Acórdão nº 153/03.6TBANS-Q.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelCATARINA GON
Data da Resolução23 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

Nos autos de inventário para partilha de bens em casos especiais no qual são interessados A...e B..., melhor identificados nos autos, foi elaborado o mapa informativo da partilha do qual resultava a obrigação da interessada A... de pagar tornas ao interessado B....

Na sequência desse facto e da notificação efectuada para proceder ao depósito das tornas, a interessada, A..., veio apresentar requerimento, alegando que: Perante a complexidade de várias questões e direitos que haviam sido suscitadas foram proferidos despachos a remeter os interessados para os meios comuns; na sequência dessas decisões, intentou, em 29/09/2008, uma acção ordinária na qual veio a ser proferida decisão que condenou B... a ver relacionado, no processo de inventário para partilha de bens subsequente ao divórcio com a Autora A..., vários bens e rendimentos comuns e de elevado valor e, apesar de ter já fixado valores de alguns desses bens e rendimentos, tal decisão remeteu a quantificação de outros para apuramento em “fase de liquidação de sentença”; tendo sido pedido e ordenado, nessa sequência, o prosseguimento daqueles autos para liquidação de sentença, encontram-se ainda pendentes e, neste momento, a aguardar que o Sr. Perito apresente o resultado da perícia que lhe foi ordenada; assim – alega – existem questões prejudiciais que impõem a suspensão dos presentes autos de Inventário, por não poderem prosseguir sem que se mostre liquidada a sentença que condena o aqui Requerido a ver relacionados, neste inventário, bens e rendimentos comuns que essa liquidação, precisamente, há-de determinar – artº 1335º/1 e 2 do C.P.C.; por outro lado, além dos créditos da Acção acima referida, já considerados líquidos, bem como os ainda não liquidados, a Requerente é também credora do Requerido e ele devedor dela, noutros autos, nomeadamente: na Execução de Alimentos, apenso “H” aos presentes autos, de mensalidades em dívida e juros, neste momento do valor de aproximadamente 6.000,00€ (seis mil euros) e na Acção de Processo Sumário nº 547/05.2TBANS, por Sentença ali proferida em 18/08/2008 e há muito transitada em julgado, por utilização da casa de morada de família, que, com juros, ascende actualmente a mais de 3.000,00€ (três mil euros). Assim, conclui, sendo devedora de tornas ao Requerido e sendo este devedor de várias quantias à Requerente, goza ela do direito de retenção sobre o valor das tornas, que aqui invoca a seu favor e para todos os efeitos legais (cfr. artº 754º do Código Civil) e até que: se mostre liquidada a sentença supra referida; sejam relacionados no presente Inventário os valores resultantes da liquidação e sejam liquidados os débitos do Requerido para com a Requerente.

Com estes fundamentos, pede que, face às questões prejudiciais que suscita, se ordene a suspensão dos autos, até que se mostre liquidada a sentença da Acção Ordinária supra indicada e relacionados, neste inventário, os bens e/ou rendimentos comuns que essa liquidação determinar, nos termos do artº 1335º/1 e 2 do C.P.C..

E, subsidiariamente, requer que seja reconhecido que goza do direito de reter o valor das tornas, nos termos do artº 754º do Código Civil, até que se mostre liquidada a sentença supra referida e até que sejam relacionados os valores resultantes dessa liquidação e liquidados os débitos do Requerido para com a Requerente.

O Interessado, B..., respondeu, sustentando que não assiste à Requerente qualquer direito de retenção, não tendo aplicação o art. 754º do CC e concluindo pela improcedência daquele requerimento.

Na sequência desses factos, foi proferida decisão que indeferiu a pretensão da Requerente e ordenou o depósito das tornas a seu cargo.

Inconformada com essa decisão, a Requerente, A..., veio interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1ª - Salvo o devido respeito por opinião contrária, existe um nexo de prejudicialidade entre as duas causas, designadamente a presente Acção de Inventário e a Acção de Processo Ordinário n.º 399/ 08.0TBANS.

