Acórdão nº 876/11.6YXLSB.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | AFONSO HENRIQUE FERREIRA |
Data da Resolução | 21 de Outubro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA VC, residente na Av. …, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma, inicialmente, sumária - convertida em ordinária face à dedução de pedido reconvencional pelos demandados – contra: - M.M. e mulher, MM, residentes na …, Pedindo: 1- A prolação de decisão que declare nulo, por vício de forma, o contrato-promessa outorgado entre as partes; 2 - A condenação dos Réus a pagar-lhe a quantia de 15.800 Euros, acrescida de juros de mora a contar da citação, à taxa legal e até integral pagamento, valor aquele correspondente ao sinal pago e às rendas por si pagas a terceiro, por outra habitação, até à resolução do litígio.
Alegou, para o efeito e em suma: - Ter celebrado com os Réus um contrato-promessa de compra e venda por força do qual estes prometeram vender-lhe a fracção autónoma correspondente à residência dos demandados, tendo pago um sinal de 2.500 Euros, além da quantia de 7.700 Euros, a título de reforço de sinal e que os Réus, em Janeiro de 2010, na sua ausência, arrombaram a porta do andar, trocaram a fechadura e ali se instalaram.
Conclui no sentido de tal conduta dos Réus ser reveladora de total falta de interesse na celebração do contrato prometido, tendo-os notificado para esclarecer se o mantinham ou não e que, por tais factos, se viu obrigado a arrendar outra casa, pela qual refere pagar uma renda de 550 Euros mensais, valor que não pagaria se não fora a conduta dos Réus, pugnando pela nulidade do contrato, por falta de reconhecimento notarial das assinaturas dos promitentes.
Contestando vieram os Réus alegar que: - As quantias alegadamente pagas pelo Autor a título de reforço do sinal foram-no, de acordo com o entre as partes combinado, a título de renda pela ocupação da fracção e, além do mais, uma pretensa falsificação do contrato promessa invocado - por de um constar uma morada do Autor e de outra versão uma segunda morada daquela parte - e que não conseguiram, a partir do seu conhecimento de que o Autor já se teria divorciado -, contactar o demandante para a morada do contrato constante, sendo as cartas devolvidas por alegadamente a rua não existir na localidade.
- Mais alegam que atento o facto de o Autor se encontrar já divorciado lhe remeteram carta a notificá-lo para proceder à marcação da escritura pública, no prazo de 15 dias, sob pena de incumprimento definitivo e que, nada tendo o Autor comunicado, resolveram voltar a entrar na sua residência, pugnando pela improcedência da lide.
- Mais vieram os Réus deduzir pedido reconvencional contra o Autor, no valor de 18.450 Euros, correspondente ao valor que poderiam ter obtido em caso de eventual arrendamento do objecto do contrato desde a ocupação do andar pelo Autor, a uma alegada desvalorização do andar desde 2008 - no valor de 5.000 Euros - e a danos não patrimoniais por si sofridos.
Finalmente os Réus peticionam a condenação do Autor como litigante de má-fé em multa e indemnização a seu favor, a fixar ulteriormente.
Replicando veio o Autor manter, no essencial, a posição, pelo mesmo, vertida na petição inicial, explicando a razão da divergência do teor das duas versões do contrato promessa, concluindo pela improcedência do pedido de condenação como litigante de má-fé.
Procedeu-se à realização de uma Audiência Preliminar, tendo sido elaborado Despacho Saneador e discriminados os factos assentes e os que careciam de prova a produzir, peças em relação às quais não foram apresentadas reclamações.
Autores e Réus juntaram documentos aos autos e arrolaram testemunhas, tendo sido requerido o depoimento de parte da Ré a parte dos factos da Base Instrutória.
Procedeu-se, com estrita observância do formalismo legal, à Audiência de Discussão e Julgamento, tendo sido ordenada a abertura de conclusão com vista à prolação da decisão de facto - quanto à matéria constante da Base Instrutória - e de direito do seguinte teor – parte decisória: “-…- Decisão Em consequência do anteriormente exposto decide-se:
-
Julgar improcedente, por não provada, a acção e, consequentemente, absolver os demandados, na íntegra, do pedido formulado pelo Autor (por a arguição da nulidade formal do contrato promessa agir em abuso de direito, deduzindo, por isso, pretensão ilegítima e ainda por não verificação dos requisitos legais do enriquecimento sem causa).
-
Julgar improcedente, por não provado, o pedido reconvencional deduzido pelos Réus contra o Autor e, consequentemente, absolver o mesmo de tal pedido, na íntegra.
-
Julgar improcedente, por não provado, o pedido de condenação do Autor como litigante de má-fé e, consequentemente, absolver o mesmo de tal pedido.
-
Custas da acção pelo Autor e do pedido reconvencional pelos Réus.
Valor da causa - Fixado a fls. 119 dos autos.
Registe e notifique.
