Acórdão nº 338-14.0TVLSB.L1.-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução22 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: * I- O Ministério Público deduziu acção declarativa comum contra «Z, SA»».

Alegou o A., em resumo: A R. procede à celebração de contratos que têm por objecto o fornecimento e a prestação de serviços de distribuição de televisão e multimédia, de acesso à internet, de telefone fixo, de telefone móvel e de banda larga móvel; a disponibilização de equipamentos necessários para tal acesso e utilização e presta serviços de instalação e/ou activação. A R. apresenta aos interessados um clausulado já impresso e previamente elaborado denominado “Condições Gerais”, o qual não contém espaços em branco para serem preenchidos pelos contratantes. Os interessados preenchem e assinam um impresso denominado “Formulário de Adesão a Produtos e Serviços – Residencial”. Nos termos deste formulário o cliente adere aos serviços Z em conformidade com o formulário e condições gerais. Assim, encontramo-nos perante um contrato de adesão sujeito ao RCCG instituído pelo Dec.-Lei nº 446/85 de 25/10 na redacção actual.

Sucede, todavia, que a R. incluiu nesse contrato cláusulas proibidas por lei, contendendo o seu conteúdo com o RCCG, pelas razões que discrimina.

Pediu o A.: 1) A declaração de nulidade das cláusulas 6ª, n.º 2, 7ª, n.º 8, 8ª, n.º 1, alínea c), 10ª, n.ºs 1 e 2 (na parte relativa à fidelização por 24 meses) das Condições Gerais, e 3ª, n.º 4, e 5ª, n.º 2 das Condições Específicas, dos contratos juntos como documentos nºs 2 e 3, condenando-se a R a abster-se de as utilizar em contratos que de futuro venha a celebrar, especificando-se na sentença o âmbito de tal proibição (art. 30º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 446/85, de 25/10, na redacção actualmente vigente); 2) A condenação da R a dar publicidade a tal proibição e a comprovar nos autos essa publicidade, em prazo a determinar na sentença, sugerindo-se que a mesma seja efectuada em anúncio a publicar em dois dos jornais diários de maior tiragem editados em Lisboa e no Porto, durante três dias consecutivos, de tamanho não inferior a ¼ de página (art. 30º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 446/85, de 25/10); 3) Que seja cumprido o disposto no art. 34º do Decreto-lei n.º 446/85, de 25/10, remetendo-se certidão da sentença proferida à Direcção-Geral da Política de Justiça – Ministério da Justiça, para os efeitos previstos na Portaria n.º 1093/95, de 06/09.

A R. contestou, suscitando a inutilidade parcial da lide e apresentando uma outra perspectiva dos factos. Concluiu pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

O processo prosseguiu, consignando-se ser a actual denominação da R. «N, SA». Teve lugar audiência prévia e foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: «1. Julgo improcedente a inutilidade superveniente da lide parcial.

  1. 2.1.

    Declaro nula a Cláusula 6.2 das Condições Gerais do contrato de fls. 42 a 49 com a seguinte redacção: “O Cliente reconhece e aceita que caso sejam efectuados consumos no âmbito dos Serviços que excedam significativamente os seus níveis habituais de consumo, a Z poderá, a qualquer momento, exigir o pagamento dos serviços em causa”; 2.2. Declaro nula a Cláusula 8.1 c) das Condições Gerais do mesmo contrato no segmento “excedendo os níveis de utilização habituais do Cliente”; 2.3. Declaro nula a Cl. 3.4 das Condições Específicas/Serviços de Banda Larga Móvel do mesmo contrato com a seguinte redacção: “O Cliente reconhece e aceita que a Z poderá a qualquer momento restringir ou impedir a utilização de serviços de voz assentes na tecnologia VoIP (Voice over Internet Protocol), nomeadamente para garantir a qualidade do serviço de acesso à Internet prestado aos seus Clientes, podendo, ainda, aplicar uma tarifa adicional pela utilização de serviços VoIP”; 2.4 Declaro nula a Cl. 5.2 das Condições Específicas/Serviço Telefónico Móvel nos segmentos “(…) recepção escrita (…)” e “sendo os custos dos serviços eventualmente utilizados até à desactivação integralmente suportados pelo Cliente”; 3.

    Condeno a R a abster-se de usar as cláusulas e os segmentos referidos no ponto antecedente em todos os contratos que de futuro ainda venha a celebrar; 4.

    Condeno a R a dar publicidade desta proibição por intermédio de anúncio a publicar em dois jornais diários de âmbito nacional e de maior tiragem em Lisboa e Porto, em três dias consecutivos, de tamanho não inferior a ¼ da página, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da presente decisão, vindo aos autos comprovar tal publicação até 10 dias após o termo do prazo fixado (art. 30º nº 2 do RJCCG).

  2. No mais, absolvo a R.» Apelou o A., concluindo nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso: 1. Da segunda parte da cláusula 7.8 das Condições Gerais do contrato em apreciação, decorre que a Ré poderá, a todo o momento, sem necessidade de qualquer fundamento ou justificação, baseada apenas na sua própria conveniência, cancelar, total ou parcialmente, o acesso a produtos e serviços por si disponibilizados no âmbito de campanhas, promoções ou regimes especiais transitórios.

