Acórdão nº 2691/13.3TCLRS.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelJORGE VILA
Data da Resolução29 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de LisboaI – Relatório M Instaurou acção declarativa sob a forma de processo comum ordinário contra: S - Companhia de Seguros, S.A.

Alegando, em síntese, o seguinte: · No dia 28 de Março de 2008 foi vítima de acidente de viação ocorrido em Puerto Real, Cádiz, Espanha, em que foram intervenientes o veículo motorizado (motociclo) de marca BMW, de matrícula portuguesa ..., por si conduzido, o veículo automóvel ligeiro de mercadorias de matrícula espanhola...-FWL, e um veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula espanhola ...

· O acidente ocorreu quando o motociclo conduzido pelo A. se imobilizou, por imposição do sinal de STOP, junto a um cruzamento, quando foi embatido na retaguarda pelo veículo ...-FWL, projectando-o para o centro do cruzamento, onde foi embatido pelo veículo ...

· O acidente em causa causou ao A. danos.

Concluiu pedindo a condenação da R. a pagar-lhe uma indemnização no valor de € 149.996,00, acrescida dos juros contados desde a citação, à taxa legal, e também a condenação da R. a reconhecer que sofre de uma incapacidade permanente parcial de 0,35, e uma incapacidade permanente e absoluta para o trabalho habitual de 75%, à qual acresce uma capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível de 25%, desde a data da consolidação, condenando-se a R. a pagar-lhe os prejuízos que tiver de suportar com os tratamentos relacionados com as lesões provocadas pelo acidente, que vier a efetuar até à sua total reabilitação, a liquidar em momento posterior. Subsidiariamente, caso não venha a julgar-se o seguro celebrado entre a 1ª Ré e o 2º Réu válido e eficaz e/ou aplicável ao caso em apreço, deverão ser condenados no pedido o 2º Réu e a 3ª Ré.

Citada regularmente, a ré contestou, alegando que a responsabilidade civil emergente de acidentes de viação referente ao veículo com matrícula espanhola ...-FWL havia sido transferida para “S España, SA de Seguros y Reaseguros”, representada pela R., através da apólice n.º..... Na contestação a R. invoca a prescrição do direito à indemnização do A., por ser aplicável o direito espanhol, por remissão do artº 45º, nº 1, do CC, nos termos do qual, o artº 1968º, nº 2, do Código Civil Espanhol determina que as acções de responsabilidade civil em que estão em causa obrigações decorrentes de culpa ou negligência, prescrevem no prazo de um ano.

A R. invoca ainda a prescrição do direito do A. face ao direito português, por terem decorrido mais de três anos, não podendo o A. beneficiar de prazo mais longo, por não estar demonstrado ter exercido o direito de queixa no âmbito de processo de natureza criminal, no mais impugnando o alegado pelo autor.

Na réplica, o autor respondeu à matéria das excepções invocadas pela ré, invocando que os tribunais portugueses são os competentes para conhecer a acção, nos termos do Regulamento (CE) nº 44/2001, de 22/12/2000, por a acção de indemnização do lesado directamente contra o segurador poder ser intentada no Estado-Membro onde aquele tiver o seu domicílio, e, quanto à segunda excepção invocada alegou que não obsta à aplicabilidade do prazo de prescrição mais longo a circunstância de não ter sido apresentada queixa, bastando tão só existir a possibilidade de instauração de procedimento criminal.

Após os articulados, foram as partes notificadas ao abrigo do disposto no art.º 5º, n.º 4, da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, para, em 15 dias, apresentarem os requerimentos probatórios ou alterar os que hajam apresentado (fls. 114).

Autor e ré vieram apresentar requerimentos probatórios (fls. 116 e segs.).

