Acórdão nº 1318/09.2TBTNV.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL RODRIGUES
Data da Resolução21 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–Relatório: G...

e S...

, casados entre si no regime de comunhão de adquiridos, ambos residentes ... intentaram, em 28/10/2009, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra C... S.A. (doravante C...), peticionando: i)–a condenação da Ré a restituir à Autora a quantia indevidamente debitada na conta poupança n.º 0819015168927 no valor de €16.000,00; ii)–a condenação da Ré a restituir a ambos os Autores a quantia indevidamente debitada na conta à ordem n.º 0819051885000 no valor de €4.000,00; iii)–a condenação da Ré no pagamento aos Autores de €3.800,00 a título de danos não patrimoniais; iv)–serem declaradas nulas, porque contrárias à boa fé e porque alteram as regras respeitantes ao ónus da prova, as cláusulas 9 e 10 do contrato-tipo de adesão do serviço Caixadirecta subscrito pela Autora; Alegam, em resumo, que são clientes do Banco Réu, titulares de contas de depósito a prazo e à ordem, tendo a Autora também subscrito o serviço Caixa Directa on-line.

Em 8 de Março de 2009, a Autora constatou movimentos bancários que não tinham sido efectuados por nenhum dos Autores, realizados em 6 e 7 de Março de 2009, que importaram para a Autora um prejuízo patrimonial de 16.000 Euros e para ambos os Autores de 4.000 Euros.

Os Autores adoptaram todos os procedimentos de segurança inerentes ao serviço Caixadirecta on-line, incluindo a obrigação de comunicar à Ré qualquer situação anómala, o que apenas não sucedeu devido ao não funcionamento da linha de apoio, pelo que em 9 de Março de 2009 (segunda-feira) se deslocaram à agência da Ré em Torres Novas para relatarem o sucedido.

A Ré comunicou aos Autores entender inexistir da sua parte qualquer responsabilidade e recusou o pedido de reembolso de 20.000 Euros das contas dos Autores.

Invocam ainda os Autores que os contratos-tipo de adesão do serviço Caixa Directa contêm cláusulas nulas porque violadoras da boa-fé e por alterarem as regras respeitantes ao ónus da prova, pelo que terão de ser declaradas nulas.

Os Autores viram-se espoliados de todas as suas poupanças, com que tencionavam fazer face às despesas do seu casamento, que ocorreu em 6 de Junho de 2009, pelo que tiveram de solicitar o pagamento em prestações dos bens que tinham encomendado e pedir ajuda monetária aos pais de ambos. Sentiram-se desgostosos, envergonhados e revoltados, peticionando, a título de danos não patrimoniais, a quantia de 3.800 Euros.

Regularmente citada, a Ré contestou defendendo-se por excepção, invocando a incompetência territorial do Tribunal de Torres Novas, e por impugnação. Em sede de impugnação, contrapôs, em síntese, que a alegada indisponibilidade do serviço de atendimento telefónico de apoio ao serviço Caixadirecta não acarretou qualquer problema para as contas dos Autores uma vez que estes conseguiram bloquear o acesso ao serviço Caixadirecta on-line de imediato e nenhuma transferência ou débito foram realizados das contas dos Autores a partir das 0h00 do dia 8 de Março de 2009.

Com a activação do serviço Caixadirecta on-line é fornecido um número de contrato, bem como um código de acesso (que são os elementos necessários para entrar no serviço Caixadirecta através de um computador – log in-) e também um cartão matriz com um conjunto único de 64 números de 3 algarismos, que funciona como um elemento de segurança adicional para as operações realizadas no serviço Caixadirecta on-line.

Os movimentos indicados na Petição Inicial foram efectuados porque foram correctamente introduzidos todos os códigos de autenticação que permitiam o acesso às contas e à sua movimentação.

Entende a Ré que a ter existido movimentação fraudulenta das contas dos Autores, a mesma só pode dever-se exclusivamente à não observância por parte dos Autores dos procedimentos de segurança a que estão obrigados pelo facto de serem utentes do serviço Caixadirecta on- line.

Não é possível aceder às contas bancárias dos Autores e proceder aos movimentos que os Autores referem ser fraudulentos sem o conhecimento de elementos de carácter absolutamente confidencial e intransmissível tais como o número de contrato, o código de acesso bem como os 64 números de 3 algarismos cada um que constituem o cartão matriz.

Aquando da adesão ao serviço Caixadirecta a Autora subscreveu e aceitou as respectivas “Condições Gerais de Utilização do Caixadirecta”, bem como as recomendações de segurança, entendendo que as cláusulas invocadas pelos Autores não são nulas.

Termos em que concluiu pela improcedência da acção e requereu a intervenção dos beneficiários das transferências provenientes das contas bancárias dos Autores, N..., M... e H..., Lda., chamamento que foi admitido pelo Tribunal.

Os Autores replicaram, pugnando pela competência territorial do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas.

