Acórdão nº 4508/10.1T3AMD.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS ESP
Data da Resolução16 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa: -Relatório: No âmbito dos autos de Instrução supra id., que correm termos pela Comarca de Lisboa Oeste, Sintra, Instância Central – ...ª Secção de Instrução Criminal – J..., em que é arguido J, com os demais sinais dos autos, foi proferido despacho a declarar nulo o inquérito, por falta de promoção, declarando-se, em consequência inválido o despacho de encerramento do inquérito e dos termos subsequentes.

Inconformado com o teor de tal decisão interpôs o MP o presente recurso pedindo a revogação daquela e a sua substituição por outra que pronuncie o arguido pelos factos constantes da acusação.

Apresentou para tal as seguintes conclusões: No caso dos autos entendeu a Srª Juiz de Instrução que o Ministério Público ignorou a factualidade suscetível de integrar a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, não tendo proferido quanto a este ilícito despacho de acusação ou de arquivamento, razão pela qual considerou estar verificada a nulidade prevista na al.b) do art. 119°, do CPP e, em consequência, declarou nulo o inquérito e inválido o despacho de encerramento do inquérito, tendo ordenado a remessa dos autos ao Ministério Público.

Os factos a que alude a Srª Juiz são os que se encontram descritos nos pontos 7 e 8 da acusação, aos quais o Ministério Público atribuiu uma outra qualificação jurídica, por entender que o desconhecimento absoluto sobre as características do produto em causa é impeditivo da verificação do crime de tráfico de estupefacientes.

Sendo este o entendimento do Ministério Público, como titular da ação penal, não pode a Sr. Juiz, sob a capa de uma pretensa nulidade do inquérito, devolver o processo ao Ministério Público, fazendo-o regressar à fase de inquérito.

A discordância da Srª Juiz sobre a qualificação jurídica dada aos factos não lhe permite a devolução do processo ao Ministério Público para que seja tido em conta um tipo de ilícito que, na sua opinião, deveria ter sido considerado.

E ao Ministério Público que cabe a direção do inquérito e a definição do objeto do processo através da acusação, não podendo nunca estar sujeito às ordens do juiz de instrução ou de julgamento.

O entendimento perfilhado no despacho aqui em análise constitui uma flagrante violação da estrutura acusatória do nosso processo penal e que encontra consagração constitucional no art. 32° n°5 da Lei Fundamental.

De igual modo, o despacho recorrido ao impor ao Ministério Público que se pronuncie de modo diverso sobre factos que foram considerados suficientemente indiciados e qualificados juridicamente no despacho de acusação está a atentar contra a autonomia do Ministério Público, igualmente consagrada constitucionalmente.

No caso em apreço, a intervenção judicial na fase de instrução tem por objeto apenas e só a comprovação ou não do ponto de vista indiciário da acusação deduzida pelo Ministério Público, decidindo-se, a final, se o arguido deve ou não ser sujeito a julgamento.

Não faz parte das competências do juiz de instrução apreciar a atividade do Ministério Público na fase de inquérito, apreciar que despachos de arquivamento deveriam ou não ter sido produzidos ou que outra matéria fática deveria constar da acusação.

Qualquer discordância com a qualificação jurídica dos factos feita pelo Ministério Público poderá dar lugar à sua alteração nos termos do art. 303° n°5, do CPP mas nunca à remessa do processo para a fase de inquérito.

Constitui entendimento generalizado entre a doutrina e a jurisprudência que a nulidade de falta de promoção do processo por parte do Ministério Público, prevista no art. 119° al. b), do CPP só se verifica quando ocorre uma ausência absoluta de inquérito.

No caso em apreço a nulidade do inquérito declarada prende-se apenas com o entendimento perfilhado pela Srª Juiz de que pelo Ministério Público deveria ter sido proferido despacho sobre a verificação ou não de um crime de tráfico de estupefacientes, sendo certo que a factualidade em causa foi levada à acusação, constituindo em conjunto com outros factos a prática por parte do arguido de outros ilícitos criminais que lhe são imputados.

O despacho ora em recurso constitui uma ingerência legalmente inadmissível na fase de inquérito, cuja direção cabe em exclusivo ao Ministério Público, impondo-lhe a realização de diligência e a prolação de despachos, em manifesto desrespeito pela autonomia desta magistratura.

