Acórdão nº 1135/15.0TBALM.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução16 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.

–RELATÓRIO: COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., com sede ……. em Lisboa, intentou, em 03.02.2015, contra CARLOS …. , INÁCIA .... e MARIA ...., residentes na ……, acção declarativa de condenação, sob forma de processo comum, através da qual pede a condenação solidária dos réus no pagamento à autora da quantia € 195.326,32, acrescida dos respectivos juros, que, à taxa legal, se vencerem desde a data de citação até integral pagamento.

Fundamentou a autora, no essencial, esta sua pretensão da forma seguinte: 1.

–No dia 08.12.2013, o veículo com matrícula DT, por si seguro, foi conduzido pela menor, a Ré Maria …., estando ao seu lado o seu pai, o Réu Carlos ..., o qual levava ao colo o filho de 2 anos de idade.

  1. –Nestas circunstâncias, a Ré MARIA ...., após imobilizar o veículo, e pretendendo reiniciar a marcha, atrapalhou-se e acelerou o veículo, vindo a perder o controlo do mesmo e a embater no veículo de Narcisa ..., que estava estacionado junto ao lote 207, bem como a destruir o muro do lote 207 e a invadir o jardim à frente da casa ali edificada, onde acabou por colher mortalmente Narcisa ....

  2. –A Autora, no cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de seguro, suportou as indemnizações dos danos decorrentes do sinistro, tanto os danos patrimoniais, incluindo os danos patrimoniais futuros, como os danos não patrimoniais, abrangendo nestes a perda do direito à vida de Narcisa ... e os danos não patrimoniais sofridos pela vítima e pelo seu marido e filha, no total de € 195.326,32.

  3. –Tem, pois, a Autora o direito a haver esta quantia dos Réus, com fundamento no direito de regresso, atenta a circunstância da condutora se não mostrar habilitada para o efeito, e mais atendendo à violação do dever de vigilância dos pais (os Réus Carlos ... e Inácia ...) sobre a Ré MARIA .....

  4. – A própria Ré MARIA .... é também responsável, na medida em que, para estes efeitos, deve ser considerada imputável.

    Citados, os réus apresentaram contestação, em 16.03.2015, admitindo o alegado pela autora, com excepção, quer do conhecimento e consentimento da Ré Inácia ... relativamente à condução do veículo pela sua filha, razão pela qual defendem a sua absolvida do pedido, quer da indemnização por danos patrimoniais futuros, pugnando pela sua absolvição do pedido nesta parte.

    Mais invocaram, os réus, a inimputabilidade da Ré MARIA.... e concluíram pela sua consequente absolvição do pedido.

    Por despacho de 06.04.2016, foi a autora convidada a esclarecer de que modo calculou o dano patrimonial futuro, convite que a autora acatou, apresentando o requerimento de 22.04.2016, no qual invocou terem sido seguidos os critérios orientadores estabelecidos pela Portaria nº 679/2009, de 25.06., tendo os valores alcançados merecido a aceitação dos herdeiros da falecida.

    Salientou a autora, quanto ao apuramento do dano patrimonial futuro, que havia recorrido à formula constante do Anexo III da aludida Portaria, através da ponderação do número de anos de previsível vida activa que a falecida ainda teria, atenta sua idade, e o facto de o seu rendimento ser consumido em família, devendo a sua perda ser compensada.

    Por despacho de 20.09.2016 foi dispensada a audiência prévia, fixado o valor da acção, proferido o despacho saneador, identificado o objecto do litígio e enunciados os Temas da Prova.

    Foi levada a efeito, em 19.10.2016 e 07.12.2016, a audiência final, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 06.03.2017, constando do Dispositivo da Sentença, o seguinte: Em face do exposto e tudo ponderado, o Tribunal decide julgar a ação parcialmente procedente, e em conformidade: 1.

    – Condena solidariamente os Réus CARLOS e MARIA .... no pagamento à Autora COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., de: a)- € 195.326,32, correspondentes à indemnização paga pela Autora aos herdeiros da falecida Narcisa ….; b)- Juros de mora sobre a quantia aludida em a), contabilizados desde 13.02.2015 até à presente data, à taxa de 4%, e desde a presente data até efetivo e integral pagamento, à taxa legal; 2.

    –Absolve a Ré INÁCIA .... do pedido.

    Custas pelas partes, na proporção do respetivo vencimento.

    Notifique e registe.

    Inconformada com o assim decidido, os réus, CARLOS … E MARIA ...., interpuseram, em 27.04.2017, recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.

    São as seguintes as CONCLUSÕES dos recorrentes: Do recurso da menor MARIA ....

    i.

    –A menor MARIA .... tinha 13 anos à data dos factos, não tendo noção de que da sua acção – que se traduzia em mudar o carro das traseiras para a frente da casa – pudessem resultar as consequências ocorridas.

    ii.

    –A menor confiava inteiramente no seu pai, obedecia às suas instruções e nunca representou que tais consequências pudessem ter ocorrido, pelo que não deve ser considerada imputável para os efeitos do art. 488.º, n.º 1, do CC.

    iii.

    –Relativamente a esta matéria, a sentença recorrida entende que a R. MARIA .... já tinha uma idade em que sabia o que são acidentes de viação e quais as suas consequências, sendo a apreensão dos acontecimentos dessa natureza perfeitamente acessível a uma jovem dessa idade.

    iv.

    –Tal proposição é correcta, mas o caso dos autos tem uma particularidade: é que a Recorrente MARIA .... conduzia o veículo nas imediações da sua casa e com o pai ao lado, que lhe ia dando instruções sobre a forma como o devia conduzir – cfr. factos provados sob os n.ºs 5 a 11, 38 e 39.

    v.

    –Ora, neste contexto, uma criança de 13 anos está “nas mãos” do pai, em quem confia cegamente, o que a torna incapacitada para compreender que, mesmo nessas condições, a segurança rodoviária estava comprometida; a MARIA sabia que a condução lhe estava vedada, mas, sentindo-se segura ao lado do pai e obedecendo às instruções deste, não tinha a capacidade para compreender cabalmente as consequências da sua conduta, que certamente, à luz de um critério de experiência comum, nunca concebeu que poderiam ocorrer nos termos em que ocorreram.

    vi.

    –Não há muito mais que, do ponto de vista jurídico, se possa dizer, cabendo ao julgador, à luz de um critério de experiência comum, formular um juízo que é iminentemente extra-jurídico.

    vii.

    –Assim sendo, espera a MARIA .... que o Tribunal da Relação a absolva do pedido, por não se mostrar preenchido o pressuposto em que se funda, ou seja, a sua capacidade para entender ou querer o facto danoso provocado, como exige o art. 488.º, n.º 1 do CC.

    Do recurso relativo aos danos patrimoniais futuros viii.

    –Salvo melhor opinião, a A. não demonstrou os pressupostos de que depende o exercício do direito de regresso quanto ao pagamento dessa parcela de indemnização, que ela livremente arbitrou e pagou.

    ix.

    –Em face dos factos apurados (cfr. factos provados 33, 34, 35, 37, 42 e 43), não é possível presumir que o marido e a filha da falecida Narcisa ... carecessem de quaisquer alimentos da mulher e mãe, ou que houvesse qualquer probabilidade de deles virem a carecer.

    x.

    –O marido de Narcisa …. tinha um vencimento aproximadamente equivalente ao da sua falecida mulher, na casa de € 1.000 para cada um, não se vislumbrando que carecesse de alimentos da mulher ou que deles viesse a carecer.

    xi.

    –Admite-se que o marido da falecida Narcisa ... beneficiasse de alguma economia de escala decorrente de viver em economia comum com a mulher, até porque está provado, e decorre de um critério de experiência comum, que a falecida Narcisa ... consumia o seu rendimento em família, ou seja, no quadro da economia familiar comum que mantinha com o marido.

    xii.

    –Já a filha de Narcisa ... não vivia com os pais, como resulta das declarações de IRS por estes apresentadas, nada se sabendo sobre a sua situação de vida.

    xiii.

    –A esta luz, não se vislumbra como é que foi possível quantificar o pagamento de uma indemnização de € 99.413,61, a favor dos herdeiros da falecida Narcisa ..., como ocorreu.

    xiv.

    –Não se encontra fundamento para ter de aceitar reembolsar a Seguradora da verba de € 99.413,61, que não se alcança como é que foi calculada, tendo naturalmente em conta os factos que foram apurados, que de forma clara indiciam que a falta do rendimento de Narcisa ... não gera qualquer quebra significativa no quadro das economias domésticas dos seus herdeiros, a não ser de uma forma muito marginal em relação ao viúvo, que se admite que pudesse beneficiar de alguma economia de escala.

    xv.

    –De resto, impressiona que a Seguradora não tenha articulado na sua petição inicial qualquer facto de onde se possa retirar a justificação para o pagamento de uma indemnização por dano patrimonial futuro, no valor de € 99.413,61.

    xvi.

    –Em qualquer caso, mesmo que se quisesse considerar a marginal contribuição do rendimento da falecida para uma economia de escala familiar, tendo em conta os rendimentos do casal e a sua idade, não há contas que permitam justificar a verba liquidada, pelo que, nesta sede, mesmo que se quisesse ponderar uma indemnização a título de danos patrimoniais futuros, ela teria de ser quase simbólica, muito inferior ao quantitativo arbitrado.

    xvii.

    –Pelo exposto, e neste segmento, o tribunal aplicou erroneamente ao caso dos autos as regras estabelecidas pelos arts. 495.º, n.º 3, 564.º e 566.º do CC, razão pela qual deve ser revogada a parte da sentença que condenou os Recorrentes no direito de regresso relativo à indemnização por danos patrimoniais futuros.

    Pedem, por isso, os apelantes, a procedência do recurso com as legais consequências.

    A autora apresentou contra-alegações, em 01.06.2017, propugnado pela improcedência do recurso apresentado pelos réus e a procedência do recurso subordinado, apresentado pela autora, e formulou as seguintes CONCLUSÕES: Da imputabilidade da Ré MARIA ....

    : i.

    –O Tribunal a quo fez uma correcta apreciação dos factos ao julgar a Ré MARIA .... imputável e, por conseguinte, responsável pela sua conduta, que vitimou mortalmente Narcisa ....

    ii.

    –A Ré MARIA .... tinha, à data dos factos, 13 anos de idade, pelo que é...

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