Citada a Interveniente H..., Lda. apresentou contestação, em que alega prestar um serviço que consiste na disponibilização de meios de pagamento de bens e serviços prestados pelos seus parceiros, pelo que não é a beneficiária da transferência operada, mas uma mera intermediária entre o seu parceiro e o respectivo cliente. Assim, não recai sobre si a obrigação de restituir qualquer montante, aos Autores ou à Ré.

Notificada, a Ré C... requereu ainda a intervenção de E..., alegado beneficiário da transferência proveniente das contas bancárias dos Autores de que a H... terá sido intermediária, chamamento que foi admitido.

Os Autores apresentaram Réplica quanto à invocada ilegitimidade da Interveniente H..., Lda.

Os interessados M...

e E...

foram citados editalmente, por se ter frustrado a sua citação pessoal.

Por decisão de 27 de Fevereiro de 2015 o Tribunal Judicial de Torres Novas julgou procedente a excepção de incompetência territorial e determinou a remessa dos autos para o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa.

Foi realizada audiência prévia, em que foi proferido Despacho Saneador, de identificação do Objecto do Litígio e enunciação dos Temas de Prova (cf. acta de fls. 353 a 360).

Realizou-se a audiência de julgamento com observância do formalismo legal, numa única sessão e com registo da prova (cf. acta de fls. 450 a 455).

Após, foi proferida sentença com data de 18/04/2017, que julgou improcedente o incidente de impugnação de documentos e parcialmente procedente a acção e, em consequência, condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de 16.000,00 Euros e aos Autores a quantia de 4.000 Euros, acrescidas de juros vencidos e vincendos à taxa legal civil supletiva, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado” 2.

–Inconformada, a Ré C... interpôs o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: “1.

– A apelante impugna a decisão do Tribunal a quo quanto à douta fundamentação de facto, em ordem a que na mesma seja incluída a matéria alegada pela R. nos n.ºs 46 da contestação (a ter existido movimentação fraudulenta das contas dos AA., a mesma só pode dever-se exclusivamente à não observância por parte dos AA. Dos procedimentos de segurança a que estão obrigados pelo facto de serem aderentes do serviço Caixa Direta on line), no n.º 49 do mesmo articulado (não é possível aceder-se às contas bancárias dos AA. e proceder-se aos movimentos que os AA. referem ser fraudulentos sem o conhecimento de elementos de caráter absolutamente confidencial e intransmissível tais como o nº do contrato, o código de acesso bem como os 64 números de 3 algarismos cada um que constituem o cartão matriz), e no n.º 59 (Não é possível ter conhecimento de todos estes códigos por outra forma que não seja a da sua própria inserção pela própria A., ou por alguém a quem tenha voluntária ou involuntariamente divulgado tais códigos), todos da sua contestação, bem como ainda a matéria constante dos nºs 6 e 42 da petição inicial[1], onde a apelante indica que existem recomendações de segurança e alertas de segurança que alertam que a C... não pede nunca a confirmação dos dados do cartão matriz e que os códigos de acesso não devem ser divulgados a ninguém, conforme teor e conteúdo dos docs. 1 e 3 juntos com a contestação, e ainda a matéria constante das cláusulas 9 a 11 das condições gerais de adesão ao serviço Caixa Direta on-line; 2.

– Na perspetiva da apelante os depoimentos das testemunhas J... e N..., arrolados pela apelante, foram desvalorizados e desconsiderados pelo Tribunal no que respeita à matéria alegada nos nºs 46, 49 e 59 da contestação; 3.

– A matéria constante dos nºs 46, 49 e 59 da contestação da C... é relevante para a decisão não pode ser qualificada como meras alegações de direito e não é manifestamente vaga ou conclusiva; todavia, o Tribunal a quo não a elencou nem na matéria de facto considerada provada nem na considerada não provada, o que só pode significar que genericamente a integrou naquele seu supra citado parágrafo, sendo que o Tribunal não concretizou se considerava a matéria alegada pela apelante nos n.ºs 46, 49 e 59 da contestação como irrelevante, ou de direito, ou vaga e conclusiva, como aliás se lhe impunha para que a decisão pudesse ser integralmente e corretamente fundamentada e assim compreendida pela apelante, pelo que quando o Tribunal ouviu o depoimento das testemunhas indicadas na 2ª conclusão - que prestaram depoimento sobre esta matéria – nem sequer o tomou em consideração no que concerne a esta matéria, por a entender irrelevante, ou de direito, ou vaga e conclusiva; 4.

– O Tribunal refere que estas testemunhas não são peritos nem foram ouvidos nessa qualidade, não explicando todavia o que pretende significar com tal afirmação, pelo que não se alcança qual o raciocínio do Tribunal no que concerne ao facto de estas duas testemunhas não serem peritos, ou seja em que concretos termos é que o seu depoimento não foi considerado pelo facto de não terem sido ouvidos na qualidade de peritos, ou, até, se o Tribunal...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT