Acórdão nº 724/04.3TBSCR. L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO.

Intentou o A, residente na Rua (...), a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra a R, com sede na Rua (...).

Alegou essencialmente: Entre o autor, como promitente-comprador, e a ré, como promitente-vendedora, foi celebrado um contrato promessa de compra e venda de três fracções autónomas destinadas a habitação em edifício ainda em construção pelo preço de 60.000.000$00.

No contrato promessa, celebrado em 16 de Agosto de 2001, as partes acordaram no pagamento do preço em três prestações, duas antecipadas de 15.000.000$00, cada uma, e a última de 30.000.000$00.

O autor já pagou as duas primeiras prestações.

Ficou estipulado que o contrato prometido seria feito até Dezembro de 2002 mediante marcação da ré.

A Ré solicitou ao autor os documentos para celebração da escritura em 23 de Abril de 2003.

Nesta altura a obra ainda se encontrava inacabada.

O A. está interessado na celebração do contrato prometido na condição das obras serem terminadas.

As fracções prometidas vender e respectivas zonas comuns do edifício não foram construídas com as características asseguradas pelo vendedor.

Conclui formulando os seguintes pedidos: “A) Ser a Ré condenada à execução específica do contrato promessa de compra e venda que outorgou com o Autor, terminando por sua conta e risco as obras em falta e correcção dos defeitos na fracção autónoma objecto do contrato promessa e consequentemente; B) Ser reconhecido ao Autor, face à modificação das circunstâncias que determinaram a vontade, o direito à modificação do contrato promessa de compra e venda no que se refere ao preço acordado e, em consequência o preço ser reduzido para o montante de € 149 639,37 (…); C) Em alternativa ao pedido de execução específica, no que concerne à realização de obras por terminar, ser o valor das mesmas reduzido ao valor real da fracção, cujo preço se indica na alínea anterior”.

A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.

Deduziu reconvenção formulando os seguintes pedidos: “Ser a reconvenção julgada procedente por provada e ser consequentemente : Declarado resolvido o contrato promessa entre as partes outorgado aos 16 de Agosto de 2001 = Ser declarado o A como promitente comprador, o único e exclusivo culpado pelo respectivo incumprimento ; Ser a quantia de 149 639,37 euros (…) prestada a título de sinal, considerada perdida a favor da R como promitente não faltosa ou, em alternativa, ser reconhecido o acréscimo do valor da fracção prometida vender, em virtude da afectação de nove espaços de estacionamento extra e, em consequência, ser o A condenado no pagamento à R da quantia de € 150 000,00 (…), para além daquela que, relativamente ao preço inicialmente acordado, permanece em falta, em igual montante de € 149 639,37 (…)”.

O autor replicou.

Procedeu-se ao saneamento dos autos conforme fls. 373 a 385.

Realizou-se audiência de julgamento.

Foi proferido, em 19 de Junho de 2014, o seguinte despacho: “ Antes de mais, notifique o autor para em 10 dias consignar em depósito o montante de 149.639,36 euros (cento e quarenta e nove mil, seiscentos e trinta e nove euros e trinta e seis cêntimos) correspondente à parte do preço em falta, com a cominação de que caso o não faça a acção improcede – artigo 830º, nº 5 do Código Civil. “ (cfr. fls. 903).

Apresentou o A. o requerimento de fls. 969 a 974, no qual essencialmente referiu que : No caso presente não se está perante a situação do disposto no artigo 830º, nº 5 do Código Civil, dado que o A. não está perante a situação do disposto no artigo 830º, nº 5 do Código Civil, pois o Autor não está numa mera posição de excepção de não cumprimento.

A situação de a Ré ter omitido nos autos a existência de uma hipoteca que sempre onerou a fracção vem alterar a posição das partes quanto ao desfecho da presente acção.

A sociedade Ré não tem qualquer actividade, estando a ser executada pelo valor de € 549.803,12, com penhora sobre a fracção objecto do presente litígio.

É manifesto que a Ré não cumprirá com a sua obrigação, resultando injusto que o A. viesse a ser obrigado a reter fundos por conta de um preço que não pode ser devido dado que a conduta da Ré sempre foi a de pretender receber a totalidade de um preço pela venda de uma fracção que não terminou e que está onerada com uma hipoteca de valor muito superior ao preço negociado com o A.

