Acórdão nº 5566/11.7TBCSC.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelEURICO REIS
Data da Resolução23 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA 1. AP intentou contra “CS, SA” e HV (este último já absolvido da instância por decisão que transitou em julgado), a presente acção declarativa com processo comum e forma ordinária que, sob o n.º …, correu termos pelo …º Juízo Cível do Tribunal da comarca de …, e na qual foi proferida a sentença de fls 242 a 285, cujo decreto judicial tem o seguinte teor (corrigindo uns insignificantes meros lapsos de escrita): “Pelo exposto julga-se a acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência, decide-se: 1.º - Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia € 63.499,26 [sessenta e três mil, quatrocentos e noventa e nove euros e vinte e seis cêntimos]; 2.º - Mais se condena a Ré a pagar à Autora o montante a liquidar correspondente às despesas já tidas pela Autora com hidroterapia, natação, consultas médicas, exames, tratamentos de fisioterapia, com médico psiquiatra e transportes, que excedam o montante de € 1.199,50 já fixado; 3.º - Mais se condena a Ré a pagar à Autora o montante a liquidar correspondente a novos exames médicos, tratamentos de fisioterapia, analgésicos e anti-inflamatórios, palmilhas/ortóteses plantares de correcção plantares de correcção e compensação para dismetria dos membros inferiores e compensação, hidroginástica/natação e meias elásticas.

  1. - Aos montantes fixados em 1.º, 2.º e 3.º acrescem juros, contados à taxa legal, e devidos desde citação até integral pagamento, acrescidos da taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado.

  2. - No mais, vai a Ré absolvida do pedido.

Custas por Autora e Ré, tendo em conta o respectivo decaimento.

Registe e notifique.” (sic).

Inconformadas com essa decisão, tanto a Autora como a Ré dela recorreram, pedindo: A) a Autora AP, que seja “… o presente recurso … julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida nas partes circunscritas ao objecto do presente recurso …” (sic), formulando para tanto as seguintes saudavelmente sucintas quatro conclusões: “1 - A indemnização por dano patrimonial futuro decorrente do défice biológico decorrente de acidente de viação a sinistrados trabalhadores em regime de tempo parcial, deve ser calculado em função da “situação comparável” com o trabalho a tempo completo e que tem por base a “retribuição mínima mensal” garantida.

2 - O cálculo para atribuição do dano patrimonial futuro da A. deve ser calculado, não em função do valor auferido efectivamente pela A., em regime de trabalho a tempo parcial, mas sim tendo por referência o salário mínimo nacional garantido para o trabalho a tempo completo, que à data da consolidação das lesões (19-12-2008), era de 426,00 €, quantia esta que devia ter sido atendida para efeitos do inerente cálculo, quer daquele dano patrimonial futuro quer do dano biológico com limitações funcionais de 11 pontos, sofrido pela A..

3 - Em função do pedido de condenação feito pela A. no seu requerimento inicial e constando como provado/reconhecido que o défice funcional de 11 pontos de que sofre a A., “tende a agravar-se devido ao agravamento das alterações degenerativas osteo-articulares, quer ao nível das articulações “de carga”, quer ao nível da coluna vertebral, condicionadas pela claudicação”, deverá este dano ser considerado pelo Tribunal em sede de execução de sentença, de forma a que a A., no futuro, possa actualizar a indemnização estipulada em função do efectivo agravamento.

4 - Ao não proceder em conformidade com o supra exposto, o Tribunal de 1ª Instância violou, por inadequada interpretação os seguintes preceitos legais: 483º, 562º, 564º e 566º, todos do Código Civil.”; B) a Ré “CS, SA”, que seja “… dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com todas as consequências legais” (sic), formulando, para tanto, as seguintes igualmente meritoriamente sucintas cinco conclusões: “I.

O douto Tribunal a quo violou o disposto no artigo 496.º, n.º 3, do Código Civil, pois, ao fixar à Recorrida o montante de € 45.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais (únicos em causa no presente recurso), desconsiderou o Princípio da Equidade previsto no referido artigo, fixando a respetiva indemnização em montante exageradamente elevado e desajustado da realidade.

II.

Ao contrapor-se a decisão ora em crise com a mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça em matéria de fixação de indemnizações por danos não patrimoniais, é possível - salvo melhor entendimento - encontrar casos mais gravosos do que o dos presentes autos nos quais foi fixada uma indemnização igual ou inferior.

III.

O juízo efetuado pelo Tribunal a quo na douta sentença recorrida, para fixação do montante da indemnização por danos não patrimoniais do Recorrida, é, em face dos factos provados nos presentes autos, desigual e injusto, por excessivo.

IV.

Sendo que, apenas uma decisão que fixasse uma indemnização por danos não patrimoniais em montante não superior a € 15.000,00 seria conforme o Princípio de Equidade.

V.

Ao descontar a quantia de € 16.451,30, já paga pela Recorrente à Recorrida, ao montante total da indemnização a esta fixado (€ 78.950,56) o Tribunal a quo cometeu um erro de cálculo, pois a diferença entre tais montantes é de € 62.499,26 e não de € 63.499,26, o que deve ser corrigido, com todas as consequências, designadamente quanto à parte decisória da douta sentença.” Só a Ré seguradora apresentou contra-alegações, nas quais pugna pela improcedência do recurso da Autora.

A fls 330 a 331, o Mmo Juiz a quo corrigiu o evidente lapso de cálculo denunciado pela Ré (e referido na conclusão V. das suas alegações de recurso), passando o n.º 1 do decreto judicial condenatório a ter a seguinte redacção: “1.º - Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia € 62.499,26 [sessenta e dois mil, quatrocentos e noventa e nove euros e vinte e seis cêntimos];”.

E estes são os contornos da lide que a este Tribunal Superior cumpre julgar.

2.1. Considerando o conteúdo das conclusões das alegações das ora apelantes (as quais são aquelas que delimitam o objecto do recurso, impedindo esta Relação de conhecer outras matérias), as questões a dirimir nesta instância de recurso são, por ordem lógica e ontológica, as seguintes: - ao fixar os valores das indemnizações por dano patrimonial futuro decorrente do défice biológico emergente do acidente de viação sofrido pela Autora e ao desconsiderar, nessa fixação do quantum indemnizatório a pagar pela Ré, o agravamento futuro desse défice biológico, o Tribunal a quo violou ou não o estatuído nos artºs 483º, 562º, 564º e 566º do Código Civil? - ao fixar em € 45.000,00 o montante a pagar à Autora a título de indemnização por danos não patrimoniais, o Tribunal a quo desconsiderou ou não o Princípio da Equidade previsto no art.º 496º n.º 3 do Código Civil, e estabeleceu ou não, nessa parte, uma indemnização em montante exageradamente elevado e desajustado? E sendo esta a matéria que compete apreciar, tal se fará de imediato, por nada obstar a esse conhecimento e por estarem cumpridas as formalidades legalmente prescritas, tendo sido oportunamente colhidos os Vistos dos Ex.mos Desembargadores Adjuntos.

  1. Em Tribunal de 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos: 1) No dia 12 de Agosto de 2006, pelas 16H00, dentro da propriedade de HV, sita no logradouro da …, na Rua …, nº …, …, em A…, ocorreu um acidente, quando aquele conduzia o tractor de matrícula nº …, marca F… e modelo …, que puxava uma plataforma fixa à retaguarda do veículo; 2) Na ocasião o condutor usava o tractor para transportar móveis e equipamentos do lar, de uma casa de apoio à propriedade para aquela …; 3) Ao chegar à … com a plataforma carregada de móveis, o condutor fez uma manobra de marcha atrás, e em rotação, para encostar a plataforma às escadas que dão acesso à porta principal da Vivenda; 4) Sem que tivesse sinalizado a manobra de marcha-atrás; 5) E sem que tivesse conseguido imobilizar o tractor antes de atingir as referidas escadas; 6) Entre o tractor e as escadas encontrava-se a Autora que, a pedido do condutor do AV, ajudava a descarregar os móveis e equipamentos da plataforma; 7) O condutor do AV perdeu o comando e o sentido da marcha do seu veículo e foi embater na Autora, com violência, que ficou entalada entre a plataforma e as escadas, pela perna esquerda; 8) O tractor de matrícula nº … é propriedade de HV; 9) HV transferiu a responsabilidade civil por acidentes ocorridos com o veículo para a Ré através de contrato de seguro titulado pela apólice n.º …; 10) Até à presente data a Ré já indemnizou a Autora por ITA, despesas de tratamento e auxílio de 3ª pessoa, no montante total de € 16.451,30, desde 25.09.2006 até 30.07.2008; 11) A Autora recebeu alta dos serviços médicos da Ré em 19/12/2008; 12) Em consequência do atropelamento, a Autora foi assistida no local pelo INEM e transportada para a Unidade de Serviços de Urgência do Hospital …, em C…, que confirmou o seguinte diagnóstico “fractura exposta grau III dos ossos da perna esquerda e secção traumática do tendão tibial anterior esquerdo”; 13) Foi transferida para o Hospital de …, em Lisboa, onde foi submetida à seguinte cirurgia: miorrafia do tibial anterior esquerdo e tratamento do esfacelo e imobilização com tala gessada cruro-podálica...

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