Acórdão nº 371/14.1PFPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Julho de 2015
Magistrado Responsável | NETO DE MOURA |
Data da Resolução | 01 de Julho de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 371/14.1PFPRT.P1 Recurso Penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 371/14.1PFPRT, corre termos pela Instância Central do Porto, 1.ª Secção Criminal (Juiz 12)[1], da Comarca do Porto, foi submetido a julgamento, por tribunal colectivo, o arguido B…, melhor identificado nos autos, mediante acusação do Ministério Público que lhe imputou a prática de factos susceptíveis de consubstanciar um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punível pelo artigo 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, após deliberação do Colectivo, foi proferido acórdão (fls. 300 e segs.), datado de 11.03.2015 e depositado na mesma data, com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto, acordam os da 1.ª Vara Criminal da Comarca do Porto em julgar parcialmente provada e procedente, nos termos referidos, a douta acusação pública deduzida nos autos e, consequentemente: 1) Condenar o arguido pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro – para o qual se convola o crime p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do mesmo diploma legal de que se encontrava aqui acusado –, na pena de 2 (dois) anos de prisão («efetiva»); 2) Condenar o arguido no pagamento das custas e demais encargos deste processo, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UC; 3) Declarar perdidos a favor do Estado: i) As substâncias estupefacientes e respetivas embalagens, apreendidos ao arguido, cuja destruição desde já se determina; ii) A quantia apreendida nos autos ao arguido, a que se dará o destino previsto no artigo 39.º, n.º 1, do falado Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; 4) Ordenar se proceda oportunamente à comunicação prevista no artigo 64.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro; 5) Determinar continue o arguido sujeito à obrigação de permanência na habitação, com sujeição a vigilância eletrónica a que se encontra subordinado, que só se extinguirá após o trânsito em julgado do presente acórdão (cfr. artigos 213.º, n.º 1, alínea b), e 214.º, n.º 214.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal); 6) Advertir o arguido de que, conforme resulta do preceituado no artigo 214.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro, até à extinção da pena que ora lhe foi imposta continuará sujeito às obrigações decorrentes da medida de coacção de termo de identidade e residência que prestou nos autos; 7) Ordenar a oportuna remessa de boletins ao Registo Criminal”.
Inconformado com tal decisão, almejando a diminuição da pena de prisão cominada e a sua substituição por trabalho a favor da comunidade, o arguido dela interpôs recurso para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes “conclusões” (em transcrição integral): 1- “No acórdão recorrido vem dado como provado:“8.1) No dia 25/06/2014, pelas 14horas e 30 minutos, na Rua …, na cidade e comarca do Porto, junto ao portão de acesso ao campo de futebol ali existente, o arguido B… procedeu à venda de quantidade não apurada de estupefaciente a um indivíduo cuja identidade não se logrou apurar, a troco da quantia de € 5 (cinco euros);”.
2- Quando aí se refere “estupefaciente” está-se a utilizar uma conclusão ou conceito de direito, e além disso sem fundamento, porquanto não é aí identificada qualquer planta, substância ou preparação compreendidas nas tabelas anexas ao DL 15/93 de 22/1.
3- Pelo que a matéria de facto reproduzida na 1ª conclusão não deveria ter sido dada como provada no douto acórdão recorrido e deve ser retirada da factualidade provada.
4- No acórdão recorrido vem ainda dado como provado: “ 8.3) Também nesse dia, pelas 16 horas, no interior de um anexo contíguo à residência do arguido, sita na Rua …, nº …, Casa ., na cidade e comarca do Porto, foi encontrado e apreendido, escondido por debaixo de uma chapa, um saco de plástico contendo uma embalagem de heroína, com o peso líquido de 9,114 gramas – cfr. o exame de fls. 92, cujo teor aqui se dá, para todos os legais efeitos, por reproduzido – produto este que também pertencia ao arguido e que ele destinava à venda a terceiros que o procurassem para o efeito mediante contrapartida económica;” 5- O recorrente considera incorretamente julgada – porque não deveria ter sido considerada provada - a parte final dessa factualidade transcrita na conclusão anterior mais concretamente a constante do trecho “produto este que também pertencia ao arguido e que ele destinava à venda a terceiros que o procurassem para o efeito mediante contrapartida económica”.
