Acórdão nº 35924/15.1T8LSB-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelCARLA C
Data da Resolução26 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: ... - Supermercados, Lda. intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra Banco ….., S.A. e …… Banco, S.A., como também contra ………., relativamente ao qual, porém, na pendência da acção, veio desistir do pedido.

Peticiona a condenação solidária dos RR. a indemnizarem a A. dos danos patrimoniais a apurar em execução de sentença.

Alega, para tanto: Que detém papel comercial da “... Invest, S.A.”; Que adquiriu esse produto na convicção de estar a adquirir obrigações do ...; Que o ... lhe garantiu que quer o capital, quer os juros estavam assegurados; Que o capital ficou por restituir, bem como juros remuneratórios; Que deixou de perceber lucros cessantes; Que nos termos da deliberação do Banco de Portugal e do regime jurídico da cisão o R. “...” é também ele responsável pelo pagamento.

* Foram proferidas nestes autos as seguintes decisões: «Julga-se verificada excepção peremptória inominada, em consequência do que, nos termos do disposto no art.º 576.º/1/3 do C.P.C., se absolve o R. “..., S.A.” do pedido.» E «(…) decreta-se a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide no que concerne ao R. “...” * Custas pela A. e pelo R. “..., S.A.” em partes iguais nos termos do disposto no art.º 536.º/1 do C.P.C., aplicável ex vi al. e) do n.º 2 do mesmo art.º, sem prejuízo da isenção a que alude a al. u) do n.º 1 do art.º 4.º do R.C.P..» * Não se conformando com as decisões, dela apelou a A., formulando as seguintes conclusões: DA INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE QUANTO AO R. ..., EM LIQUIDAÇÃO 1.–Se no processo de insolvência se vai liquidar o património do devedor insolvente e repartir o produto obtido pelos credores, é necessário que estes sejam contemplados e graduados nesse processo, sob pena de nada poderem vir a receber depois de executado o património.

  1. –Mas, isto apenas significa que os credores têm de ser contemplados e graduados num processo de insolvência, mesmo que já tenham o seu crédito reconhecido por sentença transitada (art.º 128.º, n.º 3).

  2. –Isto não significa que os créditos não possam - ou não tenham - que ser reconhecidos em processo autónomo, nomeadamente quando não se trata de créditos comuns, em particular com origem na responsabilidade civil.

  3. –A natureza célere e urgente do processo de insolvência é incompatível com a tramitação e a necessária ponderação de direitos litigiosos complexos ou especializados.

  4. –A extinção da acção declarativa, com a deslocação do processo para o tribunal de comércio, importaria a perda de toda a tramitação processual já decorrida, com prejuízo para as partes e para a celeridade do processo.

  5. –Consciente desta situação, o legislador do CIRE, no Capítulo II do Título IV (Efeitos Processuais), não determina a suspensão das acções declarativas.

  6. –Nas acções declarativas a regra não é a extinção, nem apensação ao processo de insolvência e esta não é automática, dependendo de requerimento do administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo. (art.º 85.º, n.º 1 in fine) ou de requisição do juiz e só nos processos “nos quais se tenha efectuado qualquer acto de apreensão ou detenção de bens compreendidos na massa insolvente”. (art.º 85.º, n.º 2).

  7. – Mas não se pode depreender que este regime excepcional seja extensivo a todas as acções declarativas. Se essa fosse a intenção do legislador, tê-lo-ia expressado, sem limitações, como, aliás, fez em relação às acções executivas (art.º 88.º).

  8. –O que o legislador pretendeu com o regime da reclamação de créditos foi evitar entropias no processo de insolvência, mas, uma vez feita a reclamação de créditos no processo de insolvência, este não interfere com as acções declarativas a correr, em que o credor seja parte, ou, mesmo, noutras, que este veja interesse em intentar, para reconhecimento do seu crédito.

  9. –É certo que o credor que tenha o crédito reconhecido por sentença transitada em julgado não está dispensado de reclamar o sue crédito (artº. 128/3 CIRE), porque só no processo de insolvência esse crédito pode ser executado, por se tratar de um processo universal.

  10. –Mas, como é evidente, tendo a decisão transitado em julgado, esse crédito não pode ser objecto de impugnação no processo de insolvência e tem de ser obrigatoriamente reconhecido, sob pena de inconstitucionalidade por violação do disposto no artº 205º/2 e 3 da Constituição.

  11. –Se o credor, com uma acção declarativa de condenação a correr, não reclamar o seu crédito no processo de insolvência, pode ver extinta a instância por inutilidade superveniente da lide (art.º 277.º al. e) do CPC), uma vez que deixa de poder ver os seus direitos de crédito satisfeitos relativamente ao devedor insolvente.

  12. –Naturalmente que, se na acção declarativa, houver outros Réus, a extinção da instância opera apenas quanto ao Réu devedor insolvente, prosseguindo os seus termos contra os demais Réus, como, aliás, está consignado expressamente para as acções executivas (art.º 85.º, n.º 1 in fine e n.º 2).

  13. –O art.º 181º n. 1 do CIRE dispõe que: “Os créditos sob condição suspensiva são atendidos pelo seu valor nominal nos rateios parciais, devendo continuar, porém, depositadas as quantias que por estes lhes sejam atribuídas, na pendência da condição”.

  14. –Só com a Lei nº 16/2012 de 20 de Abril, é que o n.º 1 do citado art.º 50.º passou a ter a actual redacção, a partir de 20 de Maio de 2012: “Para efeitos deste Código consideram-se créditos sob condição suspensiva e resolutiva, respetivamente, aqueles cuja constituição ou subsistência se encontrem sujeitos à verificação ou à não verificação de um acontecimento futuro e incerto, por força da lei, de decisão judicial ou de negócio jurídico.”.

  15. –Com a nova redacção do n.º 1 do art.º 50.º, o legislador tomou posição clara sobre o assunto, considerando expressamente as decisões judiciais como condição suspensiva, até ao trânsito em julgado da decisão, pelo que o citado Acórdão Uniformizador, no domínio do actual quadro legislativo, salvo o devido respeito, perdeu actualidade e validade.

  16. –O art. 50º ao acrescentar o novo tertium genus da decisão judicial, certamente não queria referir-se às outras condições suspensivas, que já resultavam da redacção anterior.

  17. –Se o facto de que depende a condição suspensiva fosse o objecto do litígio, já estava abrangido na anterior redacção do preceito e não faria qualquer sentido acrescentar a decisão judicial.

  18. –Com a nova redacção do n.º 1 do art.º 50.º ficou claro que as acções declarativas contra o devedor insolvente são fundamento da graduação do respectivo crédito sob condição suspensiva, até ao trânsito em julgado da sentença, só ficando impossibilitadas de alcançar o seu efeito útil normal se o crédito subjacente não for reclamado no processo de insolvência, nos termos do CIRE.

  19. –Assim, no actual quadro legislativo, só na falta dessa reclamação, se poderá entender que o credor perdeu o seu interesse na acção declarativa e consequentemente decretar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 287.º al. e) do CPC.

  20. –A A. reclamou o seu crédito, subjacente à presente acção declarativa, no processo de insolvência do R. ..., Banco ..., S.A. – em Liquidação, conforme documento junto aos autos.

  21. –Pelo que a presente acção declarativa não perdeu o seu interesse e fundamento para reconhecimento definitivo do crédito da A.

  22. –O qual deverá ser acautelado, no processo de insolvência do ..., como crédito sob condição suspensiva, até ao trânsito em julgado da presente acção, prosseguindo a presente acção a sua tramitação normal, não se desperdiçando toda a actividade processual já decorrida.

  23. –De qualquer forma, à cautela, sem admitir, sempre se diga que, caso o tribunal decretasse a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, essa extinção só operaria relativamente ao ..., Banco ..., S.A. - em Liquidação, mantendo-se a instância contra o outro R., ..., S.A., à semelhança, aliás, do que ocorre nas acções executivas, nos termos do art.º 88.º, n.º 1 in fine e 2.

  24. –Acresce que a deslocação para o processo de insolvência do apuramento da responsabilidade do ... – devedor solidário – poderia levar a decisões contraditórias relativamente aos mesmos factos.

  25. –A acção declarativa não viola o princípio da igualdade dos credores, mas, apenas, trata diferentemente o que é diferente, conforme decorre do próprio CIRE.

  26. –O douto despacho saneador violou os art.º 50º nº 1 do CIRE e 277º al. e) do CPC.

  27. –A douta sentença recorrida, ao condenar a A. em custas, violou, ainda, o art.º 536º do CPC DA ABSOLVIÇÃO DO R. ..., S.A.

  28. –O ... não foi apenas intermediário na comercialização do papel comercial da ..., mas assumiu uma garantia efectiva do seu pagamento.

  29. –A garantia de pagamento prestada pelo ... resulta directamente das responsabilidades assumidas pelo ... na venda do papel comercial aos seus balcões e não de qualquer garantia prestada à ESI ou ..., não estando, por conseguinte, abrangida pelos “passivos excluídos” em qualquer das deliberações do BdP.

  30. –Embora os poderes do BdP possam ser discricionários, não são arbitrários, pois, estão sujeitos aos princípios da adequação e proporcionalidade (art.º 139.º, n.º 2 do RGIF), bem como às regras enunciadas no art.º 145.º-H do RGIF e, naturalmente, aos princípios e direitos fundamentais garantidos pela Constituição.

  31. –A deliberação do BdP de 3 de Agosto de 2014, com a clarificação/correcção da deliberação de 29 de Dezembro de 2015, excluindo as responsabilidades para com a A., violou direitos fundamentais constitucionalmente garantidos, como o direito de propriedade.

  32. –O ..., não obstante conhecer o perfil e vontade da A., em vez de aplicar as poupanças em depósitos a prazo, convenceu a A. a subscrever papel comercial, dizendo que se tratava de um produto equivalente, com as mesmas garantias e segurança dos depósitos a prazo.

  33. ...

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