Acórdão nº 443/09.4TRPRT.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso 443/09.4TRPRT.P2*Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

  1. Nos autos de processo comum singular 443/09.4TRPRT, do 2º Juízo Criminal de Gondomar, acusado pelo MP, foi submetido a julgamento o arguido B…, casado, nascido 03.08.1960, advogado, filho de C… e de D…, natural da freguesia …, concelho de …, com residência profissional na Rua …, nº .., .º Dto., em Lisboa, pela prática de factos subsumíveis ao crime de difamação agravado, p. e p. nos artigos 180º, nº 1, 182º, 183º, nº 1, al. a) e 184º, por referência ao artigo 132º, nº 1, al. l), todos do Código Penal.

  2. O ofendido deduziu PIC, pedindo que o arguido seja condenado a pagar-lhe a quantia de €5.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da notificação para contestar até efectivo pagamento.

  3. Efectuado o julgamento foi o arguido absolvido tanto do crime por que vinha acusado como do PIC.

  4. Não conformado, o Digno Magistrado do MP interpôs recurso.

    Na procedência do mesmo foi anulada a sentença por falta de fundamentação.

    Lê-se do acórdão desta Relação que “a Sr.ª Juiz não explica (a decisão é totalmente omissa nesta parte), e vai ter de o fazer, por que é que a expressão usada na resposta ao parecer do MP na Relação do Porto, na qual apelida o ofendido, conjuntamente com uma Sr.ª Juíza, de “Magistrados Prevaricadores”, não é ofensiva da honra quando se trata de emissão de um juízo de valor que, com o devido respeito, em nada “depende da análise jurídica do comportamento objectivamente comprovado do arguido”.

  5. Lavrada nova sentença, foi novamente o arguido absolvido tanto da acusação como do PIC.

  6. Porque continua irresignado, o Digno Magistrado do MP interpõe recurso, de cuja motivação extraiu as seguintes conclusões: 1. A decisão recorrida interpretou erradamente o principio consagrado no artigo 127 do CPP, ao dar como provado que um arguido advogado que apelida de prevaricador um Procurador da República, durante e por causa da postura deste num interrogatório judicial, não age com dolo, com intenção de ofender e ao dar como provado que tal epíteto é necessário á defesa de um cliente do advogado arguido, sem que alguma vez se tenha provado no dito magistrado uma postura criminosa.

  7. E, tal interpretação errada, viola também o dito princípio consagrado no artigo 127 do CPP, por não ter feito uma análise criteriosa de toda a prova e apenas dado credibilidade à versão do arguido e de suas testemunhas, ao arrepio das regras de experiência, do bom senso, como exige o artigo 127 do CPP.

  8. Deve pois a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que dê como provados todos os factos que constavam da acusação incluindo os três factos que agora a decisão recorrida deu como não provados e assim se dará cumprimento satisfatório ao artigo 127 do CPP.

  9. E, tal nova decisão deverá terminar como tem de ser, pela condenação do arguido como vinha requerido na acusação e, só assim se poderá fazer uma esclarecida e saudável Justiça.

  10. O arguido apresentou a sua resposta que, por despacho de fls. 571 foi mandada desentranhar e entregar ao apresentante.

    Fundamentou a Sr.ª Juiz a sua decisão no facto de “o prazo para responder ao recurso interposto terminou no dia 23/6/2014. Tendo as alegações do recorrido sido apresentadas em 4/7/2014, são, assim, manifestamente extemporâneas”.

  11. O arguido atravessou requerimento, que apelidou de reclamação, suscitando a intervenção do Ex.mo Presidente desta Relação.

    Conclui pedindo seja proferido despacho “que ordene a admissão da resposta oferecida, em tempo útil e legalmente oportuno pelo Arguido, às motivações de recurso apresentadas pelo MP de Gondomar, no âmbito dos presentes autos”.

  12. Não foi lavrado qualquer despacho a dar destino à Reclamação.

  13. Nesta Relação, o Exmo PGA emite douto parecer no qual consignou: “Tais juízos são claramente ofensivos da honra e consideração de um Magistrado do Ministério Público porque incorporam a negação dos já enunciados deveres legais e estatutários a que o mesmo se mostra vinculado e deste modo atingem a sua honra, na dignidade da pessoa e na pretensão de respeito que lhe é devido Destarte, acompanhamos a resposta apresentada pelo Ministério Público na 1ª Instância, a cujos argumentos nada mais se nos oferece acrescentar com relevo para a apreciação e decisão do recurso pelo que, sem necessidade de mais considerações, se emite parecer no sentido da procedência do recurso”.

    Colhidos os vistos dos Colhidos dos Ex.mos Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

    II 1. O Tribunal a quo considerou provada a seguinte factualidade:

    1. O arguido exerce a profissão de advogado.

    2. No âmbito do processo-crime n.º 221/08.8JAPRT, teve lugar no dia 3 de Junho de 2009, no Tribunal de Instrução Criminal do Porto, entre outros, o primeiro interrogatório judicial do E…, que tinha como defensor constituído, o ora arguido, Dr. B….

    3. Iniciado o referido interrogatório, o arguido afirmou que o seu cliente havia sido detido em hora anterior à que consta dos mandados de detenção, encontrando-se, assim, ultrapassado o prazo máximo de quarenta e oito horas.

