Acórdão nº 1.401/16.8PBCSC.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelABRUNHOSA DE CARVALHO
Data da Resolução20 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: Na Secção Criminal da Instância Local de Cascais, por sentença de 28/08/2016, constante da acta de fls. 34/39, foi o Arg.

[1] XXX, com os restantes sinais dos autos (cf. TIR[2] de fls. 8[3]), condenado nos seguintes termos: “… Face ao exposto, julgo a acusação procedente por provada e consequentemente:

  1. Condeno o arguido XXX, pela prática, no dia 27-08-2016, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art° 292°, n° 1, do Código Penal, na pena de 30 (trinta) dias de multa à razão diária de € 10,00 (dez euros), o que perfaz um total de € 300,00 (trezentos euros).

    B) Condeno ainda o arguido na pena acessória de inibição de conduzir veículos com motor pelo período de 3 (três) meses (art° 69° n°1 do C.P.).

    C) Mais vai o arguido condenado nas custas do processo fixando-se a taxa de justiça em 1 /2 UC (art° 8°, n° 5, do Regulamento das Custas Processuais e respetiva tabela III anexa e art° 344°, n° 2, alínea c) do Código de Processo Penal).

    …”.

    * Não se conformando, o Arg.

    interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 45/47, concluindo da seguinte forma: “…

  2. Salvo melhor entendimento, existiu um lapso evidente do Ministério Público ao ter deduzido acusação e remetido o processo para julgamento em processo sumário.

    B) Em vez de ter promovido a suspensão provisória do processo.

    C) Como o recorrente requereu em 29/08/2016, a que não foi dada qualquer resposta pelo Ministério Público.

    D) O recorrente arguiu a nulidade desses actos processuais em sede de julgamento, cuja arguição foi indeferida.

    E) Salvo o devido respeito, mal indeferida, conforme resulta da acta de julgamento, não só porque a decisão do Ministério Público não foi fundamentada, nos termos legais, como também não existe qualquer margem de discricionariedade F) Com efeito, a redacção do art° 281, n°1, do C. P. Penal foi alterada, pela Lei n° 48/2007, de 29/08, com a importante alteração de "(...) pode o Ministério Público decidir-se (...) pela suspensão do processo (...)" para " (...) o Ministério Público (...) determina (...) a suspensão do processo (...)" — sublinhados e negritos nossos.

    G) Actualmente e de forma imperativa, o Ministério Público é obrigado a promover a suspensão provisória do processo nos casos que preencham os pressupostos legalmente previstos e este é, indubitavelmente, um desses casos.

    H) É previsível que a imposição de qualquer injunção responda cabalmente às necessidades de prevenção.

    I) Pelo exposto, deve a sentença recorrida ser revogada e proferido um acórdão que determine que o Digno Magistrado do Ministério Público promova a suspensão provisória do processo, como é obrigado legalmente.

    …”.

    * A Exm.ª Magistrada do MP[4] respondeu ao recurso, nos termos de fls. 55/58, com as seguintes conclusões: “… 1. Nos presentes autos, nos termos dos artigos 381.º, e segs. do Código de Processo Penal, após a detenção em flagrante delito do arguido e apresentação ao Ministério Público havia que tomar uma de duas decisões: apresentar o arguido para julgamento sumário, caso estivessem reunidos os devidos requisitos ou aplicar o instituto da suspensão provisória do processo, mediante a concordância do Juiz de Instrução Criminal, caso se verificassem os pressupostos de aplicação.

    1. In casu, o Ministério Público, entendeu não se encontrarem reunidos os pressupostos de aplicação do instituto da suspensão provisória do processo ínsitos no artigo 281.º, n.º1, do Código de Processo Penal,tendo submetido o arguido a julgamento.

    2. O recorrente pretende sindicar a decisão do Ministério Público de submeter o processo a julgamento na forma sumária, ao invés de aplicar o instituto da suspensão provisória do processo. Tal despacho do Ministério Público não é recorrível. Nem nenhum despacho do Ministério Público é recorrível, mas apenas despachos, sentenças e acórdãos proferidos por Juiz.

    3. Deverá , assim manter-se a douta sentença recorrida por se afigurar justa ,adequada e proporcional e não merecer qualquer censura.

      …”.

      * Neste tribunal o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer de fls. 62, em suma, subscrevendo a posição assumida pelo MP na 1ª instância.

      *A sentença (ou acórdão) proferida em processo penal integra três partes distintas: o relatório, a fundamentação e o dispositivo. A fundamentação abrange a enumeração dos factos provados e não provados relevantes para a decisão e que o tribunal podia e devia investigar; expõe os motivos de facto e de direito que fundamentam a mesma decisão e indica, procedendo ao seu exame crítico e explanando o processo de formação da sua convicção, as provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal.

      Tais provas terão de ser produzidas de acordo com os princípios fundamentais aplicáveis ou seja o princípio da verdade material; da livre apreciação da prova e o princípio “in dubio pro reo”. Igualmente é certo que, no caso vertente, tendo a prova sido produzida em sede de audiência de julgamento, está sujeita aos princípios da publicidade bem como da oralidade e da imediação.

      Tratando-se, como se trata, de sentença ditada para a acta, proferida em processo sumário, atenta a simplicidade da matéria de facto, considerámos dispensável a transcrição da sentença (art.º 101º/5 do CPP[5]) e não procederemos à reprodução total da matéria de facto fixada pelo tribunal recorrido, nem da respectiva fundamentação, limitando-nos a reproduzir os factos essenciais à decisão das questões suscitadas.

      * Assim, a matéria de facto provada relevante, atentas as questões suscitadas, é a seguinte: no dia 27/08/2016, pelas 05h35, o Arg. conduziu o veículo automóvel, ligeiro de passageiros, com a matrícula 34-80-QZ, na via pública Av. 25 de Abril, em Cascais, após ter ingerido bebidas alcoólicas, apresentando uma taxa de alcoolemia de, pelo menos, 01,22 g/l.; agiu livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

      * A sentença encontra-se devidamente fundamentada, quer de facto quer de direito, cumprindo inteiramente as exigências do art.º 389º-A/1 do CPP, e não padece de qualquer dos vícios de apreciação da prova, previstos no art.º 410º/2 do CPP, que são de conhecimento oficioso[6] e têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum[7].

      *É pacífica a jurisprudência do STJ[8] no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação[9], sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso.

      Da leitura dessas conclusões e tendo em conta as questões de conhecimento oficioso, afigura-se-nos que a única questão fundamental a decidir no presente recurso é a seguinte: Consequências de o MP não ter usado da faculdade de suspender provisoriamente o processo.

      * Cumpre decidir.

      Entende o Recorrente que a decisão recorrida deve ser revogada por não ter sido usado aquele instituto quando se verificavam todos os requisitos da suspensão provisória do processo.

      Como expõe Sónia Fidalgo[10], “… A suspensão provisória do processo foi introduzida no ordenamento português pelo CPP de 1987, afirmando-se como uma alternativa ao despacho de acusação: apesar de, durante o inquérito, o Ministério Público ter recolhido indícios suficientes de se ter verificado um crime e de quem foi o seu agente, a infracção não vai ser submetida a julgamento (…). Alcançado o acordo entre os diversos sujeitos processuais (Ministério Público, juiz de instrução, arguido e assistente) e verificados os demais pressupostos previstos na lei, o Ministério Público é competente para impor ao arguido certas injunções e regras de conduta cujo cumprimento conduzirá ao arquivamento do processo.

      O instituto da suspensão provisória do processo gerou dúvidas acerca da sua constitucionalidade logo a partir do momento em que o Conselho de Ministros aprovou o Código de Processo Penal, em 4 de Dezembro de 1986, pelo Decreto registado sob o n.° 754/86. … Podemos hoje reafirmar o que foi dito pelo Tribunal Constitucional em 1987: não há qualquer obstáculo constitucional quanto à admissibilidade do instituto da suspensão provisória do processo.

      Com o objectivo de alargar a aplicação da suspensão provisória do processo, após a revisão de Setembro de 2007, passou a permitir-se expressamente a promoção deste instituto a requerimento do arguido ou do assistente (artigo 281.°, n.° 1, do CPP). Em rigor, esta possibilidade não constitui uma verdadeira novidade (…) - tendo em conta o conjunto de direitos que o CPP confere ao arguido e ao assistente (artigo 61.°, n.° 1, al. g), e artigo 69.°), nada impediria que estes sujeitos processuais requeressem ao Ministério Público, na fase de inquérito, e ao juiz de instrução, na fase de instrução, a aplicação da suspensão provisória do processo.

      Aliás, desde a revisão do CPP de 1998 (…) (momento em que passou a prever-se a possibilidade de aplicação da suspensão provisória do processo na fase de instrução — artigo 307.°, n.° 2, do CPP), a doutrina tem defendido a possibilidade de o arguido requerer a abertura de instrução com...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT