Acórdão nº 7030/14.3T8LRS.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelCRISTINA COELHO
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

RELATÓRIO: J. A. P. M.

intentou contra José C. V.

, acção declarativa com processo comum, pedindo que o R. seja condenado a proceder a obras de reparação do locado com a consequente substituição do telhado.

A fundamentar o peticionado, alegou, em síntese: O A. é arrendatário do R., sem contrato, em virtude do locado – prédio sito na Rua..., nº..., Lousa – ter sido dado de arrendamento a seu pai pelo pai do R., tendo o A. ficado a viver no locado após a morte do pai.

O R. nunca procedeu a qualquer obra de beneficiação, vindo-se o seu exterior a degradar, por ser imóvel centenário.

No início de 2013, após várias reclamações quanto ao estado do telhado e das infiltrações existentes, e sem que o senhorio tomasse qualquer tipo de providência, o A. apresentou pedido de vistoria na CM de Loures, a qual procedeu à referida vistoria em 4.1.2013, verificando que o imóvel apresentava um avançado estado de degradação a nível da cobertura, notificando o proprietário para proceder à reparação das anomalias, no prazo de 90 dias, o que este não fez, tendo o A. sido, então, notificado para recorrer aos meios legais para resolver a situação.

O estado em que se encontra o telhado coloca em risco a integridade física do A., que pernoita em casa da sua irmã sempre que o tempo piora.

O A. não tem outra habitação, nem meios financeiros para conseguir arrendar outro imóvel.

O R. sabe em que estado se encontra o imóvel.

Regularmente citado, o R.

contestou, por excepção (invocando abuso de direito do A.) e por impugnação, e termina propugnando pela procedência da excepção inominada, com absolvição do R. do pedido.

O A.

respondeu à matéria da excepção, propugnando pela improcedência da excepção alegada.

Após demais processado, foi proferida sentença que julgou improcedente a excepção de abuso de direito e procedente a acção, e, em consequência, condenou o R. a proceder a obras de substituição do telhado do imóvel sito na Rua..., nº..., Lousa.

Não se conformando com a decisão, dela apelou o R., tendo no final das respectivas alegações formulado as seguintes conclusões, que se reproduzem: 1ª-O Apelante aceitou no processo, que o locado necessitava de obras.

  1. -A douta sentença recorrida, na fundamentação de facto, nada refere sobre a alegada incapacidade financeira do Réu para executar tais obras, não só por não ter herdado dinheiro, como também por não o ter seu.

  2. -Há desigualdade de tratamento na matéria alegada pelas partes quanto às respectivas situações financeiras, na medida em que apenas a do A. foi valorada, verificando-se omissão de pronúncia quanto a facto relevante para a decisão da causa.

  3. -O valor de rendas pagas pelo A. e seus pais desde o início do arrendamento, há cerca de 55 anos, é de € 5.749,50.

  4. -O valor do IMI pago pelo Réu relativamente ao ano de 2013, foi de € 99,72 e o valor de rendas recebidas do A. no mesmo ano, foi de € 110,76.

  5. -O valor orçado para as obras de substituição do telhado ascende a € 20.910,00, incluindo IVA à taxa de 23%.

  6. -O valor da renda mensal paga pelo A., ora Apelado, é de € 9,23 (nove euros e vinte e três cêntimos).

  7. -O valor orçado para as obras corresponde a 2265 ( dois mil, duzentos e sessenta e cinco) meses de renda, ou seja, a mais de 188 (cento e oitenta e oito ) anos.

  8. -As rendas pagas até ao momento - € 5.749,50 – pelo A. e respectivos progenitores deram, basicamente, para liquidar o IMI em vigor e os impostos que o precederam, pelo que o senhorio pouco ou nenhum rendimento extraiu do imóvel.

  9. -O valor recebido em 55 anos de arrendamento constitui pouco mais de uma quarta parte do valor orçado para as obras de substituição do telhado.

  10. -O critério económico ou de interesse patrimonial do Réu ( senhorio há pouco mais de dois anos ) que é referido na sentença recorrida, não pondera que o Réu não extraiu qualquer vantagem económico-financeira por deter um imóvel que lhe rende anualmente apenas o equivalente ao que paga de imposto, também anualmente.

  11. -Nos arrendamentos é suposto ( embora no presente caso isso não aconteça ) o locador obter rendimentos que lhe permitam a rentabilização da sua propriedade, extraindo ganhos que paguem a cedência do gozo desta e que lhe permitam custear encargos fiscais e efectuar obras de reparação ou conservação da mesma, quando delas careça.

  12. -Os valores e números referidos nas anteriores conclusões, embora mencionados na própria sentença recorrida, não foram levados em consideração na decisão, numa perspectiva de exigível justiça, equilíbrio e proporcionalidade.

  13. -É irrelevante a questão da integridade física do A., quando o que se mostra em causa é a desproporção e disparidade do invocado pelo Apelado e acolhido na sentença recorrida e o constante da reacção do Apelante, que legitimamente se socorreu da figura do abuso de direito.

  14. -Não faz sentido proceder à substituição integral de um telhado, com os custos indicados nos autos, num prédio centenário, sem ter em consideração que haverá sempre que mexer no forro da casa e nas paredes interiores e exteriores que o suportam, o que significará, certamente, um acréscimo avultado nos referidos custos.

  15. -O valor orçamentado para a substituição do telhado em causa é também pouco inferior ao valor patrimonial do imóvel, o que também evidencia a já indicada discrepância dos valores da renda e das obras.

  16. -Embora o valor patrimonial do prédio resulte de avaliação para efeitos de liquidação do imposto, não andará longe do respectivo valor de mercado, sendo certo que embora posto à venda, a procura não existe, nomeadamente, por se saber que o imóvel tem um inquilino com 72 anos de idade.

  17. -Das conclusões anteriores resultam as razões que o Apelante entende fundamentarem o presente recurso, aliás já apontadas na contestação da acção, sustentadoras da invocada excepção de abuso de direito, julgada improcedente.

  18. -Concluiu a douta sentença recorrida, quanto ao abuso de direito invocado que, “ no actual quadro legislativo impende expressamente sobre o proprietário e senhorio o dever de realização de obras, especialmente quando o locado se encontre em mau estado de conservação e, por via disso, só se pode concluir pela diminuição considerável do espaço de aplicação do instituto do abuso de direito neste âmbito, excluindo-a em situações como a presente, em que se confronta o direito à integridade física do arrendatário com interesses de natureza patrimonial do senhorio “.

  19. -Verificam-se nos autos os...

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