Acórdão nº 3842/10.7TBCSC.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução27 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

* Relatório: I–Sérgio .......

intentou acção declarativa com processo ordinário contra Carlos .......

e U……..

.

Alegou o A., em resumo: Em 1983 o A. decidiu adquirir a fracção autónoma correspondente ao 8º andar, letra D, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Urbanização da Portela, lote ......., freguesia de Sacavém. Sendo o R., à época, emigrante, para além de amigo do A. e irmão do seu sogro, sendo ainda titular de contas poupança emigrante, beneficiava de isenções fiscais e bonificações nas taxas de juros de empréstimos bancários para a aquisição de imóveis. Havendo-se o R. disponibilizado para facultar ao A. acesso àqueles benefícios, acordaram ambos que o R. adquiriria a fracção em seu nome, mas no interesse do A. e logo que liquidado o empréstimo bancário os RR. transfeririam a titularidade da fracção para o A.. Este, munido de procuração emitida pelos RR., realizaria todas as diligências relativas à negociação e à compra, suportaria todas as despesas e encargos relacionados com a aquisição, designadamente aprovisionando a conta poupança emigrante do R. que seria usada para a concessão do crédito bancário com o valor relativo às prestações para o seu pagamento.

Para aqueles efeitos os RR. outorgaram procuração a favor do A..

Na sequência, em 1-5-1983 foi celebrado contrato promessa de compra e venda da fracção supra referida, tendo o A. custeado os valores de sinal e reforço, nos montantes de 1.273.000$00 e 637.000$00, embora tais pagamentos tenham sido feitos em nome do R..

Tendo recebido as chaves da fracção, o A. e sua mulher passaram a residir na mesma, pagando todas as despesas: consumos, condomínio, manutenção e beneficiação, etc.. O A. e o R. subscreveram um contrato de arrendamento apenas para legitimar perante terceiros a posse do A., acordando que a renda dele constante não seria devida.

A promitente vendedora, «F ......., CRL» não celebrou o contrato prometido, incumprindo o contrato promessa. Assim, o A., actuando em nome do R., propôs acção em que a promitente vendedora foi condenada a pagar ao ora R. a quantia de 3.000.000$00, acrescida do que se liquidasse em execução de sentença resultante do valor da fracção em 6-11-.......2 deduzido do valor das despesas da responsabilidade do ali A. (aqui R.) em dívida à promitente vendedora, no montante de 576.279$00 acrescido de juros, e reconheceu ao ali A. (aqui R.) o direito de retenção sobre a fracção.

A dívida da promitente vendedora veio a ser liquidada, em liquidação prévia a execução de sentença, no valor de € 116.047,87 mais juros, que à data em que a presente acção foi intentada somavam € 21.984,62; a subsequente execução de sentença veio a ser apensa a processo de execução fiscal e o crédito exequendo foi ali reclamado.

Tendo sido promovida execução pela credora com garantia hipotecária sobre a fracção prometida vender, veio esta a ser vendida a terceiro em hasta pública, mas face ao reconhecido direito de retenção, o A. e família continuaram a residir na fracção.

Tendo sido o A. quem desembolsou todos os valores relativos à fracção - sinal, reforço, todas as outras despesas, designadamente as judiciais e com honorários de advogados no âmbito daquelas acções – entende este ser da sua titularidade o crédito reclamado em nome do R. na acima citada execução fiscal, e por isso solicitou ao R. a emissão de procuração a seu favor para poder receber aquele crédito, o que o R. recusou, negando ao A. qualquer direito ao dito crédito, preparando-se os RR. para embolsar aquele crédito que está prestes a ser pago pelo Tribunal, como já ocorreu com um montante relativo a restituição de custas que, pese embora suportadas pelo A., o R. marido se recusou entregar-lhe.

Considera o A. que foi celebrado um contrato de mandato sem representação – nos termos do qual o R. se comprometeu a praticar os actos jurídicos necessários à aquisição de um imóvel por conta do A. – bem como um contrato de mandato com representação (submandato) nos termos do qual o A. se comprometeu a praticar os actos jurídicos necessários à concretização dos mesmos fins daquele outro contrato de mandato. Defendendo a obrigação de o R. transferir para o A., mandante, os direitos adquiridos e de entregar o que recebeu em execução do mandato, conclui que perante o incumprimento daquele dever de transferência pode o A. obter judicialmente a condenação do mandatário no cumprimento.

Entende, todavia, que se não for considerado que se verificam os pressupostos do mandato sem representação, não estando os RR. obrigados a transmitir o crédito para o A., então estaremos perante um locupletamento à custa alheia (à custa do A.).

Pediu o A. que se declare: «A)–Que entre autor e réu foi acordado um mandato sem representação em que aquele figura como mandante e este como mandatário; B)–Que como consequência deste mandato sem representação tinha o réu marido obrigação de transferir para o autor o crédito que lhe foi reconhecido naqueles autos nº 1532 da 3ª Secção da 8ª Vara Cível de Lisboa e ainda todos e quaisquer valores por si recebidos como consequência do mesmo mandato; C)–Que o réu ao recusar-se a passar procuração ao autor para que este pudesse receber o mencionado crédito entrou em incumprimento.

