Acórdão nº 819/14.5PAAMD-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Junho de 2016
Magistrado Responsável | VASCO DE FREITAS |
Data da Resolução | 22 de Junho de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam em Conferência, os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa.
I-RELATÓRIO: No termo do inquérito que, com o nº 819/14.5PAAMD, correu termos nos serviços do MºPº de Sintra comarca de Lisboa Oeste, pelo Ministério Publico foi proposto o arquivamento dos autos por considerar estarem verificados os pressupostos do de dispensa de pena nos termos das disposições conjugadas nos artigos 74° e 143° n°3 do Código Penal e artigo 280° n°1 do Código de Processo Penal relativamente ao arguido P.F.S.
O Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal proferiu despacho de concordância com a proposta de arquivamento por dispensa de pena, após o que o Ministério Público determinou o arquivamento dos autos nos termos do art. 280° do Código de Processo Penal.
Inconformado D.C.A. constitui-se assistente e veio requerer a abertura de instrução pretendendo demonstrar que não se verificavam os pressupostos da dispensa da pena, nomeadamente as agressões mútuas, já que teria sido inicialmente agredido pelo P.F.S., e a reparação do dano.
Tal requerimento veio, porém, a ser rejeitado, por inadmissibilidade legal ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 287º do C.P.P., por a Srª. Juiz de Instrução ter considerado que o despacho que determinou o arquivamento dos autos em conformidade com o disposto no citado artigo 280 ° do C.P.P. não é susceptível de impugnação.
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o assistente, pretendendo a revogação do despacho recorrido e a sua substituição por outro que admita a abertura da fase processual requerida, com a subsequente apreciação das questões por ela levantadas formulando para tanto as seguintes conclusões: 1)O ora Recorrente não se conforma com o douto Despacho de Abertura de Instrução, proferido nos presentes Autos, uma vez que do teor do mesmo resulta que é rejeitada "a abertura de instrução requerida pelo assistente D.C.A., na parte em que pretende a pronúncia de P.F.S."; 2)Efectivamente, não pode o aqui Recorrente conformar-se com a decisão de arquivamento dos Autos, nos termos do artigo 280.°, número 1 do CPP, relativamente a P.F.S. - e, muito menos, com o Despacho de Concordância do Tribunal a quo - porquanto, tal decisão ignora factos, depoimentos e relatórios médicos juntos aos Autos, essenciais à boa decisão da causa, que, a terem sido devidamente apreciados, resultariam, inevitavelmente, na acusação de P.F.S. , pela prática, em autoria imediata e na forma consumada, de um crime de ofensas à integridade física, p. e p. nos termos do artigo 143.° do Código Penal; 3)Aliás, a verdade é que não se encontram, sequer, preenchidos os pressupostos - quer gerais, quer especiais - da dispensa de pena e, consequentemente, ao caso sub judice não é possível aplicar-se a teoria da compensação; 4)Resultou indiciado e provado pelo depoimento da testemunha M.W. , que presenciou todos os factos sub judice, que no dia 07/08/2014, pelas 22h30, na Rua ……………….., na Amadora, esta encontrava-se na companhia do ora Recorrente, quando P.F.S. , acompanhado de M.M.R., saiu de uma viatura que se encontrava estacionada perto da viatura do ora Recorrente - precisamente aguardando que o mesmo regressasse -, dirigindo-se ao mesmo, num tom de voz bastante agressivo e com uma garrafa de cerveja de vidro na sua mão; 5)Esta testemunha presenciou que "o P.F.S. desferiu uma bofetada ao D.C.A. e este em acto de defesa agarrou-o pelos colarinhos" e, bem assim, que P.F.S., munido da garrafa de vidro de cerveja que tinha na mão, desferiu uma violenta pancada na testa do ora Recorrente; 6)Ora, o Recorrente, em momento algum agrediu P.F.S., tendo, tão-só, agarrado o mesmo pelos colarinhos em legítimo acto de defesa, não podendo, pois, considerar-se que o Recorrente e P.F.S. se envolveram em agressões mútuas, pois o único agredido foi o ora Recorrente e o único agressor foi P.F.S. ; 7)Aliás - além do depoimento desta testemunha directa, M.W. -, foram juntos aos Autos, a fls. 169 e 170, relatórios emitidos pelo Hospital da Luz, respeitantes, precisamente, ao episódio de urgência de 07/08/2014, pelas 23h50 e nos termos dos quais consta que foi diagnosticado ao ora Recorrente, D.C.A.: hematoma frontal, hematoma occipital, hematoma da região mastoideia à esquerda e onde se constata uma pequena escoriação e dor à palpação do ombro esquerdo, tendo sido dada alta ao aqui Recorrente, mas com alerta para vigilância de sinais de alarme de traumatismo craniano; 8)Já previa o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 11 de Julho de 2011, à semelhança do caso sub judice, que, "(...) por imperativo do disposto no artigo 74°, n.° l, do CP, a reparação do dano é conditio sine quan non da aplicação do instituto da dispensa de pena. Reparação essa que não é potencial, mas efectiva, concretizada. (...)Ora, no caso concreto, salvo o devido respeito, não se encontra comprovado o requisito da compensação de danos. (...) Tratam-se de danos que não foram reparados e nem resulta do processo que os arguidos tenham diligenciado pela sua reparação. (...) Assim sendo, não se verificando no caso concreto a compensação dos danos, não poderia ter sido proferido despacho de arquivamento por dispensa de pena (...)"; 9)Por seu lado, já quanto a P.F.S. , não resultam dos Autos quaisquer elementos clínicos que se reportem a uma qualquer alegada lesão do mesmo - precisamente, porque a mesma é inexistente -; 10)Assim, não existiram "lesões recíprocas", ao contrário do que consta do douto Despacho de Arquivamento do Ministério Público, com dispensa de pena e relativamente ao qual foi obtida a concordância do Mm. Juiz do Tribunal a quo; 11)Resulta do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 7 de Outubro de 2009, que "(...) os referidos pressupostos [da dispensa de pena, nos termos do artigo 74.° do CP] não se verificam no caso concreto. (...) A douta Magistrada do Ministério Público errou na apreciação da prova indiciária. (...) Os factos indiciários constantes dos autos, não configuram ter havido lesões recíprocas, e agressões mútuas, nem a ilicitude do facto e a culpa dos arguidos foram diminutas. (...) O ora recorrente (...) sofreu lesões físicas (...), conforme relatório (...). Dos autos não consta quaisquer lesões físicas sofridas pelos denunciados (...) sendo o crime imputado aos arguidos de ofensa à integridade física e sendo a integridade física o interesse primeiramente protegido, também estão em causa os danos não patrimoniais sofridos pelo ora recorrente, como a dor, sofrimento, humilhação, nervos e insónias, que da ofensa resultaram e que devem ser ressarcidos. (...) Com o arquivamento do processo foram postergados os direitos da vítima e da sociedade, e esses direitos são defendidos pela exigência da reparação do dano e ausência de razões de prevenção que têm que estar presentes e resolvidas em cada situação de arquivamento, e que no caso não foram acautelados. (...)"; 12)Destarte, não é possível operar o Princípio da Compensação e da Desnecessidade da Pena, pois não nos encontramos perante uma situação, nos termos da qual as partes são, simultaneamente agressor e agredido, uma vez que no caso sub judice apenas existe um agressor - P.F.S. - e um agredido - o ora Recorrente -; 13)Além do mais, é falso que não haja ficado provado quem agrediu primeiro, quando a testemunha M.W. , que presenciou toda a factualidade sub judice, esclareceu que "o P.F.S. desferiu uma bofetada ao D.C.A. e este em acto de defesa agarrou-o pelos colarinhos", conforme explanado supra; 14)É com enorme surpresa que o ora Recorrente verifica que o Ministério Público omitiu, na fundamentação da referida decisão de arquivamento, que P.F.S. se fazia acompanhar do seu amigo M.M.R. e, de igual modo, omite o facto de o mesmo deter uma garrafa de vidro de cerveja na sua mão - factos estes que foram claramente provados, quer pelo depoimento da testemunha M.W. , quer pelo depoimento da testemunha M.M.R. , que o admitiu e que, como tal, deveriam ter sido alvo da devida apreciação -; 15)É notório que P.F.S. estava a fazer -...
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