Acórdão nº 1756/14.9TBTVD.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | FARINHA ALVES |
Data da Resolução | 05 de Novembro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa, 2ª Secção Cível Delfina e e Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Júnior, (…), vieram instaurar contra Vicente e mulher, todos com os sinais dos autos, a presente ação declarativa de condenação, a seguir a forma ordinária do processo comum, pedindo a final, após convite ao aperfeiçoamento: 1- Seja declarada a anulação parcial da escritura de doação celebrada entre a autora, seu marido e o réu marido, por erro, nos termos do art.º 251.º do CC, e em consequência a redução da liberalidade em termos de se haver como doado, por conta da legítima, o prédio constituído por lote de terreno para construção, sito no lugar e freguesia de (….), concelho de Torres Vedras, com a área de 140 m2, a confrontar (…), que é parte do prédio inscrito na respetiva matriz predial; 2- Sejam os RR condenados a reconhecer a autora e a herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Júnior, em comunhão hereditária, como proprietários do prédio identificado no art.º 56.º da contestação [prédio rústico sito no lugar e freguesia de (…), concelho de Torres Vedras, com a área de 4 940m2, a confrontar (….)], que resultou da divisão de facto ocorrida com a escritura de doação; 3- Subsidiariamente, nos termos do art.º 469.º do CPC, caso se entenda não haver lugar a erro e à anulação e redução do negócio, devem os RR ser condenados a reconhecer a autora e a herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Júnior, em comunhão hereditária, como proprietários do mesmo prédio, mas por usucapião.
Para tanto alegaram, em síntese: A autora Delfina e seu falecido marido eram donos do prédio rústico denominado ( ….), sito na freguesia de (…), concelho de Torre Vedras, inscrito na matriz predial respetiva sob o art.º (….) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, onde se encontrava inscrito a seu favor pela inscrição G-1.
No ano de 1980 a autora Delfina e o falecido marido autorizaram o seu filho, aqui réu marido, a edificar uma casa para si numa parcela do aludido prédio, situada junto à estrema poente/norte.
Pois que era sua intenção dividir o dito prédio pelos quatro filhos em partes iguais.
Decorridos cerca de 8 anos, e visando formalizar tal doação, a autora e o falecido deslocaram-se ao Cartório Notarial de Torres Vedras onde, no dia (…) outorgaram uma escritura de doação.
Através da qual, ao contrário do que pretendiam e sem que disso se de tivessem apercebido, doaram ao filho Vicente, e por conta das respetivas quotas disponíveis, o já identificado prédio.
Os doadores outorgaram nessa escritura convencidos de que estavam a doar ao filho Vicente apenas a parte do terreno onde se encontrava incorporada a casa.
Pois que era essa a vontade real dos doadores, que o réu Vicente bem conhecia.
O réu Vicente também sabia que os seus pais não pretendiam beneficiá-lo relativamente aos seus irmãos.
E a partir do seu casamento o réu marido passou a habitar na casa que havia construído, não tendo ocupado qualquer outra área do prédio.
A parte restante do prédio continuou a ser explorada pelos doadores e pelo filho Paulo.
Após a morte do doador marido, ocorrida a 14-12-1995, os seus herdeiros, incluindo o ora réu Vicente, acordaram, tendo em vista a partilha da respetiva herança, em dividir o prédio aqui em causa pelo ora réu e pelas duas irmãs.
Foi ao preparar a relação de bens que se deu conta de que a doação tinha abrangido a totalidade do prédio.
Na ocasião, o ora réu admitiu que a intenção dos pais era doar-lhe apenas a parcela onde está incorporada a casa e dividir o terreno por todos os filhos em partes iguais, para que todos ali pudessem construir as suas casas, sem que pretendessem beneficiá-lo em relação aos irmãos.
E aceitou a solução, proposta por advogada, que passava pelo destaque da parcela ocupada pela casa e pela doação da parte restante prédio às irmãs.
Mas os réus foram protelando e acabaram por recusar fazer a desanexação.
Por se verificar erro que atinge parte do negócio, deve ser decretada a sua anulação parcial e a consequente redução, devendo ser declarado que aos RR foi doada apenas a dita parcela, e por conta da legítima.
Citados, os réus opuseram, em síntese: Impugnaram o valor da causa, propondo a sua fixação em € 17.051,10.
Caducou o direito de pedir a anulação do negócio jurídico, uma vez que a A. e os herdeiros tomaram conhecimento do erro que invocam, pelo menos em Maio de 2001.
No ano de 1978 o réu foi autorizado pelos pais a construir casa própria numa parcela de terreno do prédio dos autos.
Desconhecendo se os pais tinham intenção de repartir esse prédio pelos irmãos.
Já no ano de 1988, estando a casa praticamente construída, foi contratada uma solicitadora visando proceder à inscrição dessa parcela de terreno em nome do réu marido.
Mas após uma reunião com essa solicitadora, a autora e o marido acabaram por decidir doar-lhe a totalidade do prédio. Nessa altura o pai apenas lhe pediu que, caso o irmão Paulo pretendesse construir casa própria, aquele se comprometeria a ceder uma parte de terreno do prédio.
