Acórdão nº 767/13.6TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | JORGE ARCANJO |
Data da Resolução | 10 de Novembro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO 1.1.- A Autora – G…, Ldª - instaurou na Comarca de Coimbra acção de simples apreciação, com forma de processo ordinário, contra a Ré – H…, SA.
Alegou, em resumo: A Autora e Ré celebraram, em 25/6/2003, através de documento escrito, contrato promessa de compra e venda, no qual aquela prometeu vender a esta, que prometeu comprar, três lotes, sitos na ...
Em 9/7/2007 a Autora interpelou a Ré para a escritura pública, mas a Ré recusou-se.
A aqui Ré instaurou contra a aqui Autora acção declarativa (proc. nº …) pretendendo resolver o contrato por incumprimento da promitente vendedora, a redução do preço de um dos lotes e, subsidiariamente, a caducidade do contrato. Em, reconvenção, a ora A., pediu também a resolução do contrato, imputando o incumprimento à contraparte.
Esta acção foi julgada improcedente quanto aos pedidos de ambas as partes, além do mais por considerar que a promitente compradora apenas estava em mora, não se verificando qualquer causa de incumprimento definitivo.
Por carta de 1/7/2013 a Ré notificou a Autora da resolução do contrato, com fundamento em ter alienado os lotes (em 21/1/2013), configurando uma situação de incumprimento definitivo.
A Autora respondeu a tal carta, interpelando admonitoriamente a Ré e informando que a actual proprietária dos imóveis, por si contactada, está na disposição de cumprir a prestação negocial prometida, pelo que a declaração de resolução é ilícita.
Pediu que seja declarada ilícita a rescisão contratual invocada pela Ré na carta datada de 1/7/2013, por não se poder considerar definitivamente incumprida a prestação prometida pela Autora pelo facto da mesma não ser actualmente proprietária dos lotes 2 e 3 que constituem objecto do contrato prometido.
Contestou a Ré defendendo-se, em síntese: A presente acção funda-se em factos novos, não alegados na acção anterior ( nº…), que não abrangeu a venda a terceiros dos lotes.
A Autora, após a sentença da 1ª instância (em 31/10/2012), alienou os lotes (em 21/1/2013) à sociedade E…, Ld.ª, a qual, dois dias após, os vendeu a M…, Ld.ª, que constitui uma situação de incumprimento definitivo, a legitimar a declaração de resolução.
Concluiu pela improcedência da acção e em reconvenção pediu: i)Seja declarada a validade da resolução do contrato promessa efectuada pela Reconvinte por comunicação de 1 de Julho de 2013, por força do incumprimento definitivo do contrato imputável à Autora; ii)A condenação da Autora a restituir à Ré a quantia de € 800.000,00, correspondente ao sinal em dobro, a crescida de juros vencidos, à taxa legal, desde a data da resolução, que importam em € 7.561,64 e dos vincendos até integral pagamento.
iii)A condenação da Autora como litigante de má fé, em multa e indemnização.
Replicou a Autora e suscitou a questão da inadmissibilidade do pedido reconvencional.
1.2.- Realizada audiência prévia, decidiu-se: Não admitir o pedido reconvencional formulado em 1); Admitir o pedido reconvencional de condenação na entrega do sinal em dobro.
Proferir sentença de mérito na qual julgou: i)A acção improcedente, absolvendo a Ré do pedido; ii) Parcialmente procedente a reconvenção e condenar a Autora a restituir à Ré a quantia de € 400.000,00.
1.3.- Inconformada, a Autora recorreu de apelação, com as seguintes conclusões: … Contra-alegou a Ré no sentido da improcedência do recurso.
II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. – O objecto do recurso As questões submetidas a recurso, delimitado pelas conclusões, sãos as seguintes: (in)admissibilidade do pedido reconvencional; A alteração de facto; A alienação a terceiros e incumprimento do contrato promessa de compra e venda; A declaração de resolução e o abuso de direito.
2.2.- Os factos provados (descritos na sentença) Do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação no âmbito da ação n.º …, datado de 19.6.2013 e já transitado, resulta provada a seguinte matéria esta que se encontra assente entre as partes e que interessa ao desfecho da presente ação, tendo-se em conta os factos elencados aí a fls. 30 e ss. desse acórdão, com a alteração produzida em segunda instância e visível a fls. 108 da mesma peça: … 2.3.- A (in)admissibilidade do pedido reconvencional A Ré deduziu na contestação os seguintes pedidos reconvencionais: (i)Seja declarada a validade da resolução do contrato promessa efectuada pela Reconvinte por comunicação de 1 de Julho de 2013, por força do incumprimento definitivo do contrato imputável à Autora; (ii)A condenação da Autora a restituir à Ré a quantia de € 800.000,00, correspondente ao sinal em dobro, a crescida de juros vencidos, à taxa legal, desde a data da resolução, que importam em € 7.561,64 e dos vincendos até integral pagamento.
A sentença rejeitou o primeiro dos pedidos, tendo admitido o segundo, nos termos do art.266 nº2 d) CPC, argumentando que o pedido de condenação (do duplo sinal) não constitui o reverso da simples apreciação proposta pela Autora, mas “um pedido próprio de uma acção de condenação”.
A Autora/Apelante considera ser processualmente inadmissível este pedido por não assentar no fundamento da acção.
Muito embora a contestação tenha sido apresentada em 22/9/2013, aplica-se à reconvenção o regime do anterior CPC (cf. art.5 nº3 da Lei nº 41/2013 de 26/6).
Para que a reconvenção seja admissível torna-se indispensável uma conexão objectiva entre as duas acções, ou seja, “um nexo entre os objectos da causa inicial e da causa reconvencional”.
O art.274 nº2 a) CPC/61 estabelece que a reconvenção é admissível quando “o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa” (sendo idêntica a redacção do art.266 nº2 a) do nCPC).
Esta norma tem sido consensualmente interpretada no sentido de que deve verificar-se uma identidade, total ou parcial, de ambas as causas de pedir, a da acção e da reconvenção (cf., por todos, Miguel Mesquita, Reconvenção e Excepção no Processo Civil, pág.146 e segs.).
Dissertando sobre a noção de causa de pedir para efeitos de reconvenção, Mariana Gouveia esclarece ser necessária a identidade, ainda que parcial, de factos essenciais ou principais, isto é, os que constam da norma como constitutivos do direito, para concluir que “ a causa de pedir, para efeitos de admissibilidade de reconvenção, deve ser definida através do facto principal comum a ambas as contra-pretensões” (A Causa de Pedir na Acção Declarativa, pág. 270).
Na acção, a Autora pretende a declaração de ilicitude da resolução do contrato promessa de compra e venda, efectivada pela Ré, por carta de 1/7/2013, alegando a falta de fundamento para a resolução, visto que o incumprimento definitivo é imputável à Ré.
Na reconvenção, a Ré pede a condenação no duplo sinal, baseada no incumprimento definitivo do contrato por parte da Autora.
Verifica-se, assim, uma clara interconexão entre ambas as causas de pedir, a legitimar a admissibilidade da reconvenção.
2.4.- A alteração de facto A Apelante pretende que se julgue provado que: “ a Apelante se ofereceu para cumprir a prestação prometida através da interpelação admonitória remetida à Apelada, datada de 4/7/2013”.
Indica como prova o doc. de fls. 28 (carta enviada à Apelada) e o doc. de fls. 302 (carta da M…).
Os documentos juntos assumem a natureza de documentos particulares (arts.363 nº3, 373 CC ), com a força probatória reconhecida no art.376 nº1 e 2 CC.
Os documentos particulares, se não for impugnada a letra e a...
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