Após tais requerimentos foi proferido despacho com o seguinte teor: " Estando já debatidas nos autos as excepções invocadas pela R., dispenso a audiência prévia, ao abrigo do disposto nos artºs. 591º, nº 1, al. d), 593º, nº 1 e 2, al. a) e 595º, nº 1, al. b), CPC, por tal audiência ter apenas como finalidade proferir despacho saneador, nos termos do artº 595º, nº 1, al. b), CPC, destinado a conhecer imediatamente do mérito da causa." Logo após tal despacho foi proferida sentença decidindo: “julgo verificada a excepção de prescrição invocada pela R. e, em consequência, absolvo a R. S - Companhia de Seguros, S.A. do pedido.” Não se conformando com aquela sentença, dela interpôs recurso o autor, que nas suas alegações formulou as seguintes “CONCLUSÕES”: 1ª – Conforme resulta de fls., o Recorrente intentou contra a Recorrida a presente ação declarativa, destinada à efetivação de Responsabilidade Civil, emergente de acidente de viação, ao abrigo do disposto nos artigos 483º e 503º do Código Civil e ainda do artigo 9º, nº 1, alínea b) e 11º do Regulamento da CE, e nos termos do disposto nos artigos 9º, 1º, 11º e 59º do Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22/12/2000, sob a forma de processo comum ordinário, pedindo a condenação da Recorrida no pagamento de € 149.996,00 €, alegando o que acima se transcreveu; 2ª - Citada, a Recorrida contestou, e, posteriormente, veio o Recorrente pronunciar-se na Réplica quanto à matéria das exceções invocadas pela Recorrida, alegando o que acima se transcreveu; 3ª - O Recorrente foi notificado para apresentar o seu Requerimento Probatório, o que fez nos termos acima transcritos; 4ª - Por Sentença de fls., decidiu a Meritíssima Juiz o acima transcrito; 5ª - Expressa a douta Sentença em recurso que é dispensada a audiência prévia ao abrigo do disposto nos artigos 591º, nº 1, alínea d), 593º, nº 1 e 2, alínea a) e 595º, nº 1, alínea b) do CPC, entendendo o Tribunal dispensar a audiência prévia, cometendo uma irregularidade que influi decisivamente na decisão da causa, violando o dever de administrar a justiça e de fundamentar corretamente a sua decisão, constantes noa artigos 152º e 154º do NCPC, sendo, portanto, causa de nulidade, de que se reclama, para todos os legais efeitos; 6ª - Para o Recorrido, a presente decisão recorrida tem contornos de “decisão surpresa”, o que a Justiça material não consente; 7ª - O Recorrente configura a ação como uma ação destinada ao ressarcimento dos danos causados por ato ilícito enquadrado no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, pois trata-se de um acidente de viação ocorrido em Puerto Real, Cádiz, Espanha; 8ª - Já está assente que a norma de conflitos aplicável à responsabilidade extracontratual emergente do acidente de viação ocorrido em Espanha, porque põe em confronto diversas ordens jurídicas, é a que consta do art. 45.º do CC; 9ª - Interpretando o conceito de responsabilidade civil extracontratual, este deve situar-se no círculo do artigo 483.º e seguintes do CC, quer se funde num ato ilícito – ação ou omissão –, quer se apoie no risco, quer decorra de uma conduta lícita; 10ª - Feita essa interpretação e correspetiva subsunção jurídica, o n.º 1 do art. 45.º do CC estabelece a regra geral que manda submeter a responsabilidade extracontratual –fundada quer em ato ilícito, quer no risco ou em qualquer conduta lícita – à lei do Estado onde decorreu a principal atividade causadora do prejuízo ou, no caso de omissão, onde ela devia ter sido exercida – lex loci; 11ª - Revertendo ao caso concreto em avaliação, temos que, tendo o acidente rodoviário acontecido em território espanhol, devem suscitar-se as exceções contempladas nos n.ºs 2 ou 3 do indicado art. 45.º do CC; 12ª - Indagação e análise que, em concreto, o Tribunal “a quo”, não realizou, tal como estava obrigado; 13ª - Verifica-se a exceção contida no n.º 3 do art. 45.º do CC, pois estão concomitantemente reunidos os seguintes pressupostos: a) o agente e o lesado terem a mesma nacionalidade, ou na falta dela, a mesma residência habitual; b) encontrarem-se ambos ocasionalmente em país estrangeiro; 14ª - É no condutor do veículo... FWL - segurado na companhia de seguros “Estrela Turismos”, representada da aqui Recorrida, pelo que recai a responsabilidade civil emergente do acidente, pela apólice n.º...., para a aqui Recorrida - S - Companhia de Seguros, S.A., contribuinte nº..., com sede na Rua ... LISBOA, representante em território português da seguradora “Estrella Turimos”, o que implicou a sua demanda; 15ª - Alegou a Recorrida que a responsabilidade civil fora transferida para “S España, S.A. de Seguros Y Reaseguros”, juntando o documento de fls. 87-92; 16ª - Tal documento foi devidamente impugnado pelo Recorrente, uma vez que não continha os elementos essenciais para a sua interpretação e demonstração de veracidade, até porque nele não consta qualquer data ou assinatura que pudesse validar a alegada transferência de responsabilidade; 17ª - Impugnado o documento referido, deveria ter o Tribunal determinado, nos termos do artigo 411º do NCPC, as diligências necessárias ao apuramento da verdade e justa composição do litígio; 18ª - Ao ter-se admitido tal documento, com fundamento para a apreciação do mérito, sem que se tivesse em conta a impugnação do Recorrente, criou-se no mesmo a espectativa de que o mesmo documento seria, pelo menos, apreciado; 19ª - Não tendo essa apreciação sido feita pelo Tribunal “a quo”, operou-se uma violação da confiança que as partes devem depositar no Tribunal e uma nítida violação do artigo 6º da CEDH e do artigo 20º, nº 4 da CRP; 20ª - A hipótese versada neste segmento normativo é ilustrada pelo mencionado autor com os seguintes exemplos concretos: “A disposição do art. 45.º, n.º 3, quadra particularmente bem às hipóteses de excursões e viagens de negócios feitas a um país estrangeiro, ou aos casos de transporte amigável oferecido a um conterrâneo para um passeio ou umas férias em país estrangeiro.”; 21ª - Situações nas quais o presente caso concreto se enquadra; 22ª - O encontro ocasional em país estrangeiro a que se refere o nº 3 do artigo 45º significa estadia sem grande estabilidade e permanência, ou seja, para durar por um período limitado, circunscrita à realização de um fim ou uma atividade pouco prolongada – vide Acórdão do STJ, 08/11/1979; 23ª - Situação que...

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