Não havendo resposta à matéria de facto, nem sentença produzida, o valor da fracção não pode ser considerado como o valor constante do contrato, pois os autos contêm matéria a ser dada como provada.

Pedindo-se a redução do preço para o valor já pago, e não tendo sido proferida sentença que confirme ou negue o pedido, o preço não está determinado.

Conclui pedindo que se considere o exposto anteriormente e a especificidade dos presentes autos, prosseguindo o processo até final, cuja urgência é inegável face a penhora e iminente perigo de perca do património financeiro do A., não se exigindo um agravamento injusto, como decorreria da consignação em depósito, que não teria efeitos práticos pois a Ré legalmente, como se veio a constatar agora, não tem direito à fracção por falta de pagamento da hipoteca.

Juntou a documentação de fls. 977 a 1023.

Foi proferida a seguinte decisão : “ Questão prévia: falta de consignação em depósito da parte da prestação em falta Encerrados os debates o Tribunal notificou o autor para consignar em depósito a parte da prestação em falta, em 10 dias.

O autor não efectuou o depósito tendo justificado a falta por requerimento e documentos juntos a fls. 969 a 1023.

Invoca, em síntese, que: posteriormente à introdução da acção, o imóvel objecto do contrato promessa de compra e venda foi objecto de penhora o que põe em risco a execução específica do contrato; o Tribunal tem de responder à matéria de facto a fim de determinar a redução do preço, antes de ordenar o respectivo depósito.

Relativamente à primeira circunstância alegada, esse risco só mediante o registo da acção promovido pelo autor poderia ter sido prevenido.

Quanto à segunda circunstância invocada, resulta da matéria assente que a prestação do autor em falta consiste na quantia de 149.639,36 euros – cf. alíneas E e F da matéria assente. No contrato promessa de compra e venda aqui em litígio, é lícito ao réu invocar a exceptio. Fora das situações previstas nos números 3 e 4 do artigo 830º do Código Civil – que não foram invocadas na presente acção – a falta de consignação em depósito da prestação em falta pelo autor no prazo que lhe foi concedido, acarreta a improcedência da acção.

Em conformidade, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas pelas partes incluindo as questões de facto controvertidas – artigo 608º nº 2 do CPC (Código de Processo Civil) de 2013.

As custas ficam a cargo do autor – artigo 527 nºs 1 e 2 do CPC de 2013. Tendo sido indeferido o requerimento do autor junto a fls. 969 e seguintes não é necessária a audição da contraparte – artigo 201 do CPC de 2013.

Decisão: Julgo totalmente improcedente por não provada a presente acção e em conformidade absolvo a ré do pedido. “ (cfr. fls. 1024 a 1026).

Apresentou o A.

recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação (cfr. fls. 1059).

Juntas as competentes alegações, a fls. 1048 a 1053, formulou o apelante as seguintes conclusões: 1ª – A sentença recorrida veio proferir decisão no sentido da improcedência da acção pela falta de consignação em depósito, determinada oficiosamente pela juíza, com errada aplicação do disposto no artigo 830º do Código Civil.

  1. – A sentença recorrida é contraditória, com a factualidade apresentada nos autos pelo Autor a qual culmina com o pedido de execução específica do contrato, com a alegação da alteração das circunstâncias e consequente modificação do contrato, considerando-se que o preço acordado resultou de um conjunto de circunstâncias, expressas na memória descritiva, não materializadas na construção em termos globais, da fracção objecto do contrato e partes comuns.

  2. – As partes não invocaram a excepção de não cumprimento, em momento algum do processo, sendo que a lei não prevê que a excepção de não cumprimento seja do conhecimento oficioso.

  3. – A sentença recorrida é contraditória nos seus fundamentos, pois fundamenta a exigência da consignação em depósito por entender que o autor não apresentou a sua pretensão dentro do previsto no número 3 do artigo 830º do Código Civil (ponto 10 da sentença) o que não corresponde à factualidade dos autos, sendo certo que no ponto um da sentença recorrida a juíza do tribunal recorrido transcreve parte do pedido do autor, onde consta, precisamente, o pedido previsto no artigo 830º, nº 3 do Código Civil – vejam-se os artigos 14º a 37º da petição.

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