D)–Consequentemente condenarem-se os réus a reconhecer que o crédito reconhecido na sentença proferida nos autos que correram os seus termos com o nº 1532 pela 3ª Secção da 8ª Vara Cível de Lisboa é pertença do autor, condenando-se ainda os réus a entregar ao autor todas as quantias recebidas e provenientes directa ou indirectamente da referida sentença e ainda dos autos de execução subsequentes.

E)–Reconhecer-se ter o autor direito a substituir-se aos réus na cobrança daquele mesmo crédito reconhecido nos autos que correram os seus termos com o nº 1532 pela 3ª Secção da 8ª Vara Cível de Lisboa e que se encontra reclamado nos autos que correm os seus termos pelo 2ª Juízo do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, 3ª Unidade Orgânica, com o nº 362/04.

F)–Subsidiariamente, requerem seja reconhecido verificar-se enriquecimento sem causa pelos réus, à custa dele autor.

G)–Consequentemente sejam os réus condenados a indemnizar o autor na medida do seu enriquecimento, transferindo-se para o autor o crédito reclamado nos autos que correm os seus termos pelo 2º Juízo do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, 3ª Unidade Orgânica, com o nº 362/04 bem como todas as importâncias recebidas ou que venham a ser recebidas ou devidas em consequência desse mesmo crédito.

H)–Devem ainda os réus ser condenados a indemnizar o autor de todos os prejuízos resultantes da sua actuação, nomeadamente despesas judiciais e extrajudiciais a que o autor se viu ou se veja compelido a suportar, a liquidar em execução de sentença.

I)–Devem também os réus ser condenados em custas e procuradoria e no mais que for de lei.» Na contestação apresentada pelos RR. estes, designadamente, impugnaram matéria alegada pelo A.. Disseram que foram os RR. quem sempre pagou todas as despesas relativas à aquisição da fracção autónoma, as obras e despesas inerentes ao condomínio e que, ainda que alguns pagamentos e contratações houvessem sido realizadas pelo A. tal sucedeu com dinheiro proveniente dos RR.. Acrescentaram que no sentido de defender o seu direito de retenção permitiram que o A. e sua mulher permanecessem no local e que embora celebrados contratos de arrendamento o A. não pagou rendas nem os RR. as exigiram, no intuito de o ajudar. Bem como que devido à sua necessidade de dinheiro o A. pedia aos RR. para descontar efeitos que depois não pagava, tendo obtido por esta via o valor de 14.134.631$50. A que acrescem cheques que o A. depositava na conta dos RR. da qual sacava as respectivas importâncias e que depois vinham devolvidos - assim, os cheques nos valores de 1.200.000$00, 3.588.453$00, 500.000$00 e 500.000$00.

Disseram que, à cautela, no caso de a acção ser julgada procedente, requeriam a compensação com o crédito invocado no pedido subsidiário.

Reconvindo afirmaram os RR. que o montante das quantias que ainda se encontram em dívida pelo A. para com os RR. é de 99.378,92 € a que acrescem juros de mora à taxa legal que perfazem o valor de 19.886,67 € e os que se vencerem até pagamento.

A final pediram que fosse julgada improcedente a acção e provada a reconvenção.

O A. replicou – pedindo então a condenação dos RR. por litigância de má fé - e requereu a intervenção principal provocada de Isabel ....... Barreto, o que foi deferido. Quanto à condenação como litigante de má fé pediu a A. que os RR. fossem condenados em indemnização a seu favor em valor não inferior a 10% da quantia pelos RR. reclamada em sede de pedido reconvencional, bem como nos honorários da mandatária judicial a liquidar a final.

O processo prosseguiu e, a final, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: «O Tribunal julga e declara nulo o contrato firmado entre A. e RR., destinado à aquisição da fracção “AM” pelo A. a um terceiro [a FOCOBA] com recurso a benefícios legalmente disponíveis para o R. mas a que o A. não tinha acesso.

Em consequência da antecedente declaração de nulidade, o Tribunal condena os RR. a restituírem ao A. o valor de € 9.706,61, acrescido de juros à taxa legal a contar da citação.

Mais, o Tribunal julga improcedente a compensação deduzida pelos RR., por não verificada a existência dos créditos por eles invocados.

Por fim, o Tribunal absolve os RR. do pedido de condenação por litigância de má fé contra eles deduzido».

Apelou o A., concluindo nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso: 1ª–Foi integralmente dada como provada a matéria de facto alegada pelo Recorrente.

2ª–A absolvição dos Recorridos relativamente à maior parte do pedido deduzido pelo Recorrente deveu-se à errada aplicação das normas relativas à indemnização por enriquecimento sem justa causa.

3ª–O art. 473.º/1 do CC traduz um princípio...

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