    4. Para confirmar tal versão dos factos, o arguido apresentou como testemunhas alguns familiares do seu cliente que estavam presente naquele Tribunal.

    5. Na conclusão desse requerimento, o arguido requereu que o seu cliente fosse restituído à liberdade.

    6. O ofendido, Dr. F…, Procurador da República, que representava o Ministério Público no referido interrogatório, entendeu que não existiam nos autos elementos fiáveis que pudessem pôr em causa a hora da detenção constante dos mandados, além de que na diligência em causa não poderiam ser inquiridas quaisquer testemunhas, pelo que promoveu que se procedesse, de imediato, ao primeiro interrogatório judicial do cliente do aqui arguido.

    7. A M.ª Juiz de Instrução que presidia ao interrogatório, argumentando que a diligência em causa destinava-se à aplicação de medidas de coacção e não à realização de diligências que contrariem aquilo que consta exarado nos autos, nomeadamente a hora em que o E… ficou privado da liberdade, indeferiu a pretensão do aqui arguido e passou, de imediato, ao interrogatório do seu cliente.

    8. Ainda antes de iniciar o interrogatório, o arguido ditou para a acta um novo requerimento, invocando a nulidade do despacho da M.ª Juiz de Instrução e de todo o processado subsequente, requerendo a emissão da pertinente certidão com vista a intentar as queixas-crime que entender adequadas.

    9. Na sequência desse requerimento, a M.ª Juiz de Instrução deferiu, de imediato, a certidão, relegando o conhecimento da nulidade invocada para o despacho referente às medidas de coacção.

    10. No final do interrogatório de todos os arguidos, no dia 9 de Junho de 2009, a M.ª Juiz de Instrução proferiu despacho em que indeferiu as arguidas nulidades, ilegalidades e irregularidades suscitadas pelo aqui arguido e aplicou ao seu cliente, além do termo de identidade e residência, caução, no montante de €50.000,00 (cinquenta mil euros) e proibição de contacto, por qualquer meio, inclusivamente por escrito, com os restantes arguidos, bem como com os legais representantes das empresas lesadas que negociaram com as sociedades instrumentais “G…/H…” e funcionários ao seu serviço.

    11. Inconformado com tal decisão, no dia 3 de Julho de 2009, o arguido, na qualidade de Advogado do E…, apresentou um recurso que deu entrada no Tribunal de Instrução Criminal do Porto e destinava-se a ser apreciado pelo Tribunal da Relação do Porto.

    12. Nas alegações desse recurso, o arguido escreveu nas conclusões o seguinte: “O interrogatório do arguido e ora recorrente, haverá que ser declarado nulo, bem como tudo quanto foi processado subsequentemente; Com efeito, o período de detenção antes da apresentação à Meritíssima Juíza de Instrução Criminal, excedeu as quarenta e oito horas previstas na lei; Por outro lado, o mandado de detenção padece do vício previsto e punido pelo artigo 256°, n.º 1, alínea d) e n.º 4, do CP; Facto esse que por ser crime público e ter sido arguido, sem que fossem extraídas as consequências legais, faz incorrer a Meritíssima Juiz de Instrução e o Digníssimo Magistrado do Ministério Público no crime previsto e punido pelo artigo 369º, do CP”; m) No dia 2 de Julho de 2009, o arguido dirigiu uma carta ao Procurador da República ofendido, Dr. F…, com o seguinte teor: “Ex.mo Senhor Procurador Adjunto, Doutor F…, B…, Advogado melhor identificado com sinais nos autos em referência, vem mui respeitosamente informar como segue: - Durante o primeiro interrogatório do arguido detido, foi levantado o incidente de falsidade do mandado de detenção; - Tal facto mereceu da parte da Meritíssima Juíza de instrução Criminal, remissão para os artigos 544.° e seguintes do CPC. Acontece que, - O facto denunciado constitui crime público, carecendo de investigação mal seja adquirida noticia do mesmo: - Por tal facto, salvo melhor e mais douta opinião, deveria V. Ex.ª (bem como a Meritíssima Juíza de Instrução Criminal), no mínimo, requerer a extracção de certidão para que o factos em apreço fossem objecto de investigação: - Não o tendo feito, incorreu V. Exa, no modesto ponto de vista do ora subscritor na prática do crime previsto e punido pelo artigo 369º, do CP; - situação que o ora subscritor entende ser obrigado a levantar, em sede de recurso, tendo em conta o dever de patrocínio a que está adstrito; Por tal facto, e apesar do artigo 91º, do Estatuto da Ordem dos Advogados a tanto não obrigar, mas tendo em conta o dever de lealdade a que os operadores da justiça estão vinculados, serve o presente requerimento para informar V. Exa. que tal será focado nas suas motivações do recurso”.

    13. Além disso, o arguido, na resposta ao parecer do Ministério Público no Tribunal da Relação do Porto, deu entrada nesse Tribunal, no dia 8 de Setembro de 2009, uma peça processual por si subscrita, onde escreveu, referindo-se ao magistrado do Ministério Público ofendido e à M.ª Juiz de Instrução Criminal: “Vêm...

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