  3. Com o funcionamento desta cláusula, a Ré pode alterar unilateralmente as condições de prestação dos seus serviços e produtos acordadas com o consumidor, sem necessidade de qualquer fundamento objetivo, e sem que a este seja dada a possibilidade de solicitar qualquer reembolso, indemnização ou compensação por tal cancelamento, mantendo-se o consumidor vinculado ao cumprimento integral do contrato, incluindo a sua sujeição ao pagamento das penalidades que sejam aplicáveis, em caso de pedido de cessação do fornecimento ou da prestação dos produtos e serviços.

  4. E tal sujeição subsiste, mesmo nos casos em que o consumidor apenas tenha acedido a celebrar contrato com a Ré, com base em determinadas condições especiais promocionais oferecidas por aquela e que posteriormente, por razões de conveniência da Ré, esta cancela antes de decorrido o prazo indicado nessas mesmas condições promocionais, pelo que tal cláusula é proibida por violação do disposto na alínea c), do n.º 1, do art.º 22.º do RCCG.

  5. Da conjugação da cláusula 10.1 e 10.2 das condições gerais com o estipulado no formulário de adesão a produtos e serviços referente ao contrato dos autos (o qual, no seu ponto 2, impõe um período de fidelização de 24 meses e impede que os produtos/serviços que integram o serviço contratado possam ser desativados separadamente, advertindo que qualquer alteração ao serviço contratado – incluindo a alteração de titularidade e a mudança de residência − pressupõe uma nova adesão e a aplicação das condições de serviço associadas que estiverem em vigor), resulta que o período de permanência e a indemnização devida no caso de incumprimento se aplica indistintamente a todos os clientes, inclusivamente aos atuais clientes que, por qualquer motivo, decidam aderir a novos serviços, ficando os mesmos vinculados a uma fidelização de 24 meses relativamente a esse novo serviço, independentemente do lapso de tempo entretanto já decorrido como clientes da Ré.

  6. Esta cláusula não concede vantagens ou benefícios económicos que justifiquem, objetivamente e de forma automática, a sujeição do cliente a novo período de fidelização de 24 meses, sendo excessiva no que ao lapso temporal respeita e como tal proibida por violação do art.º 22.º, n.º 1, al. a) do RCCG.

  7. E neste circunstancialismo, a indemnização prevista consubstancia uma manifesta desconformidade entre a penalidade e o prejuízo, em benefício da Ré, consagrando-se uma cláusula penal desproporcionada e excessiva face aos danos que visa ressarcir, pelo que esta cláusula é igualmente proibida, nos termos do art.º 19º, alínea c), do RCCG.

  8. A sentença recorrida ao não declarar nulas as cláusulas em questão, violou o preceituado nos art.ºs 19.º, al. c) e 22.º, n.º 1, als. a) e c), ambos do RCCG.

    Também a R. apelou, apresentando as seguintes alegações de recurso: 1- A Ré recorre da sentença de fls., quer quanto à decisão aí proferida sobre a matéria de facto, quer quanto à decisão de Direito.

    2- A Ré considera que a matéria alegada nos artºs 64º, 65º, 66º e 158º da contestação não tem natureza conclusiva, antes se tratando de factos materiais e concretos.

    3- Para além disso julga a Ré que tais factos, no que ao setor em que se integra a Ré respeita, consubstanciam factos notórios nos termos do disposto no artº no artigo 412°, n° 1, do C.P.C.

    4- A circunstância de ser dispensada a sua alegação e prova não significa que os factos notórios não tenham de ser fixados pelas instâncias, podendo o Tribunal da Relação, ao abrigo do disposto no artigo 412°, n° 1, do Cód. Proc. Civil considerar certos factos como notórios.

    5- Entende a Ré que o Tribunal da Relação deve revogar a decisão de considerar tais factos como conclusivos, dando como provada tal matéria por se tratar de factos notórios e, como tal, não carecerem de prova porque subsumíveis no disposto no artigo acima indicado, propondo-se a manutenção da sua redacção que é a seguinte: -Sucede, no entanto, que pode dar-se o caso de um determinado utilizador (humano ou automatizado) estar a fazer uma utilização tal da rede de um determinado operador, que coloca em causa o acesso dos demais clientes desse mesmo operador aos serviços que legitimamente contrataram.

    -Estas situações ocorrem, por exemplo, quando existe o envio massivo de mensagens, práticas vulgarmente descritas como spam, mail bombing e hacking.

    -Ou com a utilização constante e ininterrupta do serviço de voz com recurso ao reencaminhamento de chamadas (prática vulgarmente denominada por “esquema de cabine telefónica”).

    -Finalmente, cabe referir que os equipamentos em questão, bem como os próprios cartões, estão dotados de códigos, pessoais e intransmissíveis, que são atribuídos aos clientes e necessários para que os mesmos funcionem.

    6- Estabelece a Lei das Comunicações Eletrónicas que “as empresas que oferecem redes de comunicações públicas ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao...

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