Acórdão nº 465/11.5TALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do Processo Comum Colectivo n.º 342/13.5JACBR do Tribunal Judicial da Lousã, mediante acusação pública, foi o arguido A..., melhor identificado nos autos, submetido a julgamento, sendo-lhe, então, imputada a prática, em autoria material, sob a forma consumada e em concurso efectivo, de um crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, p. e p. pelo artigo 165.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, agravado nos termos do disposto no artigo 177.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal e de dois crimes de coacção agravada tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 22.º, 23.º, 73.º, 154.º, n.ºs 1 e 2 e 155.º, n.º 1, als. a) e b), todos do Código Penal.

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual foi comunicada a alteração da qualificação jurídica, por acórdão do Tribunal Colectivo de 12.06.2014 [depositado na mesma data], deliberou o Colectivo [transcrição parcial do dispositivo]: «Nos termos e com os fundamentos expostos, as juízes que compõem o Tribunal Colectivo, deliberam: 1. Absolver o arguido A... da prática de um crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência agravado, previsto e punido pelos artigos 165.º, n.º 2 e 177.º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal.

  2. Absolver o arguido A... da prática de dois crimes de coacção agravada, na forma tentada, previstos e puníveis pelos arts. 22.º, 23.º, 154.º e 155.º, n.º 1, als. a) e b) todos do Código Penal.

  3. Condenar o arguido A... pela prática de um crime de violação agravada na pena de cinco anos e seis meses de prisão efectiva, nos termos dos arts. 164.º, n.º 1 e 177.º, n.º 1, al. b) ambos do Código Penal.

  4. Condenar o demandado A... a pagar à demandante B... indemnização no valor de € 10.000,00, a título de danos não patrimoniais.

    (…)».

  5. Inconformados com o assim decidido recorreram arguido [ A...] e assistente [ B...].

  6. Por decisão sumária de 22.10.2014, uma vez reconhecida a falta de interesse em agir, foi o recurso interposto pela assistente rejeitado.

  7. Rejeição, essa, contra a qual regiu a assistente/recorrente, o que fez nos termos do artigo 417.º, n.ºs 8 e 9 do C.P.P., invocando haver a relatora interpretado incorrectamente o disposto na alínea a), n.º 6, do citado artigo 417º.

  8. Notificados os sujeitos processuais interessados nenhum deles se pronunciou relativamente à reclamação.

  9. O recorrente A...

    extraiu da correspondente motivação as seguintes conclusões: 1. Do depoimento prestado pela Ofendida, constante no auto de declarações para memória futura (fls. 352 a 378) ressaltam contradições substanciais: Fls 360: Juíza: ele tirou a tua roupa? B...: Tirou as calças e a … as … cuecas.

    Fls. 361: B...: depois meteu-se em … passou de um banco para o outro.

    Fls 366: Sra Juíza: quando ele tirou a roupa foi à força? B...: Tirou a roupa assim normal mas eu estive quieta, estive assim com as mãos.

    Fls. 370 (a instâncias da Sra. Procurador

    1. B...: sim depois ele vai agarra e puxa calças.

    Procuradora: Com força? B...: Sim, um bocado com força.

  10. Quanto aos depoimentos das testemunhas C..., D..., E..., F..., G... e H..., estas não tem qualquer conhecimento directo dos factos dos quais o Arguido vinha acusado … 3. Assim, o Arguido entende que não há elementos de prova que leve a que se dêem como provados os factos k., l., m., o., dd., pelo que merecem análise e avaliação os elementos probatórios supre referidos, devendo proceder-se, nos termos dos artigos 412º, n.ºs 3 e 4 e 430.º, CPP, à sua renovação, o que se requer.

  11. É manifesta e exigida nos autos a aplicação do princípio in dubio pro reo, pois, avaliando-se a prova segundo as regras da experiência e atento o princípio da liberdade de apreciação da prova, revela-se uma dúvida no espírito do Tribunal a quo sobre a existência dos factos dados como provados e aqui postos em crise.

    Sem prescindir, 5. Não existe qualquer facto concreto provado que permita extrair a conclusão de que o arguido tivesse praticado os factos os factos k., l., m., o., dd., pelo que tais factos, dados como provados, são mero juízo conclusivo.

  12. Existe quanto a estes elementos o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, prevista no artigo 410.º, n.º 2, al. a), do C.P.P.

    Sem prescindir, 7. O arguido, ora recorrente, entende ainda que a sua conduta, dada como provada, não se subsume no tipo legal de crime p.p. pelo artigo 163.º, n.º 1, do Código Penal, por não preenchimento do elemento objectivo e subjectivo do tipo.

  13. A violência tem de considerar-se “ … idónea, segundo as circunstâncias do caso nos termos conhecidos da doutrina da adequação, a vencer a resistência efectiva ou esperada da vítima.” 9. Dos factos provados não é permitido concluir que a força que o argudido fez para tirar as cuecas e as calças, bem como a força que fez ao colocar-se em cima da ofendida visou impedi-la de qualquer resistência.

  14. O arguido não agiu com dolo.

    Sem prescindir, 11. Os factos praticados, a serem dados como provados, não são de tal forma graves que imponham pena superior ao mínimo legal, nem existe especial carácter intenso do dolo.

  15. Pelo que, ao arguido deve ser fixada pena de prisão não superior a 3 anos de prisão, suspensa por igual período, sem necessidade de qualquer regime de prova, pois tal pena afigura-se suficiente para as exigências de prevenção geral e especial do caso em concreto.

  16. Foram violadas as seguintes normas: art. 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, art. 14.º, n.º 1 e art.º 164.º, n.º 1 e 177.º, n.º 1 al. b) do Código Penal, art. 53.º, n.º 1 e 71.º, n.º 1 e 2 do Código Penal.

    ASSIM, SEM MENOSPREZO PELA DOUTA SENTENÇA DE QUE SE RECORRE E SEMPRE COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VV. EXA.S, ESPERA-SE QUE SEJA DECRETADA A ABSOLVIÇÃO DO ARGUIDO, ORA RECORRENTE, A..., DADA A INSUFICIÊNCIA DA PROVA E ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÂO DA MESMA, ORA ALEGADAS, PROCEDENDO-SE À RENOVAÇÃO DA PROVA REQUERIDA, E, DECIDINDO DE HARMONIA COM AS ANTECEDENTES CONCLUSÕES, OU, SE ASSIM NÃO FOR ENTENDIDO, REDUZINDO A PENA APLICADA PARA 3 ANOS DE PRISÃO, SUSPENSA NA SUA EXECUÇÃO POR IGUAL PERÍODO, SEM REGIME DE PROVA, VV. EXA.S FARÃO JUSTIÇA! 8. Por despacho exarado em 22.07.2014 foram os recursos admitidos, fixado o respectivo regime de subida e efeito.

  17. Aos recursos interpostos por arguido e assistente respondeu o Ministério Público [o que fez na mesma peça processual, sem que haja formulado conclusões], contrariando toda a argumentação expendida por cada um dos recorrentes, conforme resulta de fls. 796 a 816, concluindo no sentido de deverem os recursos ser julgados totalmente improcedentes e confirmado, na íntegra, o acórdão recorrido.

  18. Na Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer junto a fls. 847 a 849 no qual, subscrevendo na íntegra a resposta apresentada pelo Ministério Público em 1.ª instância, se pronunciou no sentido de nenhum dos recursos merecer provimento, devendo ser mantida a decisão recorrida.

  19. Cumprido o artigo 417.º, n.º 2 do CPP, nenhum dos sujeitos processuais interessados reagiu.

  20. Realizado o exame preliminar, ocasião em que foi indeferida a renovação da prova requerida pelo arguido/recorrente, e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo, agora, decidir.

    1. Fundamentação 1. Delimitação do objecto da reclamação apresentada pela assistente/recorrente: a.

    Saber se a decisão sumária que, reconhecendo a falta de interesse em agir por parte da assistente, rejeitou o recurso fez uma incorrecta interpretação do artigo 417.º, n.º 6, alínea a), do CPP.

  21. Delimitação do objecto do recurso interposto pelo arguido/recorrente A...

    : De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 412.º do CPP e conforme jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas da respectiva motivação, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito – [cf. acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19.10.1995, DR, I Série – A, de 28.12.1995].

    No caso concreto invoca o recorrente: - Erro de julgamento; - Os vícios do artigo 410.º do CPP; - Violação do princípio in dubio pro reo; - Errada subsunção dos factos ao direito; - Violação dos artigos 53.º, n.º 1 e 71.º do C. Penal.

  22. A decisão sob reclamação Ficou a constar da decisão sumária [transcrição parcial]: « (…) De acordo com o n.º 3 do artigo 414º do CPP, o despacho de admissão do recurso não vincula o tribunal superior.

    No caso em apreço, temos para nós que, por falta de interesse em agir – artigo 401.º, n.º 2 do CPP -, o recurso deverá ser rejeitado.

    Com efeito, para além do requisito da legitimidade para recorrer, exige o legislador, ainda, um outro requisito, qual seja o «interesse em agir», condição, esta, que a lei não define, tendo sido deixada à jurisprudência a função, de casuisticamente, avaliar da sua existência.

    A propósito escreve Germano Marques da Silva [Curso de Processo Penal», III, Verbo, pág. 326/327]: «No que se refere ao interesse em agir do assistente, a jurisprudência não está ainda inteiramente assente. O acórdão do STJ de 9 de Abril de 1997 decidiu que a sua legitimidade ou ilegitimidade para o recurso deve ser encontrada apreciando, caso a caso, se a sua posição é afectada pela natureza da condenação ou pela espécie da medida da pena aplicada ao arguido. A jurisprudência dominante vai no sentido de que o assistente não tem interesse no que respeita à espécie e quantidade da pena concretamente aplicada.

    A intervenção do assistente no processo é a de colaborador da justiça e, por isso, que possa intervir no processo, oferecendo provas e participando na sua discussão, e até acusar independentemente do Ministério Público. A lei, porém, só permite que recorra das decisões que o afectem [art. 69.º, n.º 2, al. c], o que representa uma efectiva limitação, porventura ditada pela preocupação de evitar que o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT