Acórdão nº 3361/09.2TBPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução30 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 3361/09.2TBPVZ.P1-Apelação Origem: Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim-2º Juízo Competência Cível Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Rita Romeira 2º Adjunto Des. Caimoto Jácome Sumário: I- Ainda que se trate de um só edifício, mas cuja configuração integre uma estrutura que se possa autonomizar em relação aos demais prédios, é possível constituir-se uma assembleia restrita de condóminos, com poderes administrativos para essa mesma estrutura a par do condomínio que pode e deve existir para o edifício como unidade predial.

II- E, para esse efeito não é necessário que no título constitutivo da propriedade horizontal venham definidas as especificações que integram de modo autónomo esse mesmo edifício.

III- A falta de personalidade judiciária não pode ser sanada pelo recurso à excepção do abuso de direito.

*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Condomínio do Edifício …, com sede na …, nº … Póvoa de Varzim intentou contra B…, Lda com sede na …, nº .., C/V Esq., Lisboa, acção declarativa com processo ordinário, peticionando a sua condenação na eliminação dos defeitos existentes no edifício que foi objecto da sua intervenção no âmbito do contrato de empreitada celebrado entre ambas.

*Devidamente citada, veio a Ré contestar alegando ter procedido à resolução do contrato celebrado com o Autor e ainda excepcionar a caducidade do direito de denúncia dos defeitos bem como da sua eliminação, pugnando, a final, pela improcedência da acção.

*Replicou o Autor e, após ter feito a ampliação do pedido e da causa de pedir, concluiu como na petição inicial.

*A Ré ainda apresentou tréplica solicitando o indeferimento da ampliação do pedido e da causa de pedir.

* Procedeu-se à elaboração de despacho saneador, com organização da matéria assente e da base instrutória que não foi objecto de qualquer reclamação, precedido tal despacho daquele que admitiu a ampliação do pedido e da causa de pedir.

*Após a realização das diligências de prova requeridas pelas partes foi agendada e audiência de julgamento.

*Na data para ela designada e após a sua abertura veio a Ré invocar a ilegitimidade do Autor por carecer de personalidade judiciária.

Alegou para tal que o conjunto de fracções agrupadas sob a denominação de Condomínio do Edifício … não representa a totalidade da propriedade horizontal do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº 2462/19970303 da freguesia da Póvoa de Varzim, pois que, analisando a certidão do registo predial verifica-se que o imóvel em causa está constituído em propriedade horizontal e integra além da parte habitacional o centro comercial, por conseguinte, o denominado Condomínio do Edifício …, por ser relativo apenas a uma parte das fracções autónomas e das partes comuns que integram o imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº 2462/19970303 da freguesia da Póvoa de Varzim, não tem personalidade judiciária o que constitui uma excepção dilatória de conhecimento oficioso e determina a absolvição da instância.

*Respondeu o Autor pugnando pela improcedência da excepção e pela admissibilidade da constituição de condomínios relativamente a parte do prédio constituído sob uma única propriedade horizontal.

*Conhecendo da invocada excepção o tribunal concluiu pela falta de personalidade jurídica do Autor e absolveu a Ré da instância.

*Não se conformando com o assim decidido veio o Autor interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: 1.- O Recorrente não se conforma com a decisão recorrida; 2.- Existe diferente jurisprudência e acórdãos, atinentes a outros tantos blocos da referida propriedade horizontal, que reconheceram a personalidade judiciária de administrações compartimentadas de blocos da mesma propriedade horizontal.

  1. - A unidade do título constitutivo de propriedade horizontal não exclui o funcionamento de mais do que um condomínio.

  2. - Não se pode falar de inexistência do condomínio, ou de falta de personalidade, pois que a estrutura de condomínio existe e está correlacionada com as deliberações dos condóminos nesse sentido.

    3- Referindo-se o próprio título de constituição de propriedade horizontal (escritura pública) a um conjunto habitacional e centro comercial, composto de cave, subnível e rés-do-chão, constituindo o subnível e rés-do-chão o centro comercial interligados por escadas interiores e o rés-do-chão constituído por três torres: uma a nascente de três andares, formada por dois blocos e outra a poente, de cinco andares composta por dois blocos e outra sul composta por um único bloco, é possível ao abrigo do art. 1438.º-A do CC constituir condomínios separados e autónomos correspondentes a cada uma das torres do conjunto habitacional, bastando para tal uma deliberação em assembleia de condóminos nesse sentido, de forma a tornar mais eficaz a gestão de cada uma das torres que integram o complexo, sendo certo que relativamente a cada um dos blocos que as compõem, se verificam os demais requisitos legais da propriedade horizontal enunciados no art. 1417.º e 1418.º do C. Civil.

    4- E havendo já uma administração (de facto) relativamente a uma dessas torres não se pode falar que haja inexistência jurídica de tal condomínio, quando de facto existem todas as condições estruturais para a legalização autónoma de tal condomínio.

    5- O condomínio do Autor reporta-se a parte daquele prédio que tem entrada pelo n.º… da Avenida …/…, correspondente à torre sul, perfeitamente autonomizada na propriedade horizontal, constituído pelas fracções DP a FV com 55 fracções autónomas e partes comuns que compõem e constituem a totalidade da propriedade horizontal, tal qual resulta do título constitutivo da mesma.

    6- Nesse sentido vejam-se os Dr.s Rodrigues Pardal e Dias da Fonseca (Da Propriedade Horizontal no Código Civil e Legislação Complementar), 6.ª ed., 125, falando, não em mais do que um “edifício”, mas em zonas ou torres de um “edifício”. E logo frisam que o título constitutivo “deve assinalar devidamente cada zona ou torre e suas fracções autónomas e respectivas partes comuns”.

    7- Nos termos do disposto do artigo 1438.º A do Código Civil, o regime da propriedade horizontal pode ser aplicado, com as necessárias adaptações, a conjuntos de edifícios contíguos funcionalmente ligados entre si pela existência de partes comuns afectas ao uso de todas ou de algumas unidades ou fracções que os compõem.

    8- Esta disposição tem por escopo a integração no regime da propriedade horizontal do conjunto de edifícios em situação de interdependência das fracções ou edifícios e da sua dependência funcional das partes comuns, estas por envolverem as essenciais características do condomínio.

    9- A nossa legislação consigna deste modo uma dualidade de regimes da propriedade horizontal, um relativo ao conjunto de edifícios com as aludidas características, e o outro concernente a edifícios não integrados em conjuntos, ou seja, os fraccionados. Acresce, como bem é referido pela nossa melhor jurisprudência, quando é muito extenso o número de fracções prediais envolvidas, é o caso sub judicie, pode configurar-se o interesse de todos os condóminos na sua divisão para efeitos de administração.

    10- Não há qualquer proibição legal nessa divisão, atribuindo a lei à assembleia de condóminos ou ao administrador a aprovação do regulamento do condomínio, o qual se destina a disciplinar o uso, a fruição e a conservação das partes comuns, ou seja, relacionado com a administração destas–art.º 1429.º- A CC.

    11- Por outro lado, em situações de propriedade horizontal de edifícios integrados por blocos, em que algum ou alguns deles é servido por partes comuns que lhe são exclusivamente próprios, ou seja, que não sirvam funcionalmente outros blocos, como é o caso, não há qualquer proibição legal de que todos os condóminos aprovem a administração autónoma relativa a...

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