Acórdão nº 372/12.4TACLD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | JORGE FRAN |
Data da Resolução | 11 de Novembro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA Nos autos de inquérito que, sob o número 372/12.4TACLD, correram termos pelos Serviços do MP de Caldas da Rainha, foi o arguido A... acusado pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de dois crimes de pornografia de menores, p. e p. pelo art.º 176.º, n.º 4, do Cód. Penal.
Remetidos os autos a juízo, com vista ao seu julgamento em processo comum (juiz singular) e distribuídos pela Secção Criminal (J1), da Instância Local de Caldas da Rainha, Comarca de Leiria, viria a ser proferido despacho do seguinte teor: «O tribunal é competente.
O Ministério Público tem legitimidade para exercer a acção penal.
Registe e autue como processo comum com intervenção de tribunal singular.
A fls. 294-296 o Ministério Público deduziu acusação contra A... imputando-lhe a prática, em autoria material e em concurso efectivo, de dois crimes de pornografia de menores, p. e p. pelo art.º 176.º, n.º 4, do Cód. Penal. Segundo dispõe o artigo 176.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal quem (…) b) Utilizar menor em fotografia, filme ou gravação pornográficos, independentemente do seu suporte, ou o aliciar para esse fim (…) é punido com pena de prisão de um a cinco anos». De acordo com o n.º 4 do mesmo preceito legal «quem adquirir ou detiver os materiais previstos na alínea b) do n.º 1 é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa». A tipicidade objectiva do crime em questão prende-se, pois, com a simples detenção ou aquisição dos materiais pornográficos previstos na citada alínea b). A respeito dos conceitos de detenção e aquisição, e partindo do princípio que o legislador se exprimiu correctamente, há que atender ao seu significado mais natural ou directo, ou seja, a detenção como sendo o acto de deter ou ter em seu poder, e a aquisição como sendo o acto de adquirir, seja a que título for, materiais de pornografia infantil. No que concerne ao elemento subjectivo o crime em análise comporta qualquer modalidade de dolo (artigo 14.º do Código Penal). Dito isto, vejamos agora se os factos vertidos na acusação são susceptíveis de preencher, ou não, a tipicidade objectiva e subjectiva do crime de pornografia de menores. Refere-se na acusação que, em duas ocasiões distintas, o arguido acedeu a um determinado site na internet, ora a partir de um computador que tinha na sua residência ora a partir das instalações de uma empresa, clicando e visualizando imagens de pornografia infantil (factos 1. a 3. da acusação). Em lado algum se refere, todavia, que o arguido tenha adquirido ou detido as fotografias em questão, limitando-se a sua conduta, segundo o texto da acusação, à simples visualização do seu conteúdo (sendo, naturalmente, o «clique» e a «ampliação» actos igualmente compreendidos nessa mesma visualização) Tanto assim é que, também não refere a acusação que o arguido tenha actuado com o propósito de deter ou adquirir as fotografias, mas apenas que o arguido agiu «com o propósito de satisfazer os seus desejos sexuais através da visualização das crianças em situações pornográficas (…)» (facto 4.). Salvo melhor entendimento, a mera visualização não se confunde com os actos de detenção ou aquisição, os quais, como já aqui ficou referido, não dispensam que o agente tenha algum tipo de domínio (o qual, admite-se, tanto pode ser de facto como de direito), sobre os materiais pornográficos (nesse mesmo sentido, cf. “Código Penal Parte geral e especial com notas e comentários”, Almedina, 2014, p. 735, inciso 12.) Por outro lado, e como já ficou referido, também não contém a acusação os factos destinados a, adequadamente, preencher o elemento subjectivo do crime em questão. Nos termos do artigo 311.º, n.º 2, alínea b) e n.º 3, alínea d) do Cód. Proc. Penal, recebidos os autos no Tribunal o presidente despacha no sentido de rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada, designadamente «se os factos não constituírem crime». Entende-se ser efectivamente o caso, pois os factos narrados na acusação não integram a prática do crime de pornografia infantil p. e p. pelo art.º 176.º, n.º 4, do Cód. Penal, quer do ponto de vista da tipicidade objectiva, quer da tipicidade subjectiva.
Por todo o exposto e ao abrigo das invocadas disposições legais, decide-se: - Rejeitar a acusação deduzida contra o arguido A... , que lhe imputa a prática de dois crimes de pornografia de menores, p. e p. pelo artigo 176.º, n.º 4, do Cód. Penal, por manifestamente infundada.
Sem custas.
Notifique.» Inconformada, a magistrada do MP interpôs o presente recurso, que motivou, concluindo nos seguintes termos: 1. O site realityteenvideos (http://realityteenvideos.com), cujos servidores foram encerrados em 2011 pelas autoridades luxemburguesas no âmbito da denominada Operação Carole, dedicava-se à distribuição de pornografia de menores, exibindo conteúdos exclusivamente relacionados com esse tema.
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Nos termos da acusação proferida o arguido A... , em dois dias seguidos e a partir de computadores diferentes, acedeu a esse site e clicou nas...
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