Acórdão nº 395/13.6TAVFX-A.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS ALMEIDA
Data da Resolução20 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: 1–No dia 21 de Setembro de 2015, o Sr. juiz proferiu nestes autos o despacho que, na parte para este efeito relevante, se transcreve: II–Arguida M. – FDQ, Lda.

Do promovido procedimento via artigo 335.º do Código de Processo Penal com vista à declaração de contumácia.

Apresentando-se inviável a notificação da arguida M. – FDQ , Lda., representada por A.N.B., e após a realização de diversas diligências com vista ao apuramento do seu actual e real paradeiro, o Ministério Público promove também quanto à mesma o procedimento legal constante do artigo 335.º do Código de Processo Penal.

Apreciando.

Como é bom de ver tal promoção pressupõe naturalmente que as pessoas colectivas podem ser declaradas contumazes.

Na nossa modesta opinião, entendemos que tal possibilidade não se extrai da lei tal como ela está talhada actualmente.

Por um lado, a figura está configurada para pessoas singulares (cf. artigo 337.º do CPP) a que a natureza da pessoa colectiva não se ajusta: note-se que no n.º 5 do referido dispositivo legal se refere que a declaração de contumácia deve ser comunicada ao defensor e a parente ou pessoa da sua confiança, momento em que são emitidos mandados de detenção.

A tudo acresce que no registo de contumácia, o formulário actualmente em vigor dispõe de campos com dados nominativos que apenas se dirigem a pessoas singulares (cf. Jorge Reis Bravo, "Incidências processuais da punibilidade de entes colectivos", in Revista do Ministério Público, 105, 2006, págs. 76 e ss.).

Assim sendo, e sem prejuízo de entendermos que tal regime legal coloca questões delicadas, mormente no que tange com a prescrição do procedimento criminal, a verdade é que actualmente a letra e o espírito da lei não apontam na direcção da possibilidade de declarar contumazes pessoas colectivas.

A propósito da questão escreveu Paulo Pinto de Albuquerque no seu Comentário ao Código de Processo Penal (2.ª edição, 2008), em anotação ao artigo 335.º do Código referido (comentário n.º 8): "A pessoa colectiva arguida não pode ser declarada contumaz, mesmo que não tenha tido sucesso a tentativa de notificação da acusação e do despacho de saneamento dos autos, sendo a natureza pessoalíssima desse regime rebelde à sua aplicação analógica a pessoas colectivas (também assim, Reis Bravo, 2006:77, que tempera esta conclusão com uma "adesão" contra natura do ente colectivo à contumácia dos co-arguidos pessoas físicas, designadamente para efeitos da suspensão e interrupção do prazo de prescrição do procedimento, em violação do princípio da legalidade)».

Efectivamente, conforme escreve Jorge Reis Bravo (ob. loc. cit.) "(...) o referido instituto é matricialmente concebido e regulado tendo em atenção a natureza individual dos seus destinatários. Na verdade julga-se que será dificilmente defensável que o instituto se possa aplicar a pessoas ou entes colectivos. Com efeito, a inexistência de previsão dessa possibilidade em sede de direito positivo sugere que tal hipótese nunca terá estado na mente do legislador. Por outro lado, toda a regulamentação do instituto é direccionada para indivíduos (pessoas humanas), sendo mais uma manifestação do carácter antropocêntrico do nosso direito processual penal. A previsão em diversas normas da possibilidade de «detenção» ou «apresentação voluntária» do arguido como meio de operar a caducidade da declaração de contumácia, «a comunicação a parente ou a pessoa da confiança do arguido» (artigo 337.º, n.º 5) expressam eloquentemente que tal regime se encontra apenas pensado para indivíduos. Ou, dito de outra forma, ainda que se admitisse a possibilidade de...

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