Acórdão nº 254/10.4TTFIG.1.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Setembro de 2016
Magistrado Responsável | RAMALHO PINTO |
Data da Resolução | 15 de Setembro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: Por considerar que se registava uma situação de agravamento das sequelas decorrentes do acidente de trabalho a que estes autos se reportam, bem assim como da incapacidade correspondente às ditas sequelas agravadas, requereu o sinistrado incidente de revisão de incapacidade.
Efectuado exame por por junta médica, os Srs. peritos foram de parecer que se tinha registado efectivamente o agravamento denunciado pelo sinistrado, razão pela qual entenderam que deveria ser atribuída ao sinistrado uma IPP de 75,45%, com IPATH.
A fls. 354, o sinistrado apresentou atestado médico, onde se considera que o mesmo tem aptidão física e mental para a condução de veículos das categorias B e B1 (Grupo 1), sendo essa condução “limitada a velocidade inferior a 100 Km/ hora; Caixa de velocidades automática; pedal do travão adequado para ser utilizado pelo é esquerdo”.
Notificada de tal documento médico, a seguradora nada veio dizer em relação ao mesmo.
Tendo sido notificado para apresentar orçamentos de viatura a adquirir, o sinistrado veio juntar dois- de um Volskwagen Golf Sportsvan 2.0 TDI- 150 cv, no valor de € 25.900,00 - fls. 367, e de um Ford Grand C-MAX 2.0 TDCi- 150 cv, no valor de € 24.181,11- fls. 372.
A fls. 379, o sinistrado apresentou requerimento do seguinte teor: “ A... , Sinistrado no âmbito do processo à margem referenciado e nele melhor identificado, notificado do requerimento junto pela Entidade Responsável, vem expor e requerer a V. Exa. o seguinte: 1. O Sinistrado, que anteriormente ao sinistro ocorrido, era pessoal saudável e com mobilidade plena, avançou com o presente processo, que de bom grado dispensaria pois seria demonstrativo que nenhuma consequência ao nível da sua saúde teria ocorrido pelo sinistro em causa, com o objectivo de ver ressarcidos, os prejuízos que sofreu.
2. Nesse sentido, anteriormente ao acidente, exercia as funções de motorista de pesados, auferindo um vencimento líquido de €2.256,63 (dois mil duzentos e cinquenta e seis euros e sessenta e três cêntimos).
3. Após o acidente, passou a auferir uma pensão vitalícia, que hoje se cifra no montante líquido de €1.352,92 (mil trezentos e cinquenta e dois euros e noventa e dois cêntimos) — o seu único rendimento actual — cumulando, até Fevereiro de 2014, com o subsídio de desemprego.
4. Sucede que o Sinistrado tinha uma vida orientada e gerida de acordo com os rendimentos que auferia, praticamente o dobro à data do acidente - daqueles que aufere hoje.
5. Ora, hoje em dia as suas dificuldades financeiras são grandes.
6. Pois está impedido de exercer quaisquer funções.
7. Aliás, se a incapacidade atribuida em 2011 ao Sinistrado foi de 56,48%, em Abril de 2015, a mesma foi fixada em 75,45% e, infelizmente com tendência para agravar.
8. Em consequência, refere o Sinistrado que não tem quaisquer possibilidades de adquirir uma viatura, colocando-se a Entidade Responsável na confortável situação de suportar as despesas de adaptação do veículo, sabendo que as mesmas, tendo em conta o universo do preço de aquisição de um veículo, são meramente residuais.
9. 0 Sinistrado sofreu e sofre física e psicologicamente em consequência das marcas paratoda a sua vida que possui do sinistro.
10. Nunca foi ressarcido por quaisquer danos morais relativamente ao acidente.
11. Encontra-se em casa desde 15 de Setembro de 2014 — há mais de um ano — pois está impossibilitado de conduzir veículos que não sejam adaptados, em virtude do atestado médico que lhe permitia a condução de veículos ditos “normais” ter expirado na data mencionada, conforme melhor se pode comprovar pelo documento que se anexa sob a forma de n.º 1.
12. Aliás, a situação que vive já foi impeditiva de o Sinistrado frequentar duas formações a que foi chamado pelo Centro de Emprego, que se viu obrigado a não comparecer, por não se poder deslocar até aos locais em que as mesmas decorreriam, nem tão pouco lhe ser paga qualquer deslocação.
13. Situação essa que levou à sua exclusão da lista de desempregados, pelas faltas referidas, não constando o nome do Sinistrado como desempregado.
14. Pelo que nesse sentido, não tem quaisquer condições de suportar a aquisição de um veículo, sem que o mesmo seja pago pela Entidade Responsável — R... — Companhia de Seguros, S.A.
15. Opondo-se, em consequência, de forma frontal, a que a Entidade Responsável se responsabilize, somente, pelo pagamento da adaptação da viatura, mas sim pela aquisição e adaptação da mesma, conforme decorre do clausulado no contrato de seguro assinado”.
Em resposta, a seguradora veio, a fls. 376, dizer: “Só aceita responsabilizar-se, após sinistrado adquirir a viatura, pelo acréscimo da adaptação mediante apresentação de orçamento”.
Foi, então, proferido o seguinte despacho: “No presente incidente de revisão de incapacidade para o trabalho, em que é Sinistrado A... e (atual) Entidade Responsável “ R... – Companhia de Seguros, S.A.”, o Sinistrado A... veio requerer exame de revisão, nos termos do Art. 145º, n.º 7 do Código de Processo do Trabalho, que se realizou com os resultados que constam dos autos, após o que foi requerida, pela Entidade Responsável “ R... – Companhia de Seguros, S.A.”, a realização de junta médica, que se efetuou sem qualquer reclamação das partes.
* (…) Resultam provados os seguintes factos, ordenados e concatenados lógico-cronologicamente: […] (…) Assim, considerando que o Sinistrado ficou afetado de Incapacidade Permanente Parcial de 75,45 %, com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, os direitos do Sinistrado consistem na atribuição de uma pensão anual e vitalícia, nos termos dos Arts. 10º, al. b) e 17º, n.º 1, al. b) da Lei n.º 100/97, cujo valor ascende a € 18.792,11 (dado que € 28.870,98 x 70 % = € 20.209,67 e € 28.870,98 x 50 % = € 14.435,49, pelo que (€ 20.209,67 - € 14.435,49) x 75,45 % = € 4.356,62 + € 14.435,49), a ser paga em 1/14 até ao 3.º dia cada mês e ainda os subsídios de férias e de Natal, de idêntico montante, a serem pagos em maio e em novembro (Art. 51º, n.os 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 143/99).
3.3.1 – Quanto à aquisição, pelo Sinistrado, de uma viatura automóvel adaptada às sequelas de que ficou afetado, concorda-se com o exposto e requerido pelo Sinistrado, a fls. 379/380 do processo em papel (a cuja factualidade não foi, propriamente, deduzida qualquer oposição pela Entidade Responsável), e já promovido pelo Ministério Público.
Assim, considera-se, efetivamente, que o Sinistrado tem direito, nos termos do Art. 10º, al. a) da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, e dado também que está habilitado para a sua condução, ao pagamento pela Entidade Responsável da quantia necessária para a aquisição de uma viatura automóvel adaptada às sequelas com que ficou afetado em resultado do acidente de trabalho objeto deste processo (cfr., por todos e mutatis mutandis, o Acórdão da Relação do Porto de 11 de outubro de 2011, consultado em www.dgsi.pt, em que se escreveu “Quanto à condenação a pagar o subsídio de readaptação automóvel é certo que tal prestação não está assim prevista na LAT. É também certo que nos autos não há qualquer orçamento ou elemento de prova que indique qual o valor da readaptação ou qual o valor mínimo da readaptação. Por isso mesmo, de novo a fixação do valor respetivo foi remetida para a liquidação da sentença, mas por isso mesmo não podia ser fixado um limite mínimo. O recorrido não tem direito a que a recorrente lhe pague a despesa que realizar com a readaptação do seu automóvel, se possível, ou com o custo de aquisição dum veículo já adaptado? Bem pelo contrário. A reparação infortunística laboral, tenha carácter objetivo e responda a seguradora por força do contrato de seguro, importa – como custo da proteção obtida na vivência numa sociedade organizada - na observância dos direitos reparatórios que da lei (e não do contrato) derivam. Dito por outro modo: a seguradora, chamada a responder por força do contrato, responde pelas prestações que derivam da lei. E tais direitos reparatórios visam, na herança civilística, a maior aproximação possível à reparação natural. O que se pretende na reparação dos danos derivados dum acidente de trabalho é, não apenas compensar a perda da capacidade de ganho, mas tanto quanto possível recuperar o sinistrado para a vida ativa – esta é a razão pela qual, não se contesta, este sinistrado tem direito às próteses e à sua renovação. O conceito de vida ativa não é colado ao conceito de vida ativa laboral, mas tem esse alcance mais geral, mais próximo da reparação natural, que é a vida que o sinistrado tinha – ou podia ter – antes de ter sofrido as lesões que lhe resultaram do acidente. Se é claro que um automóvel não é uma prótese, no caso do sinistrado ter um automóvel antes do acidente e poder guiá-lo, se as lesões que sofreu com o acidente já não lhe permitem fazê-lo, está o mesmo privado da sua vida ativa – não se trata do seu conforto, trata-se da sua capacidade de agir como qualquer outro cidadão que tem e pode guiar o seu automóvel. Está privado de levar o filho ao hospital, ou de ir passear, ou de iniciar uma vida laboral nova como taxista (por improvável que seja) está privado quer antes utilizasse muito ou pouco o carro, porque estaria na sua liberdade natural utilizá-lo no futuro, muito ou pouco. Não assim pertinência perguntar se a necessidade do veículo é pontual, para os casos em que a mulher do sinistrado não possa conduzir, porque o sinistrado não era e não tem passar a ser dependente da mulher, neste particular, e porque esta não tinha nem tem de ter carta. Queremos dizer que, embora o artº 10º da LAT remeta os termos das prestações em espécie que elenca na sua al. a) para a futura regulamentação, e esta se encontre no artº 23º do DL 143/99, este elenco tem de ser interpretado à luz do objetivo que aquele artº 10º dispõe, ou seja, “quaisquer outras (prestações), seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas à recuperação do...
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