstos no artigo 181.º/1 do Código Penal, «quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra ou consideração, é punido com pena de prisão até três meses ou com pena de multa até 120 dias».

    É evidente que, como conclui a assistente, louvando-se nos arestos que cita no respectivo recurso, a concretização do momento da prática dos factos imputados à arguida não integra o tipo objectivo do crime de injúria, tratando-se de um elemento acidental, tal como o será o da concreta localização dos factos – o que, de resto, decorre da norma prevista no artigo 283.º/3, alínea b), do Código de Processo Penal: «a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada».

    In casu, os crimes imputados à arguida terão ocorrido «desde o final do ano 2015» e «aquando do Verão de 2016», pelo que, os três crimes terão alegadamente ocorrido durante um período temporal de cerca de nove meses: (…).

    Salvo melhor entendimento, será tanto quanto baste para que esteja possibilitado o exercício do contraditório pela arguida, uma vez que bastará escalpelizar, aquando da produção de prova em audiência de julgamento, se as imputadas expressões injuriosas ocorreram em três momentos distintos (e, se possível, em que datas) ou não; na afirmativa, estarão demonstrados os três crimes imputados à arguida, ainda que possam eventualmente não ser determináveis as concretas datas da prática dos factos.

    Refira-se, ainda, que a defesa não fica prejudicada pela não alegação das concretas datas em que os factos imputados terão ocorrido, nomeadamente para efeitos de eventual conhecimento da prescrição do procedimento criminal, na medida em que sempre seria de considerar-se o marco temporal referido como «desde o final do ano 2015» - ou seja, desde 31.12.2015.

    A acusação particular contém, ainda que sinteticamente, a «narração dos factos», os quais, a serem julgados como provados, integram o tipo do crime de injúria imputado à arguida e, portanto, fundamentam a aplicação de uma pena.

    O despacho recorrido, embora igualmente sustentado em jurisprudência dos tribunais superiores, ao...

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