Acórdão nº 801/10.1TAESP.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelCRAVO ROXO
Data da Resolução09 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

801/10.1TAESP.P1*Acordam na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:*No processo comum nº 801/10.1TAESP, do 1º Juízo, 1ª Secção Criminal, Instância Central da Comarca do Porto, foi o arguido B… julgado em Tribunal Colectivo.

Realizado o julgamento, foi proferida a seguinte decisão:

  1. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos art.ºs 217º e 218º, n.º 1 e n.º 2, al. b) ambos do Código Penal (por referência ao ponto I), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  2. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.ºs 217º e 218º, n.º 2, al. b) ambos do Código Penal (por referência ao ponto II) na pena de 2 (dois) anos de prisão.

  3. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.ºs 217º e 218º, n.º 2, al. b) ambos do Código Penal (por referência ao ponto III) na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão.

  4. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos art.ºs 217º e 218º, n.º 2, als. a) e b) ambos do Código Penal (por referência ao ponto IV), na pena de 3 (três) anos de prisão.

  5. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos art.ºs 217º e 218º, n.º 1 e n.º 2, als. a) e b) ambos do Código Penal (por referência ao ponto V), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) de prisão.

  6. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos art.ºs 217º e 218º, n.º 1 e n.º 2, al. b) ambos do Código Penal (por referência ao ponto V), na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) de prisão.

  7. Absolver o arguido B… da prática de um crime de falsificação de documento simples, p. e p. pelo art.º 256º, n.º 1 do Código Pena.

  8. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de falsificação de documento simples, p. e p. pelo art.º 256º, n.º 1, als a), c) e e) do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão.

  9. Condenar o arguido B… pela prática de um crime de falsificação de documento agravado, p. e p. pelos art.ºs 256º, n.º 3, por referência aos art.ºs 255º, al. a) e 256º, n.º 1, als. c) e e) do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão.

  10. Em cúmulo jurídico, condena-se o arguido B… na pena única de 7 (sete) anos de prisão efectiva.

*Desta decisão, recorre o arguido, formulando as seguintes conclusões (sic), que balizam e limitam o âmbito do recurso:*A - Inexistência da circunstância qualificativa "modo de vida" determinante para a qualificação da burla: I - O Tribunal a quo socorre-se do artigo 218.°, n.° 2 do CP para qualificar o crime de burla por entender que o recorrente fazia da sua prática modo de vida; II- Os factos criminosos que constam dos autos são tão separados no tempo - Junho de 2010, Janeiro de 2011, finais de 2011, Outubro de 2013 e Fevereiro de 2014 - que não têm o mínimo contacto com uma realidade conceptual do princípio do modo de vida.

III- O Tribunal a quo qualifica as condutas como modo de vida também pela ausência de declarações de rendimentos "(...) até porque provado ficou que desde o ano de 2007 que o recorrente não apresentou qualquer declaração de rendimentos e não efectuou descontos para a Segurança Social, não se encontrando vinculado a qualquer entidade empregadora desde Abril de 2007." IV- A falta de apresentação de declarações fiscais, embora possam conduzir a violações fiscais relativas à falta de entrega das declarações de rendimentos, não podem consubstanciar ou até indiciar a prática de um modo de vida criminoso.

V- Além disso, afigura-se ainda de maior gravidade o facto do Tribunal a quo fundamentar esta questão com processos que foram arquivados por desistência de queixa e, deste modo, não ter sido afastado o velho princípio que recai sobre o recorrente de in dúbio pro reo.

VI- Ou seja, aproveitou o Tribunal a quo processos cuja responsabilidade criminal não se apurou - por desistência de queixa - para fundamentar a qualificação do crime de burla.

VII- E, assim, o recorrente foi condenado pelo crime de burla qualificada, sendo esta qualificação baseada no modo de vida do recorrente que, como vimos, não tem qualquer razão de ser, mormente nas decisões vertidas nos pontos a), b), c) e f) do douto acordão.

VIII- Caso de burla simples estamos na presença de uma moldura penal até três anos de pena de prisão, enquanto que no caso de burla qualificada numa pena de prisão de dois a oito anos.

IX- E, assim, desde já se requer que as decisões supra identificadas devam ser tidas com base na moldura penal do crime de burla simples.

B - da consideração de burla simples para a desistência de queixa X- Acresce ao que foi dito, que inexistindo a qualificação do crime de burla, o recorrente jamais poderia ser punido pelo crime constante no ponto II dos factos provados - vide pág. 267 dos autos e págs. 61, 62. 63 e 91 do douto acórdão.

XI- Com efeito, o crime de burla simples previsto e punido pelo artigo 217.° do CP é um crime semi-público, ou seja, admite desistência de queixa.

XII- Consta dos autos a pág. 267 dos autos e 61, 62, 63 e 91 do douto acórdão, C… e D… declararam nos autos desistir da queixa apresentada contra o recorrente.

