Acórdão nº 341/14.0GALSD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução06 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pr 341/14.0GALSD.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – B… veio interpor recurso da douta sentença do Juiz 1 do Juízo Local Criminal de Lousada do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este que o condenou, pela prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos artigos 15.º, 137.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, a), do Código Penal, na pena de duzentos e cinquenta dias de multa, à taxa diária de seis euros, e na pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados por cinco meses.

São as seguintes as conclusões da motivação do recurso: «I. O presente recurso vem interposto da Sentença que condenou o Recorrente pela prática de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo disposto nos artigos 15.º, 137.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), num total de €1.500,00 (mil e quinhentos euros); II. Salvo o devido respeito por opinião em contrário, o Recorrente nunca se poderia conformar com tal decisão, uma vez que a mesma alicerçou-se em considerações e interpretações erradas, tanto dos depoimentos prestados pelos dois militares da GNR bem como dos esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito que fez o subscreveu o relatório pericial pedido pelo tribunal ao Centro Pericial de Acidentes do INEGI – CENPERCA da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.

  1. A Mma. Juíza da douta sentença recorrida não atendeu ao relatório efectuado a seu pedido, nem aos esclarecimentos prestados pelo Engº D… que fez e subscreveu o relatório, nem justificou nos termos do artigo 163º do CPP porque não considerou os esclarecimentos prestados e ou divergiu dos mesmos.

  2. Desde logo, os factos da matéria assente 3, 4, 7, 8 e 9 deveriam ter sido considerados não provados e as alíneas c), d), e), e g) dos factos dados como não provados deveriam fazer parte do elenco dos factos provados; V. Deveria que dar-se como provado que se o arguido E… conduzisse a uma velocidade de 50 Km/h limite máximo no local, o acidente não ocorreria e a ocorrer não teria a dinâmica e consequentes consequências que teve.

  3. Tendo em conta que no sentido em que seguia o veículo conduzido pelo arguido E… existiam marcas no pavimento de aproximação de passadeira para peões, que nas margens da via existem habitações, estabelecimentos comerciais e instalações fabris e que existe o entroncamento onde se de deu o acidente a velocidade nos termos dos artigos 24º, nº 1 e 25º, nº 1, alíneas a), c) e h) do Código de Estrada o arguido E… circulava a uma velocidade excessiva. Se circulasse a uma velocidade especialmente moderada não teria ocorrido o embate.

  4. Contrariamente ao referido na douta sentença não foi a mudança de direção a única causa do acidente dado que ela era no local permitida por lei no local.

  5. Deve ser dado como provado que no momento do acidente o arguido E… conduzia uma taxa de alcoolemia igual ou superior a 1,2 gr/l com efeitos na sua reação e condições físicas e anímicas para conduzir que causaram junto com a velocidade excessiva o acidente; IX. Mesmo que não se desse como provado, por mera hipótese de raciocínio que o acidente ocorreu porque o arguido E… circulava com velocidade excessiva e sob efeito de álcool, sempre o tribunal teria, de acordo com o princípio do in dubio pro reo, que consiste numa imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa; X. Desta feita, existiu um erro na valoração e apreciação da prova, pelo que, deve o Recorrente ser absolvido do respetivo crime uma vez que, não praticou os factos de que vem acusado.

  6. Acresce que resulta dos autos que o recorrente, ao contrário do dado como provado nos autos, deitava atenção à sua condução e ao trânsito, só assim permitiu que antes de realizar a manobra de mudança de direcção à esquerda deixasse a vítima e a amiga atravessar a rua em segurança.

  7. Ao decidir como decidiu, a sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 24º, 25º e 26º do Código de Estrada, 163º, 412º, nº 3 do Código do Processo Penal e artigo 32º da CRP» O Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso.

O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, pugnando pelo não provimento do recurso.

Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

II – A questão que importa decidir é, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, a de saber se a prova produzida, também à luz do princípio in dubio pro reo, impõe decisão diferente da que foi tomada na sentença recorrida, devendo o arguido e recorrente ser absolvido do crime por que nessa sentença foi condenado.

III – Da fundamentação da douta sentença recorrida consta o seguinte:«(…) II – Fundamentação de Facto 2.1. Factos provadosDiscutida a causa e com interesse para a decisão da mesma, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia 6 de Junho de 2014, cerca das 20 horas e 30 minutos, o arguido B… conduzia o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula XH – .. - .., pela Avenida …, na localidade de …, Lousada, no sentido de … - ….

  1. Ao chegar ao entroncamento formado por aquela Avenida com a Rua …, o arguido B… imobilizou o seu veículo junto à linha divisória da faixa de rodagem, aí aguardando que F… e G… atravessassem, a pé, a Rua de ….

