Acórdão nº 8472/03.5TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelROSA RIBEIRO COELHO
Data da Resolução17 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: I-K GROUP B. V., sociedade comercial holandesa, intentou a presente ação declarativa contra: 1º-JOAQUIM M.R.R., 2ºs.-NUNO MIGUEL A.A. da B.B. e mulher, MARIA TERESA S. R.L.L. da B.B., 3ª-MARIA EDUARDA B. de B.C., 4°-JOÃO MANUEL B.P., 5ºs.-MÁRIO RUI B.R.J. de R. e mulher, CÉLIA S.S.B. de R., 6º-NUNO DE M.R.Z., pedindo que: a)Sejam declaradas nulas e ineficazes relativamente à Autora a divisão da quota da titularidade da mesma no capital social da "Carré & R." e as cessões das quotas resultantes dessa divisão, efetuadas pelo 6.° Réu, Nuno Z., na escritura pública outorgada no 5.º Cartório Notarial de Lisboa, em 27 de dezembro de 2000, com as inerentes consequências legais, designadamente, a entrega à Autora, pelos 1.°, 2.°s, 3.ª, 4.° e 5.ºs Réus, das ações representativas do capital social da "Carré & R." correspondentes ao valor da quota que a Autora detinha naquele capital, uma vez que os referidos atos foram praticados pelo 6.° Réu, Nuno Z., em nome da Autora, sem os necessários poderes de representação; b)Sejam os Réus condenados a, solidariamente, pagar à Autora, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos, a quantia de € 1.175.022,90 (um milhão cento e setenta e cinco mil e vinte e dois euros e noventa cêntimos) (€ 997.496,03 + € 177.526,96 de juros que integram a referida indemnização), bem como os juros de mora vincendos até integral pagamento, sobre a quantia de € 1.175.022,90, à taxa legal supletiva, contados desde a citação dos Réus; c)Subsidiariamente e para o caso de não procederem os pedidos anteriores, por se considerar que o 6° Réu, Nuno Z., praticou os atos referidos na escritura pública de 27 de dezembro de 2000 munido dos necessários poderes para o efeito, sejam os Réus, nos termos do disposto nos artigos 77° a 84° do presente articulado, condenados a, solidariamente, pagar à Autora a quantia de 1.175.022,90 (um milhão cento e setenta e cinco mil e vinte e dois euros noventa cêntimos) (€ 997.496,03 + € 177.526,96 de juros legais à presente data), bem como os juros de mora vincendos até integral pagamento, sobre a quantia de € 997.496,03, à taxa legal supletiva, contados desde a citação dos Réus; d)Sejam os Réus condenados a, solidariamente, pagar à Autora uma quantia não inferior a € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), relativa aos honorários dos Advogados a que a Autora teve de recorrer para defesa dos seus direitos e às despesas suportadas e a suportar pela Autora com a presente demanda.

Alegou, em síntese nossa, que o 6.º R., em uso abusivo de uma procuração que a A. lhe havia outorgado para outro efeito, dividiu em cinco a quota da A. na sociedade Carré & R., Informática, Lda. e cedeu-as aos demais RR., que delas se apropriaram.

Houve contestação de todos os réus, réplica e tréplica.

Foi realizada, já em 23.01.2014, audiência prévia na qual se julgaram improcedentes as exceções de ilegitimidade passiva suscitadas pelos réus Mário e Célia R., se selecionaram os factos já tidos como assentes e se fixaram os temas de prova.

Após audiência de julgamento, foi proferida sentença que, julgando a ação parcialmente procedente, decidiu: -declarar ineficazes relativamente à autora a divisão da quota da sua titularidade no capital social da Carré & R., Informática, S.A., bem como as cessões das quotas resultantes dessa divisão, efetuadas pelo 6.° réu, na escritura pública outorgada no 5.º Cartório Notarial de Lisboa, em 27 de dezembro de 2000, condenando os 1.°, 2.°, 3ª e 4.° réus a, no âmbito da liquidação da Carré & R., Informática, S.A., em curso, serem substituídos pela Autora na titularidade das ações representativas do capital social da «Carré & R., Informática, S.A. – Em Liquidação», correspondentes ao valor da quota que a Autora detinha naquele capital; -absolver os 1.º, 2.º, 3.ª e 4.º réus do demais pedido; -absolver os réus Maria Teresa B., Mário R. e Célia R. de todos os pedidos contra eles formulados. Apelou a autora, tendo apresentado alegações onde, pedindo a alteração da sentença no sentido da total procedência da ação, formulou as prolixas[1] conclusões que passamos a transcrever: I.

Relativamente aos temas da prova 1, 3, 4, e 6, com o devido respeito, que é muito, a Meritíssima Juiz “a quo” andou mal ao dar como não provados os mesmos.

II.

De facto, ficou provado, no entendimento da Meritíssima Juiz “a quo”, que o 6.º Recorrido Nuno Z. não possuía qualquer título que o legitimasse a proceder àquela divisão da quota da Recorrente na “Carré & R.” e à posterior cessão das quotas resultantes dessa divisão.

III.

A própria Meritíssima Juiz “a quo” concluiu que resulta claro e inequívoco do próprio texto da procuração que o Recorrido Nuno Z. poderia utilizar a procuração em análise nestes autos para realizar a cessão de quotas representativas do capital social da “Carré & R.”, da “Austin Commercial Enterprises Limited” para a Recorrente. IV.

Mais, refere o Tribunal “a quo” (e bem, diga-se) que basta a leitura da procuração em causa para se constatar que, tanto o Recorrido Nuno Z. (que ainda para mais é Advogado), como os restantes Recorridos, tinham perfeita consciência de que aquela procuração não atribuía poderes ao primeiro para proceder à venda da quota da Recorrente para os mesmos Recorridos.

V.

Ficou, pois, amplamente provado (também no entendimento da Meritíssima Juiz “a quo”) que o Recorrido Nuno Z. utilizou abusiva e ilegalmente aquela procuração.

VI.

Como pôde então o Tribunal “a quo” concluir que o Recorrido Nuno Z. fê-lo por conta da Recorrente, no interesse desta, nos termos em que esta o manifestou na assembleia de 1 de dezembro, com o conhecimento da Recorrente e até de acordo com a legítima interpretação que fez da vontade da mesma? VII.

É, no mínimo, estranho que um Advogado (o 6.º Recorrido Nuno Z.), sabendo que não existia uma procuração que lhe desse poderes para praticar os atos que praticou, o tenha feito sem solicitar a outorga de uma procuração à Recorrente.

VIII.

É da própria falta da prática de determinados atos por parte da Recorrente que devem ser retiradas as ilações que se impõem, a saber: (i) da falta de outorga, por parte da Recorrente, de uma procuração que atribuísse poderes ao 6.º Recorrido para proceder à divisão da quota da Recorrente na “Carré & R.” e à posterior cessão das quotas resultantes dessa divisão; (ii) da falta de ratificação, por parte da Recorrente, dessas divisão e posterior cessão efetuadas através da escritura pública de 27 de dezembro de 2000; e (iii) da recusa de assinatura, por parte da Recorrente, do contrato-promessa que consta de fls. 69 a 77 dos autos.

IX.

Resultou da prova documental que a Recorrente nunca autorizou ou consentiu a divisão e a cessão de quotas efetuada pelo 6.º Recorrido a favor dos demais Recorridos, sendo que só muito mais tarde teve conhecimento da concretização desta transmissão não autorizada.

X.

Ficou por demais evidente que a Recorrente não teve noção de que a quota da sua titularidade havia sido dividida e cedida através da escritura pública de 27 de dezembro de 2000, até porque continuou a incluir a referência a essa quota no seu balanço datado de 31 de dezembro de 2000, com a convicção de que ainda era detentora de uma quota no capital social da “Carré & R.”.

XI.

Conforme considerou provado o Tribunal “a quo” existiram negociações entre a Recorrente e o 1.º Recorrido Joaquim R., para a cessão a este último da quota de que a primeira era titular na “Carré & R.”. No entanto, essas divisão e cessão, como é óbvio, pressupunham, necessariamente, a prévia conclusão das referidas negociações em curso.

XII.

Resulta claro dos documentos juntos aos presentes autos que a Recorrente pretendia que se formalizassem as condições acordadas entre as partes.

XIII.

Ficou claro que, não obstante as negociações que decorreram, as mesmas nunca chegaram a bom termo, não tendo a Recorrente autorizado a divisão e a cessão da quota de que era titular no capital social da “Carré & R.”, tendo a referida escritura de 27 de dezembro de 2000 sido outorgada com o total desconhecimento da Recorrente e à sua total revelia.

XIV.

Conforme considerou o próprio Tribunal “a quo”, havia uma necessidade urgente de efetuar a cessão de quota da Recorrente para o 1.º Recorrido Joaquim R. até ao final do ano de 2000, por uma questão fiscal, porque, de outra forma, o indicado Recorrido iria ser extremamente Z.lizado quando procedesse à posterior venda das ações, a título de mais valias.

XV.

Acontece que, por um lado, as indicadas negociações ainda não haviam terminado e, por outro lado, não haviam sido concedidos, pela Recorrente, poderes para efetuar essa cessão de quota, o que iria inviabilizar que o “negócio” se concretizasse até ao final do ano.

XVI.

Foi, pois, esta a razão pela qual o 6.º Recorrido Nuno Z. se aproveitou, dolosamente, diga-se, do facto de o texto da procuração conter a palavra “ceder” e utilizou ilicitamente a mesma para praticar atos que sabia não estar autorizado a realizar, ou seja, a divisão da quota da Recorrente no capital social da “Carré & R.” e a posterior cessão das quotas daí resultantes a favor dos 1.º, 2.º, 3.ª, 4.º e 5.º Recorridos.

XVII.

O 6.º Recorrido Nuno Z. não estava, assim, autorizado a praticar os atos que praticou, em nome e representação da Recorrente, na indicada escritura pública, sendo do conhecimento dos 1.º, 2.º, 3.ª, 4.º e 5.º Recorridos que o 6.º Recorrido Nuno Z. não tinha poderes para lhes transmitir as quotas resultantes da divisão da quota de que a Recorrente era titular no capital social da “Carré & R.”, também conforme reconhece o Tribunal “a quo”.

XVIII.

Por outro lado, os Recorridos, em conluio, prestaram falsas declarações na mencionada escritura, tendo o 6.º Recorrido Nuno Z. declarado que, cito, “(...) as quotas são cedidas por preços iguais aos respectivos valores nominais, que a cedente já recebeu dos cessionários (...)”, e tendo os 1.º, 2.º, 3.ª, 4.º e 5.º Recorridos...

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