Acórdão nº 972/11.0TBLSD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelALBERTO RU
Data da Resolução23 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Tribunal da Relação do Porto – 5.ª secção.

Recurso de Apelação.

Processo n.º 972/11.0TBLSD do Tribunal Judicial da Comarca de Porto Este – Penafiel – Instância Central – Secção Cível – J3.

*Juiz relator – Alberto Augusto Vicente Ruço.

  1. Juiz-adjunto……Joaquim Manuel de Almeida Correia Pinto.

  2. Juiz-adjunto…….Ana Paula Pereira de Amorim.

*Sumário: A circunstância de no n.º 3, do artigo 9.º, da Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio, se referir que «Nos casos em que não haja lugar à indemnização pelos danos previstos na alínea a) do artigo 3.º, é também inacumulável a indemnização por dano biológico com a indemnização por acidente de trabalho», não impede que seja atribuída indemnização a título de dano biológico, se este existir.

*Recorrente/Ré…………………......

Companhia de Seguros B…, S.

A., melhor identificada nos autos.

Recorrido/Autor…………………...

C…, carpinteiro, residente em …, …, ….-… Celorico de Basto.

*I. Relatório.

  1. O presente recurso vem interposto da sentença que condenou a ré seguradora a pagar ao autor uma indemnização por danos que este alegou ter sofrido em consequência de um acidente de viação.

    Pediu €25.000,00 euros a título de danos não patrimoniais; €7.000,00 euros por perdas salariais e €85.000,00 euros por perda de capacidade de ganho.

    No final, o tribunal julgou parcialmente procedente a acção e condenou a ré seguradora a pagar ao autor a quantia de «…€30.000,00 (trinta mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a citação da ré, até integral pagamento», tendo absolvido a ré do restante pedido.

    Esta verba é composta pela quantia de €25.000,00 euros atribuída ao recorrido a título de dano biológico.

  2. É desta decisão que recorre a ré B…, S. A., tendo formulado as seguintes conclusões: «1. O presente recurso versa apenas sobre o montante de €25.000,00 atribuído pelo Tribunal a quo ao Recorrido a título de Dano Biológico, pelo que nenhum reparo há a fazer ao restante conteúdo da douta sentença de fls.

    1. Na verdade, a ora Recorrente não pode concordar com o teor da douta sentença de fls. nesse aspeto, por entender que houve uma incorreta interpretação e aplicação da lei, na medida em que entende não ser devida qualquer indemnização ao lesado a título de dano biológico. Daí o presente recurso na expectativa de que lhe seja feita justiça.

    2. O Recorrido intentou uma ação declarativa sob a forma de processo ordinário contra a ora Recorrente, na qual pediu a condenação desta, pelos danos advenientes de acidente de viação, nas quantias de €25.000,00, a título de danos não patrimoniais, €7.000,00, por perdas salariais e €85.000,00, por perda de capacidade de ganho. Acrescidas de juros legais, contados da citação e até integral pagamento.

    3. Quando a presente ação deu entrada em juízo, em 04.07.2011, bem sabia o Recorrido, e isso resultou alegado e provado pela ora Recorrente e, mais tarde, também pela chamada D…, nomeadamente com a junção dos respetivos documentos comprovativos (vide, por exemplo, documentos n.º 4 e 7 juntos com o articulado da chamada), que não tinha direito a peticionar os referidos valores a titulo de perdas salariais, pois que já havia recebido daquela esses valores, atinentes aos períodos de Incapacidade Temporária Absoluta e Parcial sofridos no âmbito da regularização do acidente de trabalho.

    4. Veio o Recorrido a reduzir o pedido para o montante de €106.815,82, por requerimento apresentado em 02.05.2012, apenas quando confrontado com tais documentos, reconhecendo afinal ter já recebido o montante de €10.184,18 no âmbito da regularização do processo por acidente de trabalho, que correu termos no Tribunal de Trabalho de Guimarães, sob o n.º 2249/10.9TIPNF.

    5. Tal valor correspondia, contudo, não só aos períodos de incapacidade, mas também ao capital de remição entregue em 24.02.2012, ou seja, recebeu valores relativos à perda de capacidade de ganho em que também havia fundamentado a presente ação.