Não houve, assim, qualquer erro dos doadores na outorga do contrato de doação, que lhes foi inteiramente lido e explicado, e com o qual concordaram.
Tendo perfeito conhecimento de que a doação abrangia a totalidade do prédio em apreço e que foi feita por conta da quota disponível.
O réu também não sabe se os seus pais pretendiam beneficiá-lo relativamente aos seus irmãos.
A partir da doação o réu passou a agir em relação ao prédio na convicção de que era o proprietário pleno do mesmo, amanhando-o, com a ajuda do irmão.
Para além disso, cimentou uma área de logradouro, com cerca de 200 m2 e construiu uma garagem com a área de cerca de 90 m2.
Tudo em vida do pai, e com total conhecimento e sem oposição deste.
E passou a amanhar sozinho o prédio cerca de um ano antes da morte do pai.
Após a morte do pai construiu outra garagem com telheiro, com a área bruta de 490 m2 e coberta de 90 m2.
Vedou parte do prédio para guardar ovelhas e plantou jardim com flores e árvores do lado sul do prédio.
Todas as obras foram feitas à vista de todos, sem qualquer oposição e na convicção de que eram feitas em prédio por si adquirido.
Tendo contraído dois empréstimos para lhes fazer face, garantidos por hipoteca sobre o prédio.
Nas reuniões realizadas pelos herdeiros do doador falecido, o réu anuiu em dividir o prédio com as suas irmãs de modo a evitar problemas familiares.
Mas acabou por recusar, porque isso não fazia sentido.
E já no ano de 2002, quando os autores recorreram a uma advogada, manteve essa recusa e apenas se disponibilizou para aceitar ficar com o prédio por conta da sua parte na herança, ficando o remanescente da herança, composto por vários prédios rústicos e urbanos, a dividir apenas entre os restantes herdeiros.
Concluiu defendendo a improcedência da ação e a condenação dos autores por litigância de má fé, em valor não inferior ao reembolso das despesas causadas por essa litigância, incluindo honorários, a liquidar posteriormente.
E deduziu reconvenção pedindo que os autores reconvindos fossem condenados a reconhecer o seu direito de propriedade sobre a totalidade do prédio, fundado em usucapião ou, se assim não se entendesse, por acessão industrial imobiliária.
Os autores replicaram, justificando o valor que atribuíram à causa e defendendo a improcedência da exceção de caducidade.
E contestaram a reconvenção, concluindo pela sua improcedência.
Seguiu-se o despacho saneador, onde foi proferida decisão absolutória da instância na reconvenção, foi julgado improcedente o incidente de verificação do valor da causa, e foi relegado para final o conhecimento das exceções.
Foi selecionada a matéria de facto assente e a submeter a prova, sem reclamações.
Após o que os autos prosseguiram para julgamento, no decurso do qual foi realizada inspeção judicial ao prédio dos autos.
A final, a matéria de facto foi decidida pela forma que consta de fls. 327 a 341, sem reclamações.
Seguiu-se a sentença, com a seguinte «3. Decisão: Em face a todo o exposto, julgo a presente acção procedente nos termos explanados e, em consequência: 3.1. declaro parcialmente anulada a escritura pública a que se reporta a al. O), outorgada em 8 de Julho de 1998 no 1.º cartório da secretaria notarial de Torres Vedras e, em consequência, decreto a redução do negócio de doação nela formalizado, em ordem a dela passar a constar ter sido doado ao aqui réu e ali segundo outorgante Vicente, por conta da legítima, o prédio constituído por lote de terreno para construção, sito no lugar e freguesia de (…), concelho de Torres Vedras, com a área de 140 m2, a confrontar (…), que é parte do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o art.º (…); 3.2- condeno os RR Vicente e Maria a reconhecerem a autora e a herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Júnior, em comunhão hereditária, como proprietários do prédio rústico sito no lugar e freguesia de (….), concelho de Torres Vedras, com a área de 4 940 m2, a confrontar do norte com(…), que resultou da desanexação da parcela doada.
Custas a cargo dos RR (art.º 446.º, nºs 1 e 2 do CPC).
» Inconformados, os réus apelaram do assim decidido, tendo apresentado alegações, rematadas pelas seguintes conclusões: a. Seja declarada a anulação parcial da escritura de doação celebrada entre a autora, seu marido e o réu marido, por erro, nos termos do art. 251º do CC, e em consequência a redução da liberalidade em termos de se haver como doado, por conta da legítima, o prédio constituído por lote de terreno para construção, sito no lugar e freguesia de (…), concelho de Torres Vedras, com a área de 140m2, a confrontar do norte(…), que é parte do prédio inscrito na respectiva matriz predial.
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Sejam os RR condenados a reconhecerem a autora e a herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Júnior, em comunhão hereditária, como proprietário do prédio identificado no artigo 56º da contestação {prédio rústico sito no lugar e...
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