Acórdão nº 2330/16.0T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução20 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A..., S.A., com sede na (...) , intentou a presente acção declarativa condenatória com forma de processo comum ao abrigo do artigo 22º do CIRE contra: B..., casado, residente em (...) .

Formula o seguinte pedido: - Condenação do réu ao pagamento da quantia de € 200.000,00, a que acrescem juros vincendos desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Alega, em síntese, os seguintes factos: - Em 11/1/2016, e conforme previsto no respectivo contrato de cedência de exploração outorgado com o réu em 8/3/2011, a autora comunicou ao requerido a resolução daquele contrato, encontrando-se por liquidar as rendas de Novembro e Dezembro 2015, sendo-lhe exigíveis, ademais, as vincendas até Abril de 2016. A circunstância de à data estarem em atraso 2 meses de renda resultava de uma prática comum sem que isso traduzisse qualquer falta da autora, pois, atendendo às relações pessoais, era normal que nem os pagamentos nem a emissão dos recibos fosse totalmente rigorosa.

- O réu conhecia que a A... se encontrava na plenitude das suas funções, com a sua produção nos limites da sua capacidade de exploração, como efectivamente se encontrava, pese embora as conhecidas dificuldades que a suinicultura começava a atravessar nesse período. A autora sempre cumpriu os seus compromissos, pagando atempadamente aos seus fornecedores e trabalhadores, nunca tendo sido citada para qualquer acção judicial, à excepção de alguns processos referentes a litígios laborais, mas que sempre terminaram por transacção, que honrou.

- Em 23 de Março de 2016, a autora foi surpreendida por dois parceiros comerciais que lhe deram conta de que o crédito tinha cessado, em concreto a fornecedora de cereais e o banco com o qual mantém mais relações comerciais, por eles tomando a autora conhecimento de que circulava nos meios informáticos e públicos que se encontrava pendente um processo de insolvência contra si requerido pelo réu, que alegou factos que sabia não corresponderem à verdade, o que fez como retaliação contra a cessação do contrato de cedência de exploração e com o intuito de prejudicar como prejudicou a autora e a sua imagem criada ao longo de vários anos.

- Depois de a autora efectuar o pagamento de € 25.000,00, o réu declarou à autora que desistiria do processo de insolvência na condição de ser assinada por esta uma declaração em como prescindia de qualquer indemnização, que a autora assinou apenas para evitar mais prejuízos.

- Especifica os prejuízos decorrentes da conduta do réu, que faz corresponder a cerca de € 200.000,00, € 100.000,00 decorrentes da necessidade de vendas forçadas em momento de baixa de preço por motivos de gestão de crédito) e € 100.000,00 decorrentes de perda de descontos na compra de cereal por força da inserção do seu nome na lista de clientes de alto risco.

Contestou o réu, pugnando pela improcedência da acção. Sustenta que: - A autora deixou de cumprir a obrigação de pagamento das rendas, sendo prática comum o seu não pagamento pontual.

- Na carta que enviou ao réu a declarar resolver o contrato, a autora invocou falta de rentabilidade no negócio, fundamentando a sua pretensão em alterações do mercado que desencadearam a grande crise no sector da suinicultura.

- Por diversas vezes interpelada, a autora não respondeu nem liquidou as rendas em atraso.

- Tornou-se notório o justo receio de não pagamento da quantia em dívida, sendo que das consultas efectuadas o réu verificou que os imóveis da autora se encontravam onerados com hipotecas de valor elevado, superiores ao valor dos imóveis.

- O réu conhecia a existência de outros credores da autora.

- Após tomar conhecimento da instauração do processo de insolvência, não por força da citação mas por informação prestada pela fornecedora de cereais e por instituição bancária, a autora providenciou pelo pagamento das rendas em atraso solicitando a declaração de desistência da acção, tendo voluntariamente assinado a declaração em causa.

- A acção nem sequer chegou a ser publicitada.

Proferiu-se despacho de convite ao aperfeiçoamento por parte da autora, no sentido de concretizar quais os prejuízos que sofreu, a que esta respondeu, cf. fl.s 65 v.º e 66, tendo sido exercido o contraditório.

* Realizou-se audiência prévia, no âmbito da qual se fixou o valor da causa e se proferiu o despacho destinado a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova, os quais não foram objecto de reclamação.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 91 a 98 v.º, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e, a final, se julgou a presente acção improcedente, por não provada, absolvendo-se o réu do pedido contra ele formulado, ficando as custas a cargo da autora.

Inconformada com a mesma, interpôs recurso a autora A... , SA, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida, imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 141 v.º), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1. A recorrente A... , SA, não se conforma com a sentença de que agora recorre.

