Acórdão nº 287/14.1GACNF.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE FRAN
Data da Resolução14 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA Nos autos de inquérito (actos jurisdicionais) que, sob o nº 287/14.1GACNF, correram termos pela Secção de Competência Genérica da Instância Local de Cinfães, da Comarca de Viseu – J1, em que é arguido A...

o MP, a encerrar o inquérito, remeteu o processo à M.ma Juíza, a fim de esta se pronunciar, em termos de concordância ou não, com a aplicação da suspensão provisória do processo.

Foi então proferido despacho do seguinte teor: «Os presentes autos de inquérito iniciaram-se com a queixa apresentada por B... contra A... , porquanto, no dia 05.12.2014, cerca das 03:00 horas, quando ambos se encontravam no interior do estabelecimento de café ‘ x... ’, sito em Nespereira, Vila Chã, envolveram-se numa discussão fútil, tendo o arguido agredido fisicamente o ofendido com murros e pontapés. O Ministério Público considerou estar em causa, nos autos ora em análise, a eventual prática do crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal, embora com a particularidade prevista n.º 3, alínea b) daquele preceito legal, ou seja, “o tribunal pode dispensar de pena quando o agente tiver unicamente exercido retorsão sobre o agressor.” Efetivamente entendeu o M.P., com base na prova carreada para os autos, designadamente o teor das declarações prestadas pelas testemunhas, C... e D... , com conhecimento direto dos factos, que resultam indícios suficientes, que, nas circunstâncias de tempo e lugar supra descritas, B... desferiu primeiro um murro na cabeça do arguido, e logo após estes se envolveram em agressões mútuas, tendo-se, assim, logrado provar que existiu unicamente retorsão por parte do arguido. Neste jaez, sempre haveria lugar à dedução de acusação pública pela prática, do arguido, na forma consumada e em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal. No entanto, considerou o Ministério Público estarem verificados os pressupostos da aplicação do instituto da dispensa de pena ao aqui arguido, A... , porquanto se apurou que este unicamente exerceu retorsão sobre o ofendido Laurentino. Nesta senda, concluiu o Ministério Público que atendendo, por um lado, às agressões que são imputadas ao arguido, e, por outro lado, ao facto de se ter apurado que o arguido exerceu retorsão sobre o ofendido Laurentino, pelo que remeteu os presentes autos ao Juiz de Instrução Criminal, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º, n.º 1 do Código de Processo Penal. Cumpre apreciar e decidir da admissibilidade do instituto da dispensa de pena nos autos ora em análise. Assim, dispõe o artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal que “quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa”. Neste conspecto, resultam dos elementos que integram os presentes autos indícios suficientes que, nas circunstâncias de tempo e lugar supra descritas, B... desferiu primeiro um murro na cabeça do arguido, e logo após se envolveram em agressões mútuas, com murros e pontapés, não tendo resultado lesões graves no corpo do ofendido. Note-se que na data da elaboração do relatório pericial o ofendido não apresentava quaisquer lesões. Ou seja, resulta suficientemente indiciado que o referido arguido praticou um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal, o que determinaria a dedução de acusação pública contra este. Contudo, foi possível apurar que o arguido exerceu unicamente retorsão sobre o ofendido Laurentino. Ora, nos termos do disposto no artigo 143.º, n.º 3, alínea b) do Código Penal, o Tribunal pode dispensar de pena quando o agente tiver unicamente exercido retorsão sobre o agressor, o que se verifica nos presentes autos. Deste modo, importa analisar o disposto no artigo 280.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, onde se prevê que “se o processo for por crime relativamente ao qual se encontre expressamente prevista na Lei penal a possibilidade da dispensa de pena, o Ministério Público, com a concordância do Juiz de Instrução pode decidir-se pelo arquivamento do processo, se se verificarem os pressupostos daquela dispensa”. Assim, o arquivamento por dispensa de pena impõe que para o crime indiciado se encontre expressamente prevista na Lei penal a possibilidade da dispensa de pena, bem como, por imperativo do disposto no artigo 74.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal, os seguintes requisitos cumulativos: a) a ilicitude do facto e a culpa do agente sejam diminutas; b) a reparação do dano; e c) se à dispensa de pena se não opuserem razões de prevenção.

Neste conspecto, o instituto da dispensa de pena tem como base ‘a declaração de culpa sem declaração de pena’. No crime de ofensa à integridade física simples – como já expresso – a possibilidade de dispensa de pena encontra-se expressamente prevista na Lei Penal, designadamente no disposto no artigo 143.º, n.º 3 do Código Penal. Por outro lado, verifica-se no caso concreto o preenchimento do estabelecido na alínea b) do n.º 3 do artigo 143.º do Código Penal, porquanto nos presentes autos se logrou provar que o arguido exerceu unicamente retorsão sobre o agressor. Importa, ora, analisar a verificação dos requisitos cumulativos previstos no artigo 74.º, n.º 1 do Código Penal. Perante os factos carreados para os presentes autos, verifica-se que está em causa uma contenda física entre o arguido A... l e o ofendido Laurentino donde não resultaram lesões graves à integridade física deste, sendo que na data da elaboração do relatório pericial o ofendido não apresentava quaisquer lesões, cfr. relatório de perícia de avaliação do dano corporal em direito penal junto a fls. 63-65. Assim sendo, as agressões foram perpetradas num ambiente de ação/reação. Assim, e aderindo à posição do Ministério Público manifestada a fls. 74-79, entendemos que a ilicitude e a culpa da conduta do arguido são diminutas, porquanto, este, num clima de exaltação e discussão, agrediu o ofendido, exercendo unicamente retorsão sobre este, não tendo resultado...

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