Acórdão nº 797/10.0 TYLSB-B.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | MARIA TERESA PARDAL |
Data da Resolução | 05 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO.
A…, Lda intentou acção declarativa com processo ordinário contra R…, Lda, alegando, em síntese, que celebrou com a ré um contrato no âmbito do qual lhe executou trabalhos de construção civil e emitiu facturas nos valores respectivos de 35 260,00 euros e de 33 780,00 euros, tendo o Sr. AS, pessoa simples e crédula e empregado da autora, emitido uma declaração de quitação a pedido da ré e com a promessa de que as facturas lhe seriam pagas nos dias seguintes, o que não aconteceu, tendo a ré vindo a devolver as facturas apoiando-se na referida declaração de quitação, emitida por quem não tinha poderes para vincular a sociedade autora.
Concluiu pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 69 040,00 euros titulada pelas referidas facturas, bem como juros vencidos no valor de 3 980,71 euros e juros vincendos. A ré contestou alegando, em síntese, que sempre esteve convencida de que a gerência da autora era exercida pela sócia FS e pelo pai desta, AS, com quem sempre lidou e que sempre se intitulou gerente da autora, como aconteceu num outro contrato de empreitada celebrado entre a sociedade BB…, Lda e a autora, que o referido AS outorgou na qualidade de gerente da autora, tendo o referido AS emitido, no dia 15/05/2007 duas declarações de quitação – uma no montante de 94 750,00 euros relativa a pagamentos do contrato celebrado com a sociedade BB…, Lda e outra que é a que está agora em discussão – uma vez que nessa data recebeu toda a quantia que estava em dívida.
Concluiu pedindo a improcedência da acção e a absolvição do pedido, assim como a condenação da autora em multa e indemnização no mínimo de 5 000,00 euros, como litigante de má fé. A autora replicou alegando, em síntese, que o funcionário da autora AS não se intitulava como gerente da autora, tendo tido intervenção no contrato celebrado com a ré na qualidade de encarregado e que no dia 15/05/2007 apenas recebeu a quantia de 94 750,00 euros correspondente à regularização da dívida da sociedade BB…, Lda, não tendo recebido o montante ora peticionado, que continua em dívida.
Concluiu como na petição inicial.
Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a acção procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de 69 040,00 euros, acrescida de juros vencidos no valor de 3 980,71 euros e de juros vincendos e condenou ainda a autora, como litigante de má fé, no pagamento de uma multa de 15 unidades de conta. * Inconformada, a ré interpôs recurso e alegou, formulando as seguintes conclusões:
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O objecto do recurso é saber se a declaração de quitação assinada pelo AS vincula a apelada, se o referido AS era gerente, representante e/ou mandatário da Apelada, e ainda se a Apelante é devedora da quantia peticionada.
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Através da Sentença de 12.02.2014 o Tribunal julgou procedente o pedido, condenando a Ré/Apelante no pagamento de 69.400,00 euros acrescido de juros, para tanto baseou-se, em síntese, no seguinte raciocínio: “que a Autora não teve qualquer intervenção na declaração entregue à Ré/Apelante, quem subscreveu tal escrito foi uma terceira pessoa que embora declarando agir em nome da sociedade, não o podia fazer, por não ser sócio ou gerente, não podendo assim, de todo, vincular a sociedade.
C) O Tribunal a quo não tem em conta aos documentos que foram juntos no dia 11 de Outubro de 2013, sendo a Sentença totalmente omissa aos mesmos e aos efeitos que os mesmo produzem no âmbito da relação controvertida, documentos esses que não foram impugnados pela Apelada/Autora, sendo eles: i.1 – Contrato promessa de cessão de quotas a favor de AS.
No dia 25 de Março de 2004, no oitavo Cartório Notarial de Lisboa, a Senhora FS sócia e gerente da Apelada outorgou uma escritura de cessão de quotas adquirindo a quota ao sócio FMS, unificando-a e alteração do contrato social, passando a ser detentora da totalidade do capital social, conforme consta da escritura junta no processo de insolvência a fls 26 e seguinte, da peça processual enviada no dia 11 de Outubro de 2013, com a referência 14692948 e que se junta novamente.
