Acórdão nº 467/09.1T2AND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Novembro de 2014
Magistrado Responsável | MARIA JO |
Data da Resolução | 11 de Novembro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I – RELATÓRIO G (…)– Companhia de Seguros, SA, intenta a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra EDP – Energias de Portugal, S.A.
, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de €107.652,85 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento.
Alegando, para tal e em síntese: invoca o direito de sub-rogação pela indemnização que satisfez no âmbito de seguro de acidentes de trabalho decorrente da morte de um trabalhador e lesões sofridas noutro, decorrentes de um acidente ocorrido no âmbito da execução de um contrato de empreitada celebrado entre a E (...) A.C.E. e a EDP – Distribuição de Energia, S.A.; o acidente é imputável à ré, porquanto ocorreu quando a EDP Distribuição iniciava a reposição da normalidade da linha, sendo as manobras locais asseguradas por funcionários da EDP Distribuição e também por piquetes da EDP, tendo ocorrido pelo facto de se ter dado uma descarga elétrica na linha que que estava a ser reparada pelos sinistrados, no momento em que um deles procedia ao fecho do selecionador; aquando do acidente, existia uma avaria nas facas duplas de bimetal do selecionador que permitiu a passagem da tensão ao local onde decorriam os trabalhos; a existência de tal avaria é da responsabilidade da EDP, porquanto as obrigações de inspeção, manutenção e/ou substituição das mesmas pertencem ao grupo EDP, sendo que a entrada de tensão na linha condutora ficou a dever-se a uma ação concreta de um funcionário da E.D.P.
A Ré contesta, invocando a prescrição do direito da Autora. Mais refere que quem foi parte no alegado contrato de empreitada foi a EDP Distribuição – Energia, S.A., pessoa jurídica distinta da contestante, imputando a responsabilidade na ocorrência do acidente em causa a culpa das próprias vítimas e demais trabalhadores da firma J (...), Lda., que não observaram as normas de segurança aplicáveis. Conclui pela sua absolvição do pedido.
Foi proferido despacho saneador que relegou para final o conhecimento da exceção da prescrição do direito da autora.
Realizada audiência de julgamento, o Juiz a quo proferiu sentença a julgar a ação improcedente, absolvendo a ré do pedido. Inconformada com tal decisão, a autora dela interpôs recurso de apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões: I – A douta sentença do tribunal a quo, fundamentou de forma errada a Decisão, ao fazer apelo às normas constantes do artigo 483º e seguintes do Código Civil, quando deveria enquadrar a factualidade provada, no âmbito do artigo 509º do mesmo Código.
II – Existe manifesta contradição entre a matéria assente e a decisão proferida, pelo que a mesma, deve ter como consequência, o disposto no artigo 615º nº 1 alíneas c) e d) e nº 4 do Código de Processo Civil.
III – A Apelada é parte legítima, tanto mais que, a douta sentença, não a absolveu da instância, como, aliás, deveria caso assim entendesse, com as legais consequências.
IV – Ao resultar de ata de julgamento que as partes chegaram acordo, sem qualquer condição, em que “aceitam que se responda de acordo com os documentos juntos nos autos” aos quesitos 34 a 42, aceitaram que os documentos juntos aos autos eram suficientes para provar essa matéria até aí controvertida.
V – Ao não entender dessa forma a douta sentença violou o disposto nos artigos 607º, nº 4 e 5 in fine do Código de Processo Civil pelo que a mesma, deve, ainda ter, como consequência o disposto no artigo 615º nº 1 c), d) e nº 4 do Código de Processo Civil.
VI - O domínio pleno da rede elétrica pertence à Apelada.
VII - Esta, encontra-se obrigada, independentemente de todo o contexto, a assegurar as respetivas condições de preservação e manutenção, nos termos do disposto no artigo 509º do Código Civil.
VIII - A fiscalização dessas normas de segurança, compete à ora Apelada e a inobservância das mesmas de um seu prestador desserviços, contratado para levar a cabo uma reparação não é motivo de exclusão da sua responsabilidade, perante terceiros lesados.
IX - O contrato de prestação de serviços efetuado, terá porventura eficácia entre as partes contratantes e o seu desrespeito, não altera as normas imperativas, contidas na legislação em vigor, mormente, as normas contidas no Código Civil, em matéria de responsabilidade civil.
X - Os trabalhadores sinistrados, limitaram-se a agir de acordo com as ordens e as instruções dos responsáveis, limitaram-se a proceder às tarefas ordenadas na presença dos responsáveis e o acidente só se deu, tendo como causa base e essencial, a ligação não atempada da energia, antes dos trabalhos concluídos e, essa ligação foi concretizada por alguém do âmbito laboral da ora Apelada.
Conclui pela revogação da decisão recorrida.
A Ré apresenta contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido.
Cumpridos que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto na última parte do nº4 do artigo 657º do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo[1] –, as questões a decidir são as seguintes: 1. Se os quesitos 34 a 42 deveriam ter obtido a resposta de “provado”.
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Responsabilidade da Ré ao abrigo do disposto no art. 509º do Código Civil.
III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Se os quesitos 36 a 40 e 42 deveriam ter obtido a resposta de provado.
Face à declaração dos ilustres mandatários das partes, no início da audiência de julgamento, de que quanto aos quesitos 34 a 42, “aceitam que se responda de acordo com os documentos juntos”, sustenta a apelante que os quesitos 36 a 40, e 42, deveriam ter sido dados como provados, uma vez que o acordo sobre essa matéria de facto não foi condicionado à apresentação de recibos.
É o seguinte o teor dos pontos da matéria de facto sob impugnação a que o juiz a quo deu a resposta de “não provado”, “por não terem sido juntos os recibos correspondentes a tais valores”: 36.
Quanto ao sinistrado M (...), a Autora liquidou, entre fevereiro de 2005 e junho de 2009, a título de incapacidades, o montante de €7.484,04? 37.
E a título de pensões, no mesmo período, liquidou ao sinistrado o montante de €22.350,90 ? 38.
E até à presente data (instauração da Ação) liquidou a título de assistência médica a quantia de €28.647,54 ? 39.
A título de despesas com medicamentos a quantia de €73,43? 40.
A título de transportes, a quantia de € 2.019,49? 42.
E a título de despesas diversas relacionadas com o sinistro, a quantia de €43,99? No início da audiência de julgamento, os ilustres mandatários das partes, declararam aceitar determinados factos por acordo, suprimindo outros e relativamente aos pontos 34 a 42 da B.I., declararam que “aceitam que se responda de acordo com os documentos juntos nos autos”.
Ora, a tal declaração, de acordo com a teoria do destinatário consagrada no artigo 236º do Código Civil[2], será de atribuir o sentido, não de que a tais pontos deveria ser dada a resposta de provado (senão, o acordo relativamente a tal resposta teria sido no sentido de aceitarem tais factos por acordo), mas sim de que a tais pontos deveria ser dada uma resposta em conformidade com o teor dos documentos juntos aos autos – ou seja, apenas caso a respetiva matéria se mostrasse confirmada pelos documentos, obteria resposta positiva.
Ora, relativamente ao sinistrado M (…), encontram-se juntos aos autos unicamente dois recibos comprovativos de que este recebeu da Seguradora aqui Autora a quantia de 6.060,99 € (doc. De fls. 62), a título de pensões e a quantia de 3.689,67 € por despesas de transporte, o que levou a que os pontos 34 e 35, tivessem obtido a resposta de provado. Não tendo a autora procedido à junção de qualquer documento do qual resultasse terem sido pagos quaisquer outros valores àquele sinistrado, as respostas aos pontos sob impugnação teriam de ser necessariamente negativas.
É de indeferir...
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