Acórdão nº 456/14.4T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelEMIDIO FRANCISCO SANTOS
Data da Resolução07 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra A... , residente na rua (...) , Pombal, propôs a presente acção declarativa com processo comum contra B... , residente em (...) , Redinha, pedindo a condenação do réu no pagamento da 80 149,90 euros [compreende 59 616,11 euros de capital e 20 533,79 euros de juros de mora], acrescidos de juros vincendos até integral pagamento.

Fundamentos do pedido: 1. A sociedade C... , Lda, forneceu ao réu, a pedido dele, produtos alimentares, cujo preço importou em 59 616,11 euros; 2. O réu não pagou o preço, apesar de interpelado para tanto; 3. São devidos juros de mora que, calculados desde a data do fornecimento dos produtos alimentares até ao momento, ascendem a 20 533,79 euros; 4. A sociedade [ C... , Lda] cedeu ao autor o crédito que detinha sobre o réu através de contrato de cessão de créditos outorgado em 4 de Junho de 2009.

O réu contestou. Na sua defesa alegou, em síntese: 1. Que pagou o preço dos fornecimentos; 2. Que os juros vencidos até 5 anos, antes da data da citação para a acção, que ocorreu em 28 de Outubro de 2014, estavam prescritos; 3. Que a cessão de créditos era nula, por ter sido simulada; 4. Que a alegada cessão de créditos nunca foi comunicada ao réu, nem tinha conhecimento dela até à citação; 5. Que o réu nunca foi interpelado para proceder ao pagamento da dívida.

Notificado para se pronunciar sobre a excepção deduzida pelo réu, o autor não disse nada.

No despacho saneador, o tribunal a quo julgou procedente a excepção de prescrição, declarando prescritos os juros vencidos antes de 28 de Outubro de 2009 e, em consequência, absolveu o réu do pedido de condenação no pagamento de tais juros.

O processo prosseguiu os seus termos e após a realização da audiência final foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, condenou o réu a pagar ao autor a quantia de € 59 616,11 (cinquenta e nove mil seiscentos e dezasseis euros e onze cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa de à taxa de 8% desde 30.10.2009 até 31.12.2009, à mesma taxa de 8% desde 01.01.2010 até 30.06.2010, à mesma taxa de 8% desde 01.07.2010 até 31.12.2010, à mesma taxa de 8% desde 01.01.2011 até 30.06.2011, à taxa de 8,25% desde 01.07.2011 até 31.12.2011, à taxa de 8% desde 01.01.2012 até 30.06.2012, à taxa de 8% desde 01.07.2012 até 31.12.2012, à taxa de 7,75% desde 01.01.2013 até 30.06.2013, à taxa de 7,5% desde 01.07.2013 até 31.12.2013, à taxa de 7,25% desde 01.01.2014 até 30.06.2014, à taxa de 7,05% a partir de 01.01.2015 até 30.06.2015, à mesma taxa de 7,05% a partir de 01.07.2015 até 31.12.205, à mesma taxa de 7,05% a partir de 01.01.2016 e partir daqui, à respectiva taxa legal até efectivo e integral pagamento (Portaria 262/99 de 12 de Abril, Aviso DGT 10097/04 de 30 de Outubro, Portaria 597/2005 de 19 de Julho e Aviso DGT 310/2005 de 14 de Janeiro, Aviso DGT 6923/2005 de 25 de Julho e Aviso DGT 240/2006 de 11 de Janeiro, e Aviso DGT 7706/2006 de 28 de Julho, Aviso DGT 191/2007 de 6 de Janeiro de 2007, Aviso DGT 13665/2007 de 30 de Julho de 2007, Aviso DGTF 2151/2008 de 28 de Janeiro de 2008, Aviso DGTF 19995/2008 de 2 de Julho de 2008, Aviso DGTF 1261/2009 de 14 de Janeiro, Aviso DGTF nº 12184/2009 de 10 de Julho, Despacho 597/2010 DGTF de 11 de Janeiro, Aviso DGTF nº 13746/2010 de 30 de Junho, Aviso DGTF nº 2284/2011 de 21 de Janeiro, Aviso DGTF nº 14190/2011 de 4 de Julho e Aviso DGTF nº 692/2012 de 17 de Janeiro, Aviso DGTF nº 9944 de 24.07.2012, Aviso DGTF nº 584/2013 de 11.01.2013, Aviso DGTF nº 10478/2013 de 4 de Julho de 2013, Aviso DGTF nº 1019/2014 de 24 de Janeiro, Aviso DGTF nº 563/2015 de 19 de Janeiro, Aviso DGTF 7758/2015 de 14 de Julho e Aviso DGTF nº de 06.01.2016).

O recurso O réu não se conformou com a sentença e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que considerasse as conclusões do recurso.

Os fundamentos do recurso melhor desenvolvidos à frente consistiram em síntese: 1. Na impugnação da decisão relativa à matéria de facto; 2. Na alegação de que o contrato de cessão de créditos era nulo por ter sido simulado; 3. Na alegação de que não podia considerar-se validamente feita a comunicação da cessão de créditos; 4. Na alegação de que os juros só eram devidos desde a citação e nunca desde as datas que a decisão recorrida considerou; 5. Na alegação de que não havia mora do recorrente e que, sem mora, não havia lugar a juros; 6. Na alegação de que a sentença devia ter repartido as custas pelo autor e pelo réu, tendo em conta a decisão de julgar prescritos os juros de mora.

