Acórdão nº 476/12.3TYLSB-E-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelFARINHA ALVES
Data da Resolução28 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Maria, residente em Lisboa, intentou contra a massa insolvente de Audiovisuais, Lda, a presente ação declarativa com processo ordinário, pedindo que a ré, através do Sr. Administrador da insolvência, fosse condenada a cumprir o contrato promessa de compra e venda de imóvel que celebrou com a autora, operando-se a execução específica prevista no art. 830.º do Código Civil, se assim se entender necessário; ou que, caso assim não se entendesse, a ré fosse condenada a restituir à autora, ao abrigo do regime do enriquecimento sem causa, a quantia de €200.001,00 correspondente ao preço da venda não concretizada e com que injustamente se locupletou.

Alegou, para tanto, em síntese: Por contrato celebrado no dia 07-02-2012, com aditamento formalizado no dia 21-02-2012, a sociedade Audiovisuais L.da, prometeu vender à ora autora, que prometeu comprar, pelo preço de € 200.001,00, já integralmente recebido, o prédio urbano sito em (,,,,), descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o nº (…) e inscrito na matriz (….) A promitente compradora era credora da promitente vendedora pelo montante de € 200.000,00, por lhe ter emprestado essa quantia, beneficiando de garantia hipotecária sobre o imóvel prometido vender e comprar.

Esse crédito foi convertido em pagamento do preço da prometida compra e venda.

Com o contrato promessa foi operada a tradição do imóvel prometido vender para a promitente compradora.

A promitente vendedora foi declarada insolvente por sentença de 26 de Março de 2012.

Na sequência dessa declaração de insolvência, a ora autora reclamou no processo de insolvência um crédito no montante de € 200.000,00, correspondente ao montante que havia emprestado à insolvente, que não tinha sido reembolsado, e que tinha servido para pagar o preço da compra do imóvel.

A autora teve, posteriormente, acesso à relação provisória de créditos reconhecidos e não reconhecidos a que alude o art. 124º do CIRE, elaborada pelo Sr. Administrados da Insolvência, e da qual resulta que o crédito reclamado pela autora não era ali reconhecido como um crédito sobre a insolvência.

Em face desse não reconhecimento, a autora, por carta de 18-01-2013, interpelou o Sr. Administrados da Insolvência para cumprir o contrato promessa.

Tendo aquele respondido que optava pela recusa do cumprimento.

Nesta situação, deve ser reconhecido à promitente compradora, nos termos do art. 102.º, n.º 3, al. c) do CIRE, um crédito sobre a insolvência de valor correspondente ao valor da prestação não cumprida da promitente vendedora, posto que a obrigação da promitente compradora já foi inteiramente realizada.

A prestação não cumprida da ré reconduz-se à outorga da escritura de compra e venda, cujo valor corresponde ao do imóvel prometido vender.

Não tendo reconhecido o crédito que a autora reclamou na insolvência, o Sr. Administrador não pode recusar o cumprimento do contrato promessa, sob pena de enriquecimento sem causa. A manter-se o não cumprimento do contrato promessa, a quantia de € 200.001,00, que foi paga pela autora, teria sido recebida pela ré em vista de um efeito que não se verificou: a transferência de propriedade sobre um imóvel.

Configurando uma situação de enriquecimento sem causa.

A massa insolvente contestou, opondo, em síntese: A autora não impugnou a decisão de não reconhecimento do crédito que reclamou no processo de insolvência, pelo que essa decisão se tornou definitiva, tendo precludido qualquer hipótese de esse crédito ser objeto de apreciação em sede judicial.

Esse crédito não foi reconhecido porque a autora não apresentou qualquer prova de ter entregue à sociedade insolvente a quantia de € 200.000,00, e essa entrega não consta dos registos da sociedade.

A autora continua a não fazer qualquer prova, designadamente bancária, da efetivação dessa entrega, prova que não resulta do contrato-promessa. E essa entrega não é verosímil sem que exista um único documento que a comprove.

Indiciando-se que o contrato-promessa é simulado e que houve da parte da sociedade promitente vendedora, com a conivência da autora, tia de uma gerente daquela sociedade, o intuito de prejudicar os credores da sociedade, uma vez que o contrato-promessa foi celebrado apenas um mês antes da declaração de insolvência da sociedade promitente vendedora, e quando esta já tinha pleno conhecimento da sua situação de insolvência.

O contrato promessa foi celebrado por simples documento particular não autenticado, sendo nula a cláusula de atribuição de eficácia real.

Pelo que a ré não é obrigada a celebrar a escritura de compra e venda do imóvel, independentemente de ter existido ou não tradição do mesmo.

Não se verifica enriquecimento sem causa, porque a autora não demonstrou ter entregue qualquer quantia à ré. A autora está a peticionar, a título de enriquecimento sem causa, o mesmo crédito que já reclamou no âmbito processo de insolvência e que ali não foi reconhecido.

Realizou-se a audiência prévia, na qual não foi conseguida a conciliação das partes.

No seguimento, tendo sido entendido que os autos já continham os elementos necessários para a decisão sobre o mérito da causa, foi proferida sentença onde a ação foi julgada totalmente improcedente.

Inconformada, a autora apelou do assim decidido, tendo apresentado alegações...

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