Acórdão nº 2631/10.1TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelORLANDO NASCIMENTO
Data da Resolução17 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. -RELATÓRIO: A (1) Administração do Condomínio do Lote 6, A (2) Administração do Condomínio do Lote 7, ambos da Av. Cidade de ... e a (3) Administração do Condomínio dos Lotes 5 e 8 do Cruzamento da Av. Estados ... ... e Av. Central de ..., todos em Lisboa, propuseram contra: Jardins de ... de ..., Empreendimentos Imobiliários, SA, esta ação declarativa de condenação, ordinária, pedindo a condenação desta a executar os trabalhos necessários à eliminação dos defeitos de construção dos respetivos prédios, com a fixação de sanção pecuniária compulsória não inferior a € 250 para cumprimento da sentença, desde o trânsito em julgado, e subsidiariamente, para o caso de o tribunal considerar existir incumprimento definitivo, a condenação da R a entregar aos AA a quantia de € 150.000,00, acrescida de juros de mora desde a citação, a título de indemnização destinada a custear os trabalhos necessários à reparação dos defeitos por terceiro, devendo a taxa ser acrescida de 5% desde o trânsito em julgado da sentença, nos termos do art.º 829.º-A, do C. Civil, com fundamento, em síntese, em que são administradoras dos prédios urbanos em causa, constituídos em regime de propriedade horizontal, os quais foram construídos, promovidos e vendidos pela R, e que padecem de defeitos de construção, por esta não ter sido realizada com zelo, quer no concernente às técnicas, quer no concernente aos materiais utilizados, que foram denunciados à R e que esta não reparou, como estava obrigada a fazer.

    Citada, contestou a R, por exceção e por impugnação, dizendo que a construção dos edifícios em causa foi feita por uma outra sociedade, a quem adquiriu, para revenda, parte das fracções a construir nos lotes, pelo que os AA e ela R são parte ilegítima, que em 25/11/2009 os AA lhe enviaram uma missiva referente a alegados vícios de construção e propuseram esta ação em 17 de Novembro de 2010, pelo que caducou o respectivo direito quanto às frações vendidas até 25/11/2004, pedindo a procedência da exceção da ilegitimidade e a absolvição da instância, a procedência da exceção da caducidade e a absolvição do pedido e a improcedência da ação e a absolvição do pedido.

    Na réplica os AA pediram a condenação da ré como litigante de má-fé em multa e indemnização não inferior a € 4.000,00 com fundamento, em síntese, em que a mesma nega a qualidade de construtora, imputando a construção a um terceiro que não identifica, com isso entorpecendo a ação da justiça e impedindo a descoberta da verdade material.

    Foi proferido despacho saneador julgando improcedente a exceção da ilegitimidade activa e passiva, relegando para final o conhecimento da exceção da caducidade e organizando os fatos assentes e base instrutória.

    Após a realização de exame pericial, cujo relatório se encontra a fls. 2027 a 2069, teve lugar audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença, julgando improcedente a exceção da caducidade, julgando a ação procedente e condenando a R à eliminação dos defeitos que identifica, mais a condenando como litigante de má-fé, no pagamento de 20 (vinte) UC de multa e no pagamento de indemnização às AA, relativa a despesas com mandatária, no valor de € 1.500,00.

    Inconformada com essa decisão, a R dela interpôs recurso, recebido como apelação, pedindo a sua revogação e a improcedência da ação, formulando as seguintes conclusões: 1.No que concerne à decisão sobre a matéria de facto, a Recorrente discorda do julgamento que o Tribunal a quo efetuou quanto aos factos constantes nos pontos 1.º a 6.º e 100.º a 103.º da resposta ao quesitos da base instrutória e dada como matéria de facto assente, considerando a aqui Ré/Recorrente que ao contrário do decidido pelo julgador, a factualidade alegada nos mesmos deveria ter sido dada como não provada.

  2. O Tribunal a quo, deu como provado, em resposta ao quesito 1.º da base instrutória, que: “A Ré foi a promotora do empreendimento em que se situam os lotes das Autoras”.

  3. De facto, nada nos autos permite concluir – como concluiu o Tribunal recorrido – quanto à resposta ao quesito 1.º da Base Instrutória, que a Ré foi a promotora do empreendimento em causa nos autos, tendo-se baseado no depoimento da testemunha ... ... que, com melhor explanado supra, não tinha conhecimento directo dos factos. O facto de ter sido junto aos autos a fls 363 um “panfleto publicitário” que refere que o Promotor dos empreendimentos em causa foi o Grupo Obras... não pode, juridicamente, determinar que a Ré foi a promotora dos referidos imóveis, tendo em conta, nomeadamente, a que documentos camarários provam que efectivamente não foi a Ré promotora dos edifícios.

  4. O Tribunal a quo dá como provado o quesito 1.º tendo em conta os depoimentos da testemunha ... ..., cujos excertos foram acima reproduzidos, desconsiderando todos os documentos (licenças de construção) juntos pela Ré em requerimento de 24 de Novembro de 2011, quer os documentos juntos pela Câmara Municipal de Lisboa, após oficio do próprio Tribunal que notificou a referida edilidade “para com a maior urgência, dado tratar-se de processo com julgamento a decorrer, para informar nos autos, certificando, relativamente aos lote 6.º, 7.º, 5.º e 8.º, quem foram as entidades, a quem foram autorizadas e emitidas licenças de construção, com indicação de todas elas, com a especificação das datas de emissão das licenças, quer das estruturas quer das especialidades, com a indicação, se for possível, das entidades promotora dos edifícios”.

  5. Ao referido ofício veio a Câmara Municipal de Lisboa remeter ao Tribunal a Quo comprovativo dos alvarás emitidos.

  6. Vem ainda certificar que: i) a entidade ... ..., Hipermercados, .... foi a promotora da construção dos edifícios em causa; ii) que relativamente ao lote 5, 6, 7 e 8 foram emitidos os competentes alvarás de construção e utilização em nome de “... ... –Hipermercados, ....

  7. Acontece que o depoimento da testemunha ... ... além de contraditório, no que respeita à resposta deste específico quesito, demonstra confusão e, consequentemente contradição, de conceitos jurídicos distintos, como seja o de “dona de obra, vendedora, promotora, “promotora comercial”. Contudo, acaba por concluindo respondendo à pergunta de quem foi o promotor dos empreendimentos, que a aqui Recorrente vendeu os referidos empreendimentos.

  8. Já no que respeita ao depoimento prestada pela testemunha ... Carvalho em nenhuma parte do mesmo é sequer referida que a Ré foi a promotora dos empreendimentos em causa, remetendo-se para o efeito para os excertos supra transcritos.

  9. Pelo que, salvo o devido respeito, considera a Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter dado como não provado a resposta ao quesito 1.º, quando decorre claramente da prova documental junta aos autos, emitida por entidade idónea para o efeito (Câmara Municipal de Lisboa) que a Ré não foi a promotora dos empreendimentos em causa, sendo que o Tribunal baseia-se apenas num depoimento de uma testemunha que não tem conhecimento directo dos factos, como a mesma acaba por admitir.

  10. Segundo as informações escritas providenciadas pela Câmara Municipal de Lisboa demonstrado se encontra que a Ré/Recorrente Jardins ... de ... – Empreendimentos Imobiliários, ... não construiu os referidos empreendimento, nem mandatou qualquer empresa para fazer a referida construção – remete-se para o referido supra. Por outro lado, importa atender, a este respeito, aos depoimentos prestados pelas testemunhas ... ... e ... Carvalho que serviram de base à decisão do Douto Tribunal a quo, que desconsiderou a prova documental junta no processo e emitida pela Câmara Municipal de Lisboa.

  11. A este propósito, recorde-se que embora tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova pelo Tribunal, plasmado no artigo 607.º, n.º5 do CPC, haverá que atender que este cede perante situações de prova legal que fundamentalmente se verifiquem nos casos de prova por certos documentos particulares, especificamente haverá que atender ao artigo 394.º1 do Código Civil.

  12. A este propósito, importa recordar o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 26.11.2007 (CJ, 2007): “A razão de ser da proibição da prova testemunhal contra ou praeter scriptum, operada pelo artigo 394.º, n.º1, em detrimento do princípio da livre admissibilidade dos meios de prova aflorado no artigo 655.º, n.º1 do CPC, prende-se com o objectivo de evitar que prevaleça a prova testemunhal ou por presunção judicial (artigo 351.º do CC), meios probatórios de reconhecida fabilidade, sobre a prova documental que, por natureza, é mais segura”.

  13. Quanto ao depoimento de ... ... considera o Tribunal a quo este depoimento, sendo certo que a testemunha claramente referiu que não tinha conhecimento directo dos factos, “uma vez que não acompanhava os processos de licenciamento”, acabando por concluir que a sociedade pudesse ter construído os referidos edifícios.

  14. Refira-se, aliás (e já debruçando-nos sobre a resposta aos quesitos 3.º, 4.º, 5.º e 6.º) que a testemunha ... ... não tem conhecimento directo dos factos, sendo inclusive um testemunho de “ouvi dizer”.

  15. Aliás, e especificamente quanto à resposta ao quesito 4.º, 5º e 6.º. da base instrutória o depoimento da referida testemunha encontra-se em contradição com os depoimentos prestados pelas testemunhas Nuno ..., Ana Paula ..., Hugo ..., Francisco ..., José Augusto ....

  16. Por outro lado, importa atender que se encontra provado nos autos, por documentos autênticos (Escrituras Públicas) que a construção dos empreendimentos em causa se encontrava concluída (vide ponto “L” a “TT” da Matéria assente da Base Instrutória).

  17. Pelo que, salvo o devido respeito, considera a Recorrente que o Tribunal a Quo deveria ter dado como não provado a resposta ao quesito 2.º, quando decorre claramente da prova documental junta aos autos (dando por reproduzidas igualmente às considerações tecidas relativamente à livre apreciação da prova e limitações da...

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