Resulta, pois, inequívoco que a decisão recorrida não encontra qualquer apoio nas normas constitucionais e processuais vigentes, sendo por isso inconstitucional e ilegal.

O despacho em causa violou as normas contidas nos arts. 32° n°5 e 291 n°l, da Constituição da República Portuguesa e os arts. 48°, 53° 286°, 298° 303°, 307° e 308° do Código de Processo Penal.

Razão pela qual deve ser o mesmo revogado e substituído por outro em que se pronuncie o arguido pelos factos constantes da acusação.

Respondeu o arguido, pugnando pela improcedência do recurso, nos seguintes termos: ………………………………… Com todo o respeito que é muito, parece-nos não assistir qualquer razão no recurso interposto, adiantando-se desde já, que a decisão recorrida, na nossa modesta opinião, se encontra devidamente fundamentada e com suporte legal, aliás, conforme nos tem vindo a habituar as decisões proferidas pelo tribunal recorrido. Isto é, o tribunal a quo, dentro dos limites da lei e do que lhe está incumbido, decidiu bem ao declarar nulo o inquérito, por falta de promoção (art.° 48.°, 119.°, al. b) 262.° e 276.°, todos do CPP) e, consequentemente declarar inválido o despacho de encerramento do inquérito e os termos subsequentes.

Por outro lado, Ao contrário do que é defendido no referido recurso, que mais parece com todo o respeito um "invoque" de Magistraturas, certo é, que labora completamente em erro.

Ou seja, Pois, seguindo a tese defendida no recurso, sempre a existência do JIC, deixaria de fazer qualquer sentido processual e constitucional, quer na defesa dos interesses legítimos do arguido ou mesmo de um assistente.

Cabe efetivamente ao JIC, sindicar e declarar as nulidades processuais do inquérito, conforme sucedeu no caso em apreço.

E do despacho recorrido, decorre perfeitamente que o tribunal a quo, bem sabe quais as questões que pode ou não sindicar.

Neste sentido, veja-se parte do despacho recorrido, que aqui se transcreve: ……………………………………………………………………… Reitera-se uma vez mais, porque é efetivamente muito o respeito por ambas as Magistraturas, que se labora em erro no recurso ora interposto.

Isto é, Esquece-se o Ministério Público de toda a base do inquérito aqui em análise, OU SEJA, O objeto inicial do processo sempre foi a investigação do crime de tráfico de estupefacientes, crime de catálogo e que, aliás, permitiu as escutas telefónicas efetuadas nos presentes autos.

Chegar-se ao fim de um inquérito e não existir qualquer pronúncia sobre este tipo de crime, se existem indícios da sua prática pelo arguido visado ou não, se se deve arquivar o processo nessa parte ou não, se se deve acusar o arguido pela sua prática ou não, configura uma autêntica omissão de pronúncia e isso é perfeitamente evidente nos autos.

Não foi por isso violada qualquer norma processual ou sequer constitucional.

Mais, dos factos constantes do inquérito, sempre o referido crime não se imputaria ao arguido mas sim à testemunha PC.

Cabe efetivamente ao JIC, sindicar e declarar as nulidades processuais do inquérito, conforme sucedeu no caso em apreço.

E do despacho recorrido, decorre perfeitamente que o tribunal a quo, bem sabe quais as questões que pode ou não sindicar.

Esquece-se o Ministério Público de toda a base do inquérito aqui em análise, OU SEJA, O objeto inicial do processo sempre foi a investigação do crime de tráfico de estupefacientes, crime de catálogo e que, aliás, permitiu as escutas telefónicas efetuadas nos presentes autos.

Chegar-se ao fim de um inquérito e não existir qualquer pronúncia sobre este tipo de crime, se existem indícios da sua prática pelo arguido visado ou não, se se deve arquivar o processo nessa parte ou não, se se deve acusar o arguido pela sua prática ou não, configura uma autêntica omissão de pronúncia e isso é perfeitamente evidente nos autos.

Não foi por isso violada qualquer norma processual ou sequer constitucional.

Mais, dos factos constantes do inquérito, sempre o referido crime não se imputaria ao arguido...

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