    6. O Tribunal a quo andou mal ao decidir como fez, pois apesar de dar como provados os factos supra referidos (vide factos provados n.º 25, 26, 28 e 29), entendeu que o Recorrido ainda teria direito a ser ressarcido pelo dano biológico, repercutindo-se o mesmo até no exercício da sua atividade profissional habitual na medida em que implica a necessidade de desenvolver esforços suplementares.

    7. O acidente dos autos traduziu-se simultaneamente num acidente de trabalho e acidente de viação. As indemnizações a que o lesado terá direito em ambos os domínios não são cumuláveis, mas complementam-se entre si, não devendo ressarcir-se duplamente o mesmo dano.

    8. Os esforços acrescidos ou suplementares no exercício da atividade profissional já foram salvaguardados pela indemnização atribuída no foro laboral, pelo que considerando-os novamente no domínio cível, estaremos a contabilizar duplamente o mesmo parâmetro do dano.

    9. As indemnizações no domínio dos acidentes de viação são reguladas pelo disposto no DL 291/2007 de 21 de Agosto, e pela Portaria 37712008 de 26 de Maio.

    10. Especificamente quanto à situação ora em crise, dita o art. 26° do DL 291/2007 que "1·Quando o acidente for simultaneamente de viação e de trabalho, aplicar-se-ão as disposições deste decreto-Iei, tendo em atenção as constantes da legislação especial de acidentes de trabalho".

    11. Por sua vez o art. 9.º da Portaria 377/2008, cuja letra é muito clara, dispões que "1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, quanto ao Fundo de Garantia Automóvel, se o acidente que originou o direito à indemnização for simultaneamente de viação e de trabalho, o lesado pode optar entre a indemnização a título de acidente de trabalho ou a indemnização devida ao abrigo da responsabilidade civil automóvel, mantendo-se a actual complementaridade entre os dois regimes. 2. Sendo o lesado indemnizado ao abrigo do regime específico de acidentes de trabalho, as indemnizações que se mostrem devidas a título de perdas salariais ou dano patrimonial futuro são sempre inacumuláveis. 3 - Nos casos em que não haja lugar à indemnização pelos danos previstos na alínea a) do artigo 3.º, é também inacumulável a indemnização por dano biológico com a indemnização por acidente de trabalho." 13. É precisamente esta última a situação dos autos, já que o Mm. Juiz a quo entendeu ser apenas de atribuir ao Recorrido uma indemnização pelo dano biológico, além, obviamente, da devida pelos danos não patrimoniais, não abrangidos pela ação laboral.

    12. Tendo em conta a data de prática dos atos, nomeadamente interposição da presente ação e recebimento do capital de remição na ação laboral, poderia o lesado ter optado por uma ou outra indemnização.

    13. Nos termos da lei, também se conclui que a indemnização a título de dano biológico não é cumulável com a indemnização já recebida no foro laboral, pelo que o recorrido não terá direito à mesma.

    14. Assim, vem a Recorrente requerer que revoguem V.a Exas. a douta sentença de fls., nos termos supra expostos, mantendo-a apenas na parte em que atribui ao recorrido uma indemnização pelos danos não patrimoniais por si sofridos no montante de €5.000,00, por ser a única devida.

    15. A douta sentença de fls. viola o artigo 9.º, n.º 3 da Portaria 377/2008 de 26 de Maio.

    Nestes termos e nos melhores de direito, revogando v. exas. a douta sentença de fls. farão um ato de inteira e sã justiça».

  3. O recorrido contra-alegou e concluiu neste termos: «1. O Tribunal a quo deu como provada entre outros, a matéria de facto vertida nos pontos 18, 19, 20, 21, 24 e 29, e com base nessa factualidade arbitrou ao recorrido uma indemnização de €30.000,00.

    1. A apelante contesta tal decisão alegando existir cumulação de indemnizações (entre o foro laboral e o foro civil) e, por via disso, uma violação do art. 9.º, n.º 3, da Portaria 377/2008, de 26 de Maio. 3. Nenhum dos danos que foram objecto de ressarcimento em sede laboral pode ser identificável com os danos não patrimoniais e biológico que motivam a atribuição ao apelado dos montantes indemnizatórios no âmbito dos presentes autos.

    2. O ressarcimento dos danos não patrimoniais jamais esteve em causa no processo de acidente de trabalho, já que este é fundamentalmente destinado a compensar o Autor pelas perdas salariais determinadas pelo acidente.

    3. Do mesmo modo, o dano biológico sofrido pelo...

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