  1. A recorrente considera no seu modesto entender não ter sido efetuada uma correta apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento, assim como não foi efetuada uma adequada aplicação do direito aos factos.

  2. O presente recurso versa sobre a matéria de facto, nomeadamente, insurge-se quanto aos factos considerados como não provados, os indicados nas alíneas: a),b), c), d), e), f), g), h), i), j), k), l), m), n), p), r), s), por considerar não ter sido efetuado uma correta apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento.

  3. Quanto ao facto considerado como não provado na alínea a), o mesmo deveria ter sido considerado como provado, atentas as declarações da testemunha C..., prestadas em sede de audiência de julgamento pela testemunha, prestadas a 18-9-2017 com a referência 20170918153549-3722904-2870954, ao minuto 12.25 ao minuto 13.16.

  4. O Mmo Juiz a quo não considerou o facto identificado na alínea a) como provado, porquanto apenas a testemunha C..., afirmou ter presenciado a exigência da declaração.

  5. O número de testemunhas não é condição para determinado factos ser considerado ou não como provado.

  6. O Mmº Juiz, inexplicavelmente, não fundamentou a não atribuição de credibilidade ao testemunha prestado quanto a tal facto, limitando-se a fazer constar que “não é de todo de afastar a possibilidade de declarações com este conteúdo serem habitualmente emitidas em situações de litigio como aquele que separava a autora do réu.” 8. Tal como o testemunho de C..., o testemunho de D..., prestado em 18/09/2017, com depoimento registado a 20170918162203-3722904-2870954 ao minuto 9.33 a 9.56, impõe que o facto a) seja considerado como provado.

  7. A A. não tinha qualquer interesse em propor e emitir uma declaração que beneficiava o Réu, nomeadamente que renunciava ao direito de agir por via judicial ou extrajudicial contra o Réu, ou de exigir àquele qualquer indemnização.

  8. Tal testemunha apenas não respondeu de forma clara a tal questão, tendo respondido com evasivas, não sabendo se fora da sua iniciativa ou do mandatário da A. a inclusão do teor da declaração aqui em causa.

  9. Longe das regras do normal acontecer, não faz qualquer sentido, declarar que a declaração fora da iniciativa da A, ou seu mandatário, 12. A A. não tinha qualquer interesse em propor tal declaração, quando pagou a quantia que estava em dívida.

  10. No espirito da emissão de tal declaração, outra razão não poderia aí estar subjacente, que o reconhecimento do infundado pedido de insolvência, e o reconhecimento dos prejuízos e consequências que tal processo trouxe e traria à agora A.

  11. O tribunal a quo não poderia simplesmente, não atribuir credibilidade ao testemunho da testemunha C..., e fazer constar que apenas ele relatou tal situação, quando ao mandatário da A. não foi permitido efetuar tal questão ao então mandatário do réu e agora testemunha D....

  12. Assim, o facto a) dos factos não provados, deverá ser considerado provado, quer porque a prova testemunhal assim o impõe, quer porque o Tribunal a quo não fundamenta de forma razoável a razão de não atender ao mesmo.

  13. Quanto ao facto considerado não provado identificado com a alínea b), o Mmº Juiz a quo considerou como não provado que o réu, tenha instaurado a ação de insolvência contra a A. como forma de retaliação pelo facto da A. ter declarado cessar o contrato de exploração com o único propósito de prejudicar a A.

  14. A ação de insolvência, não é uma ação de cobrança de dívidas, 18. O processo de insolvência tem como finalidade a liquidação do património de um devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores, ou a satisfação destes através de um plano de insolvência que se baseie na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente.

  15. A insolvência traduz a situação daquele que está impossibilitado de cumprir as suas obrigações, normalmente, por ausência da necessária liquidez em momento determinado ou em certos casos porque o total das suas responsabilidades excede os bens de que pode dispor para as satisfazer.

  16. Se o Réu, pretendia efetivamente receber o seu crédito, teria de intentar a competente ação de cobrança, e não, tentar que todo o património da A. fosse liquidado, com manifesto prejuízo para si 21. Pelo que, outro objetivo não teria que prejudicar a A., por ter deixado de explorar as instalações suinícolas do Réu, afastando-a do mercado.

  17. Aliás, contrariamente ao constante da douta sentença, o facto do Mmº Juiz a quo considerar que não se compreende qual a razão de tal retaliação por parte do Réu, é justificável, pela meridiana razão, de que nada, nenhum elemento permitia concluir que a A. estivesse insolvente.

  18. A situação económico financeira da A. não preenchia qualquer dos...

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