Acórdão nº 116/08.5GDALM-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelVITOR MORGADO
Data da Resolução11 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 9ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Por acórdão proferido no processo comum nº 116/08.5GDALM (autos principais), transitado em julgado em 18/2/2010, o arguido L...

foi condenado – em cúmulo jurídico de cinco penas parcelares aplicadas pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21°, n° 1, do Decreto-Lei n° 15/93 de 22/1, de um crime de roubo, previsto e punido, pelo artigo 210°, n° 1 do Código Penal, de um crime de extorsão, previsto e punido, pelo artigo 223° do Código Penal, de um crime de falsificação agravada, previsto e punido pelo artigo 256°, nº1, alíneas a) e c) e nº 3 do Código Penal, e de um crime de recetação, previsto e punido, pelo artigo 231°, n° 1 do Código Penal – na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, nos termos dos artigos 50°, n.°s 1 e 5, e 53° do Código Penal.

Elaborado plano individual de reinserção, mas não tendo o mesmo sido cumprido – por o arguido se ter, entretanto, ausentado para destino desconhecido, em França, e não se tendo revelado possível a sua notificação – e, depois de se ter constatado a inviabilidade da sua audição, para os efeitos do disposto no artigo 495°, nºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, veio a ser proferido despacho judicial em que, concluindo-se pela violação grosseira, pelo condenado, dos deveres inerentes ao plano de reinserção social, foi revogada a suspensão da execução da pena e determinado o cumprimento da mesma.

* Inconformado com o assim decidido, o arguido L... interpôs o presente recurso, cujos fundamentos condensou nas seguintes conclusões: «1 - O presente recurso irá quedar-se basicamente no facto de se saber se a questão da contumácia aplicada num processo, produz efeitos no âmbito de demais processos que contra o arguido se encontrem a correr, ou se apenas "vale, produz efeitos, no processo onde foi aplicada.

2 - E isto porque, em termos muito simples, se a declaração de contumácia, declarada a 18/03/2013, no âmbito do proc. 1375/13.7TBALM, que corria os seus termos no 3° Juízo de Competência Criminal do Tribunal de Família e de Menores de Almada, cfr. consta de fls. 1313 dos autos à margem referenciados, não produz efeitos no âmbito dos presentes autos, a pena aplicada neste processo a 15 de janeiro de 2010, que, quanto ao arguido ora recorrente, transitou em julgado a 18 de fevereiro de 2010, cfr. fls. 1317 dos autos, extinguiu-se por decurso do tempo no dia 17 de fevereiro de 2015, pois não consta dos presentes autos nenhuma causa de suspensão e interrupção ou sequer de prorrogação da pena nestes autos aplicada.

3 - Se entendermos que a declaração de contumácia decretada a 18/03/2013, no âmbito do proc. 1375/13.7TBALM, que corria os seus termos no 3° Juízo de Competência Criminal do Tribunal de Família e de Menores de Almada, cfr. consta de fls. 1313 dos autos à margem referenciados, produz efeitos no âmbito dos presentes autos, então todas as notificações efetuadas a partir de tal data ao arguido para a morada constante do TIR que prestou a fls. 7 nos presentes autos, no dia 16 de fevereiro de 2008, são nulas, não produzindo estas qualquer efeito, devendo a Douta Decisão ser considerada nula, porquanto o arguido não foi notificado, devendo os presentes autos ficarem suspensos até à apresentação do arguido em juízo e prestação de novo TIR, tendo o Douto Tribunal conhecimento de que o mesmo se encontrava contumaz no âmbito de um outro processo.

4 - Acresce que o Tribunal revogou a suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido, sem que se cumprisse o disposto no artigo 495° nº 2 do Código de Processo Penal, sendo certo que tal omissão é culminada ([1]) de nulidade insanável nos termos do disposto no artigo 119° alínea c) do Código de Processo Penal.

4 – Assim, face ao supra exposto, ou se considera que ouve falta de notificação (atendendo à contumácia do arguido decretada no âmbito do processo já supra identificado), devendo, por conseguinte, o arguido ser notificado, para pronunciar-se nos termos do disposto no artigo 495° nº 2 do Código de Processo Penal, sendo certo que a decisão que revogou a pena de prisão que lhe foi aplicada, se deve ter como inexistente, ou deve, conforme é nosso entendimento e salvo melhor e Douta opinião, a pena nos presentes autos ser declarada extinta pelo decurso do tempo, uma vez que inexiste nos autos e tal pode ser verificado por V. Exas. pela simples leitura de fls. 1200 a 1441, verifica-se que o Douto Tribunal não ordenou a suspensão do incidente de revogação da suspensão, permitindo, assim, em nosso modesto entender, a extinção da pena pelo simples decurso do tempo, o que ocorreu em 17 de fevereiro de 2015.

5 - Não pode o Douto Tribunal vir, em 3 de dezembro de 2015, com base numa promoção de 28/10/20015, revogar a suspensão da execução da pena, determinando o cumprimento da mesma, sem ouvir o arguido, nos termos do disposto no artigo 495° nº 2 do Código de Processo Penal.

6 - Tanto mais que, em 3 de julho de 2014, entende-se por essencial a presença do arguido, conforme consta de fls. 1387 e 1388 dos autos.

7 - Tal como supra se referiu, a pena dos presentes autos deve ser declarada extinta pelo decurso do tempo, uma vez que o Douto Tribunal não fez operar no processo nenhuma causa de suspensão ou interrupção da referida pena.

8 - Acresce que, tal como já supra se referiu, o Douto Tribunal tinha pela consciência de que o arguido estava declarado contumaz no âmbito de um outro processo.

9 - A contumácia é a situação processual de suspensão dos termos de um processo-crime, por ausência do arguido, e que conduz a que se imponha, ao declarado contumaz, um conjunto de medidas que, por lhe dificultarem a vida, se consideram adequadas a persuadi-lo a comparecer.

10 - A contumácia representa como que um “coma processual”, quer para o arguido, quer para o próprio processo.

11 - Mas se a declaração de contumácia é um reconhecimento de que, no processo, se gorou a possibilidade de localizar o arguido e de o sujeitar a TIR, ela indicia também que o arguido desconhece a pendência de processo-crime.

12 - Nestes casos, é de reconhecer a impossibilidade de cumprimento dos deveres decorrentes da posição de arguido, mesmo que um concreto acusado pretendesse responder perante a justiça. Ou desejasse ‘apresentar-se’, no sentido ‘mala partem’ que é dado ao termo legal no despacho recorrido.

13 - A prestação de TIR é condição sine qua non da possibilidade de prosseguimento do processo, pois só ela garante os direitos de defesa, investindo plenamente o arguido nesse estatuto complexo de direitos/poderes/deveres. Mas também apenas o próprio prosseguimento do processo garante, por seu turno, o cumprimento das finalidades do próprio processo penal.

14 - Assim, a contumácia não pode deixar de representar uma suspensão do processo indesejável, uma anomalia, um remedeio necessariamente transitório para uma enfermidade adjetiva que é a impossibilidade de localização do arguido. Impossibilidade que impede o julgamento e obsta à decisão do caso e da causa, enquanto essa localização não se verificar.

15 - Por isso que a lei processual obriga, nestes casos, o Ministério Público e o próprio Juiz de julgamento a encetar todas as diligências necessárias à localização do arguido ausente, de forma a que, encontrado, se lhe dê conhecimento da existência do processo e da acusação contra si deduzida, seja sujeito a prestação de TIR, assim se alcançando o objetivo do prosseguimento do processo "paralisado".

16 - De outro modo, não se percebe a preocupação processual de procurar a localização do arguido, que aliás a lei não limita ao espaço nacional. Encontrado o arguido no estrangeiro, obtida a sua atual residência, nada obsta, pelo contrário, impõe-se que ao mesmo se dê conhecimento da existência do processo e da acusação contra si deduzida para lhe permitir o exercício dos seus poderes/deveres e, por outro lado, consolidar a realização de justiça pelos Tribunais/Estado com a prolação de uma sentença.

17 - De qualquer modo, entende-se que, se no momento em que se completa o período de suspensão não se tiver iniciado o incidente de incumprimento das condições a que foi subordinada a suspensão, impõe-se declarar extinta a pena de substituição, em face da regra geral prevenida no nº 1 do artigo 57° do Código Penal.

18 - Nos casos de suspensão da execução da pena de prisão, concluído o período da suspensão, só a pendência de incidente por incumprimento dos deveres, regras de conduta ou do plano de readaptação (hoje, plano de reinserção) ou a pendência de processo por crime que possa determinar a sua revogação poderão evitar a extinção da pena pelo decurso do período de suspensão (artigo 57°, nº 1, do Código Penal), mas, em nosso entender, tem o Tribunal de ordenar a suspensão do incidente de revogação da suspensão, pois, se assim não o fizer, conforme sucedeu nos presentes autos, a pena tem de ser declarada extinta pelo decurso do tempo.

19 - Do disposto nos artigos 50°, nºs 2 e 3, 51°, nº 4, 52°, nº 4, e 53°, nº 2, todos do Código Penal, e 595°, nº 2, do Código de Processo Civil, bem como do princípio do contraditório, decorre que, no incidente de revogação da suspensão da pena de prisão, o Tribunal deve sempre ouvir o Arguido.

20 - Tal audição tem de ser presencial sempre que, durante a suspensão da execução da pena, tenha havido intervenção dos serviços de reinserção social, sendo desnecessária a audição presencial quando tal intervenção não tenha sucedido.

21 - Acresce que o facto de ter processos em curso ou mesmo o cometimento de um crime no período de suspensão da execução da pena de prisão não determina automaticamente a revogação daquela.

22 - Sendo até jurisprudência dos nossos tribunais que só a pena de prisão efetiva e após o trânsito em julgado poderá vir a determinar a revogação da suspensão da pena aplicada.

23 - O Arguido deveria ter...

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