Acórdão nº 487/11.6TBMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelRUI MOREIRA
Data da Resolução08 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

PROC. Nº 487/11.6TBMTS.P1 Comarca do Porto – Tribunal da Póvoa de Varzim Inst. Central - 2ª Secção Cível - J3 REL. N.º 253 Relator: Rui Moreira Adjuntos: Henrique Araújo Fernando Samões*ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: 1 - RELATÓRIO COMPANHIA DE SEGUROS B…, SA, com sede no …, em Lisboa intentou contra C…, residente na Rua …, …., sala .., em Matosinhos, acção de condenação com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 77.832,10, acrescida dos juros de mora à taxa legal, desde a data da p.i até integral pagamento, a contar sobre €68.263,93, quantia esta que lhe deve já que, em execução de um contrato de seguro entre ambos celebrado, acabou por lha entregar duas vezes, com o que o réu teria violado as suas obrigações contratuais.

Sustentando a sua pretensão, alegou que celebrou com o réu um contrato de seguro do ramo vida, titulado pela apólice n° …….., por força do qual ele tinha direito a receber da autora, decorridos 8 anos, isto é em 22 de Maio de 2006, a quantia de € 68.263,93 euros. Tendo-se vencido este crédito, o réu reclamou-lhe o seu pagamento, que afirma ter satisfeito.

Porém, o réu omitiu-lhe que havia dado à penhora esse mesmo crédito, em execução movida pela Fazenda Nacional, no âmbito de uma execução contra si instaurada; e bem assim que, na sequência dessa penhora, o D… operara o resgate antecipado e total do produto financeiro em causa, entregando a quantia daí resultante em pagamento à Fazenda Nacional, na medida do necessário, e o remanescente ao próprio réu.

Na tese da ora apelante, então autora, tendo o réu omitido que já havia recebido o valor do seguro e reclamando o mesmo perante a autora, teria violado um dever essencial do cumprimento das obrigações a que estava sujeito no âmbito de tal contrato de seguro, constituindo-se assim na obrigação de a indemnizar pelo prejuízo causado, prejuízo este correspondente à quantia de € 68.263,93 que embolsou e não deveria ter recebido.

Contestou o réu, dizendo que desconhecia qualquer penhora, tendo sempre actuado de boa-fé. Concluiu pela improcedência total do pedido. Mais pediu a condenação da autora como litigante de má-fé, alegando que ela distorceu a realidade dos factos e dos direitos, com o propósito de se locupletar à sua custa.

Replicou a autora, defendendo-se da imputação de litigância de má-fé e concluindo como na p.i.

O processo foi preparado para julgamento e, realizada a audiência, foi proferida sentença que declarou a acção improcedente, por não se reconhecer o incumprimento contratual invocado pela autora, pois que o contrato já se encontrava extinto ao tempo em que lhe fez o pagamento do valor de € 68.263,93; e, bem assim, por se ter entendido não poder subsumir-se a situação sub judice ao regime do enriquecimento sem causa.

É esta sentença que a autora vem impugnar através do presente recurso, que termina com as seguintes conclusões: 1. Perante a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento e face aos documentos juntos aos autos (nomeadamente, a apólice de seguro e os documentos juntos pela Autora e pelo Réu na sessão da audiência de julgamento de 26 de Junho de 2014.) nunca o Tribunal recorrido podia dar como provado o facto constante do nº 10 da douta sentença recorrida nos termos em que o fez.

  1. Nos termos das alíneas a), b) e c) do nº 1 do art. 640º do CPC, entende e defende a Ré que o facto constante do n° 10 da douta sentença recorrida tem de ser dado como provado nos termos seguintes: "O D…, SA tinha autorização da Autora para proceder ao débito na conta desta aberta naquele banco, n° ……….. de pagamentos relacionados com o resgate antecipado do produto financeiro …, estando autorizada a pagar ao Réu o montante do capital seguro devido em caso de resgate".

  2. E isto porque o depoimento da testemunha E… é inequívoco em tal matéria, bem como os documentos juntos aos autos o comprovam.

