Acórdão nº 111662/12.0YIPRT-B.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelTIB
Data da Resolução09 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I–Relatório: 1.

–Por despacho proferido no Proc. 111662/12.0YPRT[1], em que é Autora T…, SRL e Ré/Reconvinte M…, LDA., com os sinais dos autos, em 15-04-2013, foi, além de outros aspectos, decidido o seguinte: «Ao abrigo dos Artigos 265º, nº3 e 568º, nº1, do Código de Processo Civil, determino se proceda à realização de prova pericial por perito único para responder à matéria dos artigos 2, 5, 8, 9, 43, 56, 57, 65, 71, 72, 75 a 79, 82, 88, 91, 102, 103, 105, 106, 112 a 114, 123, 127, 138, 139, 140, 151 a 155, 162 a 169, 174 a 177, 181 e 183 da BI.

Notifique as partes a fim de se pronunciarem sobre a nomeação do perito (Artigo 568º, nº2, do Código de Processo Civil).

À cautela, desde já, solicite à Ordem dos TOC a designação de dois peritos.

Envie cópia deste despacho e da BI.

* Notifique as partes nos termos e para os efeitos do Artigo 20-1 do Regulamento das Custas Processuais ex vi Artigo 447º-C, nº3, do Código de Processo Civil.».

  1. –A Ré veio, face ao teor do relatório pericial apresentado, requerer a realização de uma segunda perícia por um revisor oficial de contas com formação e experiência que assegurasse uma maior idoneidade na resposta aos quesitos.

  2. –Foi proferido despacho, em 13-11-2013, no qual, além do mais, se ponderou e se determinou o seguinte: « Requerimento da Ré de 3.10.2013 (fls. 6470-6476) em que a Ré requere a realização de segunda perícia: […] No caso, a Ré aponta algumas inexatidões ao relatório pericial que têm pertinência. A título exemplificativo, referimos as seguintes: - No que tange à existência de uma conta corrente, respondeu o Sr. Perito que “Não pode responder com base nos elementos disponíveis. Se existia de facto esse encontro de contas, o mesmo não se encontra vertido oficialmente” (fls. 6450). A resposta é insatisfatória porquanto cabia, de facto, ao Sr. Perito analisar a contabilidade das partes, cruzar dados, para daí formular conclusões. Obviamente que se o encontro de contas estivesse “vertido oficialmente”, a questão nem seria objeto de controvérsia, sendo – pelo contrário – facto assente; - No que tange às respostas aos quesitos 102º e 155º, o Sr. Perito respondeu que não tem como saber quais os clientes que foram angariados pela M…, “sendo certo que a T… não reconhece que tenha sido a M… a angaria as grandes superfícies”. Ora, também aqui, a resposta é insatisfatória e inexata. Cabia ao Sr. Perito, a partir da contabilidade, ver quais eram os clientes da M… e identificá-los, mesmo que não conseguisse daí saber quem os angariou. Por outro lado, o laudo pericial não está condicionado – nem pode estar- pela posição das partes expressa nos articulados.

    Estando patentes várias inexatidões no laudo pericial, e face ao requerimento da Ré, há que ordenar a realização de segunda perícia.

    Pese embora o atual regime do Artigo 488º do Código de Processo Civil, pode o juiz – ao abrigo dos Artigos 468-1-a e 547º do Código de Processo Civil – ordenar a realização da segunda perícia em moldes colegiais – cf. PAULO RAMOS DE FARIA e ANA LUÍSA LOUREIRO, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Almedina, I Vol., 2013, p. 378.

    * Pelo exposto: a)-Ordeno a realização de segunda perícia, na sequência de requerimento da ré, a qual será colegial; b)-Solicite à OTOC a designação de novo perito para ser nomeado por parte do Tribunal. Prazo: dez dias.

    c)-Os encargos da realização da segunda perícia são a cargo da Ré na medida em que foi a Ré que requereu a realização de segunda perícia (Artigos 532-2 do Código de Processo Civil e 20-1 do Regulamento das Custas Processuais); d)-Notifique a Ré nos termos do Artigo 20-1 do Regulamento das Custas Processuais, sendo certo que o valor de referência dos honorários dos Srs. Peritos ainda está por fixar nos termos do despacho supra.

    e)-Notifique também o Sr. Perito deste despacho.» 4.

    –Em 06-12-2013, foi proferido o seguinte despacho: «Nestes autos foram juntos documentos de fls. 29 v a 155, 175 a 231, 271 a 307, 328 a 420, 617 a 6.339, 6385 a 6420, num total de 6.067 folhas de documentos.

    A Base Instrutória tem duzentos artigos (fls. 517-537).

    Por despacho de 15.4.2013, foi determinada – oficiosamente - a realização de prova pericial sobre quarenta e oito artigos da BI (fls. 581).

    O Sr. Perito apresentou relatório pericial composto de 29 páginas (fls. 6436-6464).

    Apresentou nota de despesas e honorários, discriminando 51 horas de trabalho, ao valor de €50 por hora, reclamando o pagamento de € 2.550 de honorários e €89,8 de despesas (fls. 6465-6466). Por requerimento de fls. 6481-6482,veio o Sr. Perito esclarecer que a realização da perícia implica conhecimentos especiais na área contabilístico-financeira, devendo a retribuição ser proporcional aos conhecimentos, ao tempo despendido e ao trabalho realizado. Mais invoca que o artigo 17º do Regulamento das Custas Processuais não quantifica, de forma justa e correta, o trabalho despendido e realizado.

