Acórdão nº 459/13.6TAMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelALICE SANTOS
Data da Resolução09 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.

*** No processo acima identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que:

  1. Absolveu o arguido A... , da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de difamação, previsto e punido pelo artigo 180.º, n.º1, do Código Penal, de que vinha acusado.

  2. Julgou improcedente por não provado o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante/assistente e, em consequência, absolveu o arguido/demandado A... do pedido contra si formulado.

    Desta sentença interpôs recurso o assistente K... , sendo do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso: 1 - O ofício que o arguido, concebeu, redigiu, assinou e dirigiu à ARS – Sub. Região de Saúde do Centro em (...) , e que intitulou de “Baixa médica irregular” “Reclamação”, compatibilizado com as declarações pelo mesmo prestadas em audiência de julgamento e portanto, constituem declarações confessórias, reafirmou ser estranha, esquisita, irregular a baixa médica atribuída pelo recorrente no exercício da sua profissão de médico e este fez “batota” para fazer “jeitos” à utente em questão, não constitui uma mera “reclamação” como o Tribunal entendeu, mas sim crime de difamação p. e p. pelo artº 180 nº1 do C. Penal.

    2 - O arguido, atenta a sua profissão, como advogado e Provedor da Santa Casa, para fundamentar junto da ARS Sub Região de Saúde do Centro em (...) , juntou ao oficio a cópia da baixa médica, que requisitou e onde se encontra devidamente identificado o médico que a emitiu, e portanto, contrariamente ao constante do facto não provado e identificado sobre a alínea a), não podia ignorar que a baixa médica emitida pelo recorrente à funcionária da Santa Casa da Misericórdia, era o seu próprio médico de família.

    Deveria portanto o facto considerado na alínea a) como não provado, por provado.

    3 - Resulta das declarações confessórias prestadas pelo arguido em audiência que o mesmo declarou que o recorrente para lhe dar a baixa com data de 14/5/2013 com efeitos a partir do dia 8, nem sequer viu ou observou a funcionária, pelo que, o facto não provado e identificado pela letra b) , deveria ter sido considerado por provado; 4 - Mesmo considerando que o arguido atuou no exercício do direito à crítica, o que não é verdade, nem é o caso, o arguido, mercê da sua profissão de advogado, experiente, astuto, avisado, que é, não podia ignorar que tal direito possui limitações estruturais e de apresentação, nomeadamente: - trata-se de defesa ou denúncia de um interesse público-social; - estar a opinião/reclamação incumbida de uma verdade objetiva dos factos; - ser a opinião/crítica conduzida com correção de linguagem; - ser a opinião expressa com continência dos termos utilizados ou empregues.

    Portanto não se tratou de mera reclamação.

    5 - O arguido com a conduta descrita, quis sim atingir o recorrente no seu brio profissional e reputação de médico, porque perfeito conhecimento possuía de que a sua conduta era de molde a produzir ofensa na sua honra e consideração.

    6 – O arguido com a conduta descrita cometeu portanto o crime de difamação, pois para se verificar a prática deste crime, se basta a consciência de que o que transmitiu à ARS de (...) ofende e ofendeu o recorrente na sua honra e consideração e esta consciência resulta do próprio depoimento prestado em audiência.

    7 – O arguido quis e conseguiu com a conduta adotada ofender e ofendeu a dignidade pessoal e profissional do recorrente/assistente e assim atingiu a sua honra e consideração por causa do exercício da sua profissão de médico e fê-lo de forma deliberada, livre e consciente, com manifesta intenção de o prejudicar social e profissionalmente.

    Conforme se alegou o arguido tinha ao seu dispor a possibilidade de obter junto da Direção do Centro de Saúde onde o assistente prestava serviço, informações sobre o modo de funcionamento das baixa médicas, mas não o fez. Foi dirigir-se à Diretora da ARS.

    8 – Uma vez que na realidade o arguido cometeu o crime de que vinha acusado, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida e, em consequência ser o arguido condenado pela prática do crime de difamação, e, procedente o pedido de indemnização civil formulado.

    9 – Com a sentença proferida foi violado o disposto nos artºs 127 e 180 do Código Penal.

    VV. Exªs assim decidindo farão a costumada Justiça.

    O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.

    Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela procedência do recurso.

    Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto apenas apôs o visto.

    Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência cumpre agora decidir.

    O recurso abrange matéria de direito e de facto já que a prova foi documentada.

    Da discussão da causa resultaram provados os factos seguintes constantes da decisão: 1. Com data de 15 de Maio de 2013, o arguido, na qualidade de Provedor da Santa Casa da Misericórdia da (...) remeteu para a ARS – Administração Regional de Saúde do Centro – Sub Região de Saúde do Centro, (...) , um ofício por si assinado, na qualidade de Provedor da Santa casa da Misericórdia e com o assunto identificado como: “Baixa médica irregular” “Reclamação”.

    1. O ofício referido em 1. apresenta o seguinte teor: “Exmo.s Senhores: Serve a presente para apresentar reclamação quanto a uma baixa médica, que consideramos irregular, dada a uma nossa empregada, J.... , beneficiária da Segurança Social com o n.º (...) , porquanto: 1.º - Esta Senhora tem muito má assiduidade ao serviço, desde há mais de ano; 2º- Normalmente chega atrasada ao trabalho, devendo iniciar às 8,00 horas e chegando muitas vezes às 10,00 horas; 3º- Falta por tudo e por nada, sem nunca avisar previamente; 4º- A partir do dia 6 do corrente, deixou de comparecer ao serviço, tendo sido instaurado contra ela um processo disciplinar.

      5º- No dia 14 do corrente...

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