6- Os depoimentos das testemunhas C…, e, D…, agentes da PSP, prestados na audiência de discussão e julgamento de 7 de Janeiro de 2015, gravados através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal (o depoimento do primeiro consta com início de gravação 16:25:36 e fim 16:38:36 e o do segundo com início 16:55:20 e fim 17:10:56), demonstram que tal factualidade não ficou provada, e não devia ter sido considerada provada.
7- E tal resulta claramente da transcrição dos depoimentos dos mesmos constantes desta peça processual.
8- O que tais testemunhas expressaram sobre a disponibilidade/utilização pelo arguido e/ou esposa do anexo ou barracão em causa baseou-se no “ouvir dizer” e em conclusões que retiraram do que lhes foi dito; nenhum facto presenciaram/comprovaram que atestasse o que a tal respeito afirmaram.
9- Não presenciaram qualquer utilização do anexo ou barracão em causa pelo arguido, ou sequer qualquer facto praticado por ele relacionado com tal espaço.
10- E o que é por eles atestado e presenciaram e comprovaram é que o dito barracão era “de livre acesso” “a porta era manual”, “Do exterior aquilo até era fácil avançar e alguém ir lá pôr aquilo”.
11- Não há prova de que o produto (heroína) encontrado no anexo era do arguido, e pelo contrário o que se provou é que o barracão não tinha fechadura, era de livre e fácil acesso a quem lá quisesse entrar até para esconder o produto em causa.
12- Pelo que deve ser considerada não provada a factualidade “produto este que também pertencia ao arguido e que ele destinava à venda a terceiros que o procurassem para o efeito mediante contrapartida económica;” constante do trecho final do ponto 8.3) dos factos considerados provados pelo acórdão recorrido, reproduzido supra na conclusão 4ª.
13- Em face da procedência da impugnação da decisão sobre matéria de facto nos termos das conclusões anteriores deverá alterar-se a pena aplicada ao arguido no acórdão recorrido pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artigo 25º alínea a) do DL 15/93 de 22/1.
14- Pelo que deverá aplicar-se ao arguido pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artigo 25º alínea a) do DL 15/93 de 22/1, em função dos critérios legais enunciados nos artigos 70º e 71º do C. Penal uma pena de prisão de um ano e determinar-se a sua substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade ao abrigo do artigo 58º do Código Penal.
SEM CONCEDER 15- Ainda que não se considere procedente a impugnação da decisão sobre matéria de facto nos termos das conclusões precedentes, entende-se excessiva, face aos critérios legais enunciados no artº 71º do C. Penal, a pena de dois anos de prisão aplicada ao arguido no acórdão recorrido pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artigo 25º alínea a) do DL 15/93 de 22/1.
16- A atividade do arguido subsumida ao artigo 25º do DL 15/93 de 22/1, assumiu no dizer do próprio acórdão “um carácter esporádico e não organizado, com expressão temporal limitada, que seguramente não envolveu quantias significativas.” 17- Em consequência do exposto nas conclusões 15ª e 16ª pela prática do referido crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artigo 25º alínea a) do DL 15/93 de 22/1, deve o arguido ser condenado numa pena de quinze meses de prisão”.
*Admitido o recurso (despacho a fls. 339) e notificado o Ministério Público, veio este responder à respectiva motivação, pugnando pela sua improcedência, por considerar que se fez correcta apreciação da prova e a aplicação do direito aos factos, também, não merece qualquer reparo.
*Ordenada a subida dos autos ao tribunal de recurso, e já nesta instância, na intervenção a que alude o n.º 1 do art.º 416.º do Cód. Proc. Penal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer em que se manifesta pela improcedência do recurso, se bem que considere que o tribunal a quo incorreu em erro notório na apreciação da prova ao dar como provado o que consta no n.º 1 do elenco de factos provados pois que, não tendo a substância vendida sido apreendida e, logo, não tendo sido submetida ao respectivo exame pericial, não poderia ter-se concluído que era produto estupefaciente sem se conhecer as respectivas características.
*Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, com resposta do recorrente a reafirmar as razões da sua discordância da decisão condenatória.
* Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.
II – Fundamentação São as conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj)[2] e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso, naturalmente sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso, como é o caso das nulidades...
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