Acórdão nº 8992/14.6T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS MARINHO
Data da Resolução12 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa: I.

RELATÓRIO A..., com os sinais identificativos constantes dos autos, instaurou acção de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges contra F..., neles também melhor identificado, peticionando o decretamento do divórcio entre si e o Réu e que lhe fosse atribuída a casa de morada de família que disse ser também a casa de ambos os filhos do casal. Para tal efeito, alegou que: vem sendo vítima de agressões verbais e físicas perpetradas pelo Demandado; este vem usando o produto exclusivo do trabalho da Autora em proveito próprio; o Demandado manteve um «caso extraconjugal»; não existe intimidade entre ambos; é a Demandante que, com o seu salário, vem fazendo face a todas as despesas do agregado familiar; o Réu tem uma conta bancária à qual a Autora nunca teve acesso; é irremediável o desgaste da relação conjugal.

O Réu contestou a acção impugnando factos, pedindo a condenação da autora como litigante de má fé e concluindo pela improcedência «da p.i.».

Após convite para aperfeiçoar a acção, que lhe foi dirigido, a Autora, em audiência prévia, relatou que os factos alegados se verificaram a partir de 13 de Maio de 2014.

Foram realizadas a instrução, a discussão e o julgamento da causa, tendo sido proferida sentença que decretou: Pelo exposto, julgo a ação procedente e, em consequência: a) Decreto o divórcio entre A... e F..., declarando dissolvido o casamento que os unia (assento nº 148 de 1990, da 2ª Conservatória do Registo Civil de Lisboa); b) Atribuo provisoriamente e de imediato à autora a utilização da casa de morada de família sita na Avenida de Roma, nº 77, r/c esquerdo, em Lisboa, até à partilha do património comum do agora dissolvido casal.

  1. Julgo improcedente o pedido do réu de condenação da autora como litigante de má fé, dele absolvendo a autora.

É desta sentença que vem o presente recurso interposto por F..., que alegou e apresentou as conclusões que se transcrevem: 1ª) Na Sentença recorrida apenas foram dados como provados os pontos 3. e 4. da Fundamentação de Facto; 2ª) E mais nenhuns, quer da petição inicial, quer da contestação, tendo-se o Tribunal quo dispensado, à luz do princípio da simplificação processual (artº. 6º, do CPC), de elencar os não provados; 3ª) Tal princípio tem como fim da actividade do Juiz, a garantia da justa composição do litígio; 4ª) In casu, a Sentença fez uso do mesmo princípio com excessiva ligeireza; 5ª) Porque não o concatenou com a imposição constante do artº. 607º, nº 4, do CPC, à luz do qual, e para além do mais, tinha de analisar criticamente as provas (indicando as ilacções tiradas de factos instrumentais) e ainda de especificar os demais fundamentos que seriam decisivos para a convicção do julgador, o que a Sentença não fez; 6ª) Mesmo no quadro do anterior (revogado) artº. 655º, nº 1, do (anterior) CPC, o princípio da livre apreciação das provas (actualmente inexistente), não atribuía ao Juiz o poder arbitrário de julgar os factos sem prova ou contra provas; 7ª) O que aconteceu in casu, dado que, a Sentença apenas se estribou no depoimento da terceira testemunha da Autora, a filha do casal – A... - e Sentença que decidiu ainda que as demais (duas) testemunhas da Autora, confirmaram o depoimento da A...; 8ª) O que é inverídico, pois, a primeira testemunha da Autora não depôs sequer à matéria sub judice, porque “não frequentava” a casa da Autora e do Réu, e a segunda testemunha da Autora afirmou que “desde 2010” não frequentava a mesma casa, sendo a matéria sub judice referente ao período desde 13 de Maio de 2014 até à data da apresentação da petição inicial em juízo; 9ª) A primeira testemunha do Réu, D... (filho também do casal e que com este habita), depôs claramente no sentido de que as discussões e desentendimentos entre Autora e Réu, se deviam ao facto de, com apoio da Autora, a A... (irmã do D...) “não prestar contas ao pai (...) não informar (...) dos estudos e da vida” que fazia, não tendo ademais “diálogo” com o pai (Réu).

(Por todos, passos da gravação da Audiência acima indicados); 10ª) As duas outras testemunhas do Réu deposeram (sic) no mesmo sentido; 11ª) Destes modos, a Sentença não fez uma análise crítica da prova testemunhal e não especificou os demais fundamentos que foram decisivos para a convicção do Julgador, como lhe cumpria nos termos do artº. 607º, nº 4, do CPC, tendo-se estribado tout court no depoimento de uma filha do casal, depoimento completamente contraditório com os depoimentos das três testemunhas do Réu; 12ª) Por tudo, na parte até ora indicada, tendo presente o disposto no artº. 640º, nº 1, a), b) e c), do CPC, parece que estão incorrectamente julgados os pontos 3. e 4. dos factos provados, bem como, a acima indicada parte da motivação da decisão da matéria de facto, pelo que, tais pontos, sobretudo o 3., devem de ser alterados e deliberados no sentido de que as discussões e desentendimentos entre Autora e Réu, se devem ao facto da filha do casal (A...) não comunicar com o pai (Réu), não dando contas a este de como vão os estudos, nem sobre a vida que faz em geral (o que em nada consubstancia causa legal de divórcio); 13ª) Ainda que assim se não entenda (subsidiariamente), a Sentença na parte em análise padece de nulidade, nos termos e para os efeitos do artº. 615º, nº 1, b) e c), primeiro trecho, todos do CPC, porque não especificou (em sentido técnico-jurídico e para efeito do disposto no artº. 607º, nº 4, do CPC) os fundamentos de facto que justificassem a decisão, estando os fundamentos de que partiu em oposição com a decisão que tomou à luz do artº. 1781º, d), do Código Civil; 14ª) É que não basta para o preenchimento deste normativo legal, discussões e desentendimentos, tal como, não bastam eventuais situações do foro interno das pessoas, não objectivadas ou constatáveis exteriormente através de factos, pois, de internus solus Deus; 15ª) Nos termos de mui douta jurisprudência acima identificada e citada, deste Colendo e Alto Tribunal da Relação de Lisboa, para efeitos do preenchimento da previsão da alínea d), do artº. 1781º, do CC, da matéria de facto provada deverá resultar retratada uma determinada situação objectiva em que os factos, pela sua gravidade ou reiteração, mostrem a ruptura definitiva do casamento, não bastando que os factos traduzam um mero acto de vontade de um dos cônjuges, visto o divórcio “a-pedido” por razões subjectivas, não haver sido acolhido nas novas disposições da lei sobre divórcio; 16ª) Para a doutrina acima identificada e transcrita, há uma razão importante, de natureza sistemática, que sugere a necessidade de uma aplicação exigente da alínea d), do artº. 1781º, do CC, que é a de ela dever ser feita no contexto, isto é, em harmonia com as alíneas anteriores; 17ª) Uma atitude mais condescendente em relação às exigências de prova que a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT