Acórdão nº 98356/13.0YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ABREU
Data da Resolução12 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº. 98356/13.0YIPRT.P1 3ª Secção Cível Relator - Juiz Desembargador Oliveira Abreu (120) Adjunto - Juiz Desembargador António Eleutério Adjunta - Juíza Desembargadora Maria José Simões Tribunal de Origem do Recurso – Tribunal Judicial da Comarca de Vale de Cambra (1º Juízo) Apelante/B…, SA.

Apelada/C…, Lda.

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Vale de Cambra (1º Juízo), B…, SA., intentou a presente acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato contra, C…, Lda., peticionando a condenação desta no pagamento da quantia de €6.173,31 (seis mil, cento e setenta e três euros e trinta e um cêntimos), integrada pelos montantes de €5.773,35 (cinco mil, setecentos e setenta e três euros e trinta e cinco cêntimos), a título de capital, de €246,96 (duzentos e quarenta e seis euros e noventa e seis cêntimos), e de €153,00 (cento e cinquenta e três euros) a título de taxa de justiça paga.

Articulou com utilidade os fornecimentos de electricidade à Ré, no âmbito da sua actividade, titulados por facturas, e o seu não pagamento.

Regularmente citada, contestou a Ré excepcionando a ineptidão do requerimento injuntivo e a prescrição do direito da Autora no sentido da exigência do recebimento do preço, outrossim, impugnou a versão dos factos em discussão propugnada pela Autora.

Foi proferido despacho no sentido de a Autora expressamente se pronunciar acerca das excepções invocadas, em ordem a cumprir os ditames do contraditório, tendo em vista a prolação de decisão de mérito.

A Autora sustentou, no essencial, a circunstância de o requerimento executivo se consubstanciar no preenchimento de um formulário próprio, considerando ter feito constar do mesmo todos os factos necessários à fundamentação da sua pretensão, salientando que a Ré convenientemente a interpretou, outrossim, a inexistência da invocada prescrição, entendendo que o envio das facturas cujo pagamento, ora peticiona, para o local indicado por aquela, interrompeu tal prazo prescricional, assim como deve ser aplicável, para a sua contagem, os prazos previstos no Código Civil, dado estarem em causa valores que, não se prendendo com o consumo, revertem para entidades terceiras que não a Autora.

O Tribunal “a quo” considerou estarem reunidas as condições para que fosse proferida decisão de mérito, tendo concluído no dispositivo do respectivo aresto “Pelo exposto, e nos termos dos fundamentos de facto e de Direito invocados, atentos os termos conjugados do art. 10.º, n.º s 1 e 4 da Lei n.º 21/96 de 26/07, dos arts. 298.º, n.º 1, 303.º e 304.º do Código Civil e dos arts. 576.º, n.º s 1 e 3 e 579.º do Código do Processo Civil, julgo a presente acção improcedente, por virtude da prescrição do direito trazido a Juízo pela mesma, em consequência do que absolvo a ré do pedido. Custas pela autora – art. 527.º do Código de Processo Civil. Registe e notifique.” É contra esta decisão que a Autora/B…, SA., se insurge formulando as seguintes conclusões: 1. O Tribunal a quo julgou improcedente a acção interposta pela Recorrente, atenta a prescrição do direito a ser ressarcida dos valores das facturas remetidas à Ré por efeito do contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre as partes, tendo, em consequência, absolvido a Ré do pedido, nos termos conjugados dos Artigos 10.°, n.º 1 e 4 da Lei n.º 21/96 de 26 de Julho, dos Artigos 298.°, n.º 1, 303.° e 304.° do Código Civil e dos Artigos 576.°, nºs. 1 e 3 e 579.° do Código de Processo Civil. Como se verá, com o devido respeito e salvo melhor opinião, não assiste razão ao Tribunal a quo.

  1. O prazo previsto no nº. 1 do Artigo 10.º da Lei nº. 21/96 de 26 de Julho é efectivamente um prazo de prescrição.

  2. No entanto, tal prazo, de seis meses, refere-se ao direito ao recebimento do preço do serviço prestado, ou seja, refere-se não à instauração da acção judicial, mas sim ao envio da factura ao Cliente//Ré após a prestação do serviço.

  3. Sendo que o Tribunal a quo não coloca em causa que tal envio foi feito antes de precludido o prazo de prescrição previsto no nº. 1 do Artigo 10.º Lei nº. 21/96 de 26 de Julho.

  4. Com efeito, as facturas foram remetidas à Ré logo após a prestação do serviço.

  5. No entanto, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, o prazo previsto no n.° 4 do Artº 10.º da Lei n.º 21/96 de 26 de Julho, não é um prazo de prescrição mas sim de caducidade.

  6. Dispõe o referido normativo legal que "o prazo para a propositura da acção ou da injunção pelo prestador de serviços é de seis meses, contados após a prestação do serviço ou do pagamento inicial, consoante os casos".

  7. Ora, nos termos do disposto no n.º 2 do Artigo 298.º do Código Civil, "quando por força da lei ou por vontade das partes um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras de caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição".

  8. Não fazendo o n.º 4 do Artigo 10.º qualquer referência à prescrição, dúvidas não restam que se trata de um prazo de caducidade.

  9. Sendo que, nos termos do Artigo 331.°, e ao contrário da prescrição, a caducidade interrompe-se na data de entrada da acção judicial/injunção.

  10. Tendo a injunção dado entrada no Balcão Nacional de Injunções no dia 5 de Julho de 2013, é apodíctico concluir que só estariam caducos os consumos anteriores a 4 Janeiro de 2013.

  11. Ora, da análise das três facturas peticionadas na acção, constata-se que: a) A factura número ………..908, no valor de € l.950,32, emitida em 03-01-13 e vencida em 11-02-13, com período de facturação é de 4/12/2012 a 3/01/2013 se encontraria caduca; b) A factura n.º ………..840, no valor de € 1.947,73, emitida em 03-02-l3 e vencida em 13-03-l3, com período de facturação de 4/0112013 a 3/02/2013 se encontra em divida e, c) a factura nº. ……….148, no valor de € 1.875,30, emitida em 04-03-13 e vencida em 05-04-13, com período de facturação de 4/02/2013 a 4/03/2013, pelo que se encontra em divida.

  12. Verifica-se a violação do disposto no Artigos 10.º, n.º 1 e 4 da Lei n.º 21/96 de 26 de Julho, com as alterações entretanto introduzidas, dos Artigos 298.º, n.º 1, 303.° e 304.° do Código Civil, dos Artigos 576.°, nºs. 1 e 3 e 579.° do Código de Processo Civil.

  13. Caso assim não se entenda o que não se concede ainda assim não assistira razão ao douto Tribunal a quo.

  14. O Tribunal a quo faz uma interpretação errónea do nº. 1 e, em especial, do nº. 2 do Artigo 323.° do Código Civil, pois, analisando-se a presente acção e a documentação a ela agregada, designadamente os documentos da secretaria do Balcão Nacional de Injunções, a Recorrente interpôs o requerimento de injunção no dia 5 de Julho de 2013 no Balcão Nacional de Injunções, interrompendo-se a prescrição cinco dias após aquele dia, ou seja, em 10 de Julho de 2013.

  15. O Tribunal a quo, chega, inclusivamente na sentença ora recorrida a reconhecer que as duas últimas facturas prescreveriam em 03/08/13 e em 04/09/13, pelo que, há um reconhecimento tácito em como a Recorrente se encontrava em prazo judicial no que respeita à interposição da acção judicial contra a Ré para peticionar os valores inscritos nas duas últimas facturas em causa nos autos.

  16. Contudo o Tribunal a quo, deliberadamente, argumenta no sentido de imputar à Recorrente factos em como a mesma não tinha logrado encetar diligências para a notificação da Ré, daí vir a concluir para prescrição do direito que carreou a juízo.

  17. O que a letra da lei sustenta naquele normativo legal é a interrupção da prescrição dentro dos cinco dias subsequentes à interposição da acção, no caso da requerente não der causa, objectivamente, a essa falta de notificação ou citação.

  18. Neste aspecto é unânime a doutrina e a jurisprudência ao considerarem que só um comportamento objectivo por parte de um autor de um processo levaria a considerar que a prescrição não ocorreria conforme prescrito no n.º 2 do Artigo 323.° do Código Civil.

  19. Acresce que, conjuntamente com o requerimento de injunção, a Recorrente pagou imediatamente a taxa de justiça devida pela mesma, ou seja, €153,00 (cento e cinquenta e três euros), bem como, indicou como a morada da Ré a morada por esta indicada aquando a celebração do contrato de fornecimento de energia eléctrica, não tendo, na vigência do contrato, contactado a Recorrente no sentido de alterar a morada contratual e respectivo local de consumo.

  20. A Recorrente deu entrada da injunção no Balcão Nacional de Injunções em 5 de Julho de 2013, tendo este Balcão promovido a notificação da Ré para a morada contratual, conforme se pode verificar da documentação junta aos autos dos actos da secretaria daquele Balcão.

  21. O Balcão Nacional de Injunções notificou a Ré para a morada sita na …, …, ….-… Vale de Cambra, em 15 de Julho de 2013, a qual veio devolvida ao remetente em 16 de Julho de 2013 por ninguém se encontrar na morada.

  22. A secretaria do Balcão Nacional de Injunções promoveu consultas às bases de dados da segurança social do Instituto de Informática e Estatística da Segurança Social em 30 de Julho de 2013, de onde resultou que a Ré tinha a mesma sede.

  23. A mesma funcionária que efectuou as pesquisas, nessa mesma data, também consultou a certidão de registo comercial da Ré onde consta como sede social a morada que a Recorrente indicou no requerimento de injunção como sendo a da Ré: 25. Só após o decurso das férias judiciais, em 13 de Setembro de 2013 é que o Balcão Nacional de Injunções voltou a notificar a Ré, para a morada do gerente, Sr. D…, com residência no …, …, ….- … …, que foi recebida em 17 de Setembro de 2013, encontrando-se o aviso de recepção assinado por E….

  24. Diga-se até que a presente questão foi apreciada muito recentemente no Acórdão n.º 67/2014, do Tribunal Constitucional, no âmbito do processo n.º 214/13, publicado na 2.a Série do Diário da Republica, n.º 37, de 21 de Fevereiro de 2014.

  25. Na primeira...

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