  2. Após estas terem terminado tal travessia, sem que aguardasse pela passagem do veículo de matrícula .. – CN - .., conduzido pelo arguido E…, que, naquele preciso momento, circulava no sentido … - …, a uma velocidade de, pelo menos, 70 km/h, o arguido invadiu a faixa de rodagem contrária com intenção de mudar de direcção para a esquerda e entrar assim na Rua ….

  3. Mercê dessa manobra, o arguido obstruiu a faixa de rodagem do lado esquerdo, atento o seu sentido de marcha, na qual circulava, naquele momento, o veículo de matrícula .. – CN - .., conduzido pelo arguido E…, que não conseguiu evitar o embate frontal com o veículo de matrícula XH - .. - .., sendo projectado, na sequência desse embate, para fora da faixa de rodagem.

  4. Indo invadir o passeio do lado direito da Avenida …, atento o sentido de marcha … - …, no qual seguia F…, que foi aí colhida e entalada contra o muro pelo veículo de matrícula .. – CN - .., o que provocou as lesões traumáticas torácicas e abdominais descritas no auto do relatório da autópsia médico-legal, junto a fls. 82 a 85 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido, as quais, de forma directa e necessária, lhe determinaram a morte.

  5. No local, a estrada tem a configuração de um entroncamento, com duas faixas de rodagem, uma em cada sentido, com a largura total de 5,80 metros.

  6. O arguido B… conduzia o seu veículo com manifesta falta de atenção em relação ao trânsito que se apresentava pela sua direita, não tendo cedido a passagem ao condutor do veículo de matrícula .. – CN - .., não usando da precaução e destreza devidas, que era capaz de adoptar e que devia ter.

  7. O arguido B… agiu deliberada, livre e conscientemente, estando ciente que com a sua conduta poderia vir a provocar lesões corporais e até a morte dos restantes utentes da via, nomeadamente aos condutores, passageiros e peões, mas com isso não se conformando.

  8. O arguido B… sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  9. O arguido E…, a hora não concretamente apurada, foi submetido à recolha de sangue para efeitos de exame pericial de pesquisa de álcool, tendo acusado uma TAS de 1,92 g/l.

  10. Os arguidos não têm antecedentes criminais registados.

  11. O arguido B… encontra-se reformado, auferindo €517,00 mensais. Reside com a esposa, reformada, que aufere €315,00 mensais. Paga €175,00 de renda. Despende na farmácia cerca de €40,00 mensais. Tem o 4º ano de escolaridade.

  12. O arguido E… é empresário, auferindo cerca de €1250,00 mensais. Reside com a esposa, que aufere cerca de €700,00 mensais, e 2 filhos, de 9 e 1 ano. Reside em casa pertencente ao Pai. Paga €250,00 de creche, €215,00 de prestação para aquisição de viatura e €270,00 de prestação para aquisição de um armazém. Tem um Citroen … de 2006. Tem o 9º ano de escolaridade.

  13. A Avenida … é uma via ladeada por fábricas, habitações e estabelecimentos comerciais.

  14. Nas imediações do local onde ocorreu o embate, estavam marcadas no pavimento barras de cor branca, assinalando a proximidade de uma passadeira.

  15. No sentido em que circulava o arguido E…, existe uma lomba, permitindo a quem circula nesse sentido uma visibilidade de 60 metros em relação ao local do embate.

  16. O arguido B… é tido como bom condutor, sendo bem considerado pelos que o rodeiam.

  17. O arguido E… é tido como bom condutor, sendo bem considerado pelos que o rodeiam.

* 2.2. Factos não provadosDiscutida a causa e com interesse para a decisão da mesma, não resultou provado que:

  1. Aquando do referido em 1. a 5., o arguido E… conduzia com uma TAS de 1,92 g/l.

  2. O arguido E… agiu livre, voluntária e conscientemente, com intenção de ingerir bebidas alcoólicas e conduzir de seguida veículo automóvel na via pública, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  3. O arguido B… seguia com atenção ao trânsito que circulava em sentido contrário.

  4. O arguido B… accionou o pisca do seu lado esquerdo.

  5. Antes de realizar a manobra referida em 3., o arguido B… certificou-se que não circulava nenhum veículo em sentido contrário.

  6. O arguido B… circulava a cerca de 90 km/h, sem prestar atenção ao trânsito e à condução.

  7. O acidente em causa nos autos ocorreu porque o arguido B… circulava a uma velocidade superior à permitida para o local e/ou com uma taxa de alcoolemia de 1,92 gr/l.

* O tribunal não se pronunciou sobre o demais vertido na acusação e contestação por constituírem afirmações conclusivas e/ou juízos de direito e que, por isso, não podem ser objecto de uma pronúncia em termos de "provado" ou "não...

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