O autor respondeu ao recurso, dizendo que a sentença não merecia reparos, que não havia lugar à alteração da matéria de facto dada como provada e que devia manter-se a sentença.

Como se vê pela exposição acabada de fazer, o recurso suscita questões de facto e questões de direito.

Considerando que a resolução das questões de facto tem precedência lógica sobre a resolução das questões de direito, é por aquelas que iremos começar o julgamento do recurso.

As questões de facto em causa são as seguintes: Em primeiro lugar, o recorrente pede se julgue não provado que, “por diversas vezes, quer verbalmente quer por escrito, o réu foi interpelado para proceder ao pagamento dos valores constantes das facturas mencionadas em 1, o que nunca fez” [facto descrito na fundamentação sob o número 4].

Em segundo lugar, pede se julgue não provado que “A sociedade C... , Lda., através de contrato de cessão de créditos, outorgado no dia 4 de Junho de 2009, cedeu o crédito que detinha sobre o réu ao autor, correspondente ao valor das facturas mencionadas em 3, no montante de € 59.616,11” [facto descrito na fundamentação sob o n.º 6].

Para o caso de assim se não entender, pede se julgue provado apenas que “A sociedade C... , Lda., através de contrato de cessão de créditos, datado do dia 4 de Junho de 2009, declarou ceder o crédito que detinha sobre o réu ao autor, correspondente ao valor das facturas mencionadas em 3, no montante de € 59.616,11”.

Em terceiro lugar, pede se julgue não provado que “o autor notificou o requerido, em 04.06.2009, da cessão de créditos mencionada em 6.

”, Para o caso de assim se não entender pede se julgue provado que “o autor produziu a carta que constitui o documento de fls. 280 dos autos ou que “o autor produziu e remeteu ao réu a carta que constitui o documento de fls. 280 dos autos, datado de 04/06/2009”.

Em quarto lugar, pede se julgue não provada a 2.ª parte do ponto n.º 10 dos fundamentos de facto, ou seja “uma vez que, desde o início da sua actividade, a mesma foi sendo desenvolvida com capital próprio seu”.

Em quinto lugar, pede se julguem provadas as seguintes alegações: 1. Que “nem o cessionário pagou nem o cedente recebeu qualquer preço pela cedência do alegado crédito”; 2. Que “nem os alegados créditos alguma vez terão saído do activo da insolvente C... , por contrapartida da entrada do alegado preço da cessão», nem este (preço da cessão) alguma vez entrou no activo contabilístico da insolvente C...

.» 3. Que “aquando da outorga da cessão de créditos referida em 6, o autor apenas quis criar a aparência negocial da transmissão de créditos, em ordem a evitar a sua apreensão no processo mencionado em 11».

Por último, pede se julgue provada a alegação de que o processo referido em 11 [processo de insolvência da sociedade C... , Lda] foi encerrado por insuficiência da massa insolvente.

Sobre estas questões cabe dizer, em primeiro lugar, que este tribunal não irá conhecer das seguintes: 1. Da de saber se, “por diversas vezes, quer verbalmente quer por escrito, o réu foi interpelado para proceder ao pagamento dos valores constantes das facturas mencionadas em 1 [no ponto n.º 1 dos fundamentos de facto da sentença]; 2. Da de saber se “o processo referido em 11 – o processo n.º 868/11.5TBPBL que correu termos no 2.º juízo do tribunal judicial de Pombal, e no qual a sociedade C... SA foi declarada insolvente por sentença transitada em julgado em 12.12.2011 – foi encerrado por insuficiência da massa insolvente”.

E não irá conhecer delas vez que a sua resolução não tem qualquer utilidade/interesse para a decisão do recurso. E assim, em obediência ao princípio da limitação dos actos, enunciado no artigo 130.º do CPC, segundo o qual “não é lícito realizar no processo actos inúteis”, este tribunal não irá conhecer de tais questões. Vejamos.

As questões de direito suscitadas no recurso são, pela ordem por que foram expostas nas conclusões, as seguintes: 1. A de saber se a sentença decidiu correctamente ao julgar improcedente a alegação de que o contrato de cessão de créditos era nulo por simulação; 2. A de saber se decidiu correctamente ao condenar o réu no pagamento de juros de mora; 3. A de saber se a condenação em custas observou o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do CPC.

Sendo estas as questões, é bom de ver que não tem qualquer interesse para a resolução delas saber se o processo de insolvência da sociedade C... , Lda, foi encerrado por insuficiência da massa. De resto, o recorrente também não retira qualquer consequência jurídica da prova de tal facto.

Quanto à questão de saber se, por diversas vezes, quer verbalmente quer por escrito, o réu foi interpelado para proceder ao pagamento dos valores constantes das facturas identificadas no ponto n.º 3 dos fundamentos de facto, ela poderia ter interesse para responder à questão da legalidade da condenação, na parte relativa aos juros de mora.

Poderia ter, mas não tem. Na verdade, mesmo desconsiderando o regime especial da mora nas transacções comerciais, resultante do artigo 4.º do Decreto-lei n.º 62/2013, de 10 de Maio, a alteração da decisão de facto não conduziria ao resultado pretendido pelo recorrente (inexigibilidade de juros de mora). Com efeito, mesmo que não se provasse que o réu havia sido interpelado extrajudicialmente, sempre a interpelação teria de considerar-se feita com a citação, por aplicação do disposto no...

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