Acórdão nº 1986/08.2TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução20 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de ... (7ª Secção).

I – RELATÓRIO.

Intentou Amadeu de ... ... de ...

, residente na Avenida Infante Santo, n.º … – ---.º- A, em ..., acção declarativa de condenação contra José Manuel ... ...

, com domicílio na Avenida Infante Santo, n.º .... - ---.º, em ..., e na Rua Doutor Pita, Edifício Magnólia, n.º ---, ....

Essencialmente alegou: É proprietário da fracção autónoma designada pela letra P, destinada a habitação, do prédio sito na Avenida Infante Santo e Rua Teixeira de Sampaio, com entrada pela Avenida Infante Santo, n.º ...., freguesia de ..., concelho de ..., estando tal prédio submetido ao regime de propriedade horizontal.

O réu é o proprietário da fracção autónoma designada pelas letras AE, destinada a habitação, do mesmo prédio.

O prédio em causa tem quatro fachadas: uma virada para a Avenida Infante Santo, outra virada para a Rua Embaixador Teixeira de Sampaio, uma terceira virada para o Palácio das Necessidades e a quarta, a tardoz, virada para o Rio Tejo.

A fachada da Rua Embaixador Teixeira de Sampaio é aquela que tem maior visibilidade, sendo totalmente visível, e a grande distância, para quem desce a Avenida Infante Santo.

De acordo com o projecto de arquitectura aprovado e executado, a fracção da qual o réu é proprietário dispõe de uma varanda na fachada da Rua Embaixador Teixeira de Sampaio, de um terraço que faz a esquina entre as fachadas da Rua Embaixador Teixeira de Sampaio e a fachada virada para o Palácio das Necessidades, e de três varandas viradas para o Rio Tejo (a tardoz), a que acrescem duas zonas para floreiras na fachada virada para a Rua Embaixador Teixeira de Sampaio.

Em 25 de Junho de 1998, a assembleia de condóminos deliberou, por unanimidade e com o voto do réu, autorizar o fecho de varandas no alçado a tardoz até ao 8.º andar (inclusive), tendo deliberado, também por unanimidade e com o voto do réu, que o fecho de varandas a partir do 9.º andar (inclusive) e no alçado a tardoz necessitaria da prévia autorização específica, e caso a caso, da assembleia de condóminos; na mesma data e assembleia, foi reprovada, por unanimidade e com o voto do réu, a proposta de concessão de autorização para fecho de varandas no alçado principal.

O réu realizou obras na sua fracção, as quais, para além de abrangerem o interior da fracção, abrangem também três das fachadas do identificado prédio, bem como a cobertura do mesmo prédio, na qual o réu mandou retirar e substituir as placas de mármore que constituíam o pavimento da cobertura.

O réu mandou construir uma parede em alvenaria a fechar o aludido terraço, além de ter mandado fechar uma segunda varanda existente na fachada virada para a Rua Embaixador Teixeira de Sampaio, bem como mandou fechar as varandas das fachadas viradas para o Palácio das Necessidades e para o Rio Tejo.

Imediatamente antes da Páscoa de 2008, a zona de obras encontrava-se tapada com cartões e plástico, tendo as varandas sido entretanto fechadas, umas com vidro e alumínio, outras com parede de alvenaria.

O réu não pediu nem obteve autorização da assembleia de condóminos para realizar as obras descritas, sendo certo que o condomínio reprovou o fecho de varandas no alçado principal e que o fecho de varandas no alçado a tardoz carecia de autorização prévia da assembleia de condóminos.

As obras realizadas pelo réu, por abrangerem quer as fachadas do prédio, quer a sua cobertura, afectam partes comuns do edifício, consistindo em alterações da linha arquitectónica e do arranjo estético do edifício.

Conclui formulando os seguintes pedidos: a) reconhecer-se ao Autor o direito a que não sejam feitas inovações nas partes comuns do prédio sito na Avenida Infante Santo e Rua Teixeira de Sampaio, com entrada pela Avenida Infante Santo, n.º..., em ..., bem como o direito a ver suspensas as obras que estejam em curso no dito prédio; b) condenar-se o Réu a demolir as obras que realizou no prédio sito na Avenida Infante Santo e Rua Teixeira de Sampaio, com entrada pela Avenida Infante Santo, n.º ...., em ..., sem autorização da assembleia de condóminos, e que constituem inovações face ao projecto de arquitectura original.

O réu, citado para o efeito, apresentou contestação onde impugnou parcialmente os factos afirmados pelo autor.

O A. replicou.

Procedeu-se ao saneamento dos autos conforme fls. 71 a 86.

Realizou-se audiência de julgamento.

Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a presente acção e reconheceu ao autor Amadeu de ... ... de ... o direito a que não sejam feitas inovações nas partes comuns do prédio sito na Avenida Infante Santo e Rua Teixeira de Sampaio, com entrada pela Avenida Infante Santo, n.º ...., em ..., designadamente nas varandas e terraço da fracção autónoma designada pelas letras AE e correspondente ao ... .º piso do mesmo prédio; condenou o réu José Manuel ... ... a demolir as obras que realizou nas varandas e terraço identificados em a) e que constituem inovações face ao projecto de arquitectura original; na parte restante, absolveu o réu do pedido [pedido de suspensão da execução das obras] julgar não verificada a acusada litigância de má fé por parte do réu (cfr. fls. 1059 a 1074).

O Réu apresentou recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação (cfr. fls. 1142).

Juntas as competentes alegações, a fls. 1089 a 1122, formulou o apelante as seguintes conclusões: 1. Deve ser alterada a resposta dada aos quesitos 66 e 67 para “Não provado”, pois tal resulta da prova documental e testemunhal produzida nos autos.

  1. Em caso de dúvida sobre a verificação do facto – falta de autorização para as obras – a dúvida resolve-se contra o Recorrido, pois o facto é constitutivo do seu direito, pelo que também por esta via os referidos factos devem ser considerados não provados.

  2. Não pode ser procedente, nos termos pedidos, o pedido a) do Recorrente, pois nenhum condómino é titular do direito de se opor a qualquer inovação, ainda que autorizada; tem apenas o direito de se opor a inovações ilícitas.

  3. As obras bastam-se com a aprovação por maioria de dois terços, não carecendo da unanimidade prevista para a alteração do título constitutivo.

  4. O condomínio aprovou, de novo, ainda que tacitamente, as obras em curso em 2008.

  5. O autor/recorrido age em abuso de direito, pois há várias outras varandas fechadas no prédio, não tendo este, há muito, a configuração original.

  6. Existe colisão de direitos entre o direito à manutenção da linha arquitectónica e ao arranjo estético do Recorrido e os direitos do Recorrente e sua família à vida, segurança, saúde, higiene e conforto.

  7. Nesta situação de conflito de direitos, regulada pelo art. 335.º do CC, deve entender-se que prevalecem os direitos do Recorrente, por serem direitos fundamentais, nenhum direito existindo no nosso ordenamento que seja superior ao direito à vida e à integridade física.

  8. A interpretação feita pelo tribunal dos artigos 1422.º e 1425.º do CC, no sentido de que é vedado ao condómino realizar obras nas partes comuns, nomeadamente fechar varandas e terraços, mesmo quando tais obras são necessárias para a sua segurança e da sua família, bem como da sua qualidade de vida, conforto e segurança, é inconstitucional por violação dos artigos 25.º, 26.º e 65.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), que contêm direitos fundamentais, e do artigo 18.º da CRP, que obriga à proporcionalidade no sacrifício de direitos fundamentais em favor de outros.

  9. Nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, a sentença é nula quando “deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.

    A sentença recorrida é nula pois não se pronunciou quanto à questão da colisão de direitos, apesar de tal questão ter sido levantada pelo Réu, ao alegar que as obras foram motivadas pela necessidade de fazer face a questões de segurança, saúde e conforto, tendo grande parte da prova produzida nos autos sido destinada à apreciação de tais factos.

  10. Foram violadas as seguintes normas: arts 334.º, 335.º, 342.º e 1425.º do Código Civil, arts. 414.º e 615.º do Código de Processo Civil, e artigos 25.º, 26.º e 65.º da Constituição da República Portuguesa.

    Contra-alegou a recorrida pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida.

    II – FACTOS PROVADOS.

    Foi dado como provado, em 1ª instância, que:

    1. O prédio sito na Avenida Infante Santo e Rua Teixeira de Sampaio, com entrada pela Avenida Infante Santo, n.º ...., freguesia de ..., concelho de ..., está descrito na 3.ª Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha n.º 343 da freguesia de Santos-o-Velho, estando o regime de propriedade horizontal registado desde 12 de Abril de 1995.

      B) O autor Amadeu ... é proprietário da fracção autónoma designada pela letra P, destinada a habitação.

      C) O réu José ... é proprietário da fracção autónoma designada pelas letras AE, destinada a habitação, composta por um espaço com seis assoalhadas com áreas generosas.

      D) Encontra-se registada a aquisição a favor do réu da fracção autónoma designada pelas letras AE pela inscrição Ap. 20, de 21 de Abril de 1999.

      E) A fracção do réu situa-se no ... .º andar do edifício, isto é, no seu último andar, a cerca de 50 metros do solo.

      F) Por cima do andar do réu fica a laje de cobertura do edifício.

      G) O prédio identificado em A) tem quatro fachadas: uma virada para a Avenida Infante Santo, outra virada para a Rua Embaixador Teixeira de Sampaio, uma terceira virada para o Palácio das Necessidades e a quarta, a tardoz, virada para o Rio Tejo.

      H) De acordo com o projecto de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT