Acórdão nº 386/16.5GCMFR.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRA
Data da Resolução07 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, em conferência, na 3ª Secção Criminal, deste Tribunal.

I–Relatório: Em processo comum, com intervenção do Tribunal colectivo, os arguidos: – ...

, casado, estivador reformado, nascido a 14/11/1955, em Alcântara, Lisboa, filho de ... e de ... de ......, residente na Rua ....

– ......

, casada, empregada doméstica, nascida a 22/02/1958, em Alcântara, Lisboa, filha de ...., residente na Rua ....., Foram condenados pela prática, em co-autoria e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento agravado, p. e p. pelo artº 256º/ 1- b) e e), e nº 3, por referência ao artº 255º/ a), ambos do Código Penal (CP), nas penas de um ano e três meses de prisão o José e de nove meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano, a Maria do Carmo.

Os arguidos vinham também acusados pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo artº 204º/1- b), do CP.

Contudo, no início do julgamento, e atenta a declaração prestada pelo ofendido ....

de que se encontrava ressarcido de todos os prejuízos que havia sofrido no âmbito dos factos que deram origem à acusação, nos presentes autos, dando o seu acordo à extinção da responsabilidade criminal dos arguidos nessa parte e tendo os arguidos dado igualmente o seu acordo, foi declarada extinta a responsabilidade criminal dos mesmos concernente ao crime de furto, tendo o julgamento prosseguido para apreciação da sua responsabilidade criminal relativa ao crime de falsificação.

*** Os arguidos recorreram, concluindo as alegações nos termos que se transcrevem: « I.

–Ora, considerando que a causa submetida a julgamento era um crime cuja moldura penal é igual a 5 anos, os arguidos ora recorrentes, entendem que ao abrigo do disposto no artigo 16° n° 1 al. b) do CPP, o tribunal competente para o julgamento é o tribunal singular e não o tribunal coletivo.

II.

–Aliás, nos termos do disposto no artigo 119° al. a) do CPP trata-se de uma nulidade insanável.

III.

–Nulidade essa que deverá por V. Exas. ser assim declarada, remetendo-se os autos para o Tribunal competente para apreciação do mérito da causa nos termos do disposto no artigo 33° n° 1 do CPP.

IV.

–Nos termos do artigo 374° n° 1 al d) e n° 2 do CPP, a sentença deve conter a indicação sumária das conclusões contidas na contestação e bem assim a enumeração dos factos provados e não provados constantes da acusação e da defesa (cf. artigo 368° n°2 do CPP), que tenham interesse para a decisão da causa, além de outros que resultarem da discussão da mesma, sob pena de nulidade nos termos do disposto no artigo 379° n° 1 e 2 do CPP.

V.

–Ora, na sua contestação os arguidos alegaram factos relevantes para a boa decisão da causa, conforme se motivou e para aí integralmente se remete, que deviam obrigatoriamente constar dos factos provados e não provados, posto que eram factos não instrumentais e atinentes ao thema decidedum, e que o tribunal recorrido não fez.

VI.

–Concluiu-se assim face aos factos acima descritos que estaríamos, salvo melhor opinião, face a um "falso grosseiro", insusceptível de passarem despercebidos aos cidadãos em geral e às autoridades públicas em particular.

VII.

–Mais se alegou, configurarem-se tais factos a uma tentativa impossível, e como tal não punível, nos termos do art.°23° n° 2° do CPP (Cfr. Art.° 4° a 7°, 15° a 17° da sua contestação).

VIII.

–Se é certo que o douto acórdão dá como não provado o elemento subjetivo do tipo crime no sentido de não se ter provado que a arguida desconhecia que circulava numa viatura com o dito autocolante na matrícula traseira, também não é menos certo que não consta como provado ou não provado tudo aquilo que acima se alegou, nomeadamente os factos constantes na sua contestação por forma a demonstrar a inidoneidade do autocolante da matricula traseira que, apreciado objectivamente, através das regras da experiência comum ou da causalidade adequada, portanto, segundo o critério da generalidade das pessoas, era incapaz de criar uma falsa aparência da realidade, perante os cidadãos em geral e perante as autoridades policiais em particular visando ocultar a real identificação do veiculo fazendo crer que aquela matricula era verdadeira.

IX.

–Ora sendo obrigatória a inclusão numa viatura automóvel de duas chapas de matrícula uma à frente e outra na retaguarda e de forma inamovível, (art.° 7° n°1 e 6, do Decreto-Lei n.° 106/2006, de 8 de junho) o dito autocolante, não poderia deturpar a fé pública daquela chapa de matrícula e muito menos criar uma falsa aparência da realidade.

X.

–Nesta medida, e salvo melhor opinião, o douto acórdão padece da nulidade acima assacada nos termos do art.° 379°, nr.2° do CPP e como tal deverá por V. Exas. ser conhecida.

