Acórdão nº 293-07.2TNLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelREGINA ALMEIDA
Data da Resolução03 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: I.1-«I... Ldª», com sede ..., intentou em 12.11.07 acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra «L... Ldª», com sede ....

Alegou para tanto, e em síntese, que contratou a Ré para que esta procedesse ao transporte marítimo de telhas autoportantes de Lisboa para o Funchal, entregando-lhe, nos dias 30-09-2005 e 04-11-2005, em Santa Apolónia, diversas telhas em perfeito estado e sem qualquer vício para serem transportadas por mar para o Funchal e aí serem entregues à empresa «L..., S.A.», com quem a A. tinha acordado o fornecimento de tal material.

Posteriormente veio a ter conhecimento que o frete foi realizado em 13-11-2005 e que as telhas chegaram danificadas ao destino e sem qualquer possibilidade de recuperação. Salientou que pediu esclarecimentos à Ré e que esta a informou que o navio transportador deparou-se com uma tempestade durante a viagem e que os atados da telha tinham tombado em consequência do mau tempo. O valor das telhas ascendia ao montante global de 84.047,55 €, sendo que a sociedade que ia recebê-las, ao verificar que estavam danificadas, recusou-se a ficar com elas e a pagar o respectivo preço. A A. , perante tal situação e devido às boas relações comerciais com a «L..., S.A.», prontamente se disponibilizou para substituir as telhas danificadas às suas custas, o que fez. Entretanto, a Ré exigiu da A. o pagamento do serviço que efectuou deficientemente, no montante de 4.945,29 €. Ademais, a Autora teve de suportar a estadia portuária das tenhas danificadas e recusadas, que a Ré lhe debitou no valor de 2.867,94 €, bem como o transporte da carga do cais para os estaleiros da compradora, no montante de 1.785,75 €, e no frete e despesas conexas do transporte das novas telhas, na importância de 10.547,53 €.

Com este fundamento pede a condenação da R. ao pagamento da quantia de 99.248,77 € acrescida dos juros de mora vincendos à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

I.2-Citada, a R. «L...» contestou e reconveio. Excepcionou a prescrição do direito da A. , atento o disposto no art. 16.º do DL n.º 255/99, de 07-07, dado que actuou como transitária, e não como transportadora – actividade que, aliás, não pode exercer. Por impugnação alegou que os atados de telhas não lhe foram entregues para que procedesse à sua carga no navio e transporte, tendo antes sido entregues ao armador e ao operador portuário por este contratado. Precisou que a obrigação por si assumida a solicitação da A. foi a de efectuar as operações necessárias para que a mercadoria – 4 atados de chapas metálicas – chegasse ao seu destino no Funchal. Asseverou que por diversas vezes alertou a A. para a necessidade de reforçar os suportes da carga de modo a que os mesmos possuíssem a resistência necessária para aguentar os esforços provocados pelo transporte marítimo, não tendo a Autora actuado em conformidade, e os os atados de telhas ficaram danificados quer em consequência de imprevista tempestade com que o navio se deparou, quer em consequência do deficiente acondicionamento da carga nos cavaletes fornecidos pela A., sendo que os mesmos foram transportados por conta e risco da mesma. Em todo o caso, sempre a sua responsabilidade estaria limitada nos termos do art. 15.º do DL n.º 255/99.

Requereu a intervenção principal provocada da seguradora para a qual transferiu a sua responsabilidade civil enquanto empresa transitária, a saber, a «L... Companhia de Seguros, S.A.».

Reconvindo, alegou que prestou à Autora diversos serviços de transitário, no montante global de 58.490, 83 €, os quais não foram pagos, ascendendo os juros de mora vencidos à taxa legal à quantia 12.999,88 €, pedindo, assim, a condenação da A. A pagar-lhe a quantia total de 71.489,65 €.

Autora replicou que celebrou com a Ré um contrato de transporte, sendo que o facto de esta ter contratado um terceiro não fez com que se desvinculasse do mesmo (art. 367.° do CCom), pelo que o prazo de prescrição a considerar é o de 20 anos (art. 309.° do CC), acrescentando que a Ré figura como carregadora no conhecimento de embarque, razão pela qual se responsabilizou pela integridade da carga confiada pela Autora. Salientou que o pedido reconvencional foi deduzido de forma ilegal, pois é inferior ao do pedido da Autora, mas em todo o caso, sempre estará extinto por compensação.

I.3-Indeferido o requerido chamamento, e dispensada a realização da audiência preliminar, procedeu-se ao saneamento dos autos, tendo sido parcialmente admitido o pedido reconvencional relativamente às facturas do transporte dos autos, nos valores de 4.945,29 € e 2.867,94 €.

Relegou-se para final o conhecimento da excepção da prescrição, e seleccionou-se a matéria de facto assente e controvertida.

A Ré recorreu do despacho saneador na parte em que o mesmo indeferiu parcialmente o pedido reconvencional, recurso admitido como sendo de agravo, com subida diferida, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

I.4-Alegando no recurso de agravo, a ré conclui assim: 1ª-O que está em causa nos autos é a relação comercial existente entre as partes, isto é, um contrato de prestação de serviços de expedição e recepção de mercadorias da Recorrida; 2ª-No âmbito da relação comercial estabelecida entre as partes, a Recorrida intentou a acção de condenação tendo em vista o ressarcimento dos prejuízos, por si sofridos, em consequência do transporte de atados de telhas autoportantes e a Recorrente, também no âmbito da relação comercial estabelecida entre as partes, deduziu pedido reconvencional, porquanto a Recorrida não liquidou diversas facturas respeitantes a transportes marítimos intermediados pela Recorrente, os quais sempre foram mencionados pela Recorrida na sua petição inicial; 3ª-No caso em apreço, a causa de pedir é toda a relação comercial existente entre as partes. É, pois, o contrato de prestação de serviços de expedição e recepção de mercadorias; 4ª-É na decorrência do contrato de prestação de serviços que ocorrem determinados danos na carga transportada, pelo que, a base de toda a acção intentada pela Recorrida funda-se no contrato e na relação comercial existente entre as partes; 5ª-O pedido reconvencional trata-se de uma contra pretensão, uma nova acção dentro do mesmo processo, a reconvenção, embora com um pedido autónomo, deve ter uma certa compatibilidade com a causa de pedir do Autor; 6ª-Foi a Recorrida que invocou toda a relação comercial existente entre as partes, logo a Recorrente considera que o pedido reconvencional deduzido é compatível com a causa de pedir da Recorrida, pelo que deverá ser totalmente admissível; 7ª-O requisito substantivo da admissibilidade da reconvenção, da alínea a) do nº 2 do artigo 274º do C.P.C, implica que o pedido formulado em reconvenção resulte naturalmente da causa de pedir do autor ou seja normal consequência do facto jurídico que suporta a defesa, que tem o propósito de obter uma modificação benigna ou extinção do pedido do autor; 8ª-O pedido reconvencional é manifestamente admissível; 9ª-O Tribunal a quo ao não admitir o presente pedido reconvencional estará a violar princípios basilares do processo civil, nomeadamente a economia processual e a segurança jurídica, pelo que deverá o presente recurso ser procedente e, consequentemente, ser revogada a decisão, que indeferiu parcialmente o pedido reconvencional, constante no Despacho Saneador de que se recorre, sendo ordenada a sua substituição por decisão que julgue o pedido reconvencional, deduzido pela ora Recorrente, totalmente admissível; 10ª-Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e a decisão que indeferiu parcialmente o pedido reconvencional constante no despacho saneador de que se recorre, revogada e, consequentemente, ser ordenada a sua substituição por decisão que julgue o pedido reconvencional totalmente admissível.

I.5-O julgamento efectuou-se em duas sessões com gravação da prova, e por último proferiu-se sentença datada de 25.02.2015, a julgar a acção procedente condenando-se a ré no pedido, e absolvendo-se a autora do pedido reconvencional admitido.

Fixou-se à causa o valor de 170.738,42 €.

I.6-Apelou a ré da sentença.

Alegando, conclui deste modo: 1ª-A sentença recorrida enferma de uma interpretação errada da prova produzida nos autos e respetiva valoração jurídica; 2ª-Da prova produzida em audiência e pré-existente nos autos não pode resultar provado que a Recorrente estabeleceu com a Recorrida que aquela procederia à carga no navio e ao seu transporte de Lisboa para o Funchal – facto k); 3ª-Não pode também ficar provado que a Recorrente descarregaria ainda os produtos dos camiões da Autora e carregá-los-ia no navio que efetuasse o transporte de Lisboa para o Funchal – facto l); 4ª-Nem pode resultar provado que a Recorrida entregou à Recorrente tais telhas para esta última mandar proceder à sua carga num navio e efetuar o frete para o Funchal – facto n); 5ª-As testemunhas B..., M..., M... e O..., confirmaram ao Tribunal que a Recorrente não efetua o transporte de mercadorias, é um mero intermediário, entre os diferentes operadores intervenientes na deslocação das mercadorias; 6ª-As mesmas testemunhas confirmaram também que a Recorrente não carrega nem descarrega mercadoria dos camiões para os navios e vice-versa, confirmando que essa tarefa é competência das empresas de estiva e desestiva, licenciadas para esse efeito; 7ª-Também a testemunha J... confirmou ao Tribunal que a Recorrente era apenas um intermediário da Recorrida para o transporte de mercadorias, confirmando ainda que é o armador quem carrega o navio; 8ª-Desta forma impõe-se a alteração da resposta dada aos pontos k), l) e n) dos factos dados como provados, devendo os factos ser julgados como NÃO PROVADOS; 9ª-Relativamente ao facto provado q), igualmente entende a ora Recorrida que não podia ter ficado provado que “A Ré não informou a Autora quando e como foram as mesmas carregadas no...

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