XIII- E tal desistência foi rejeitada, tal como foi vertido na pág. 63 do douto acórdão, porque se estava na presença de um crime de natureza pública e o recorrente fazer da burla um modo de vida.

XIV- Não resultou provado que o recorrente fez da burla modo de vida; e, assim, não poderia tal crime constituir natureza pública.

XV- A desistência de queixa deveria ter sido aceite, atenta a natureza semi- pública do crime aqui em causa.

XVI- E assim fosse, como é de elementar justiça, a condenação por este processo não entrava para o cúmulo jurídico da pena aplicada ao recorrente.

XVII- Face ao exposto, a desistência de queixa supra identificada deve ser aceite e. consequentemente, o crime constante do ponto II do Douto acórdão não ser considerado para efeito de cúmulo jurídico.

C - concurso aparente entre os crimes de falsificação de documento e o crime de burla XVIII- Quanto a este ponto da factualidade dada como provada, vem o Douto acórdão, nas págs. 59 a 61, 83, 84, 85, 90 e 91, condenar o recorrente por burla qualificada a 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, por falsificação de documento simples a 6 (seis) meses de prisão e pelo crime de falsificação de documento agravado a 1 (um) ano de prisão.

XIX- Em síntese, os factos dados como provados e consequentes crimes praticados são os seguintes: Burla O recorrente exibiu um imóvel a E… dizendo que o mesmo pertencia a F… com o propósito de o vender; E… acreditou que o recorrente estava em representação de F…; O recorrente apresentou um contrato promessa a E… que acedeu a assinar; E… entregou ao recorrente um cheque de 8.000€; - O recorrente sabia que não podia vender o imóvel porque não detinha autorização do proprietário; Falsificação de Documento - O recorrente elaborou um contrato promessa, apondo ou mandando apor no mesmo, as palavras "F…", como se da assinatura dele se tratasse e entregou-o ao E… para que este o assinasse na qualidade de promitente comprador; Falsificação de Documento Agravado - E… entregou o dito cheque de 8.000€; - O recorrente ou alguém a seu mando apôs no verso do cheque os dizeres "F…", como se da assinatura deste se tratasse; -O recorrente usou da assinatura de F… sem o seu consentimento.

XX- Face aos factos supra descritos e tidos como provados, os crimes de falsificação cometidos pelo recorrente foram o meio com que cometeu o crime de burla.

XXI- Uma falsificação de escritos utilizados unicamente como meio de burlar alguém, está em concurso aparente (é consumida pelo) com o crime de burla (crime-fim), devendo a punição deste concurso ser encontrada na moldura penal mais grave, na qual se considerará o ilícito excedente em termos de medida da pena." - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.° 4395/03.6TDLSB.L1-5 de 29-06-2010 in www.dgsi.pt.

XXII- Neste sentido escreve Paulo Pinto de Albuquerque: "Há concurso aparente (consunção) entre o crime de falsificação de documento e o crime de burla ou qualquer outro crime que tenha sido preparado, facilitado, executado ou encoberto por intermédio de documento falso, tendo o legislador propositadamente afastado a jurisprudência dos acórdãos de fixação de jurisprudência do STJ de 19/02/1992 e 8/2000 (...)." XXIII- Assim, por encontrarem em concurso aparente, outra decisão não se espera que não seja a do crime de burla consumir o crime de falsificação, o que desde já se peticiona.

D - Do crime continuado XXIV- O recorrente vem acusado de ter cometido, em autoria material e concurso efectivo, três (3) crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.°, n.° 1 e 218.°, n.° 2, ais. a) e b) do Código Penal (CP), um (1) crime de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.°, n.° 1 e 218.°, n.° 2, al. b) do CP, dois (2) crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.°, n.° 1 e 218.°, n.° 2, al. b) do CP, um (1) crime de falsificação de documento, p. e p. pelos artigos 255.° e 256.°, n.° 1, ais. a), c) e e) do CP, um (1) crime de falsificação de documento, p. e p. pelos artigos 255.° e 256.°, n.° 2 do CP.

XXV- O recorrente, a ser condenado com decisão transitada em julgado, apenas pode ser punido por um crime (continuado), ou seja, um crime de burla qualificada.

XXVI- Atendendo à circunstância do crime de burla consumir o de falsificação, a punição pelo crime continuado deve ser a de mais elevada moldura penal, que é o da burla qualificada.

XXVII- Encontramo-nos diante de uma pluralidade de factos aos que, por força da lei, corresponde uma unidade de acção e portanto o tratamento como um único crime, ou seja, a actuação imputada ao recorrente consubstancia a previsão legal do crime continuado.

XXIX- As resoluções concebidas a concretizadas pelo recorrente estão entre si umbilicalmente relacionadas, estão numa relação de continuidade e interdependência, inserem-se numa rotina de...

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