Acórdão nº 3376/14.9T8FNC-A.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS MARINHO
Data da Resolução23 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa: SUMÁRIO: I. A providência cautelar de arrolamento prevista nos art.s 403.º e seguintes do Código de Processo Civil visa conferir tutela urgente e acauteladora a direitos a brandir ulteriormente em situações de «receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens, móveis ou imóveis, ou de documentos», pelo que logra proteger os direitos de ex-cônjuge que vise obviar à dissipação de depósitos bancários e dinheiro alegadamente pertencentes a ambos os elementos do casal não se justificando, pois, em tal caso, o recurso a procedimento cautelar não especificado; II. O erro na forma de processo emergente do uso indevido deste procedimento é susceptível de ser invocado em sede de oposição à providência e deve ser conhecido no âmbito da sentença que a aprecie; III. É distinta a questão da excepção de caso julgado da atinente à autoridade do caso julgado, face à distinta estrutura dos pressupostos e requisitos de sustentação, sendo que a impugnação incidente sobre o decidido relativamente a uma não atinge o definido quanto à outra.

  1. RELATÓRIO 1. A..., com os sinais identificativos constantes dos autos, instaurou «providência cautelar», que classificou como «não especificada», contra M... e M..., neles também melhor identificados, por intermédio da qual peticionou a apreensão de contas bancárias nas quais os Requeridos possam ter depositado o valor pecuniário que indicou, bem como do cofre alugado no banco referenciado no requerimento inicial; mais requereu a fixação de uma sanção pecuniária compulsória até à entrega efectiva da quantia que referiu pertencer-lhe. Alegou, para o efeito, que: a Requerente e o Requerido M... foram casados um com o outro encontrando-se, atualmente, divorciados; perante o início do distanciamento e conflito entre o casal que conduziu à situação de separação, o Requerido M... foi ao Banco e desviou da conta comum do casal a quantia de 560.000,00 € para uma conta aberta apenas em seu nome; a Requerente pediu ao Requerido que lhe devolvesse metade do valor levantado mas este recusou-se a entregar-lhe essa metade; nunca mais conseguiu reaver o seu dinheiro; tem medo de que o Requerido dissipe o valor existente nas contas bancárias antes da partilha dos bens comuns do casal; a providência deve abarcar todas as contas existentes em nome dos Requeridos em todas as instituições de crédito e ainda quaisquer outras para as quais tenham sido efectuadas transferências bancárias de avultado valor; o Requerido M... confia muito no Requerido M... e ambos, por diversas vezes, já ameaçaram que a Requerente nunca irá ter acesso ao dinheiro, demonstrando que ambos sabem onde o mesmo se encontra; requereu, de imediato, o arrolamento dos bens comuns do casal, tendo pedido o arrolamento de todas as contas bancárias existentes; no entanto, não foi possível arrolar nenhuma conta com tais valores e o procedimento cautelar de arrolamento acabou por ser declarado extinto por inutilidade superveniente da lide, em virtude de o casal ter convertido o divórcio em mútuo consentimento; vive em estado de pânico e com medo de nunca mais conseguir reaver o seu dinheiro; quer o arrolamento quer o procedimento criminal não surtiram quaisquer efeitos práticos e preventivos, até agora; os Requeridos afirmam que a mesma nunca mais irá ver o dinheiro nem conseguirá provar a sua existência; o filho, o aqui requerido M..., é quem esconde o dinheiro num cofre bancário; com a extinção da providência de arrolamento, e sem que a verba tenha efetivamente sido arrolada, existe o justo receio de o valor em causa ser dissipado e de a requerente nunca mais o conseguir reaver; os requeridos trabalham por conta de patrão e recebem salários modestos pelo que, se o dinheiro desaparecer, ainda que se prove o direito da requerente, a mesma terá inúmeras dificuldades em recuperá-lo.

    2. Foi realizada a instrução do procedimento sem audição da parte contrária, tendo sido proferida decisão que decretou: «Pelo exposto, julga-se totalmente procedente a presente providência e, consequentemente, decide-se: a) Apreender o saldo da conta bancária para onde foi transferido o valor de € 560.000,00, junto do M..., com os números 040.10.014748-3 e 325.10.000001-8; b) Apreender os saldos bancários de contas tituladas pelos requeridos, em valor superior ao salário mínimo regional; c) Apreender o cofre alugado no Banco ... em nome dos requeridos.» 3. Os Requeridos deduziram oposição arguindo a existência de erro na forma de processo, invocando a autoridade de caso julgado, referindo ser inexistente o direito invocado, patenteando considerarem existir causa prejudicial (face ao curso de processo de inventário subsequente ao divórcio), impugnando factos e opondo-se à inversão do contencioso que divisaram como tendo sido pedida pela Requerente. Concluíram que: «A – Deve o alegado erro na forma de processo ser julgado procedente, por provado e, em consequência, serem os Requeridos absolvidos da instância; B – Caso assim não se entenda, ser a invocada autoridade de caso julgado considerada procedente, por provada e, em consequência, serem os Requeridos absolvidos da instância; C – Na hipótese de ainda assim não se entender, deve então ser julgada procedente, por provada, a alegada existência de causa prejudicial e, em consequência, ser determinada a suspensão da presente instância, nos termos do artº. 272º, nº. 1 do Cód. Proc. Civ., até que seja proferida decisão nos autos de inventário subsequente ao divórcio a que alude o artº. 58º do presente articulado.

    D – Se se entender que a questão é de fundo e não de forma, deve então o presente procedimento cautelar ser julgado improcedente, por não provado, devido à inexistência dos respectivos pressupostos legais, bem como dos direitos que a Requerente arvora em juízo e, em consequência, serem os Requeridos absolvidos do pedido.

    E – Deve ainda ser indeferida a requerida inversão do contencioso, por não se verificarem igualmente os necessários pressupostos legais, para que a mesma seja decretada.

    Tudo com as legais consequências.» 4. A Requerente pronunciou-se sobre o que considerou ser matéria de excepção do requerimento de oposição concluindo pela sua improcedência.

    5. Os Requeridos suscitaram a questão da nulidade desta resposta pedindo o respectivo desentranhamento. Esta questão não foi decidida após a sua dedução mas, apenas, na sentença, tendo-se determinado a manutenção nos autos do aludido requerimento.

    6. Foi designada data para a inquirição das testemunhas indicadas e realizou-se a instrução, discussão e julgamento da oposição, tendo sido proferida sentença que absolveu os Requeridos da instância e determinou o «levantamento das apreensões efectuadas nos presentes autos».

    7. É desta sentença que vem este recurso interposto pela Requerente, que alegou e apresentou as seguintes conclusões e pedido: «I. O tribunal a quo com a sentença ora recorrida violou os artº 403º, 362º, 580º 581 e 619º todos do CPC.

  2. A presente providência não é de arrolamento, pois não ser pretende a mera listagem dos bens do casal.

  3. Pretende-se, sim, a apreensão de um cofre e conta bancária, quer do casal quer o requerido filho do casal M....

  4. Pelo que a providência cautelar não especificada decretada não podia ter sido convertida para arrolamento, pois os fundamentos e os objectivos são diferentes.

  5. A convolação de providência, entende-se, que a existir teria que ser efectuada pelo Juiz que recebeu e julgou a providência inicialmente e não pelo juiz...

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