    O Sr. Perito prestou esclarecimentos, na sequência de reclamação ao relatório pericial, reclamando o pagamento de mais e 300 (fls. 6484 a 6487).

    Por despachos de 15.10 (fls. 6483) e de 12.11. (fls. 6508) foi afirmado que a perícia deve ser remunerada por valor/hora não inferior a €40, sendo que o valor final excederá o limite legal do Artigo 17º do Regulamento das Custas Processuais. Foi ordenada a notificação das partes a fim de pronunciarem (Artigos 6º, nº2, 547º, 630º, nº2, do Código de Processo Civil).

    A Ré opõe-se a que o tribunal fixe honorários acima do limite legal do Artigo 17º do Regulamento das Custas Processuais (fls. 6501-6504).

    Cumpre apreciar e decidir sobre a fixação dos honorários ao Sr. Perito.

    No regime de pretérito, a remuneração dos Srs. Peritos decorria do Artigo 34º, nº1, alínea b) e nº3 do Código das Custas Judiciais e da Portaria nº 1178-D/2000, de 15.12.

    Esta Portaria atualizou os valores estabelecidos nas alíneas a) e b) do nº1 do Artigo 34º do Código das Custas Judiciais sem que, todavia, tenha revogado o nº2 do Artigo 34º - cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 7.11.2005, Sousa Lameira, CJ 2005 – V, pp.. 178- 180.

    Assim, no caso da diligência implicar mais do que um dia de trabalho, o tribunal podia fixar os dias a pagar de acordo com a informação prestada por quem a realizar, reduzindo-os se lhe parecesse que podia ser realizada em menos tempo ou aumentando-os quando a dificuldade, relevo ou qualidade do serviço o justificasse. Daqui decorria que o juiz podia, em função do grau de dificuldade e exigência e segundo juízos de equidade e razoabilidade, fixar os dias de trabalho que deviam ser remunerados.

    No atual Regulamento das Custas Processuais, o legislador não conferiu ao juiz uma válvula de segurança que permita ajustar o valor dos honorários em função da dificuldade, qualidade do serviço prestado e – sobretudo- do tempo requerido para a realização da perícia. Com efeito, nos termos do Artigo 17º, nos. 1, 2, 3 e 4, a remuneração dos Srs. Peritos não pode ultrapassar os limites impostos pela Tabela IV, os quais são de dez UCs por peritagem, ou seja, €1.020. Nos termos de tal dispositivo, o juiz pode fixar o valor da remuneração do perito entre € 102 e € 1020, não podendo exceder os € 1.020 , os quais funcionam como limite inultrapassável.

    Se é certo que, na maioria das perícias (v.g., médico-legal, sobre o estado da estrutura de um edifício, etc.), o limite superior é apropriado, o mesmo não acontece noutras perícias como a dos autos. Com efeito, a análise das 6.067 folhas de documentos do processo e as deslocações do Sr. Perito importaram um tempo de trabalho de cinquenta e uma horas. E, por força do limite legal referido, o Sr. Perito não poderá receber mais de € 1.020.

    Esta solução é altamente censurável, desproporcional e inconstitucional.

    Conforme se referia já em 2005, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 7.11.2005, Sousa Lameira, 5521/05, www.colectaneadejurisprudencia.com, «Acresce ainda realçar que estamos a falar de peritos qualificados, que devem ser remunerados condignamente.

    A título meramente exemplificativo, a Ordem dos Engenheiros, não utilizando o termo "diligência", vem fixando, anualmente, os honorários dos engenheiros nomeados. No caso de "Honorários calculados pelo tempo gasto na execução dos trabalhos", estabelece um montante que designa por "jornal", este fixado em 2002, como variando entre 224,46 euros e 299,28 euros líquidos).

    E, por exemplo, em qualquer oficina automóvel o custo da mão-de-obra é de 35 euros/hora acrescido do respetivo IVA.

    Importa ainda ter em consideração que os montantes pagos pelo tribunal aos Srs. Peritos a título de remuneração (despesas e honorários) se encontram sujeitos à liquidação de IVA à taxa de legal em vigor. Ou seja, por cada 100 euros que o tribunal entrega ao perito, este devolve 21 ao Estado a título de IVA.” Revertendo ao caso em apreço, a observância do limite legal significa que o trabalho do Sr. Perito, em última instância, terá de ser remunerado por €20 por hora.

    Aqui chegados, cabe perguntar: Quem está disponível para colaborar com a Justiça? Como podem os tribunais esperar que os profissionais mais qualificados e isentos (como a inscrição na na respetiva Ordem atesta, sendo que foi a Ordem que indicou o Sr. Perito) aceitem auxiliá-los nas questões técnicas em julgamento, pagando-lhe por dia ou por vários dias de trabalho, montantes iguais ou muito inferiores aos auferidos por trabalhadores indiferenciados? O limite legal, aplicado ao caso em apreço e a outros similares, tem como consequência necessária uma de duas situações: (i)-Ou a pretexto da colaboração com a Justiça, o Estado está a expropriar o trabalho do Sr. Perito ou a impor-lhe uma espécie de sanção civil, obrigando-o a trabalhar por períodos de tempo que não são efetivamente remunerados; (ii)-Ou o Sr. Perito está a ser remunerado por valores indignos, bastantes inferiores aos valores de mercado e à prestação de serviços...

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