Também, conforme consta a fls 30 e 31 do referido processo de insolvência, no dia 25 de Março de 2004 a referida sócia gerente FS, já como única sócia a gerente, outorgou um contrato promessa de cessão de quotas, cedendo a totalidade da sua quota a favor AS – pai da referida cedente – pelo valor de cinco mil euros, vide doc. 2, da peça processual enviada no dia 11 de Outubro de 2013, com a referência 14692948 e que se junta novamente.
i.2 – A procuração a favor de AS.
No mesmo dia – 25 de Março de 2004 - a referida FS, na qualidade de sócia e gerente da Autora/apelada, outorgou uma procuração a favor de seu pai, AS, vide doc. 3, procuração essa que se encontra junto aos autos no processo de insolvência a fls 33 e seguintes.
E nos termos da referida procuração a referida FS deu plenos poderes a seu pai AS, assinar quaisquer documentos, incluindo dar quitação, vide doc. 3, da peça processual enviada no dia 11 de Outubro de 2013, com a referência 14692948 e que se junta novamente.
A referida procuração ainda confere ao Senhor AS poderes para: intervir e aprovar assembleias gerais, universais, ou não, ou em deliberação unânime por voto escrito a prestação do consentimento da sociedade à cessão da quota e ainda para representar a mandante em qualquer assembleias gerais da aludida sociedade, regularmente convocadas ou não e nas mesmas participar e votar como entender.
i.3 – Carta datada de 01.04.2010, assinada pela Sócia gerente da Apelada e junta aos autos do processo de insolvência, no qual alega que a gerência era exercida exclusivamente pelo AS.
A sócia gerente da Apelada/Autora, FS, através de carta datada de 01 de Abril de 2010 (junto aos autos a fls 40 e seguintes do processo de insolvência) declara que foi o seu pai – AS - que geriu a sociedade, dizendo que: “ que diariamente a geriu contactando e contratando e despedindo pessoal, abrindo contas, assumindo responsabilidades perante a banca, emitindo cheques por mim assinados em branco, dando orçamentos, firmando contratos, recebendo e efectuando pagamentos, adquirindo e utilizando viaturas, recebendo toda a correspondência enfim inúmeros actos …” vide doc. 4 da peça processual enviada no dia 11 de Outubro de 2013, com a referência 14692948 e que se junta novamente.
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A Apelante requereu que o Apelada juntasse aos autos o livro de actas, facto que nunca aconteceu. A razão é que a Apelada, na pessoa da sua sócia gerente, alegou na referida carta – que a gerência sempre foi exercida pelo AS, o que quer dizer que o mencionado AS era quem representava a Autora em todos os seus actos, com conhecimento e aprovação da sócia gerente FS, conforme a carta de 01 de Abril de 2010.
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E sociedades também se vinculam perante terceiros por meio de representantes voluntários (cfr. os artigos 252º, nº 6, e 391º, nº 7, do Cód. das Sociedades Comerciais)”.
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Nos termos da procuração que foi conferida a favor do referido AS, o mesmo podia convocar assembleia convocadas ou não e nas mesmas participar e votar como entender, o que quer dizer que à data da outorga da declaração de quitação (2007) o referido AS era representante da sociedade – conforme carta da sócia gerente FS – e ainda mandatário nos termos da procuração conferida pela Autora/Apelada, com poderes, para convocar assembleias e votar como entender, sem esquecer outras possíveis procurações emitidas pela sócia gerente, atendendo que a mesma na referida carta alega que o referido AS, em nome da Autora abriu contas bancárias, assumiu responsabilidades perante a banca, actos esses que só seriam possíveis se o referido AS estivesse devidamente mandatado.
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Apelada não juntou o livro de acta, apesar de ter sido devidamente notificada para o fazer, pelo que, salvo melhor opinião, temos uma inversão do ónus de prova, conforme artigos 344º do Código Civil e o artigo 430º e 417 n.º 2 NCPC H) O Tribunal a quo, salvo melhor opinião, violou os artigo s 252 n.º...
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