Acórdão nº 326/16.1JACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Novembro de 2017
Magistrado Responsável | ORLANDO GON |
Data da Resolução | 08 de Novembro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra Relatório Pelo Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, Juízo Central Criminal de Coimbra, Juiz 3, sob acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Coletivo, os arguidos A...
(conhecido por “AA... ”), divorciado, comercial, nascido a 13.12.1963, em (...) , filho de (...) e de (...) , portador do bilhete de identidade n.º (...) , e residente na Rua (...), atualmente preso no Estabelecimento Prisional de (...) a; B....
(conhecido por “BB... ”), casado, nascido a 9.12.1973, em (...) , filho de (...) e de (...) , portador do bilhete de identidade n.º (...) , e residente na Travessa (...) , atualmente preso no Estabelecimento Prisional de (...) ; C... , casado, guarda prisional, nascido a 6.02.1960, na freguesia da (...) , filho de (...) e de (...) , portador do bilhete de identidade n.º (...) , e residente na (...) - , atualmente preso no Estabelecimento Prisional de (...) , imputando-se: - ao arguido C...
a prática , em autoria e em concurso real, de dois crimes de corrupção passiva, p. e p. pelo art.373.º, n.º 1 do Código Penal; - aos arguidos A...
e B...
a prática, em coautoria e concurso real, de dois crimes de corrupção ativa, p. e p. pelo art.374.°, n.º1 do Código Penal; - aos três arguidos C...
, A...
e B...
a prática, em coautoria [os arguidos A... e B... em concurso real com os anteriores], de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos artigos 21.°, n.º 1 e 24.º, als. e) e h) do D.L. n.º 15/93 de 22.01; e - aos arguidos A...
e B...
ainda a circunstância da reincidência, nos termos dos artigos 75.º e 76.º do Código Penal.
O Ministério Público requereu a aplicação da pena acessória de proibição do exercício de funções ao arguido C... , ao abrigo do disposto no art. 66.°, n.º1, als. a), b) e c) do Código Penal e, ainda, ao abrigo do disposto no art.111.º, n.ºs 1, 2 e 4 do Código Penal, o perdimento a favor do Estado das vantagens recebidas pelos arguidos através dos crimes pelos quais vão os mesmos acusados: “1. O perdimento do dinheiro e demais objetos apreendidos nos autos; 2. que os arguidos C... , A... e B... sejam condenados solidariamente no pagamento ao Estado no valor de: 2.1. € 1.200, referente ao valor do suborno por si entregue/recebido no primeiro negócio efetuado; 2.2. € 2.320, referente ao valor remanescente da recompensa prometida no segundo negócio efetuado [€ 3.000 prometidos - € 680 apreendidos)]; 3. que os arguidos A... e B... sejam solidariamente condenados no pagamento ao Estado do valor de € 4.070, correspondente ao valor da vantagem auferida pela venda do haxixe no interior da cadeia [€ 4.000 resultante da venda das 5 placas de haxixe introduzidas em março de 2016 (cfr. pontos 22. a 26.) + € 70 resultante da venda de haxixe ao D... (cfr. ponto 11.2.).” Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Coletivo - no decurso da qual foi comunicada uma alteração não substancial dos factos, nos termos do art.358.º, n.º1 do C.P.P. -, por acórdão proferido a 19 de maio de 2017, decidiu: A- Condenar o arguido C...
, pela prática, em autoria e coautoria material, na forma consumada, em concurso efetivo, de: - Um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. nos termos dos artigos 21.°, n.º 1 e 24.º, als. e) e h) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 anos de prisão; - Dois crimes de corrupção passiva para ato ilícito, p. e p. pelo art.373°, n° 1 do Código Penal, na pena de 20 meses prisão, por cada um dos dois crimes; - Operar o cúmulo jurídico destas penas e condenar o arguido C... na pena única de 7 anos de prisão; e - Condenar ainda o arguido C... na pena acessória de proibição do exercício de funções, p. e p. pelo art.66.º do Código Penal, pelo período de 4 anos.
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- Condenar o arguido A...
, pela prática, em autoria e coautoria material, na forma consumada, em concurso efetivo e como reincidente (art.75° e 76° do CP) de: - Um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. nos termos dos artigos 21.°, n.º 1 e 24.º, als. e) e h) do Decreto-Lei n.º15/93 de 22 de Janeiro, na pena de 7 anos prisão.
- Um crime de corrupção ativa para ato ilícito, p. e p. pelo art.374°, n° 1 do Código Penal, na pena de 20 (vinte) meses de prisão, e absolve-lo da prática de um crime de corrupção ativa, para ato ilícito, p. e p. pelo art.374°, n° 1 do Código Penal.
- Operar o cúmulo jurídico destas penas e condenar o mesmo arguido A... na pena única de 7 anos e 9 meses de prisão.
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- Condenar o arguido B...
pela prática, em autoria e coautoria material, na forma consumada, em concurso efetivo e como reincidente (artigos 75.º e 76.º do CP) de: - Um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. nos termos dos artigos 21.°, n.º 1 e 24.º, als. e) e h) do Decreto-Lei n.º15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 7 anos de prisão.
- Um crime de corrupção ativa para ato ilícito, p. e p. pelo art.374°, n° 1 do Código Penal, na pena de 20 meses de prisão, absolve-lo da prática de um crime de corrupção ativa para ato ilícito, p. e p. pelo art.374°, n° 1 do Código Penal.
- Operar o cúmulo jurídico destas penas e condenar o mesmo arguido B... na pena única de 7 anos e 9 meses de prisão.
Mais decidiu o Tribunal: - Condenar o arguido C... na perda a favor do Estado da quantia total de € 1.880,00.
- Condenar os arguidos A... e B... na perda a favor do Estado da quantia de € 70,00, absolvendo-os da demais requerida perda a favor do Estado.
Inconformado com o douto acórdão dele interpôs recurso o arguido C...
, concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1. O presente recurso vem interposto do Acórdão que condenou o arguido pela prática, em autoria e co-autoria material, na forma consumada, em concurso efectivo de: - um (l) crime de Tráfico de Estupefacientes agravado, p. e p. nos termos do art.21º, nº 1 e art. 24º, ais. e) e h) do Decreto-Lei nº15/93 de 22 Janeiro, na pena de 6 (seis) anos de prisão; - dois (2)crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo art.373º nº 1 do Código Penal, na pena de 20 (vinte) meses de prisão por cada um dos dois crimes; - em cúmulo jurídico de penas na pena única de 7 (sete) anos de prisão.
- E na pena acessória de proibição do exercício de funções, p. e p. pelo artigo 66º do CP pelo período de 4 (quatro) anos.
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O recurso restringe-se a matéria de direito, consubstanciada na apreciação da adequação da medida concreta da pena aplicada por cada um dos crimes de que vem condenado e na pena única aplicada em cúmulo jurídico.
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O artigo 432 º nº 1c) do CPP estipula a competência específica do STJ, em caso de recurso directo, para conhecer de condenações em pena superior a 5 anos de prisão e limitado unicamente à matéria de direito.
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A jurisprudência última do STJ vai no sentido de, sempre que a pena unitária exceda 5 anos, podendo ser iguais ou inferiores as penas (parcelares) de concurso, é admissível o recurso para o STJ quanto a todas as penas, sob pena de se retirar um grau de recurso, 5. O presente recurso é portanto admissível pelo que deve ser recebido e julgado.
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O acórdão recorrido não valora devidamente os factos provados nos autos, na determinação do quantum das penas parcelares e da pena única que decreta, aplicando erradamente as normas do artigo 40º nº 1 e 2 , 70º, 71 º e 72º e 77º todos do CP e ainda artigo 18º da CRP.
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A matriz atual da política criminológica acolhida nos normativos citados e na jurisprudência visa a ressocialização do indivíduo, recuperando-o para a sociedade e reconduzindo-o à normatividade.
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Nos termos do art.40.º, n.ºs 1 e 2 do CP, a pena tem como principal finalidade a tutela dos bens jurídicos, a que está ligada a função de prevenção geral positiva, não podendo todavia ultrapassar a medida da culpa, e o julgador deverá ponderar também a reinserção social do condenado, a que está ligada a função de prevenção especial ou de socialização.
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A interpretação do artigo 40º em conjugação com o artigo 18º da CRP, implicam um fim utilitário das penas, que não um fim expiatório ou de mera retribuição.
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Sendo a medida da pena determinada concretamente em função da culpa e das exigências de prevenção, terão que levar-se em conta determinados factores, que não fazendo parte do tipo legal de crime, tenham relevância para aquele efeito, quer esses factores estejam previstos, quer não previstos legalmente (art.71.º, n.ºs 1 e 2 do CP).
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Ora o Acórdão recorrido não valorou estes factores, na interligação das várias circunstâncias relevantes e no seu significado unitário em termos de ilicitude e culpa, bem como das finalidades de prevenção; 12. E não teve em atenção que o grau de culpa e as exigências de prevenção não são variáveis autónomas em relação ao peso das circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.
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Na apreciação da culpa o acórdão decisório decide mal ao afirmar que o modo de execução dos crimes, evidencia elevada ilicitude e culpa, sendo que também o arguido C... agiu com dolo intenso.
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Toda a matéria de facto provada nos autos impõem decisão diversa.
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Com efeito as circunstâncias atenuantes consubstanciadas nos factos provados quanto ao arguido C... deverão ser valoradas na apreciação da ilicitude e da culpa, tanto quanto as agravantes justificam, quanto aos restantes arguidos, uma maior condenação ou, nas palavras do acórdão recorrido: o enfoque acentuado na actuação dos restantes arguidos levando a que a pena a aplicar a estes arguidos tenha de ser sempre superior àquela a aplicar ao arguido C... .
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Para além de ser fundamento, a culpa concreta é o máximo de condenação possível e nunca, em caso algum as razões de prevenção geral poderão impor uma pena que ultrapasse essa culpa concreta do agente.
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A decisão condenatória ultrapassou este limiar imposto pela culpa, atribuindo um maior peso às exigências de prevenção geral no cálculo das penas parcelares, bem como na...
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