  1. - Contudo, o poder de suspensão da instância não tem carácter discricionário, estando dependente da verificação de determinados condicionalismos legais.

  2. - Daí que, em face do disposto no artigo 1335° do Código de Processo Civil (anterior), se entenda, tal como o fez o Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de 9/10/97 (CJ, STJ, III/97, pag.54) que "tendo algum interessado pedido a exclusão de verbas da relação de bens alegando que eram suas e não da herança ( ... ) deve a instância ser suspensa em consequência de ter sido proposta acção pedindo se declare que as ditas verbas lhe pertencem." 4ª - Assim, o fundamento para a suspensão dos presentes autos, assenta na referida prejudicialidade, por daquela «depender a definição dos direitos dos interessados na partilha».

  3. - Ora, uma questão prejudicial é uma questão prévia que, não sendo preliminar (em que a solução pode tornar dispensável ou inadmissível o julgamento das questões delas dependentes), a sua decisão influenciará ou determinará o conteúdo da questão vinculada.

  4. - Isto é, à luz da disposição legal supra mencionada, estamos perante uma questão prejudicial susceptível de justificar, à luz dos critérios concretos e subjectivos de ponderação definidos na lei, a suspensão do inventário.

  5. - Aliás, o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação Coimbra n.º 4265/03 datado de 09/03/2004 no proc. 314/09.4TBAVR.Cl, publicado in www.dgsi.pt, traduz isso mesmo: «I - Quando a Lei permite que possa ser ordenada a suspensão quando a decisão da causa esteja dependente do julgamento de outra já proposta, a anterioridade aí mencionada é relativa à própria suspensão, querendo, portanto, significar que para ser decretada a suspensão é necessário que a acção considerada como prejudicial já tenha sido proposta, antes ou depois da acção a suspender. II - Resulta do art. 279.° n.º 1 1.ª parte do C. P. C., que a suspensão da instância por causa prejudicial depende de nesta se discutir questão cuja decisão pode destruir o fundamento ou razão de ser daquela. III - A 2.ª parte do n.º 2 do art. 279.° deve ser entendida no sentido de que a lei não toma em consideração, propriamente, os prejuízos ou vantagens (de um ponto de vista subjectivo) das partes, mas apenas a fase em que se encontra a causa dependente quando é requerida a suspensão.» 8ª - Ora, para efeitos de suspensão para a anterioridade de questão prejudicial basta que a acção considerada como prejudicial já tenha sido proposta, antes ou depois da acção a suspender.

  6. - O que se verificou no caso concreto.

  7. - Também, importa referir que, a suspensão do inventário não tem de ser imediatamente ordenada, devendo antes acontecer quando as partes demonstrarem haver já recorrido aos meios comuns.

  8. - Estamos, assim, perante uma medida cautelar que assegura que a suspensão da instância só será decretada quando existir fundamento sério para tal.

  9. - Ora, a Recorrente requereu a suspensão com fundamento e prova de que já havia recorrido aos meios comuns.

  10. - Apesar de a acção que determina a suspensão ter sido instaurada posteriormente à de inventário, tal não é bastante para concluir que foi unicamente instaurada para obter a suspensão destes autos.

  11. - Acresce referir que, no que concerne à certeza jurídica, não existe base para concluir que a suspensão destes autos causará mais prejuízos do que as vantagens decorrentes da mesma.

  12. - Nestes termos, não restam dúvidas de que estamos perante uma questão prejudicial e a decisão a proferir na Acção de Processo Ordinário supra referida (no que concerne à liquidação) pode influir na decisão a proferir na presente Acção de Inventário, designadamente no que concerne ao valor do acervo patrimonial do casal dissolvido, ao mapa da partilha, aos quinhões de cada interessado e sobretudo...

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