XI.

–Da prova supra transcrita na motivação e para aí integralmente se remete, impõe-se a alteração desses pontos de facto para que devam ter a seguinte redação: 1)-Em data que não se logrou apurar e de modo não concretamente apurado, pessoa não concretamente identificada colocou um autocolante com número 89 por cima do número 50 na chapa de matrícula traseira 7...-50-L... do veículo ligeiro de passageiros, de marca Audi A4, propriedade da arguida Mª do Carmo S....

2)-No dia 02/12/2016, cerca das 13:15 horas, os arguidos José S... e Mª do Carmo S... deslocaram-se no veículo referido em 1), o qual ostentava chapa de matrícula traseira com os dizeres “7...-89-L...”, mantendo a da frente a chapa de matrícula com os dizeres originais “7...-50-L...”, ao estabelecimento comercial “Agril...”, sito em M.... “.

XII.

–Mais devia constar da matéria assente vertida na contestação pelo menos que: "o número "89" colado por cima do numero "50", encontrava-se torto, e em que a cor era visivelmente diferente dos restantes números".

XIII.

–Aliás em caso exatamente semelhante ao nosso, mas em que ambas as matrículas tinham apostos material sintético autocolante por cima dos números e letras, essa alteração resultou de tal modo imperfeita que, para um qualquer observador medianamente conhecedor e informado, tornava-se imediatamente percetível que a letra e dígito alterados não correspondiam aos originais (Cfr. entre outros, ACRL de 17-03-2010 Crime de falsificação de documento - matrícula. Falso grosseiro. Tentativa impossível não punível).

XIV.

–Nos factos provados não constam elementos da coautoria do crime pelo qual a arguida foi condenada.

XV.

–Na verdade, não se diz que a arguida quis ou tomou parte direta na execução, por acordo ou juntamente com os demais, na utilização dos dizeres na chapa de matrícula traseira, pelo que deveria ser absolvida.

XVI.

–Nos termos do artigo 70° o legislador dá preferência à aplicação da pena de multa em detrimento da pena de prisão.

XVII.

–O recurso às penas privativas da liberdade só será legítimo quando, face às circunstâncias do caso, se não mostrarem adequadas as reações penais não detentivas.

XVIII. –O tribunal acabou por condenar a arguida, sem antecedentes criminais, numa pena de prisão de 9 meses suspensa na sua execução por um ano, não percorrendo, sequer, as outras opções legislativas, entendemos que a pena de multa em alternativa à pena de prisão é a mais adequada e proporcional ao caso em concreto, nos termos do artigo 47° do CP. o que desde já se requer a V. Exas.

XIX.

–E quanto ao arguido José S..., e mesmo considerando os seus antecedentes criminais, embora com o devido respeito não expressivos, tudo delitos de pequena e média gravidade, condenado em penas de multa, sem prejuízo, da pena de prisão suspensa na sua execução por factos ocorridos em 2011, a sua deficiência grave de locomoção, o estar inserido social e familiarmente, o desvalor da ação e do resultado serem diminutos, posto que em concreto nenhum benefício obteve, a precariedade e o modo como usou o dito documento, que dificilmente passava aos «olhos» das autoridades, a pena devia ser reduzida para 1 ano de prisão e substituída por pena de multa nos termos do artigo 43° n° 1 do CP, ou por pena de prestação de trabalho a favor da comunidade nos termos do disposto no artigo 58° do CP.

XX.

–O Tribunal por erro de interpretação violou as disposições acima indicadas, nomeadamente, os artigos 23° n° 2, 40°, 70° 256° n° 1 als. b) e) e 3 do CP e os artigos 16°, 33°, 368° n° 2, 374° e 379° n°1 al. a) e c) e 2 do CPP.

Nestes termos e nos melhores de direito deve o recurso ser considerado procedente, por provado, e, consequentemente, o douto acórdão recorrido substituído, por outro, ainda mais douto, absolvendo os arguidos do crime de que foram condenados, assim se fazendo a sã e habitual Justiça!».

*** Contra-alegou o Ministério Público, concluindo as respectivas alegações no sentido da improcedência do recurso.

*** Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto secundou os termos da contra-motivação.

*** II–Questões a decidir: Do artº 412º/1, do CPP resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso ( Cf. Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», III, 2ª edição, 2000, pág. 335, e Acs. do S.T.J. de 13/5/1998, em B.M.J. 477-º 263; de 25/6/1998,em B.M.J. 478º-242 e de 3/2/1999, em B.M.J. 477º-271.

), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso ( Cf. Artºs 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do CPP e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R., I – A Série, de 28/12/1995.

).

Os recorrentes pedem a sua absolvição.

Limitam...

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