  3. Assim, face aos meios probatórios indicados pela Autora neste seu recurso, não pode dar-se como provado o facto que consta do n° 10 da douta sentença recorrida nos termos em que da mesma consta, devendo revogar-se a douta sentença recorrida nesta parte e dar-se como provado o referido facto nos termos que constam do nº 2 destas conclusões.

  4. É o que se requer nos termos do art. 662° do CPC.

  5. Face aos factos provados - aí se incluindo o que resulta do alegado no presente recurso - entende a Autora que a acção deve proceder.

  6. De tais factos resulta que o Réu incumpriu a prestação, a que estava obrigado - incumprimento esse que se verificou ainda quando o contrato estava em execução 8. Resulta do recibo de quitação junto aos autos na sessão da audiência de julgamento de 26 de Junho de 2014, que a Autora apenas pagou ao Réu a quantia devida na data do respectivo vencimento em 5 de Junho de 2006 - logo, o contrato não se extinguiu em 3 de Maio de 2006.

  7. Resulta dos autos que o Réu recebeu em 3 de Maio de 2006 a quantia devida a título de resgate, pelo que em 22 de Maio de 2006 não devia solicitar (como vem provado) o pagamento da quantia devida na data do vencimento.

  8. Mas solicitou o pagamento de tal quantia, que lhe foi paga porque a Autora ignorava o resgate - logo, ardilosamente, o Réu enganou a Autora c obteve uma quantia que não lhe era devida.

  9. A lei impõe que as partes de um contrato cumpram as prestações que lhe são devidas – nº 1 do art. 762º do cevo 12. "A prestação devida" tem de ser vista pelo lado activo, como ainda pelo lado passivo, ou seja e quanto a este, a parte num contrato tem de se abster de actos que ponham em cousa a boa execução e o pontual cumprimento do contrato pela outra parte.

  10. E cada uma das partes, num contrato, deve agir de boa fé.

  11. Os factos provados revelam que o Réu não só não cumpriu a prestação que lhe era devida, como ainda agiu de má fé, pelo que, 15. Deve a acção proceder e o Réu deve ser condenado no pedido - se assim não for, está a ser violado o art. 762º do CC.

  12. Se assim se não entender, deve - na mesma - a acção proceder, pois que o Réu recebeu duas vezes o capital seguro, quando o que contratualmente lhe era devido era apenas uma prestação.

  13. Há lugar, assim, à repetição do indevido, sob pena de enriquecimento do Réu - foram violados os arts. 463º e seguintes do CCV - pelo que a acção deve proceder e o Réu deve ser condenado no pedido.

  14. E nem se diga que a fundamentação jurídica da Autora é o incumprimento contratual, pois que o Tribunal não está sujeito à aplicação das regras de direito invocadas pela Autora.

  15. Se é certo que o Tribunal recorrido decidiu bem quando disse que não é de aceitar a excepção de prescrição, por alegação extemporânea, 20. Não menos verdade é que não seguiu as regras do direito processual, tendo sido violado o art. 531º do CPC.

O recorrido apresentou resposta, defendendo a confirmação da decisão da 1ª instância, não sem antes ter alertado da pendência de um recurso sobre a decisão de realização da audiência de julgamento na ausência do seu mandatário, o que tenderia a determinar a anulação do processado ulteriormente, incluindo o julgamento e a sentença recorrida.

O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Foi depois recebido nesta Relação, considerando-se o mesmo devidamente admitido, no efeito legalmente previsto.

Indagada a situação referente ao alegado recurso processado em separado, foi obtida a informação constante de fls. 344, reveladora de que foi decretado o desentranhamento das alegações desse recurso, face “à inércia do recorrente e à omissão de pagamento da respectiva taxa de justiça,… por aplicação do disposto no art. 642º, nº 2 do C.P. Civil (…)”. Tal despacho não mereceu qualquer impugnação do aqui recorrido, em tempo útil.

Por conseguinte, o julgamento do presente recurso não se revela...

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