Acórdão nº 349-10.4YXLSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelSACARR
Data da Resolução24 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO: Os autores J... e M... intentaram acção ordinária contra os réus M... e M..., pedindo que os mesmos fossem condenados a desocupar a fracção autónoma designada pela letra “C” do prédio urbano sito na Avª ..., inscrito na matriz predial urbana sob o nº 567, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº 2133 e ainda a pagar aos autores a quantia de € 708,34 por cada mês de ocupação do imóvel até entrega do mesmo aos autores.

Alegaram, em síntese, que autores e réus são comproprietários da fracção “C” daquele prédio, na proporção, respectivamente, de 5/6 avos e 1/6, tendo a compropriedade resultado, entre outros factos, dos inventários por morte de M..., o qual correu termos na 2ª secção do 17º Juízo Cível de Lisboa, processo 6.220 e de L... o qual correu termos na 1ª secção do 4º Juízo Cível de Lisboa, processo 933/05.8TJLSB. A fracção em causa tem vindo a ser ocupada pelos réus, tendo-lhes sido entregue, por meio de contrato de comodato, sem que fosse estabelecido prazo ou uso para o dito comodato. Os autores enviaram aos réus uma comunicação, que os réus se recusaram a receber, onde reclamam o direito de administrar a dita fracção, por serem detentores de 5/6 da aludida fracção. A fracção tem um valor de mercado, ao nível do arrendamento, superior a € 850,00 por mês.

Os réus contestaram, pugnando pela improcedência da acção. Em substância, alegaram que sempre viveram no imóvel dos autos, que sempre constituiu a casa de morada de família dos réus, pelo que a ocupação da fracção não resulta de qualquer contrato de comodato.

Os autores nunca enviaram qualquer carta aos réus. Os autores nunca contribuíram para os encargos com a referida fracção, o que sempre foi da responsabilidade dos réus, incluindo as de natureza fiscal. A fracção possui um valor de mercado muito inferior ao indicado pelo autor e nunca superior a € 300,00 mensais.

Os autores replicaram, concluindo como na petição inicial.

Foi proferida SENTENÇA que julgou a acção parcialmente procedente e: (i) julgou improcedente o pedido de desocupação da fracção autónoma designada pela letra C, correspondente à cave direita, do prédio urbano com o n° 33 sito na Avenida ..., em Lisboa; (ii) condenou os réus a pagarem aos autores a quantia mensal de € 395,83, devida desde 30 de Abril de 2010 e respeitante à ocupação da referida fracção.

Não se conformando com a sentença, dela recorreram os réus, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1ª - A douta decisão a quo, ao condenar os réus no pagamento aos autores de uma renda pela casa morada de família, que aqueles desde sempre ocuparam com conhecimento expresso e directo dos autores, viola, no seu entendimento, o disposto no artigo 334º do Código Civil pois existe clamorosa situação de excesso dos limites impostos pela boa fé, bons costumes e fim social do direito.

  1. - A autora mulher e o réu marido são irmãos, possuindo em curso vários processos, entre eles um de divisão de coisa comum, o que os traz, juntamente com outros factos, em situação de permanente conflito.

  2. - Os réus ocupam a fracção dos autos, pelo menos desde 1980, isto é, há pelo menos 35 anos.

  3. - Os anteriores proprietários da fracção, pais do réu marido e da autora mulher, sempre consentiram que os réus a referida fracção, permitindo que estes dela fizessem a sua casa de morada de família.

  4. - Os autores, não obstante estar em curso processo de divisão de coisa comum, cientes das dificuldades financeiras dos réus, procuram o seu vexame, tentando onerar a sua posição, como forma de diminuir a sua parte dos bens a receber no âmbito da mencionada acção de divisão de coisa comum.

  5. - Prescreve o artigo 334º do Código Civil que é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.

  6. - Neste autos, após realização das partilhas decorrentes de ambos os inventários, os autores ficaram proprietários de 5/6 da fracção dos autos, por os réus não terem tido a necessária capacidade financeira para aumentar a sua licitação e por sempre terem confiado, que a sua casa de morada de família não seria posta em causa.

  7. - Ou seja, os réus confiaram na boa fé e respeito pelos bons costumes por parte dos autores e nessa medida confiaram que a sua morada estaria sempre a salvo de investidas, pelo menos até à conclusão da acção de divisão de coisa comum.

  8. - Movidos por essa confiança, os réus tentaram uma solução de equilíbrio nas partilhas efectuadas, sem curar que os autores pudessem pretender a sua saída de casa, tanto mais que o apartamento usado pelos réus, estando profundamente degradado, não oferece qualquer solução de rendimento, sem que antes sejam efectuadas avultadas obras de restauro.

  9. - A casa de morada de família dos réus possui 54,53 m2 de área útil.

  10. - É uma cave, a carecer de obras profundas de conservação e até de intervenção, pois não recebe obras há mais de 30 anos, como decorre da peritagem efectuada.

  11. - É composta por três pequeníssimas divisões, cozinha, 1 wc e logradouro.

  12. - Encontra-se, como está suficientemente documentado nos autos, em avançado estado de degradação.

  13. - É assim evidente o intuito vexatório destes autos, já que o benefício que os autores podem retirar da eventual procedência dos autos é diminuto ou nulo.

  14. - A desproporção de benefício e prejuízo para as partes é clamorosa e indicia os intuitos vexatórios e pouco ortodoxos (para não dizer mais), dos autores 16ª - Manuel de Andrade refere-se aos direitos exercidos em termos clamorosamente ofensivos da Justiça (Teoria Geral das Obrigações, pág.63) e às hipóteses em que a invocação e aplicação de um preceito de lei resultaria, no caso concreto, intoleravelmente ofensiva do nosso sentido ético-jurídico 17ª - Para determinar os limites impostos...

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