-…-” Desta sentença veio o A. recorrer, recurso esse que foi admitido com sendo de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
E fundamentou o respectivo recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1) O recurso foi interposto da sentença que decidiu "...Julgar improcedente, por não provada, a acção e, consequentemente, absolver os demandados, na íntegra, do pedido formulado pelo Autor (por a arguição da nulidade formal do contrato promessa agir em abuso de direito, deduzindo, por isso, pretensão ilegítima e ainda por não verificação dos requisitos legais do enriquecimento sem causa)." 2) O Recorrente considera que, o Tribunal a quo, além de se pronunciar sobre questões que não foram submetidas à sua apreciação, fez uma errada aplicação do direito à matéria assente, pelo que, a sentença constitui uma verdadeira "decisão surpresa" perante o que foi alegado pelas partes.
Senão vejamos: 3) "D) Da eventual nulidade do acordo outorgado entre as partes e, na afirmativa, quais as respectivas consequências jurídicas" resulta da matéria assente que as assinaturas dos Autor e Réus no contrato-promessa não foram presencialmente reconhecidas.
4) Pelo que, conforme a Ma Juíza alude e bem, "...segundo a doutrina e jurisprudência, de uma modalidade de invalidade arguível a todo o tempo, subtraída ao conhecimento oficioso do tribunal - e apenas invocável pelos contraentes mas, quanto ao promitente vendedor apenas no caso de o seu não cumprimento ser imputável ao promitente-comprador...." 5) Neste caso, foi o ora Recorrente, promitente-comprador que pediu a declaração de nulidade do contrato-promessa com fundamento na falta de reconhecimento presencial das assinaturas e consequente restituição do que foi prestado em cumprimento do negócio nulo, o que, no nosso humilde entendimento, é absolutamente devido.
6) Aliás, retira-se da própria sentença que "...a omissão dos requisitos de forma legalmente previstos por lei determina a nulidade do contrato analisado – artº220 do C. Civil -, em regra, a tal constatação segue-se, se pedida, a declaração da mesma e a consequente restituição de tudo o que tiver sido prestado em cumprimento do negócio nulo – artº289 do C. Civil.
" 7) Só assim não sucederia, se a arguição da nulidade pelo promitente-comprador, ora Recorrente, fosse ilegítima, ou seja, se os promitentes-vendedores, ora Recorridos, arguissem (e provassem) que a omissão de tais requisitos era imputável ao promitente-comprador, o que no caso sub judice não ocorreu.
8) Os promitentes-vendedores, ora Recorridos, na própria reconvenção aceitaram a arguida nulidade nos termos em que foi invocada, porém a decisão recorrida foi além do submetido à sua apreciação pelas partes e considerou ilegítima a arguição da nulidade por parte do promitente-comprador, ora Recorrente.
9)Daqui resulta que, apenas o ora Recorrente, promitente-comprador, tinha direito a invocar tal nulidade, a não ser que a omissão lhe pudesse ser imputada - único caso em que poderia ter sido arguida pelos promitentes-vendedores, ora Recorridos, o que não aconteceu, neste sentido o Ac. do STJ, de 05-07-2007, 8J200707050020272, Relator Juiz Conselheiro Oliveira Rocha, in www.dgsi.pt que refere: "Temos, portanto, na omissão dos requisitos prescritos no nº3 do artº410° do C. Civil, uma invalidade arguível a todo o tempo, subtraída ao conhecimento oficioso do tribunal, e apenas invocável pelos contraentes, mas, quanto ao promitente-vendedor, apenas no caso de a falta ser imputável ao promitente-comprador...".
10) Assim, o teor da própria sentença se afigura descontextualizado, uma vez que, a mesma decisão que defende que um facto, impeditivo do direito do Autor, tem de ser arguido pelos Réus na sua contestação sob pena do seu conhecimento estar vedado ao Tribunal, é a mesma que acaba por, a final, conhecer e decidir sobre esse mesmo facto - vide parágrafos 6.° a 8.° da questão D) levantada na sentença.
11) Pois, o Tribunal a quo, apesar dos Recorridos nunca o terem suscitado, considera que, em sede de audiência, se constatou que a omissão de tais requisitos de forma se ficou a dever a facto imputável ao Recorrente em virtude da redacção do contrato-promessa ter sido preparada por um advogado, a seu pedido.
12) Ora, salvo o devido respeito, tal dedução não nos parece admissível, pois o Recorrente socorreu-se de um advogado para elaborar o contrato, porque não é, ele próprio advogado e, como tal, não tem conhecimentos privilegiados nesse âmbito.
13) E por conseguinte, não podem ser imputadas ao Recorrente as responsabilidades que obrigam aqueles que têm ou deveriam ter conhecimentos específicos sobre as condições de validade de um contrato-promessa.
14) De facto, o Recorrente ao procurar um advogado apenas quis salvaguardar a validade de tal contrato, sendo que apenas tomou conhecimento do vício de forma e correspondente nulidade quando posteriormente recorreu a um outro advogado para exigir o cumprimento desse contrato.
15) E tanto assim é, que o Recorrente cumpriu todas as obrigações a que contratualmente estava obrigado, até ao momento em foi forçado pelos Recorridos a sair do imóvel objecto do referido contrato.
...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO