Acórdão nº 22/13.1TCFUN.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | ONDINA CARMO ALVES |
Data da Resolução | 30 de Abril de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I. RELATÓRIO EDUARDO ….
e MARIA …….
, residentes …… e PALMIRA ….., intentam, em 23.01.2013, contra: 1.
MANUEL ……..
, 2.
JORGE …….
, ambos residentes na Rua ------- e, 3.
JOAQUIM …..
, residente …….., acção declarativa de condenação, com processo ordinário, através da pediram a condenação dos réus a pagarem aos autores: a.
O primeiro e segundo réus, as quantias de €60.000,00 e €90.000,00, respectivamente; b.
O terceiro réu a quantia a liquidar, c.
Juros de mora, sobre todas as mencionadas quantias, à taxa legal, a contar da data da citação.
Fundamentaram os autores, no essencial, estas suas pretensões da forma seguinte: 1.
Decorreu pelos serviços do MP de …… o processo de Inquérito n.° 1323/97.0 movido pelos AA. Tal inquérito foi arquivado por não se terem verificado os pressupostos de facto e de direito que obrigavam a um despacho de acusação — vide doc. n.° 1.
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A prova carreada para os autos era suficiente para obter uma decisão condenatória sobretudo pela prática de um crime de burla qualificada previsto e punido pelos arts. 217 e 218 do Código Penal.
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Foram juntos os respectivos contratos de compra e venda celebrados entre as partes e a documentação camarária que comprovava a impossibilidade de celebração objectiva do negócio proposto aos AA.
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Apesar da matéria estar suficientemente comprovada o MP decidiu em 31 de Janeiro de 2001 arquivar o inquérito pela insuficiência de indícios definidos no Art. 283 do Código do Processo Penal que permitisse acusar o arguido e o mediador, submetendo-os a julgamento. 5.
Impossibilitada ficou assim, por inexistência de libelo acusatório, a hipótese de deduzir o respectivo pedido cível, o que se fará presentemente ao abrigo do disposto no art. 473 do Código Civil.
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Face ao decurso do tempo, e porque a prescrição apenas se interrompeu em 2001, resta-nos apelar ao prazo ordinário previsto no art.° 309 do Código Civil, segundo o qual: "O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos." 7.
Os AA. estabeleceram negociações com o mediador Joaquim ….., com vista à aquisição das moradias melhor identificadas nos contratos, -doc. n.° 2.
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No decurso das mesmas vieram a celebrar os contratos promessa para titular os respectivos negócios, tendo sido subscritos não pela imobiliária mas sim pelo 1° R.
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No dia 12 de Setembro de 1996 os AA. subscreveram os contratos promessa e titularam o respectivo negócio jurídico, no escritório do 3° R., mediante a entrega das quantias que se passam a discriminar:
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Eduardo …… e mulher entregaram um cheque no valor de um milhão de escudos e outro cheque pós datado com data de vencimento a 10 de Janeiro de 1997, no valor de quinhentos mil escudos; b) Palmira …… entregou na mesma data como sinal e princípio de pagamento a quantia de um milhão e quinhentos mil escudos e um cheque pós-datado com data de vencimento em 10 de Janeiro de 1997, no valor de um milhão de escudos. (doc. n.° 3) 10.
Pese embora terem subscrito os contratos promessa de compra e venda e sinalizado o respectivo negócio, tal não veio a suceder por razões completamente alheias à vontade dos AA.
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Veio a constatar-se que lhes foi apresentado um projecto de construção de uma urbanização, à data considerada de luxo, para a construção de vários apartamentos que pretensamente seriam edificados ao Sítio …….; 12.
O mediador exibiu aos AA. o projecto, entregou-lhes as plantas, tendo-se deslocado diversas vezes ao terreno onde seria implantada a construção conforme resulta do teor do doc. n.° 4.
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Os AA., convencidos da veracidade dos documentos apresentados e da legalidade camarária, subscreveram os contratos promessa supra referidos.
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Tentaram certificar-se se estaria tudo conforme, deslocando-se ao local e reunindo diversas vezes na imobiliária sita, à data, em ………..
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Nas conversações, reuniões e na obra esteve maioritariamente presente o 1° R.
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Foram celebrados inúmeros contratos promessa, nos quais o primeiro R. identificou o imóvel onde seriam construídos os apartamentos como prédio rústico inscrito na matriz cadastral sob o artigo …. da secção Dl e todo o artigo 8/27 da secção Dl, ambos da Freguesia de ….., deste Concelho, descritos na respectiva conservatória do registo predial sob o n.° 00509/060891.
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A data estipulada para a realização das respectivas escrituras públicas remontava a finais de Fevereiro de 1997.
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Como a obra não avançava os AA. agendaram uma reunião em Janeiro de 1997 no escritório do intermediário Joaquim …., na qual compareceu o 1.° R.
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Tentou, uma vez mais, ludibriar os AA., nada referindo de conclusivo, afirmando que apenas estava à espera que a obra fosse autorizada pela Câmara Municipal ….., segundo ele demoraria apenas alguns dias.
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Foi nesta altura que os AA. descobriram a verdade dos factos, ou seja, o 1° R. não era dono do terreno conforme constava dos contratos promessa, tendo o mesmo sido adquirido pelo 2° R. Jorge ……, seu filho.
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Também apuraram, nessa mesma data, junto da Câmara Municipal de ….., que não existia nenhum projecto aprovado para aquele local e que, inclusivamente, não poderia ser aprovado já que o PDM de ……. apenas permitia a construção de moradias unifamiliares geminadas e nunca edificações em regime de propriedade horizontal.
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Também subsistiram dúvidas quanto à titularidade do terreno onde de facto começou a ser implantada a construção em virtude de alguns trabalhadores referirem que o "patrão" era o 1° R. e outros que seria o 2° R.
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O 1° R. sempre soube que não era legítimo proprietário do lote de terreno para construção e que o PDM daquela zona não permitia semelhante projecto e tudo fez para convencer os AA. do contrário.
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Depois de constatarem o logro em que haviam caído, solicitaram uma peritagem a uma equipa especializada a fim de aferir a viabilidade da construção de acordo com o REGEU, concluindo os AA. que não era possível edificar tais moradias.
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Tentaram sanar a situação, resolvendo os contratos promessa celebrados com o 1° R..
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Deslocaram-se à imobiliária e pediram justificações que jamais lhes foram concedidas.
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O 3.° R. eximiu-se sempre a responsabilidades, referindo que nada tinha a ver com o assunto, e que os contratos não se encontravam assinados por si.
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Sendo conivente com toda a situação até porque o negócio foi por si apresentado, competindo-lhe aferir a legalidade da construção e a verificação das certidões de teor e prediais a fim de elaborar os respectivos contratos promessa.
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Jamais podendo alegar que não é civilmente responsável porque a assinatura de um contrato pressupõe que estejam reunidos os pressupostos legais para o efeito, nomeadamente conferir a titularidade do lote de terreno e o projecto camarário.
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Agiu dolosamente, sabendo de antemão que estava a violar as normas aplicáveis ao exercício das suas funções.
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Os três RR. agiram dolosamente a fim de se apropriarem de quantias monetárias a que sabiam não ter direito.
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Os AA. não têm outro meio de serem indemnizados porque decorreram os respectivos prazos legais para propor acções de responsabilidade civil nos termos previstos no art.° 483 do Código Civil.
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Facto este que não lhes é imputável: tendo-se provado que recorreram aos meios criminais para dirimir o litígio que os opunha os RR.
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Não tinham conhecimentos jurídicos para saberem que poderiam interpor a acção nos 3 anos subsequentes à data da prática dos factos ou, no caso concreto, após a prolação do despacho de arquivamento.
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Apesar de ser possível a entrega dos montantes, ou seja, a restituição natural, os RR. não só não o fizeram como nem sequer foram indiciados pela pratica dos respectivos crimes.
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O MP parece ter-se preocupado apenas que o processo não estivesse sobre a sua alçada e fosse remetido para os meios comuns, 37.
Esquecendo-se que a matéria em causa revestia natureza e dignidade penal, consubstanciando a prática dos crimes inicialmente imputados aos arguidos.
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A decisão de arquivamento do Processo de Inquérito pelo MºPº obriga presentemente os AA. a recorrerem aos meios cíveis, podendo apenas exigir a restituição do indevido com a correspondente correcção monetária e juros legais, o que limita consideravelmente os direitos dos AA. até porque os contratos remontam ao ano de 1996 e, nessa altura, os montantes em causa eram significativos e tinham outro valor de mercado.
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Importa referir que, no decurso do processo crime e posteriormente, o 1° e 2° RR. construíram moradias conforme resulta das fotos que se juntam.
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Enriquecendo duplamente: apropriaram-se das quantias supra referidas e voltaram a celebrar novos contratos, com a realização das respetivas escrituras públicas.
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Não se preocupando sequer, nessa data, em restituir os montantes devidos aos AA., sendo certo que, realizaram dinheiro e negócios que permitiam reparar os actos praticados anteriormente e não estavam apenas em causa os AA, 42.
Os RR. são obrigados a restituir as importâncias indevidamente recebidas, sendo responsável, de igual modo, o 3.° R. porque recebeu determinados montantes para mediar o negócio, montantes estes que se desconhecem, e que por serem objecto de produção de prova, se relegam para posterior execução de sentença.
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O 1° e 2° RR. devem aos AA. , com fundamento no enriquecimento sem causa prevista no art. 473 n.° 1º do Código Civil, as quantias que se passam a discriminar: a.
Eduardo ……. e mulher entregaram um cheque no valor de um milhão de cudos, ter-lhe-ão ser restituídos o valor de € 60.000,00; b.
Palmira …… entregou um cheque no valor de 1 milhão e quinhentos mil escudos, terá de lhe ser restituída a quantia global de € 90.000,00.
c.
O 3.° R. deve aos AA. a quantia que se vier a liquidar, após produção de prova, o que se relega para posterior execução de sentença.
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Os montantes supra referidos resultam de simples operações aritméticas que se prendem com as taxas de inflação anuais, desde 1996 até à presente data, bem como dos juros de mora calculados às diversas taxas...
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